sábado, 30 de junho de 2012

[SGM] Os Fantasmas de Yalta nos perseguem ainda Hoje

Eric Margolis, 5/07/2010


Como colunista de assuntos estrangeiros, é um pouco estranho estar escrevendo sobre o Mar Negro quando tanta coisa está acontecendo em casa: a atrasada demissão do general americano Stanley McChrystal, o ataque impressionante da Grã-Bretanha à suas dívidas, a nova regulamentação dos bancos americanos, e a farra cara e desnecessária do G20 em Toronto, que tornou aquela metrópole normalmente pacata em uma versão de Fuga de Nova York.

Mais sobre McChrystal e seus Cruzados na próxima semana.

Para mim, como historiador militar, Yalta é uma conexão da história, o lugar dos eventos que continuam a afetar nosso mundo atual. Ela será estudada mesmo após o fim da última Guerra Afegã e continuará sendo discutida após os banqueiros de Wall Street serem esquecidos.

Como toda residência imperial russa parece, Livadia é um palacete, mesmo modesto. O Czar Nicolau II tinha este belo palácio de calcário construído como residência de férias da família na ensolarada Criméia.

Livadia negligencia uma das florestas sub-tropicais mais incríveis da Criméia e o vislumbre do Mar Negro. O último líder soviético, Mikhail Gorbachev, tinha uma casa de verão perto da costa, no antigo porto de comércio grego em Foros. Josef Stalin, que amava a costa do Mar Negro, tinha dachas (vilas) espalhadas entre a Criméia e a Georgia.

Durante os anos 1980, fui até Sochi, Abkhazia e Georgia quando os americanos não eram permitidos ir além dos limites da cidade de Moscou. Fiquei espantado ao descobrir o norte de Sochi como uma versão soviética de Acapulco, completa com um hotel em forma de pirâmide, discotecas noturnas, bares tumultuados e multidões de foliões abastecidos de vodka.

De volta para Livadia. Como muitas coisas russas, o palácio mexe com as emoções de qualquer um. Tantos fantasmas circulam por seus salões sombrios.

As paredes do andar superior do palácio estão lotadas de fotos do Czar, da Imperatriz Alexandra e de suas adoráveis crianças. O apaixonado Nicolau freqüentemente negligenciava assuntos de governo para gastar tempo com sua família. Havia fotografias tristes de seu filho, que sofria da tragédia genética da família, hemofilia – mas não há fotografias do monge sinistro Rasputin, que voltou o povo contra a Czarina.

Vemos o rosto cansado de Nicolau, os olhos assustados ressaltados por trás de sua barba de um governante fraco superado por uma tempestade de problemas, faltando-lhe vontade ou força para governar uma Rússia colapsando em uma revolução.

As fotografias mostram a família imperial reunida em Livadia do mesmo modo como eles estavam quando foram assassinados em 1918 por atiradores comunistas em uma sombria base nos Urais. Quem os vê lamenta que essa família unida por amor tão intenso e seu fim trágico.

Mas enquanto estava estudando estes momentos melancólicos do último Czar da Rússia, fiquei intrigado como Nicolau carrega uma responsabilidade intensa pelos desastres subsequentes do século XX. Ele teve em suas mãos a chance de mudar o fluxo da história, mas falhou em fazer isso. Vemos atitudes semelhantes de indecisão no caráter de um outro líder iniciante, conduzido em tempos obscuros, Barack Obama.

Em 1914, a Sérvia não pestanejou em provocar uma guerra entre a Rússia e seu inimigo, o Império Austro-Húngaro, sobre a Bósnia-Herzegovínia, ao assassinar o Arquiduque Franz Ferdinand, sucessor do trono Habsburg, em Saraievo. Como esperado, a Áustria mobilizou seus exércitos para se vingar da Sérvia.

A Sérvia era aliada dos russos, como o é ainda hoje, e a primeira peça da expansão russa na Europa Oriental pós-Império Otomano, como também o é ainda hoje. Em um ato fatal que encerrou a Época de Ouro da Europa, Nicolau ordenou que seus exércitos poderosos se mobilizassem contra a Áustria em apoio à Sérvia.

A mobilização da Rússia forçou o aliado da Áustria-Hungria, Alemanha, a mobilizar suas forças. A França mobilizou em resposta à mobilização alemã. Enfrentando França e Rússia em duas frentes, a Alemanha foi forçada a atacar a França antes que os vastos exércitos da Rússia tomassem o terreno.

A decisão do Czar de mobilizar acendeu o pavio da Primeira Guerra Mundial, que levou então à Segunda Guerra Mundial.

Nicolau poderia ao invés disso ter se dirigido a Berlim em seu trem particular para encontrar seu “primo Willy”, o Kaiser da Alemanha, para preveni-lo da eminente catástrofe. Mas Nicolau libertou os cães de guerra. Ele acabou perdendo seu Império e sua família – e jogando a Europa em três décadas de guerra.

No piso principal de Livadia, ninguém sente melancolia, mas raiva. Lá, em fevereiro de 1945, o presidente americano Franklin Roosevelt, o Primeiro-Ministro Winston Churchill e o ditador soviético Josef Stalin se encontraram para decidir o futuro da Europa no pós-guerra.

Na maior traição da história moderna, os líderes de guerra Aliados deram metade da Europa para o domínio soviético, levando dezenas de milhões de seus povos para os gulags, ditaduras e confisco de suas propriedades.

O falecido general da KGB Pavel Sudoplatov, que liderou a equipe que matou Trotsky e esteve presente em Yalta, chama adequadamente o pacto em seu diário como “tão cínico quanto o pacto Hitler-Stalin de 1939” que dividiu partes da Europa Oriental entre a Alemanha e a União Soviética. Mas naquele caso, Hitler e Stalin fizeram um acordo de dois lados, restaurando terras às suas nações que foram perdidas em consequência da Primeira Guerra Mundial.

Yalta foi uma entrega vergonhosa para apenas um lado de metade do continente europeu. Foi uma traição mais clamorosa do que o Pacto citado acima. A esquerda submissa, assim como o senil Roosevelt continuaram saudando Stalin, que havia matado mais de 20 milhões de seu próprio povo, “nosso Tio Joe”.

Ironicamente, na semana passada, o governo pró-ocidente da Georgia explodiu uma estátua de Stalin em sua cidade natal de Gori, irando muitos geórgios e russos em uma época em que a memória do ditador soviético está sendo reabilitada na Rússia.

A maquinaria pesada usada por Stalin para industrializar a URSS e construer suas fábricas de armas foi largamente comprada dos Estados Unidos. Moscou confiscou grãos de seus camponeses para financiar a industrialização, deixando cerca de dez milhões deles famintos. Mao Tsé-Tung mais tarde faria o mesmo para industrializar a China, da mesma maneira cruel nos anos 1950. Lembrem-se da profecia de Lênin que os capitalistas venderiam aos comunistas a corda que seria usada para enforcá-los.

Tem sido geralmente esquecido que os campos de concentração e o extermínio em massa de Stalin atingiram seu pico nos anos 1930, pelo menos cinco anos antes de Hitler começar seu extermínio em massa. Além disso, a América partiu para o socorro da União Soviética quando ela foi atacada pela Alemanha, fornecendo grandes quantidades de materiais, armas, combustível e dinheiro.

Como Churchill lembrou bem apropriadamente, quando Stalin chegou ao poder, os russos lavravam a terra com arados de madeira. Quando seu governo terminou, a União Soviética tinha armas nucleares.

Surpreendentemente, na Conferência de Yalta, o ingênuo Roosevelt e a delegação americana ficaram no Palácio de Livadia. O NKVD, a polícia secreta soviética, grampeou todo pedaço de Livadia, e escutou tudo o que era dito pelo presidente e seus funcionários.

Os ingleses ficaram no escuro Palácio Vorontzov vizinho, também altamente grampeado. Sarah Churchill lembrou para um membro da delegação britânica que seria bom provar o frango de Kiev. Ele foi entregue uma hora depois. Um outro diplomata britânico lembrou que ele queria limão para o seu chá. Um limoeiro inteiro foi rapidamente entregue.

O NKVD e a inteligência militar, GRU, sabiam quase tudo o que se passava nas mentes dos americanos e britânicos. Havia dois agentes soviéticos na equipe de Roosevelt: o assistente do Secretário do Tesouro Harry Dexter White e Alger Hiss. Sudoplatov diz que ele ouviu da GRU que havia um terceiro espião soviético bem colocado na Casa Branca, e um outro que era um famoso financista e descendente de uma das famílias mais famosas da América.

Harry Dexter White trabalhou para o Secretário de Tesouro, Henry Morgenthau, que planejou desindustrializar a Alemanha e jogá-la de volta à época medieval.

Como os senhores da guerra Roosevelt e Churchill puderam ser tão tolos e covardes? Stalin tinha 12 milhões de homens se deslocando pela Europa Oriental. O poder de Stalin intimidou Roosevelt e Churchill, fazendo com que trocassem um ditador totalitário, Adolf Hitler, apaziguando um ditador muito mais perigoso, Stalin.

A União Soviética tinha feito o trabalho do leão ao lutar na Europa, destruindo 75% de todas as forças terrestres e aéreas alemãs, e naturalmente esperava uma partilha proporcional do espólio. Quando os americanos, britânicos e canadenses pisaram na Normandia, quem os enfrentava era o fantasma da outrora invencível Wehrmacht, fatalmente alijada de suprimentos de combustível, munições e blindados, e sem qualquer cobertura aérea. É incrível que os alemães tenham durado tanto tempo na frente ocidental.

Depois que as forças alemãs se renderam, o general americano Patton estava pronto para direcionar seu famoso 3º. Exército contra os russos na Europa Oriental. Os EUA tinham a bomba atômica, e a Rússia não. Mas os EUA e a Inglaterra falida decidiram curvar-se a Stalin. A Europa Oriental pagou um preço caro. Patton foi dispensado e subsequentemente morto em um acidente de carro ainda misterioso.

Em 1905, o Kaiser Wilhelm da Alemanha predisse que em 50 anos o Império Britânico, que então controlava um quarto do globo terrestre, desapareceria em pós e seria substituído por dois novos impérios, a América e a Rússia.

Penso sobre isso, em uma das vilas verdes e sinistras de Stalin na costa russa próximo de Sochi. Sentei à mesa de Stalin, imaginando como após Yalta seus olhos amarelos devem ter piscado com malícia e triunfo enquanto baforava seu cachimbo após olhar com desprezo para o tolo Roosevelt e o perdido Churchill.

http://www.huffingtonpost.com/eric-margolis/the-ghosts-of-yalta-haunt_b_635676.html


As Origens do “Politicamente Correto”

William S. Lind, 19/11/2009


Em resposta ao assassinato de 13 soldados americanos no Forte Hood por um major mulçumano do Exército dos EUA, um número de oficiais superiores expressou seu medo, não do Islã, mas de uma possível ameaça para a “diversidade”. “Diversidade” é um dos muitos deuses falsos do “Politicamente Correto”. Mas o que é exatamente o Politicamente Correto?

O Politicamente Correto é marxismo cultural, marxismo traduzido do termo econômico para o cultural. Sua história remonta não aos anos 1960, mas à Primeira Guerra Mundial. Antes de 1914, a teoria marxista dizia que se uma guerra catastrófica eclodisse na Europa, os trabalhadores de cada país unir-se-iam em uma revolução para destruir o capitalismo e substituí-lo pelo socialismo internacional. Mas quando a guerra chegou, isto não aconteceu. O que deu errado?

Dois teóricos marxistas, Antonio Gramsci na Itália e Georg Lukacs na Hungria, independentemente chegaram à mesma resposta. Eles disseram que a cultura ocidental e a religião cristã tinham “cegado” a classe trabalhadora para os seus interesses de classe verdadeiros (marxistas) de modo que o Comunismo era impossível no Ocidente até que a cultura ocidental e Cristianismo fossem destruídos. Quando Lukacs tornou-se Comissário Especial para Cultura no breve governo bolchevista de Bela Kun na Hungria em 1919, um de seus primeiros atos foi introduzir a educação sexual nas escolas húngaras. Ele sabia que destruindo a moral sexual tradicional seria um passo importante para destruir a própria cultura ocidental.

Lukacs tornou-se uma grande influência no pensamento marxista estabelecido em 1923 na Universidade de Frankfurt na Alemanha, o Instituto para pesquisa Social, comumente conhecido como Escola de Frankfurt. Quando Max Horkheimer assumiu como diretor da Escola de Frankfurt em 1930, ele estabeleceu de forma determinada os comandos de Lukacs do termo econômico para o cultural. Outros membros da Escola de Frankfurt devotados a essa tarefa intelectual difícil foram Theodor Adorno, Eric Fromm, Wilhelm Reich e Herbert Marcuse. Seu objetivo não era o marxismo da União Soviética – Moscou os considerava hereges – mas era marxismo de qualquer forma.

A chave do sucesso da Escola de Frankfurt era cruzar Marx com Freud. Eles argumentavam que assim como vivendo sob o capitalismo as pessoas viviam em um estado de opressão econômica, então sob a cultura ocidental as pessoas viviam sob a repressão psicológica. Da psicologia eles também pegaram a técnica do condicionamento psicológico. Querem “normalizar” o homossexualismo? Apenas mostrem programa após programa na TV onde o macho branco normal é homossexual.

Em 1933, com a ascensão de Hitler, a Escola de Frankfurt mudou-se da Alemanha para Nova York. Lá, seus produtos incluíam “teoria crítica”, que exigia crítica constante e destrutiva de toda instituição social tradicional, começando pela família. Ela também criou uma série de “estudos do preconceito”, culminando com o livro imensamente influente de Adorno, “A Personalidade Autoritária”, que argumentava que todo mundo que defende a cultura tradicional é um “fascista” e mentalmente doente. Este é o motivo porquê qualquer um que desafia o “PC” (Politicamente Correto) é conduzido a um “treinamento de sensibilidade”, que é o condicionamento psicológico projetado para produzir submissão.

(N. do T.: um exemplo disso são os fóruns patrocinados por grandes jornais on-line. Se o forista escreve alguma coisa que bata de frente com o PC, logo seu comentário é apagado e ele é sujeito a expulsão.)

Nos anos 1950 e 1960, Herbert Marcuse traduziu o trabalho confuso de outros pensadores da Escola de Frankfurt em livros que estudantes universitários poderiam entender, tais como “Eros e Civilização”, que tornou-se a Bíblia da Nova Esquerda nos anos 1960. Marcuse injetou o Marxismo cultural da Escola de Frankfurt na geração do baby boom (a que nasceu durante a Segunda Guerra Mundial), ao ponto de tornar-se a ideologia desta geração. Nós o conhecemos como “multiculturalismo”, “diversidade” ou apenas Politicamente Correto.

Este é o pequeno segredo sujo do Politicamente Correto, pessoal: é uma forma de Marxismo. Se o americano médio soubesse disso, suspeito que o Politicamente Correto estaria em sérios problemas.

(N. do T.: não aqui no Brasil, onde os meios de comunicação e acadêmico estão infestados de marxistas liberais assumidos, que estão “fazendo a cabeça” da moçada.)

As mortes no Forte Hood levantam uma questão interessante: por que os Marxistas de qualquer linha apoiam o Islã? Acima de tudo, se os mulçumanos assumissem, eles cortariam as gargantas dos marxistas mesmo antes que eles cortassem as gargantas de cristãos e judeus. A resposta é que o marxismo cultural se aliará com qualquer força que ajude a atingir seus objetivos, ou seja destruir a cultura ocidental e o Cristianismo.

Obviamente, há muito mais da história da Escola de Frankfurt e sua criação do Politicamente Correto do que eu posso cobrir em um artigo curto. Esta é apenas a estrutura básica. Para aqueles que querem saber mais (espero que você seja um deles), pode encontrar um pequeno livro sobre o assunto, o qual eu editei, no site da Fundação do Congresso Livre (www.freecongress.org). O Congresso Livre também produziu um pequeno documentário sobre a Escola de Frankfurt, que me parece estar disponível no Youtube (procure por Escola de Frankfurt ou pelo meu nome). O vídeo é especialmente valioso porque entrevistamos o principal especialista americano na Escola de Frankfurt, Martin Jay, que é o diretor do Departamento de História em Berkeley (e obviamente não é um conservador). Ele fala tudo.

(N. do T.: quem quiser ouvir uma crítica ao PC em português, procure no Youtube os vídeos do filósofo católico Olavo de Carvalho.)

A maior parte das pessoas nas forças armadas dos EUA odeia o Politicamente Correto, mas eles não sabem como lutar contra isso. O modo de lutar é descobrir o que ele realmente é, e divulgar entre seus amigos também. O Politicamente Correto é Marxismo Cultural, que é o mesmo que o Soylent Green intelectual. Isto é tudo, o conhecimento é uma arma!

(N. do T.: Soylent Green é um filme de ficção científica, dirigido por Richard Fleischer. No ano de 2022, a cidade de Nova Iorque conta com 40 milhões de habitantes. Para alimentar as inúmeras pessoas pobres e desempregadas, existem tabletes verdes chamados de Soylent Green, produzidos inicialmente através da industrialização de algas. Somente os ricos tem acesso a comidas raras, como carnes, frutas e legumes.

Quando um rico empresário das indústrias Soylent Corporation é assassinado em seu luxuoso apartamento, o detetive policial Robert Thorn começa a investigar. O segredo que o poderoso empresário conhecia colocava em risco toda a ordem social reinante, porque falava da possibilidade da destruição da vida no nosso planeta.)

http://www.theamericanconservative.com/the-roots-of-political-correctness/


Por que os EUA invadiram o Iraque?

Jim Lobe, 18/03/2008


As razões oficiais - a ameaça imposta aos EUA e a seus aliados pelos alegados programas de Armas de Destruição em Massa (WMD, sigla em inglês) de Saddam Hussein e a possiblidade de que ele pudesse passar essas armas para a Al Qaeda - há muito tempo estão descartadas pelo peso extraordinário das evidências, ou, mais precisamente, a falta de evidência que tal ameaça alguma vez tenha existido.

Liberar o Iraque da tirania da versão particularmente vingativa e sanguinária do Baatismo (ideologia nacionalista árabe) de Hussein e assim estabelecer um precedente irresistível que seria espalhado por todo o mundo árabe - um tema defendido pela administração do presidente George Walker Bush principalmente após a invasão, já que tornou-se claro que os motivos oficiais poderiam não ser justificáveis - parece ter sido a obsessão dominante de somente um membro da equipe de Bush, e que não era particularmente influente: o adjunto do Secretário da Defesa Paul Wolfowitz.

Então, há a teoria que Bush - cuja psicologia enigmática, particularmente sua relação com seu pai, já deu muito combustível para a fogueira literária - queria esnobar seu pai por ter falhado em conquistar Bagdá em 1991. Ou ele quis "terminar o trabalho" que seu pai começou em 1991; e/ou vingar seu pai pela suposta tentativa de assassinato ordenada por Hussein contra ele no Kuwait após a guerra.

Pelo fato de Bush ser quem decidia as coisas, como ele próprio dizia, e porque ninguém que trabalhou nos níveis mais altos da administração jamais foi capaz de dizer precisamente quando (deixe sozinho o porquê) a decisão foi tomada para invadir o Iraque, esta explicação não pode ser inteiramente dispensada como uma resposta.

Então, há a questão do petróleo. A administração estava agindo a favor de uma indústria petrolífera desesperada para colocar suas mãos no petróleo mesopotâmico que era negado como resultado de sansões unilaterais da ONU proibindo negócios entre as companhias americanas e Hussein?

Dada a longa relação de Bush e do vice-presidente Dick Cheney com a indústria e a afirmação do antigo presidente do Federal Reserve (FED, o Banco Central americano) em sua recente auto-biografia que "a Guerra do Iraque é principalmente por causa do petróleo," esta teoria tem apelo definitivo - particularmente para aqueles da esquerda que fizeram do "Nenhuma gota de sangue por petróleo" um mantra favorito nos protestos anti-guerra na época da invasão - com uma grande plausibilidade.

O problema, entretanto, é que pouca ou nenhuma evidência que o Grande Petróleo, uma besta extremamente cautelsa no circo corporativo global, favoreceu uma guerra, particularmente uma conduzida de um modo (unilateralmente) que arriscava desestabilizar a região mais rica de petróleo do mundo, especialmente a Arábia Saudita e os Emirados.

Pelo contrário, o Instituto da Universidade Rice que carrega o nome do antigo secretário de Estado James Baker - um homem que representava e encarnava o Grande Petróleo ao longo de sua longa carreira jurídica - publicamente alertou no começo que se Bush absolutamente, positivamente tinha que invadir o Iraque por qualquer razão que fosse, ele sequer deveria considerar isso se duas condições não fossem satisfeitas: 1) que a ação fosse autorizada pelo Conselho de Segurança da ONU; e 2) que tudo deveria ser feito para que não ficasse a impressão de que a motivação era a aquisição das reservas de petróleo do Iraque por companhias americanas.

Isto não quer dizer que o petróleo era irrelevante nos cálculos da administração, mas talvez de uma forma diferente do que aquele slogan "Nenhuma gota de sangue por petróleo" sugeriria. Acima de tudo, o petróleo é uma exigência absolutamente indispensável para movimentar as modernas economias e forças armadas. E a invasão era uma demonstração forçada - de fato, chocante e surpreendente - para o resto do mundo, especialmente rivais potencialmente estratégicos como China, Rússia ou mesmo a União Européia, da habilidade de Washington de conquistar e controlar rápida e eficazmente uma nação petrolífera no coração da região rica do Oriente Médio/Golfo Pérsico qualquer momento que os EUA desejassem, talvez convencendo aquelas potências emergentes que desafiar os EUA poderia ser contra-produtivo aos interesses de longo prazo, senão suas fontes de energia no curto prazo.

De fato, uma demonstração de tal poder poderia bem ser o caminho mais rápido para formalizar uma nova ordem internacional baseada no poder militar extraordinário dos Estados Unidos, inigualado pelo menos desde a época do Império Romano. Seria um “mundo unipolar” do tipo imaginado pelo relatório Guia de Planejamento de Defesa de 1992 organizado pelo então chefe do Pentágono Dick Cheney, examinado por Wolfowitz e pelo futuro chefe de gabinete de Cheney, I. Lewis Libby, e subscrito pelo futuro embaixador do Afeganistão e Iraque “libertados”, Zalmay Khalilzad e pelo conselheiro adjunto de segurança nacional de Bush, J. D. Crouch.

Era a mesma visão que formou a inspiração para os 27 signatários da Carta – uma coalizão de nacionalistas agressivos, neo-conservadores e líderes da direita cristã que incluía Cheney, Donald Rumsfeld, Wolfowitz, Libby, Khalilzad e muitos outros futuros funcionários de segurança nacional da administração Bush – do Projeto para um Novo Século Americano (PNAC) em 1997. Era o mesmo projeto que começou clamando por “mudança de regime” no Iraque em 1998 e que, nove dias após o ataque de 11/09 em Nova York e no Pentágono, publicamente alertou que qualquer “guerra ao terror” que excluísse a eliminação de Hussein seria necessariamente incompleta.

Resumindo, parece claro que o Iraque estava sendo visto por este grupo, que se tornou poderoso primeiro com a eleição de Bush e depois com o 11/09, como o primeiro, mais fácil e melhor disponível passo para alcançar a “Pax Americana” que não apenas estabeleceria os EUA de uma vez por todas como a potência dominante na região, mas cujas implicações estratégicas geopolíticas para almejar “competidores iguais” seria global em escopo.

Para os neo-conservadores e para os membros da direita cristã deste grupo, que eram os maiores belicistas, Israel também seria um grande beneficiário de uma invasão.

De acordo com um documento de 1996 esboçado por neo-conservadores linha dura proeminentes – incluindo alguns como Douglas Feith e David Wurmser, que mais tarde serviria em postos superiores no departamento de Cheney e no Pentágono no decorrer da invasão – expulsar Hussein e instalar um líder pró-ocidente era a chave para desestabilizar os inimigos árabes de Israel e/ou subjugá-los para o seus interesses. Isto permitiria que o Estado Judaico não somente escapasse do processo de paz de Oslo, mas também garantir todo território na Palestina ocupada e Síria que desejasse.

De fato, livrando-se de Hussein e ocupando o Iraque não somente aumentaria o poder de Israel nos territórios árabes nesta visão, mas também ameaçaria a sobrevivência da mais formidável arma dos mundos árabes e mulçumanos contra Israel – OPEC – ao despejar no mercado mundial petróleo iraquiano e forçando o preço do commodity para níveis históricos baixíssimos.

Isto é como parecia cinco anos atrás.


http://www.ipsnews.net/2008/03/politics-why-did-the-us-invade-iraq/

sábado, 23 de junho de 2012

[POL] Cova encontrada na Ucrânia contém Vítimas de Stalin

New York Times, 25 de março de 1989

Uma comissão governamental concluiu que milhares de pessoas enterradas em uma cova coletiva nos arredores de Kiev foram mortas durante as repressões de Stalin, e não pelos soldados nazistas, anunciou a agência oficial de imprensa Tass hoje.

A conclusão da comissão apoia o depoimento de testemunhas idosas na vila de Bykovnia, que disseram que eles viram caminhões derramando sangue no caminho para o site nos anos 1930, antes de os nazistas ocuparem a área.

Estimativas não-oficiais colocam o número de corpos na cova em 200.000 a 300.000.

Os moradores de Bykovnia quebraram cinco décadas de silêncio para acusar a polícia secreta de Stalin após o governo ucraniano erguer um monumento em maio de 1988 culpando os invasores nazistas pelo crime. Os moradores forçaram as autoridades ucranianas em dezembro a criar a comissão, dizendo que três investigações prévias tinham encoberto a verdade ao acusar as tropas nazistas.

O relatório de hoje da agência oficial não mencionou as investigações originais.

http://www.nytimes.com/1989/03/25/world/ukraine-grave-found-to-hold-stalin-victims.html?scp=1&sq=ukraine%20grave%20found%20to%20hold%20stalin%20victims&st=cse

Novo caça da Mitsubishi: o Espirito Divino que defende o Japão

DefesaNet, 29 de maio de 2012

A alternativa japonesa

No início de maio, o Japão encomendou os primeiros quatro caças F-35 norte-americanos. Nesta década, o Japão pretende comprar 42 máquinas deste tipo, continuando após 2020, mas esses planos podem mudar em caso de êxito no desenvolvimento de seu próprio caça japonês, que promete superar o F-35 no conjunto de características.

O novo avião japonês, desenvolvido no âmbito do programa ATD-X (Advanced Technology Demonstrator-X), é relativamente pouco conhecido, e até recentemente sua realização na prática era posta em questão.

O projeto de desenvolvimento foi iniciado em 2004, e ao mesmo tempo foi atribuído ao programa o código ATD-X: o novo avião era considerado um demonstrador de tecnologia, e não se falava da sua utilização prática.

Os voos do novo caça russo T-50 em janeiro de 2010 e do chinês J-20 um ano depois, deram um novo impulso ao trabalho dos japoneses. A incapacidade de adquirir caças F-22 junto com as perspectivas indefinidas (até agora) do F-35 e as capacidades limitadas dessa máquina, levaram as autoridades japonesas a aumentar o financiamento do projeto ATD-X.

Em março de 2012, a fábrica da Mitsubishi em Tobishima, perto da cidade de Nagoya, começou a montagem do primeiro protótipo do ATD-X para testes estáticos. No ano seguinte deve começar a construção de três protótipos voadores, e o primeiro voo do novo caça Mitsubishi, apelidado de Shinshin (a tradução mais próxima do sentido dos hieróglifos ?? que compõem seu nome é “espírito divino”), é esperado em 2014.




Como ultrapassar as limitações?

O caça F-35A que o Japão pode (e planeja) comprar nos EUA tem algumas limitações significativas. Em particular, ele não tem alta capacidade de manobra, tem uma velocidade de cruzeiro subsônica, não tem radar lateral. Em conjunto, isso leva muitos especialistas a avaliar o potencial do F-35 como menor mesmo em comparação com as atuais máquinas de série da geração 4++, como o Su-30MKI e o Su-35S, e como significativamente menor que o F-22 e, potencialmente, o T-50.

Entretanto, os adversários mais prováveis do Japão – a China e a Rússia – estão atualmente rearmado sua aviação com máquinas avançadas de quarta geração, e deverão receber aviões de quinta geração já nos próximos 10 anos. O potencial do projeto chinês J-20, por enquanto, é questionável, mas a probabilidade da força aérea chinesa de obter caças de quinta geração é uma ameaça bastante grande.

Assim, o projeto ATD-X deve dar à força aérea japonesa um novo avião que não terá as limitações do F-35 causadas pelo desejo de construir uma plataforma versátil que atenda aos requisitos de todos os tipos de aviação. Restrições financeiras e tecnológicas não têm muita importância – o Japão é um país bastante rico para poder se permitir até mesmo um caça muito caro, e seu nível tecnológico torna possível desenvolver em um período razoável de tempo todo o equipamento necessário para as novas máquinas, incluindo o motor.



Futuro provável

Tendo em conta o tempo que todos os estados com aviação geralmente levam para desenvolver equipamento militar, o novo caça japonês, se o primeiro voo for realizado em 2014, entrará em série limitada não antes de 2017-18, e em produção em massa – mais próximo de 2020-21. Por esta altura, o Japão irá receber caças F-35 de combate, que entrarão em serviço da força aérea em 2016. Se as características do “Espírito divino” forem bastante altas, no futuro, o Japão poderá deixar de comprar F-35 em larga escala, fazendo uma aposta em sua própria indústria aeronáutica.

Além disso, se o Japão conseguir desenvolver seu próprio motor e tornar o projeto totalmente independente do fornecimento de peças críticas, será possível também sua exportação – pelo menos para diminuir o preço de uma unidade com o aumento dos volumes de produção.

http://www.defesanet.com.br/aviacao/noticia/6197/Novo-caca-da-Mitsubishi--o-Espirito-Divino-que-defende-o-Japao

[SGM] Tempo de encarar a Verdade sobre a Segunda Guerra Mundial

Eric Margolis, 23 de maio de 2011


Desta antiga cidade-fortaleza, permitam-me, um antigo professor de história militar, conversar sobre três mitos particularmente equivocados sobre a Segunda Guerra Mundial ainda em voga:

Primeiro Mito: O exército francês não se rendeu simplesmente, como os ignorantes conservadores americanos afirmam.

A Blitzkrieg alemã que golpeou a França entre maio e junho de 1940 foi uma revolução extraordinária na arte da guerra. Ela combinou carros blindados rápidos com infantaria móvel, bombardeamento de mergulho preciso, apoio logístico flexível, e novas tecnologias em C3 - comando, controle e comunicações. Em 1940, a Alemanha liderava o mundo em tecnologia: 75% de todos os livros técnicos estavam escritos em alemão. Os generais e exércitos da França, treinados para re-lutar a Primeira Guerra Mundial, foram superados pela guerra ligeira. A França ainda era uma sociedade agrícola. A Blitzkrieg foi projetada para atacar o cérebro do inimigo ao invés do seu corpo, paralisando sua habilidade em gerenciar grandes forças ou lutar. Os alemães chamavam-na de sua "bala de prata". A França ainda confiava a carteiros a entrega de mensagens. O comandante francês General Gamelin sequer tinha um telefone no seu quartel-general nos arredores de Paris. A força expedicionária britânica bem treinada na França foi batida tão rapidamente quanto os franceses, e salvou-se somente pela fuga através do Canal. Nenhum exército no mundo na época poderia derrotar a Blitzkrieg alemã, planejada pelo brilhante Erich von Manstein e liderada por Heinz Guderian e Erwin Rommel: três dos maiores generais da história moderna.

Eles também foram incrivelmente sortudos. Uma bomba sobre uma ponte alemã sobre o Meuse, ou uma dificuldade em mobilidade na floresta das Ardenas poderia ter significado a diferença entre vitória e derrota. Os franceses tinham temporariamente movido algumas de suas mais fracas unidades de reserva no setor que os alemães atacavam. Foi, como Wellington disse após Waterloo, um maldito lance de sorte. A nova tática fluida da Alemanha rompeu os exércitos da França. Eles foram incapazes de renovar suas linhas apesar da frequente resistência violenta. Os rápidos panzers alemães estavam constantemente no seu encalço. A retirada sob fogo é a operação militar mais difícil e perigosa. Após seis semanas, e com uma facada nas costas pela Itália de Mussolini, os exércitos da França desintegraram.

A França teve 217.000 mortos e 400.000 feridos em combate. Pelo menos a França não sofreu os dois milhões de mortos da Primeira Guerra Mundial. As perdas alemãs: 46.000 mortos em ação, 121.000 feridos e 1.000 aeronaves. Como comparação, os Aliados ocidentais (EUA, Grã-Bretanha e Canadá) tiveram somente 10.000 mortos e feridos no Dia D.

Segundo Mito: os fortes da Linha Maginot da França não eram taticamente flanqueados.

Os alemães atacaram a noroeste do fim da Linha, através da floresta das Ardenas franco-belga, uma rota antecipada pelo exército francês, que executou simulações de guerra lá em 1939. O exército imóvel francês falhou, não a Linha Maginot. A Linha incompleta era muito cara, mantinha muitos homens e acabou se tornando um símbolo da atitude defensiva francesa. Mas ela cumpriu sua missão de defender as indústrias vitais de carvão e aço da França em Lorraine. A Linha também foi projetada para direcionar qualquer ataque alemão para a Bélgica ou para a Suíça.

Os soldados dos fortes Maginot não conquistados resistiram até o final. Aqueles que ridicularizam a França por construir fortes que eram supostamente "flanqueáveis" deveriam saber que as modernas fortificações americanas "impregnáveis"em Manila, e a Fortaleza Singapura da Grã-Bretanha foram ambas tomadas pelas costas pelo exército japonês.

Terceiro Mito: Os EUA, a Inglaterra e o Canadá derrotaram a Alemanha.

Mentira. O 66º aniversário da vitória soviética na Segunda Guerra Mundial passou totalmente ignorado no Ocidente. Devemos saudar o valor dos soldados e pilotos destemidos da Rússia que, como os soldados alemães, lutaram extraordinariamente, apesar de seus regimes criminosos. A Segunda Guerra Mundial na Europa não foi ganha no Dia D. O exército e a força aérea da Alemanha já estavam quebrados pelas batalhas titânicas da frente oriental. Os números falam por si mesmos. Os soviéticos destruíram entre 75 e 80% de todas as divisões alemãs - 4 milhões de soldados - e a maioria da Luftwaffe. A Rússia perdeu pelo menos 14 milhões de soldados e um número equivalente de civis. O Exército Vermelho destruiu 507 divisões do Eixo. Na frente ocidental, após o Dia D, os Aliados destruíram 176 divisões alemães totalmente desestruturadas. Quando os Aliados pisaram na Normandia, eles encontraram forças alemãs destruídas sem cobertura aérea, incapacitadas pela falta de combustível e suprimentos. Tivesse, os Aliados encontrado a Wehrmacht e a Luftwaffe de 1940, o resultado poderia ter sido bem diferente.

http://www.smirkingchimp.com/thread/eric-margolis/36330/time-to-face-the-truth-about-world-war-ii

quarta-feira, 20 de junho de 2012

[ARM] Armas de Infantaria: Munição e Calibre de Armas de Fogo

Jayme Piloni Junior/Wikipedia

Cartucho é o conjunto do projétil e os componentes necessários para lançá-lo, no disparo.

Munição é o conjunto de cartuchos necessários ou disponíveis para uma arma ou uma ação qualquer em que serão usadas armas de fogo.

A figura 1 apresenta um cartucho completo, com seus componentes principais.


Figura 1  

Projétil é qualquer sólido que pode ser ou foi arremessado, lançado. No universo das armas de defesa, o projétil é a parte do cartucho que será lançada através do cano.

O projétil pode ser dividido em três partes, como mostra a figura 2:

Figura 2
  • Ponta: parte superior do projétil, fica quase sempre exposta, fora do estojo;
  • Base: parte inferior do projétil, fica presa no estojo e está sujeita à ação dos gases resultantes da queima da pólvora.
  • Corpo: cilíndrico, geralmente contém canaletas destinadas a receber graxa ou para aumentar a fixação do projétil ao estojo.

O estojo é o componente de união mecânica do cartucho, apesar de não ser essencial ao disparo, já que algumas armas de fogo mais antigas dispensavam seu uso, trata-se de um componente indispensável às armas modernas. O estojo possibilita que todos os componentes necessários ao disparo fiquem unidos em uma peça, facilitando o manejo da arma e acelera o intervalo em cada disparo.

O estojo é classificado nos seguintes tipos:

a. Quanto à forma do corpo



b. Quanto aos tipos de base:



Propelente ou carga de projeção é a fonte de energia química capaz de arremessar o projétil a frente, imprimindo-lhe grande velocidade. A energia é produzida pelos gases resultantes da queima do propelente, que possuem volume muito maior que o sólido original. O rápido aumento de volume de matéria no interior do estojo gera grande pressão para impulsionar o projétil.

Dois tipos de pólvoras sem fumaça são utilizadas atualmente em armas de defesa:

a) Pólvora de base simples: fabricada a base de nitrocelulose, gera menos calor durante a queima, aumentando a durabilidade da arma; e

b) Pólvora de base dupla: fabricada com nitrocelulose e nitroglicerina, tem maior conteúdo energético.

A espoleta é um recipiente que contém a mistura detonante e uma bigorna, utilizado em cartuchos de fogo central.

A mistura detonante é um composto que queima com facilidade, bastando o atrito gerado pelo amassamento da espoleta contra a bigorna, provocada pelo precursor; a queima dessa mistura gera calor, que passa para o propelente, através de pequenos furos no estojo, chamados eventos.

O termo calibre designa o diâmetro interior de um tubo ou o diâmetro exterior de um fio ou haste. Nas armas de fogo, o calibre é o diâmetro interior do cano. Num cano do tipo helicoidal (formato interno que permite ao projétil girar em torno de seu eixo), a distância é medida entre cheios (liso) ou raias opostas; medidas de raias são comuns nas designações de cartucho originárias dos EUA, enquanto que medidas de cheios são geralmente usadas em outros lugares. Isto é muito importante quando do carregamento manual (handloading) , já que a bala deve encaixar perfeitamente no diâmetro da raia do cano para garantir uma boa selagem.

Quando o diâmetro do cano é dado em polegadas (1 polegada = 1” = 2,54 cm), a abreviação “cal” é usada no lugar de polegadas. Por exemplo, um fuzil de calibre reduzido com um diâmetro de 0,22” tem um calibre de .22 cal, entretanto o ponto decimal é geralmente deixado de lado quando falado, tornando-o um “calibre vinte-e-dois”.

Analogamente, calibres de armas podem ser medidos em unidades métricas, como no “calibre de oitenta-e-oito milímetros” (88 mm) ou “canhão de calibre cento-e-cinco milímetros” (algumas vezes abreviado como canhão de 105 mm).

O comprimento do cano (especialmente para armas de grande porte) é freqüentemente medido em calibres. O comprimento efetivo do cano (de ponta a ponta) é dividido pelo diâmetro do cano dando um certo valor. Por exemplo, os canhões principais dos encouraçados da Classe Iowa, da Marinha americana, podem ser denominados como calibre 16”/50. Eles têm 16 polegadas de diâmetro e o cano possui 800” de comprimento (16 x 50 = 800). Isto é também algumas vezes indicado usando-se o prefixo L/, de modo que o canhão mais comum do tanque Panzer V é descrito como um “75mm L/70”, significando um cano de 75 mm de diâmetro e comprimento 5.250 mm.

O Parabellum 9 x19 mm (mundialmente conhecido como Luger 9 mm) é um cartucho de pistola introduzido em 1902 pelo fabricante de armas alemão Deutsche Waffen und Munitionsfabriken (DWM) para sua pistola Luger. Por causa disto, ele é chamado universalmente como cartucho Luger 9mm. O cartucho que lhe deu origem foi o Parabellum 7,65 x 22mm, este próprio descendente do cartucho Borchardt 7,65 x 25mm. O Parabellum 9 mm é usado em pistolas, submetralhadoras e carabinas.

A figura 3 mostra o calibre sendo usado como medida de diâmetro e comprimento do cano da arma.


Figura 3

O Desenvolvimento do Space Shuttle

Introdução

Os defensores do vôo espacial sonharam em construir lançadores reutilizáveis, pois eles oferecem relativa simplicidade operacional e o potencial de custos reduzidos significativos comparados aos veículos descartáveis. Entretanto, os lançadores reutilizáveis também são tecnologicamente muito mais difíceis de construir. Os experimentadores alemães foram os primeiros a avaliar, durante os anos de 1920 e 1930, o desenvolvimento de um veículo de lançamento reutilizável (RLV, em inglês).

O lançamento bem sucedido e retorno dependem de todos os sistemas funcionando em sincronia durante todo o ciclo da missão, à medida que eles atravessam regimes ambientais distintos. Na fase de lançamento, o veículo reutilizável e seu impulsionador (booster), com qualquer tancagem de propelente associada, deve operar como um foguete de alto desempenho, erguendo centenas de milhares de quilogramas em Baixa Órbita Terrestre (LEO, em inglês). No espaço, o veículo reutilizável funciona como uma espaçonave orbital manobrável na qual considerações aerodinâmicas são discutíveis. Entretanto, durante a reentrada na atmosfera e a redução para velocidades subsônicas, o controle da aerodinâmica e do calor torna-se rapidamente extremamente importante, pois o veículo reutilizável deve voar através da atmosfera, primeiro a velocidades hipersônicas (maiores que Mach 5), então a velocidades supersônicas e, depois, a velocidades subsônicas. Finalmente, o veículo deve voar ou planar para um pouso seguro.

Pelo fato dos RLVs serem capazes de voar várias vezes, e pelo fato de eles deverem reentrar na atmosfera, eles estão sujeitos a tensões nos materiais e na estrutura principal que os veículos descartáveis não precisam suportar. Assim, construir um RLV impõem exigências extraordinárias em materiais e sistemas.

Histórico

As origens conceituais do primeiro veículo reutilizável para lançamento do mundo data de pelo menos os anos 1950, quando o Departamento de Defesa (DoD, em inglês) começou a estudar a viabilidade de um RLV no espaço para uma variedade de aplicações militares, incluindo reconhecimento automático, interceptação anti-satélite e manobras com armas. A Força Aérea e a NASA anteviram um planador em asa delta que levaria um piloto em órbita no topo de um foguete Titan II ou III. Custos crescentes e outras prioridades rivais levaram ao cancelamento do programa em 1963.

Em 1962, em um esforço para salvar o conceito reutilizável, os projetistas da Força Aérea voltaram-se para um desenho dois estágios para um conceito que eles começaram a chamar de Aerospaceplane. Sete companhias aeroespaciais receberam contratos para o projeto inicial. Em outubro de 1963, após estudar o programa Aerospaceplane por algum tempo, o Escritório de Conselho Científico do DoD chegou à conclusão que o programa estava levando a Força Aérea a negligenciar problemas convencionais na pesquisa de lançamento. O programa Aerospaceplane foi rapidamente cancelado.

Origens do Space Shuttle

O programa surgiu ainda durante o desenvolvimento do foguete Saturno V e do lançamento dos astronautas do programa Apollo para a Lua. Na época, o presidente Nixon tomou a decisão de 1972 de continuar com o desenvolvimento do Space Shuttle, já que os aspectos principais do projeto estavam definidos. Em dezembro de 1968, à medida que o programa espacial pós-Apollo ganhou velocidade, a NASA criou o Grupo de Trabalho do Space Shuttle para determinar as necessidades da agência para o transporte espacial. Este grupo de trabalho estabeleceu as missões básicas e características do tipo de veículo que a NASA esperava ganhar aprovação para desenvolver.

O relatório final do Grupo de Trabalho do Space Shuttle, emitido em julho de 1969, concluiu que um ILRV deveria ser capaz de:

• Apoiar logisticamente a Estação Espacial.

• Lançamento orbital e colocação de satélites.

• Lançamento e entrega de estágios propulsivos e cargas.

• Entrega orbital de propelente.

• Serviços e manutenção de satellites.

• Missões orbitais tripuladas de curta duração.

O desenho definitivo do orbitador Shuttle e de outros components do sistema dependiam de decisões sobre cinco características-chaves do orbitador:

• Capacidade e tamanho do compartimento de carga.

• Extensão da manobrabilidade lateral.

• Sistema de propulsão.

• Planagem ou pouso assistido por motor.

• Material primário estrutural.

Ao longo de 1971, os projetistas do Centro de Espaçonaves Tripuladas e do Centro de Vôo Espacial Marshall analisaram um número incrível de 29 desenhos diferentes do Shuttle, incorporando uma grande variedade de capacidade do orbitador, tanque de combustível de oxigênio e hidrogênio e os impulsionadores. No final de 1971, os projetistas tanto na NASA quanto na indústria estavam começando a perceber que o desenho mais eficiente economicamente para o sistema Shuttle era um orbitador com asa delta lançado verticalmente de um tanque externo carregando oxigênio e hidrogênio líquidos, flanqueados por foguetes impulsionadores. Ao colocar todo oxidante e combustível em um tanque externo permitiu aos projetistas reduzir o tamanho do orbitador. Ele também tornou o projeto e construção dos tanques de propelentes mais simples e, portanto, mais baratos. O desenho permitiu ao Shuttle carregar uma carga maior como uma fração do peso total inerte do veículo em relação a um sistema Shuttle totalmente reutilizável, dois estágios.


O administrador da NASA, James Fletcher (esquerda), apresenta ao presidente Richard Nixon o modelo do Space Shuttle em 1972


Em agosto de 1972, a North American Rockwell recebeu o contrato para projetar e desenvolver o orbitador do Shuttle. Mais tarde, a Morton Thiokol foi selecionada para produzir os SRBs. A NASA também selecionou a Martin Marietta para desenvolver o tanque externo. O Centro de Espaçonaves Tripuladas foi responsável pela supervisão do desenvolvimento e fabricação do SRB (Solid Rocket Booster, Foguete Impulsionador a Propelente Sólido), do SSME (Space Shuttle Main Engine, Motor Principal do Space Shuttle) e do tanque externo, e o Centro espacial Kennedy ficou responsável pelo desenvolvimento de métodos para a montagem, verificação e operações de lançamento do Space Shuttle.

A Rockwell começou a fabricar o Veículo Orbitador (OV-101) em 14 de junho de 1974; a companhia entregou o orbitador de sua planta em Palmdale, Califórnia, em 17 de setembro de 1976. O OV-101 não continha muitos dos subsistemas necessários para funcionar no espaço. Ele era capaz, assim, de servir somente como maquete em escala natural para vôo atmosférico; um comitê da NASA geralmente escolheria o nome do orbitador, mas os fãs da série de TV Jornada nas Estrelas fez pressão junto à NASA e ao Congresso para nomear o OV-101 de Enterprise, o nome da espaçonave da icônica série. Em 12 de agosto de 1977, o 747 transportou o Enterprise até 7,35 km, onde foi liberado para uma planagem de cinco minutos e pouso bem sucedido na base da Força Aérea em Edwards, na Califórinia. Após quatro vôos planados experimentais, a NASA encerrou ser programa de teste de vôo atmosférico e voltou-se para os testes de vibração e outros feitos em terra com o Enterprise.


Primeiro vôo do Enterprise

A proteção térmica para a reentrada do Shuttle era um item de extrema importância desde os conceitos iniciais até os primeiros vôos do Shuttle. Os engenheiros da NASA resolveram o problema da reentrada para as cápsulas Mercury, Gemini e Apollo usando materiais ablativos que aqueciam e vaporizavam quando a cápsula encontrava a atmosfera superior na reentrada. Entretanto, estas cápsulas não eram projetadas para sofrer os rigores de vôos múltiplos e reentrada e, assim, eram descartadas após o uso. Cada orbitador Shuttle foi projetado para operar até 100 lançamentos e retornos. Seu sistema de proteção térmica tinha que ser robusto o suficiente para agüentar cargas térmicas repetidas e os rigores estruturais da reentrada. O sistema tinha que ser relativamente leve para manter o peso total do orbitador aceitavelmente baixo. Além disso, tinha que ser relativamente barato para ser trocado entre os vôos.

A NASA escolheu usar pastilhas de cerâmica isolantes coladas a uma estrutura leve. Um “escudo” de proteção térmica cerâmico também permitiu aos engenheiros da NASA usar alumínio para a estrutura do orbitador Shuttle. Problemas em instalar as pastilhas fizeram com que a NASA entregasse o primeiro orbitador qualificado para vôo, o Columbia, para o Centro Espacial Kennedy no início de 1979, antes mesmo que os técnicos da NASA tivessem concluído a instalação. Colar as pastilhas tornou-se, então, o elemento crítico na programação do primeiro lançamento do Shuttle. Originalmente planejado para 1978, por volta de março de 1979, a programação havia escorregado pelo menos por dois anos. O trabalho nas pastilhas continuou por 24 horas por dia, seis dias por semana, à medida que os técnicos lutavam para instalar mais de 30.000 pastilhas individuais.

O primeiro lançamento do ônibus espacial Columbia foi programado para 10 de abril; seria comandado pelos astronautas John Young e Robert Crippen. Após um atraso causado por problemas nos computadores, o lançamento aconteceu às 7:00 da manhã de 12 de abril de 1981. Young e Crippen orbitaram a Terra 37 vezes enquanto realizavam testes de rotina em vários componentes do Shuttle, tais como as portas do compartimento de carga, que foram abertas e fechadas. Enquanto orbitava a Terra, a NASA conseguiu que as câmeras de alta resolução da Força Aérea fotografassem o lado inferior para confirmar a integridade da proteção. Ao verificar as pastilhas em aparentemente bom estado, o Controle da Missão da NASA notificou os dois astronautas para prepararem-se para o retorno.

54 horas após o lançamento, o Columbia planou até um pouso bem sucedido na Base Área de Edwards. Apesar do Columbia ter aterrisado a uma velocidade mais rápida do que a planejada e ter corrido quase 1 km além de seu ponto de parada, o vôo provou a viabilidade do projeto do Shuttle.


Etapas de uma missão típica do ônibus espacial
 
 
Os vôos operacionais do Space Shuttle – Primeira Fase

Quando a NASA começou o desenvolvimento do Shuttle, a agência esperava que o veículo assumisse a responsabilidade total de levar os satélites dos EUA e outras cargas em órbita logo após atingir condição operacional completa. A NASA também esperava que outras nações usassem o Shuttle para acesso ao espaço, e a agência projetou uma taxa de vôo de 48/ano, começando em 1980. Tal taxa teria, segundo as estimativas da NASA, levado a um baixo custo por vôo e mesmo permitido que a NASA recuperar muito do seu investimento no sistema do Space Shuttle. Pela metade e final dos anos 1980, a NASA esperava que custos reduzidos para operar o sistema Shuttle permitiriam à agência investir em outros projetos, como a estação espacial. Este “concentrador de fundos Shuttle” tornou-se uma referência da política da NASA e a expectativa da agência para projetos de grande porte no futuro.

O orbitador tornou-se muito mais difícil e consumidor de tempo para manutenção e preparação para lançamento do que a NASA havia pensado. Isto foi conseqüência em parte da necessidade de corrigir deficiências no projeto do sistema, o que, por sua vez, manteve o sistema em um estado de desenvolvimento contínuo. O tempo de turnaround do orbitador (o tempo necessário para uma viagem de ida e volta) tornou-se o item de medida nos esforços para melhorar a taxa de lançamento do Shuttle. De 1983 a 1985, a NASA aumentou constantemente a taxa de vôo até que, em 1985, Eça estava capaz de lançar nove vôos.

Entretanto, o Space Shuttle provou ser incapaz de conseguir seu objetivo de peso de carga de 30 toneladas em LEO (inclinação orbital de 28º), que era necessário para lançar 18 toneladas em órbita polar. Este problema, combinado com a perda do Challenger em 1986 e o desenvolvimento do Titan IV, levou aos freqüentes atrasos do Shuttle e ao aumento do tempo entre o anúncio da carga no Shuttle e o vôo propriamente dito (cerca de 24 meses).

Perdendo o Challenger

A Comissão presidencial do acidente com o ônibus espacial Challenger, apoiada pela NASA e outras agências federais, juntou evidência, investigou a cadeia de eventos e realizou audições públicas.

Como a investigação revelou, a junta entre o primeiro e segundo segmento do motor foi rompida cerca de 59 segundos em vôo. Chamas da junta aberta atingiram o tanque externo e provocaram a ruptura dos tanques de hidrogênio e oxigênio líquidos. Em 69 segundos de vôo, fragmentos do Challenger podiam ser vistos contra o fundo de uma grande bola de fogo, provocada pela ignição de milhares de quilogramas de hidrogênio do tanque externo. O orbitador sofreu ruptura devido às enormes forças aerodinâmicas, que excederam em muito as especificações máximas do orbitador. Grandes partes do Challenger começaram a cair na atmosfera e na direção do Oceano Atlântico. A fuselagem de proa e o módulo da tripulação, ambas permanecendo relativamente intactas, chocaram-se contra a superfície do mar uns poucos segundos depois, matando todos os sete astronautas a bordo.


Fumaça negra saindo da junta entre os segmentos do motor


As audiências e o relatório que resultaram delas também expuseram publicamente um número de deficiências de gestão cruciais dentro da NASA, entre as quais estava a dificuldade do pessoal do fornecedor e de engenheiros de nível médio na NASA em levar a seriedade de problemas técnicos para os administradores de nível superior.

Alguns funcionários da NASA haviam inadvertidamente chegado ao ponto de pensar no Space Shuttle quase tão confiável quanto uma aeronave comercial. Entretanto, aeronaves tipicamente têm confiabilidades derivadas empiricamente (vôos bem sucedidos dividido por tentativas) se aproximando de 99,9999%, baseado em muitos milhares de vôos de veículos essencialmente idênticos. Antes dos primeiro lançamento do Shuttle, a NASA tinha enfrentado a dificuldade de estimar riscos de vôo baseados em estimativas detalhadas de experiência prévia com subsistemas, testes extensivos de subsistemas novos, e a quantidade de redundância construída em sistemas críticos. Baseada em tais considerações, a NASA projetou cada orbitador para ter uma probabilidade de 97% em 100 vôos, o que leva a uma exigência de cada vôo individual do Shuttle ter uma confiabilidade de pelo menos 99,97%. A confiabilidade real do Shuttle era incerta, mas um estudo da NASA estimou que ela estaria entre 97 e 99%.

O choque de perder o Challenger e sua tripulação também forçou os funcionários dentro da administração Reagan a reconsiderar que tipos de cargas o Shuttle poderia carregar. Em agosto de 1986, a administração emitiu um memorando sobre o uso do Shuttle, seguido de um documento formal de política em dezembro. Aquela política restringia as cargas do Shuttle àquelas exigindo as únicas capacidades do Shuttle ou precisando do Shuttle para propósitos de segurança nacional. Em particular, o Shuttle não seria mais usado para lançamento de satélites comerciais de comunicação.

A administração Reagan e o Congresso se empenharam rapidamente para substituir o orbitador perdido. Em maio de 1989, o presidente George Bush anunciou que o novo veículo seria chamado Endeavour, em homenagem ao famoso navio do capitão Cook. O novo veículo (OV-105) foi entregue ao Centro Espacial Kennedy em maio de 1991 e fez seu primeiro vôo em maio de 1992.

Retorno ao Vôo

Em 24 de março de 1986, bem antes das causas detalhadas da falha do Shuttle serem definitivamente estabelecidas, o novo Administrador Associado para Vôo Espacial, o antigo astronauta Richard H. Truly, anunciou uma estratégia de retornar o Shuttle para a condição de vôo. Entre outras coisas, seu memorando clamou por uma reestruturação do gerenciamento do programa inteiro e operação, e baseava-se em um plano para um “retorno conservador às operações”.

Durante o hiato em vôo, a NASA examinou todo elemento vulnerável do desenho do Shuttle e repensou as operações e preparação de lançamento do Shuttle. A NASA instituiu muitos novos procedimentos de segurança e substituiu os componentes do sistema substituídos.

Os procedimentos não eram somente maiores, mas tornaram-se mais complicados e intensos, trazendo mais dúvidas que a NASA pudesse inclusive planejar a taxa de lançamentos anuais de 24 vôos, mesmo se suficiente orçamento das cargas do Shuttle e serviços de lançamento tornassem possível apoiar tal taxa. Mais importante, contudo, a NASA redesenhou e testou os SRBs do Shuttle de modo que eles fossem menos propensos a falhas novamente, especialmente nas juntas entre os segmentos do motor.

Em 29 de setembro de 1988, o shuttle Discovery levantou vôo da plataforma 39B no Centro Espacial Kennedy, transportando uma tripulação de cinco em órbita (STS-26). O Discovery também transportou o substituto do Satélite de Retransmissão de Dados e Rastreamento (TDRS), uma das cargas perdidas quando o Challenger explodiu em janeiro de 1986. O vôo bem sucedido do Discovery e o lançamento do TDRS tiveram significado especial porque marcou o retorno do programa do ônibus espacial para condição de vôo e o fim de uma reavaliação dolorosa do acesso americano ao espaço.

O segundo e último vôo do Shuttle em 1988 (STS-27) aconteceu nove semanas após em 2 de dezembro, durante o qual o orbitador Atlantis transportou um satélite secreto do DoD em inclinação de alta órbita. O sucesso deste vôo agregou a confiança do DoD nos procedimentos de lançamentos revisados.



 
O Space Shuttle nos anos 1990

O acordo de 1993 entre a federação Russa e os Estados Unidos para incluir a Rússia como parceira na Estação espacial Internacional, teve um efeito importante na operação do Space Shuttle durante os anos 1990. Por um lado, a Rússia concordou em lançar parte da estação e ajudar no suprimento, reduzindo os encargos do ônibus espacial. Por outro lado, os Estados Unidos concordavam em colocar a estação em uma órbita de 51,6º, que reduzia a carga que o shuttle poderia transportar para uma órbita com alta inclinação.

O primeiro lançamento para a estação espacial russa Mir aconteceu durante junho de 1995 na STA-71. Em 29 de junho, o shuttle Atlantis fez o acoplamento com a Mir para entregar dois cosmonautas russos e retornar o astronauta Norman Thagard para a terra após 115 dias à bordo da etação russa. O programa Shuttle-Mir foi completado com a STS-91 em junho de 1998 após nove acoplamentos bem sucedidos com a Mir. Em 4 de dezembro de 1999, o shuttle Endeavour (STS-88) lançou o primeiro componente da Estação espacial Internacional em órbita, tornando o início do uso do Shuttle para o qual ele foi basicamente construído – transportar para e de uma estação espacial orbital permanente.

A Tragédia do Columbia e o Fim do Programa

Infelizmente, o destino não sorriu para o programa do ônibus especial. Em fevereiro de 2003, durante a reentrada na atmosfera após uma missão à Estação Espacial Internacional, o shuttle Columbia foi destruído, matando toda sua tripulação. No ano seguinte, o presidente George W. Bush ordenou o desativamento do programa space shuttle e a sua substituição pelo Programa Constellation.

A idéia por trás dessa reformulação era estabelecer objetivos claros para o programa espacial tripulado americano, como o retorno à Lua e uma viagem a Marte. Também contou para a aposentadoria do Shuttle o fato do alto custo do programa e o baixo retorno financeiro, sendo que o ônibus espacial estava servindo apenas para transporte de pessoas e equipamentos para a Estação Espacial.

Quando assumiu a presidência em 2009, Barack Obama resolveu fazer cortes orçamentários para fazer frente à crise econômica que se abateu sobre os EUA. A nova administração reformulou o programa espacial tripulado, cancelando o Constellation, mas mantendo a aposentadoria dos ônibus espaciais. As missões foram retomadas em julho de 2005, mas apenas para a conclusão dos compromissos americanos junto à Estação Espacial. Entre fevereiro e junho de 2011, foram realizados os últimos vôos operacionais deste programa.

Destino dos Shuttles Remanescentes

Enterprise

A “viagem final” do ônibus especial Enterprise foi pelo rio Hudson, em Nova York, para ser exposto no Intrepid Sea, Air and Space Museum.

Discovery

É o mais velho dos ônibus espaciais. Voou em 39 missões, sendo a primeira delas em 1984 e a última em março de 2011. No total, viajou 274 milhões de quilômetros, passando 365 dias no espaço.

Em abril, foi conduzido do Cabo Canaveral, na Flórida, para Virgínia, fazendo um sobrevoo pela capital americana, Washington. Ele já se encontra em exposição no Museu Nacional Aeroespacial Smithsonian, em Chantilly, Virgínia.

Endeavour

É a mais nova das aeronaves. Foi construída para substituir a Challenger, que explodiu durante seu lançamento, em janeiro de 1986. Voou em 25 missões, sendo a primeira em 1992, e a última em junho de 2011. Viajou quase 228 milhões de quilômetros e ficou 299 dias no espaço.

A Endeavour continua no Centro Espacial Kennedy, em Orlando, Flórida e vai ser levada via aérea em setembro para o Centro de Ciência da Califórnia, em Los Angeles.

Atlantis

Voou em 33 missões, sendo a primeira em 1985 e o última em julho de 2011. No total, viajou pouco mais de 233 milhões de quilômetros e ficou 307 dias no espaço.

O Atlantis continua no Centro Espacial Kennedy, em Orlando, Flórida e vai permanecer por lá. Em novembro, vai ser levado pela estrada para o complexo de visitantes do local.

Conclusão

O projeto do Space Shuttle foi um compromisso entre muitas considerações técnicas e políticas. Durante sua concepção, e ao longo de seu desenvolvimento e uso, virtualmente todo elemento do desenho do shuttle e seu uso foi criticado por alguém – algumas vezes por motivos técnicos, algumas vezes por seus altos custos, e algumas vezes pelas decisões questionáveis da NASA. Mesmo assim, este desenho de compromisso, apesar de caro e complexo para operar, é considerado hoje o mais avançado e versátil sistema de lançamento criado pelo homem.

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terça-feira, 19 de junho de 2012

A História por trás do “Litzen”

Brian Bell


Como entusiastas da re-encenação militar da Segunda Guerra Mundial, frequentemente nem ligamos para as insígnias que existem em nossos uniformes. Geralmente, vemos estes itens como algo que precisam aparecer no sentido de parecer correto historicamente. Pouco sabemos da história dessas insígnias, dos seus desenhos, variações de cores e motivos pelos quais eram usadas. Não conhecendo a resposta, frequentemente significa que não podemos responder quaisquer perguntas a respeito delas se forem feitas por alguém que está passando pelo local onde estamos atuando em um evento público. Um dos itens que tenho sido questionado mais do que qualquer outro é o litzen do colarinho que todos nós usamos em nossos uniformes. Este artigo lidará com a história do “litzen” e como eles tornaram-se uma parte essencial do uniforme do soldado alemão.

Como com toda insígnia militar, a insígnia de barra dupla usada na gola de toda túnica do soldado (incluindo oficiais) tem uma longa história de desenvolvimento. O nascimento do litzen remonta tão longe quanto o Império Romano. Durante os dias nascentes da civilização, o Império Romano teve um papel significativo e influente na estruturação da cultura na Europa Central (e, em especial, na Germânia). Os símbolos militares romanos tornaram-se uma parte inseparável dos temas ornamentais do novo estilo em arte que foi chamado estilo imperial.

O desenvolvimento da insígnia de gola de barra dupla foi similar ao da águia heráldica. Águias heráldicas têm sido, por longo tempo, os emblemas de países europeus como Rússia, Áustria e Prússia. Em 1804, Napoleão Bonaparte, no trono do novo império, declarou o “reino da águia.” Junto com esta declaração, vieram várias formas de símbolos heráldicos diretamente adquiridos ou adotados da heráldica Romana. Desde que nenhum país europeu desde a época do Império romano adquiriu o poder e força que a França conseguiu sob Napoleão, o uso de tal simbolismo tornou-se comum entre os vários exércitos que foram influenciados pelas vitórias militares francesas. De fato, foi Napoleão que proclamou seu país como herdeiro do grande Império Romano.

Como outros países, o militarismo prussiano também foi grandemente influenciado pelas armas, uniformes e táticas empregadas pelos franceses. Nesta era de história militar, era comum para os exércitos adotar estilos semelhantes de vestimenta militar. Para o exército prussiano, isto incluiu a criação e uso de uma variedade de acessórios que eram usados para enriquecer a aparência dos uniformes militares. Em muitos exércitos, era comum era comum usar acessórios de pano ou metálicos ao redor das golas dos uniformes. Unidades de guarda únicas ou distintas frequentemente recebiam detalhes importantes quando se desenhavam os uniformes.

Soldado de infantaria prussiano

Durante o século XIX e o começo do século XX (antes da primeira Guerra Mundial), os militares, como profissão, eram considerados como tendo uma carreira de prestígio. Não havia reflexão maior deste prestígio do que os uniformes das várias forças armadas. Podemos até supor que antes do advento dos esportes modernos os homens que prestavam o serviço militar eram considerados o “time” que representava o orgulho nacional, regional ou local. Na Europa, as comunidades maiores possuíam da “Guardas de Honra” formada pela elite das sociedades que vestiam seus uniformes pomposos para ocasiões cerimoniais ou para escoltar autoridades estrangeiras. Seguindo as Guerras Napoleônicas, a moda militar atingiu seu ápice quando os combatentes e seus herdeiros em todos os lados dos conflitos relembravam ou revelavam suas glórias passadas.

Durante o auge desta época na moda militar, o exército prussiano adotou o litzen como uma forma padrão de decoração de uniforme para uso em túnicas usadas pelas unidades de guardas. O desenho real do litzen pode ser imaginado como uma coluna de pedra romana. Na arquitetura roamana, assim como nas estruturas militares, a coluna de pedra representava a noção de “resistência e solidariedade”.

Coluna romana

A insígnia litzen com barra dupla é, na verdade, uma forma modificada da imagem da coluna romana colocada lateralmente e levemente inclinada como recurso apelativo. Colocada em cada lado da gola, esta imagem tinha a mensagem da resistência para os homens que vestiam uniformes decorados com este tipo de acessório. Enquanto os oficiais eram geralmente designados para usar uma versão de alta qualidade do litzen, durante os primeiros dias do militarismo prussiano, o uso deste tipo de insígnia era permitido a soldados somente se estivessem servindo as famosas unidades de guardas.

Litzen de gola 
 
Durante a Primeira Guerra Mundial, o litzen de gola gradualmente começou a aparecer em uniformes de campanha para infantes comuns. Apesar de não ser comum, seu uso por unidades militares selecionadas sob o comando militar combinado do Kaiser pode ser visto durante a última parte do conflito. Seguindo a derrota da Alemanha na Primeira Guerra Mundial, o litzen de gola foi abandonado mas também não esquecido. As tradições militares inspiradas pelo exército prussiano sob o comando de oficiais que ajudaram a reconstruir o poder militar da Alemanha durante os anos 1920 e 1930 inspirou o ressurgimento da tradição militar. Estes homens reintroduziram a insígnia para uso tanto nos uniformes do oficial quanto no do soldado do Reichswehr. Nesta época, muitos soldados usavam insígnias de alta qualidade de oficiais, que diferiam daquelas usadas na Segunda Guerra Mundial.

Quando Hitler assumiu o controle da Alemanha em 1934 e estabeleceu a Wehrmacht como as forças militares combinadas da Alemanha, ele continuou a permitir o litzen de gola a ser usado nos uniformes.

Após ser redesenhado para apelo moderno, o litzen de gola usado por soldados assumiu a forma de um litzen estilizado e angularizado semelhante àqueles usados nos primeiros uniformes prussianos do século XIX. Estes novos litzen eram bem menores que os exemplos anteriores com a adição de novas cores para identificar o ramo do exército de serviço (waffenfarbe). O novo litzen de gola tinha cinco componentes básicos, quais sejam:

Dopplelitze: esta porção da insígnia continha as principais barras horizontais inclinadas levemente tanto para cima quanto para baixo. A insígnia inteira era produzida por um processo mecânico de costura em uma tira de material costurado. O doppletitze era produzido em uma variedade de cores começando com o branco (1934 – 1936) e rapidamente passou para cinza (1936 – 1945) frequentemente sendo referido como “camundongo cinza”. O dopplelitze era geralmente produzido em seda artificial, mas podia também ser encontrado em algodão.

Kragenpatte: este era a tira verde de lã sobre o qual o dopplelitze era costurado. A cor da lã variava do verde escuro até o cinza esverdeado, dependendo do fabricante e da época na qual foi produzido. O fundo era apoiado por um tecido grosso tratado com cola. Começando no início de 1939, o dopplelitzen era frequentemente costurado diretamente na gola do uniforme sem o fundo kragenpatte. Esta prática tornou-se padrão a partir de 1941 apesar de muitas insígnias com fundo verde escuro continuarem a ser usadas de antigos estoques até maio de 1945.

Mittlestreife: a listra longa no centro de dois dopplelitze paralelos. A listra tinha geralmente a mesma cor que a kragenpatte. Entretanto, podia também ser encontrado em preto, verde ou cinza para todos os ramos de serviço. A cor permanecia consistente e não mudava de um ramo para outro.

Litzenspiegel: estes eram as linhas centrais percorrendo o meio das barras principais. As linhas de tecido ou “leves” como elas eram chamadas por muitos soldados eram diferentes em cores de um ramo de serviço para outro. O Branco era a cor que representava a infantaria. Num esforço para padronizar o suprimento e a transferência de homens e materiais entre os vários ramos do exército, começando em 1941, muitos litzen foram produzidos em cor cinza sem a waffenfarbe do ramo. Estas insígnias eram “universais” na natureza e tornaram mais eficientes as transferências de homens de uma unidade para outra sem a necessidade de mudar a cor da insígnia ou fabricar um uniforme novo.

Litzen de gola usado na Segunda Guerra Mundial

domingo, 17 de junho de 2012

[POL] Gestapo, a polícia secreta de Hitler

Eduardo Szklarz   04/04/2012

Em 1934, a estudante de música Ilse Sonja Totzke chamou a atenção dos moradores da pequena Wurtzburgo, na Alemanha. Volta e meia, era vista conversando com judeus. Graças a denúncias anônimas, em 1936, sua caixa de correio passou a ser vigiada pela Gestapo. Três anos depois, o médico Ludwig Kneisel foi ao quartel-general da polícia secreta do regime nazista para delatar o "comportamento suspeito" da vizinha. Em 1940, foi a vez da jovem Gertrude Weiss. Ela informou aos agentes que a estudante nunca respondia à saudação "Heil Hitler!".

Questionada no ano seguinte, Totzke confirmou que tinha amigas, mas não amigos judeus. Corria o risco de ser acusada de ter relações sexuais com eles - um grave delito de "desonra racial". Em vários interrogatórios, a Gestapo advertiu que a mandaria a um campo de concentração se mantivesse as amizades. Mas ela deu de ombros: declarou que não apoiava o antissemitismo do Reich. Em 1943, sob ameaça crescente, fugiu com a judia Ruth Basinsky para Estrasburgo (atual França), sua cidade natal. As duas cruzaram a fronteira com a Suíça, mas foram detidas na aduana e entregues à Gestapo. Totzke foi enviada ao campo de concentração de Ravensbruck - e nunca mais voltou.

Raros alemães desafiaram a Gestapo como ela. Milhões, contudo, viveram no mesmo clima de pavor, em que todos eram denunciantes e potenciais denunciados.

Após a Segunda Guerra, a polícia secreta de Adolf Hitler tinha a fama de ser infalível e implacável, quase onisciente, até. Hoje, porém, historiadores têm uma visão distinta. Embora fosse a peça central do terror nazista e agisse praticamente acima da lei, a Gestapo não teria a mesma eficácia sem a colaboração de cidadãos comuns, como Kneisel e Weiss. As fichas da estudante de música e outras vítimas também indicam que a brutalidade não atingiu a todos por igual nem aconteceu do dia para a noite. Ao menos no início do Terceiro Reich, muitos tiveram margem de manobra para lidar com as investidas do estado policial... até que já fosse tarde demais.

Quarta-feira, 26 de abril de 1933. Criada por um decreto do ministro do Interior da Prússia, Hermann Göring, a Gestapo surgiu da necessidade de o regime nazista controlar (e eliminar) seus adversários políticos.

Vigiar o pensamento não era novidade no país. Desde os tempos do Segundo Império (1871-1918), o chanceler Otto von Bismarck costumava recorrer a leis especiais para perseguir oponentes. Após a derrota da Alemanha na Primeira Guerra, o império deu lugar à República de Weimar (1919-1933). Mas a democracia manteve a velha estrutura policial, a cargo de cada estado, monitorando, inclusive, as atividades dos futuros donos do poder. Os efeitos do conflito ainda se faziam sentir, e os nazistas aproveitaram a turbulência que tomou conta da nação para obter sucessivos triunfos nas urnas.

Assim, quando o presidente Paul von Hindenburg apontou Hitler como chanceler, em janeiro, a base da Gestapo já estava pronta. Os nazistas só precisariam depurar os profissionais e aproveitar antigos métodos de inteligência, investigação e tortura para criar sua própria polícia secreta.

O incêndio do Reichstag (o parlamento), em 27 de fevereiro de 1933, foi decisivo nesse processo. Pesquisadores ainda discutem se os nazistas atearam o fogo (é provável que sim) - mas é fato que usaram as chamas para culpar os adversários comunistas. Pressionado por Hitler, Hindenburg assinou o Decreto do Reichstag, que facultou a polícia a espiar as comunicações privadas e manter suspeitos sob "detenção preventiva" sem acusação específica. O Partido Nazista obteve 43,9% dos votos nas eleições parlamentares da semana seguinte e conseguiu aprovar a chamada Lei de Habilitação, que dava ao führer o direito de dispensar o aval do parlamento ou do presidente para governar. Logo foram abolidas as liberdades de expressão, de imprensa e de associação.

Veteranos

Göring, que dirigia a força policial da Prússia desde fevereiro, já havia dispensado centenas de funcionários não alinhados com o ideário nazista. Eles foram substituídos, em geral, por integrantes das tropas paramilitares do partido, as SA e SS. O quartel-general, em Berlim, em breve teria jurisdição sobre todo o país, absorvendo outros serviços de inteligência de cada estado, que também passaram por expurgos internos. Em novembro, uma lei isentou a polícia secreta da jurisdição do Ministério do Interior e deu aos agentes uma liberdade de ação inédita.

"Cerca de 90% dos antigos agentes das polícias políticas permaneceram na Gestapo", afirma o historiador Robert Gellately, autor de várias obras sobre o Reich. Segundo ele, os veteranos acabaram atraídos por uma espécie de "tentação totalitária": o poder gigantesco adquirido pela instituição para controlar seus alvos. Suas demandas tinham prioridade sobre as de outras polícias. "A Gestapo reunia os investigadores de elite, encarregados de fazer valer as leis e os decretos que o regime considerava mais importantes: aqueles sobre raça e oposição política."

As primeiras vítimas foram os comunistas, social-democratas e demais adversários políticos. Dias após o incêndio, os nazistas ergueram 30 campos de concentração para os "inimigos". Antes que o mês de abril terminasse, mais de 5 mil pessoas já estavam em detenção preventiva. Em 25 de maio, a polícia da Baviera informouque o Partido Comunista e todos os seus afiliados "haviam deixado de existir".

A Gestapo serviu também para vigiar e punir seus próprios pares. Nomeado ministro da aviação, Göring se viu compelido, em 1934, a entregar o controle da força a Heinrich Himmler, líder da SS, então à frente das polícias de toda a Alemanha, exceto a prussiana. Interessados em conter a influência da SA (mais numerosa e dirigida por Ernst Röhm), os dois usaram a Gestapo e a SS para executar centenas de "camisas pardas" (os membros da SA) em 30 de junho daquele ano - a Noite das Facas Longas. Röhm não sobreviveu ao dia seguinte. Não era raro que as investigações da polícia secreta servissem como arma na disputa de poder dentro do regime. Que o digam Werner von Blomberg e Werner von Fritsch. Em 1938, eles renunciaram aos mais altos cargos das Forças Armadas da Alemanha por causa de informações pessoais e boatos espalhados por agentes da Gestapo. A mulher do primeiro posou para fotos pornográficas e o segundo foi acusado de ser homossexual.

Extermínio

A maioria desses agentes atuava atrás da escrivaninha, analisando denúncias. Nas batidas em locais suspeitos, nas ruas, frequentemente andavam à paisana. Mas, sob o comando de Himmler, que pretendia fundir toda a intrincada estrutura policial alemã à SS, investigadores, espiões e detetives tornaram-se cada vez mais violentos. Desde o início da Segunda Guerra, membros da Gestapo passaram a integrar, ao lado da tropa paramilitar, esquadrões da morte que seguiam o Exército nos países ocupados, eliminando quem bem quisessem - principalmente os judeus.

Himmler revelou-se um dos maiores carrascos da população judia ainda antes da guerra. A perseguição começou com um boicote econômico às suas lojas, ordenado por Hitler, em 1933. Dois anos depois, as Leis de Nuremberg cassaram a cidadania dos judeus e declararam ilegais os casamentos entre eles e pessoas de "sangue alemão". Qualquer contato passou a ser visto pelo regime como um crime em potencial.

E a polícia secreta mantinha-se atenta, para azar de Samuel Novak, entre tantos outros. Em 1936, o judeu de 61 anos foi a um restaurante berlinense com a jovem ariana Augusta Hauser. Um soldado avisou a Gestapo. Interrogada, ela revelou que tinha um caso com o patrão havia dois anos. Ambos foram presos e torturados. Desesperado ao saber da confissão da amante, Novak enforcou-se na cela.

"A maioria dos alemães achou que as novas leis estabilizariam a situação do país ao relegar aos judeus uma esfera de segunda classe e que isso sanaria a violência das ruas. Em geral, não pareciam se incomodar com a violação dos direitos fundamentais", diz o historiador Michael Burleigh no livro The Third Reich: A New History (O Terceiro Reich: Uma Nova História, inédito no Brasil). "A oposição se limitava à burguesia liberal, alguns enclaves católicos e homens de negócios preocupados com as repercussões no exterior."

A perseguição se intensificou para valer com a Noite dos Cristais, em 9 de novembro de 1938. Uma onda de ira popular varreu a Alemanha em represália ao assassinato de um diplomata, em Paris, por um judeu polonês, revoltado com a perseguição a seu povo. Os tumultos foram insuflados pelos escritórios locais da
Gestapo. Deixaram mais de 90 judeus mortos e centenas de feridos. Cerca de 30 mil pessoas foram enviadas aos campos de concentração, administrados pela SS. A partir daí, a polícia secreta só permitiu perseguições "metódicas e planejadas", como dizia Göring.

Durante a guerra, o controle social foi radicalizado. O regime de exceção podia considerar delito qualquer frase dita em público que pudesse ofender "a vontade do povo alemão". A Gestapo se tornara mais poderosa do que nunca. Himmler conseguira unificar todas as forças policiais do país e submetê-las à SS com a criação do Escritório Central de Segurança do Reich (RSHA). Em 1940, a polícia secreta foi liberada de cumprir o Decreto do Reichstag. Ou seja, na prática, podia atuar como legislador, juiz, jurado e executor. Assim, tornou-se a última instância responsável pelo destino dos judeus.

Comandante em Berlim, Reinhard Heydrich personificava o estereótipo dos oficiais da Gestapo: intrépido e impassível. "Muitos também tinham uma personalidade insegura. Heydrich vivia atormentado pela ideia de ter um antepassado judeu", diz Eric A. Johnson em Nazi Terror. Segundo ele, os chefes de assuntos judaicos eram selecionados entre os veteranos de aparência pouco ameaçadora - uma estratégia para fisgar suas vítimas.

"Além de refinar métodos tradicionais de tortura, terror e colaboração, a Gestapo agregou um ingrediente novo: ela operava juntamente com organizações extraterritoriais e internacionais, como a Ausland-SD (agência de inteligência no exterior com abrangência das Américas ao Japão), o corpo diplomático alemão e departamentos policiais da Interpol, que ela ajudou a fundar (leia à pág. 31)", afirma o escritor Edwin Black, autor de Nazi Nexus.

O papel dos cidadãos

"Já não dá para dizer que a Gestapo estava em toda parte e o poder do estado era total. Também não dá para dividir os alemães em dois polos opostos: o dos seguidores cegos de Hitler e o das vítimas ou combatentes da resistência", diz Johnson, relativizando a gigantesca dimensão atribuída à instituição por pesquisadores no pós-guerra. Em Krefeld, por exemplo, com 170 mil habitantes, a polícia secreta tinha apenas 13 oficiais (um para cada 13 mil habitantes). No total, a Gestapo contava com 32 mil integrantes em 1944. Para ter uma ideia, as SA tinham 2,9 milhões, dez anos antes.

Com a equipe restrita, como a instituição conseguiu criar nas pessoas a percepção de que eram vigiadas o tempo todo? Eis a colaboração do "alemão comum". Qualquer um era tomado de pânico só de receber a carta timbrada convocando para "responder perguntas". Mas o ponto é: sem a ajuda dos vizinhos e companhia, a Gestapo não teria a mesma eficiência. Entre 1933 e 1939, 41% dos processos contra judeus em Krefeld foram iniciados por denúncias de civis. Em outras cidades, não foi diferente.

Alguns fofoqueiros chegaram a integrar uma "rede de espionagem" da instituição. Ninguém sabe ao certo seu tamanho. Em Nuremberg (2,7 milhões de habitantes, em 1941), havia 80 informantes para os 150 funcionários. Vários colaboradores eram antissemitas, e outros, indiferentes - mas, em geral, receptivos à propaganda nazista. E dispostos a dedurar pelo bem do país ou resolver desavenças pessoais, até rixas com ex-amante (veja acima). Uma cliente insatisfeita, da cidade de Mitelberg, denunciou Ludwig Hell por vender aguardente a uma judia em seu armazém, em novembro de 1941. Depois de passar pela loja de manhã, Helen Pfaff voltou à tarde para comprar uma cota extra de "produtos escassos". Hell recusou-se a atendê-la, mas serviu, sem cerimônia, a freguesa seguinte, uma judia. Pfaff reclamou à Gestapo. O comerciante teve de jurar que nunca mais faria algo parecido e permaneceu sob vigilância. Já o doutor Kneisel declarou que se sentia obrigado a denunciar Ilse Sonja Totzke por seu "dever como oficial da reserva".

"À medida que o regime se tornava mais totalitário, sobretudo durante a guerra, aí sim a Gestapo infundiu muito medo e adquiriu cada vez mais poderes para apertar os mecanismos de controle. Dessa forma, o que era permissível em 1935 terminava com prisão ou morte em 1943", afirma o historiador Andrés Reggiani, da Universidade Torcuato Di Tella.

"Não esperamos ser amados por muitos", dizia Himmler. Bastava o conformismo dos cidadãos. "O que o regime precisava era estabelecer a linha oficial, obter a cooperação e atuar sem descanso com base na informação recebida", afirma Gellately. Foi o que a Gestapo fez, sem que quase ninguém na Alemanha reclamasse da matança de 6 milhões de judeus, além de gays, ciganos e outras minorias.

Julgamento

Em 1946, o Tribunal de Nuremberg julgou os 22 criminosos de guerra mais importantes da Alemanha. Doze foram condenados à morte. A Gestapo foi definida como uma organização criminosa e a corte resolveu que os responsáveis pagariam por seus crimes. Mas vários manda-chuvas menos conhecidos, como Richard Schulenburg, puderam reorganizar sua vida normalmente. Aos 68 anos, o ex-chefe de assuntos judaicos em Krefeld pleiteou uma pensão do Estado. Submeteu-se a um processo de "desnazificação", em que teve de convencer um comitê da cidade sobre seu passado impoluto. Juntou referências de moradores e jurou nunca ter cometido delito: "Eu tratava com humanismo todas as pessoas". Não conseguiu a pensão, mas seu advogado apelou, justificando que ele fora obrigado a integrar a Gestapo.

Deu certo: recebeu pensão até morrer, aos 82 anos. Karl Loffer, da polícia secreta de Colônia, também se reabilitou com cartas de apoio de líderes das Igrejas católica e protestante. Diretor-geral do departamento dedicado aos judeus, Adolf Eichmann fugiu para a Argentina, mas foi capturado por israelenses em 1960 e condenado à morte. Diversos companheiros dele, contudo, continuaram gozando a boa vida na América do Sul - e sabe-se lá onde mais.

Intercâmbio produtivo

Chefões da Gestapo e da cúpula nazista dominaram a Interpol

A Organização Internacional de Polícia Criminal, a Interpol, foi criada na Áustria, em 1923, para promover a cooperação entre as polícias do mundo. Para a Gestapo, o intercâmbio significava uma bela chance de aprimorar as técnicas de investigação. Não foi à toa que vários nazistas fizeram carreira na organização. Um deles foi o general da SS Kurt Daluege, eleito vice-presidente da Interpol em 1937. Reinhard Heydrich, um dos primeiros líderes da Gestapo, chefe da RSHA (que englobava as polícias do Reich, inclusive a secreta) e arquiteto do Holocausto, ocupou a presidência da organização entre 1940 e 1942. "Sob a nova liderança alemã, a Interpol vai ser o centro da polícia criminal", anunciou ele à época. A sede nacional da Interpol ficava numa mansão em Wannsee, subúrbio de Berlim. Foi ali que a cúpula nazista realizou uma conferência, em 20 de janeiro de 1942, para planejar a chamada Solução Final contra os judeus. Heydrich morreu meses depois, vítima de um atentado em Praga, mas o Reich não perdeu a liderança da organização por muito tempo. Ernst Kaltenbrunner (sucessor de Heydrich na RSHA) tornou-se presidente em 1943 - e continuou no cargo até o fim da Segunda Guerra.

Tentação perigosa

Agentes monitoravam um dos mais luxuosos bordéis de Berlim

Segredos de alcova também alimentaram a rede de informações do Reich. Uma parceria entre a Gestapo e o SD (o Serviço de Segurança do partido nazista) transformou um badalado bordel de Berlim em centro de vigilância. O Salão Kitty tinha escutas nos quartos e prostitutas treinadas para tirar confidências de clientes como diplomatas do exterior e oficiais nazistas. A ideia de Reinhard Heydrich era identificar possíveis traidores. O bordel foi operado pelo SD entre 1940 e 1942 e inspirou o filme Salão Kitty (1976), de Tinto Brass. Mulheres ambiciosas não só espionavam mas também tiravam vantagem de seu relacionamento com os barões da Gestapo, como a atriz russa Mara Tchernycheff. Protegida por Henri Chamberlain, chefe da polícia secreta na França ocupada, ela faturou alto contrabandeando bens de judeus deportados. Ela é uma das "condessas da Gestapo", citadas no livro homônimo de Cyril Eder, sem edição no Brasil.

Sem limites

Organograma do terror: como funcionava a polícia secreta


http://guiadoestudante.abril.com.br/estudar/historia/confira-historia-gestapo-policia-secreta-hitler-681227.shtml