terça-feira, 31 de julho de 2012

[ARM] O Míssil Intercontinental de Hitler

Planos de Hitler encontrados; mísseis alados poderosos deveriam ser usados em 1946.

Popular Science, outubro de 1947


Quando a invasão aliada atrapalhou os planos nazistas, eles tinham um foguete supersônico, com 5.000 km de alcance, em operação. No estágio de desenvolvimento estava seu sucessor - um verdadeiro bombardeiro-foguete de velocidade e alcance idênticos. Os planos originais são mostrados na figura 2.

Os projetos de foguetes de Hitler eram os equivalentes ao Projeto Manhattan da América. Os planos da bomba atômica ainda estão mantidos em segredo, mas os planos detalhados nazistas para a guerra transoceânica por controle automático foram expostos publicamente. Eles são uma provas de desenvolvimentos que podem ser razoavelmente esperados se houver outra guerra.

Se a invasão da Europa tivesse sido adiada por seis meses, os mísseis autômatos alemães e bombardeiros-foguetes pilotados estariam cruzando o Atlântico. O bombardeio de Nova York estava programado para o início de 1946.

Em 1943, os principais cientistas da Alemanha estavam incumbidos de trabalhar na série A de foguetes guiados e pilotados. Os três primeiros destes foguetes foram projetados para pesquisa básica em aerodinâmica, estruturas aeronáuticas e propulsão. O primeiro modelo "comercial" foi o A-4, melhor conhecido como V-2, que fez uma estreia devastadora em solo britânico em 8 de setembro de 1944.

O A-4 foi um produto da série A muito avançado para provocar um grande número de mortes enquanto que os cientistas de Hitler desenvolveram mísseis mais mortais e de maior alcance. Em seguida, veio o A-5, que tinha metade do tamanho do A-4. Ele foi usado para experimentos em novos mecanismos de controle. Ele foi seguido pelo A-6, projetado para testes em velocidades supersônicas.

Mas alcance era o que os nazistas procuravam - alcance para alcançar os Estados Unidos. E asas teriam sido dadas a eles. Asas teriam permitido a um foguete, após atingidos a velocidade e altitude máximas, escorregar e pular o ar rarefeito da ionosfera e o ar pesado da atmosfera. O modelo experimental era o A-7, uma versão alada do pequeno A-5; então, o A-4 (V-2) estendia asas para tornar-se o A-8, seguido pelo A-9, que usava ácido ao invés de oxigênio como oxidante. As bombas de combustível do A-9 eram acionadas por uma turbina usando peróxido de hidrogênio e permanganato de cálcio.

Figura 1

Impulsionador para Altitude

O próximo problema foi conseguir levar o A-9 para a ionosfera no início de sua jornada balística através do Atlântico. Seu suprimento próprio de combustível era insuficiente. A resposta estava no A-10, um foguete do tipo booster de 8,6 toneladas, dos quais 6,3 toneladas seriam combustível. Este impulsionador era para carregar o A-9 para a ionosfera a 4.165 km/h. Quando o combustível terminasse, o impulsionador seria descartado e o motor-foguete do A-9 assumiria, aumentando a velocidade do míssil para 10.000 km/h.

Os cientistas de Hitler, com a típica precisão alemã, tentaram de tudo. Eles projetaram cerca de 138 mísseis de vários tipos. Para motores eles usaram modelos com exaustão a jato, turbinas a gás, turbojatos, ramjets e foguetes puros. Nos combustíveis, eles experimentaram ácido nítrico e misturas de compostos de xilidina (isômero do xileno, que é um derivado do benzeno) e aminas; outros incluíam oxigênio gasoso e carvão em pó.


Figura 2


Excesso de Sistemas de Controle

No campo dos controles, eles diversificaram dos métodos iniciais de controle direto por cabo de um avião "mãe" para o uso do rádio, radar, onda contínua, infravermelho, raios de luz e magnetismo. um míssil tinha uma televisão montada na ogiva. Ligada a cerca de 4,25 km do alvo, ela permitia que os controladores na base de lançamento direcionar o foguete visualmente a uma instalação predial específica, tal como um depósito de munição.

Um dispositivo de controle recusou-se a ser controlado. Neste caso, o míssil supostamente deveria seguir um raio de energia de um equipamento de radar, o qual apontava para um alvo inimigo. Em um vôo de teste, contudo, o míssil inverteu a direção de vôo e seguiu o raio para um impacto direto na estação de controle. Após este acidente, os cientistas nazistas favoreceram dispositivos embarcados sensíveis a calor ou som.

Os nazistas também tiveram outros problemas. Eles estavam atrasados em relação a nós em algumas pesquisas básicas, tal como energia nuclear para ogivas e ligas que pudessem resistir ao calor terrível gerado desenvolvido pelos motores a foguete. Os ácidos que eles usavam tinham a tendência a corroer vasos e tubulações; explosões no solo eram freqüentes e as fatalidades altas. Mas não resta dúvidas que os cientistas de Hitler estavam 10 anos à nossa frente na guerra automática.

Apesar de a combinação do A-9 mais o A-10 ser a última palavra na série de mísseis de longo alcance da série A, todos os estudos de projeto e cálculos foram feitos para o próximo passo - o verdadeiro bombardeiro-foguete. Equipado com trem de pouso e um compartimento de bomba, ele teria sido capaz de despejar suas bombas e incendiar-se após sua viagem transoceânica. Com um motor a propelente líquido pesando 1,2 toneladas e desenvolver um empuxo de 890 kN, ele teria atravessado o Atlântico, da Alemanha até Nova York, em 40 minutos.

Somente o tempo preveniu Hitler de vangloriar-se em 1944 após assistir as primeiras tentativas de disparo de suas "armas secretas": "... Eles não são o produto de sonhadores... e o mundo inteiro logo sentirá seu efeito."*


* Como muitas frases supostamente atribuídas a Hitler, o autor do texto não fornece nenhuma referência.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

[SGM] O Mais Longo dos Dias

Flávia Ribeiro e Fábio Varsano

Normandia, o local da invasão

O espanhol Juan Pujol García ganhou dos ingleses o codinome Garbo em homenagem a Greta Garbo, atriz que viveu, no cinema, a espiã da Primeira Guerra Mundial Mata Hari. Pujol, diziam os ingleses, era um baita ator. Tanto que enganou os alemães por anos e foi decisivo para o sucesso do Dia D. Agente duplo, trabalhava para os ingleses passando informações erradas à Alemanha. Durante os preparativos para o Dia D, o espião deu mais subsídios para que o exército de Hitler acreditasse que a invasão seria no departamento de Pas-de-Calais, e não em Calvados.

Garbo foi peça fundamental da Operação Fortitude, que visava justamente a confundir o inimigo com mensagens de rádio falsas e deslocamentos de exércitos que sequer existiam. No esquema de espionagem dos Aliados, havia ainda o sistema Ultra, desenvolvido pelo Serviço Secreto britânico, que permitiu a decodificação de mensagens militares alemãs e a descoberta de informações sigilosas inestimáveis.

Mas não precisava ser um espião experimentado para participar dos preparativos para a invasão. Pessoas comuns tiveram papel semelhante ao de Garbo em diversos momentos, especialmente na França ocupada. O historiador americano Stephen Ambrose conta o caso de um menino cego, de 9 anos, que forneceu aos Aliados as coordenadas exatas de bunkers alemães dotados de grandes canhões e construídos sobre um rochedo a oeste de Port-en-Bessin. O pai do garoto era o fazendeiro francês dono do terreno e mediu a distância de cada ponto das redondezas para cada fortificação, além da distância de uma para outra. Passou as informações ao menino, que, no início de 1944, pegou uma carona até a cidade de Bayeux e entrou em contato com André Heintz, membro da Resistência Francesa. Heintz, que tinha um radiotransmissor caseiro, enviou as coordenadas preciosas para a Inglaterra.

Resistência Francesa

Assim como o menino cego, outras pessoas acima de qualquer suspeita para os alemães repassaram dados fundamentais para os Aliados, geralmente por intermédio de membros da Resistência Francesa, que se desdobravam em serviços de espionagem e de sabotagem e estavam em comunicação direta com os ingleses. A organização colhia informações, por exemplo, diretamente de operários franceses obrigados a construir fortificações alemãs. E elas não eram poucas. O general Erwin Rommel mandou instalar minas, arames farpados e bunkers em cada pedaço de praia ocupado.

Além disso, a Resistência Francesa explodiu pontes, linhas ferroviárias e sistemas de telefonia e de telégrafo, como parte do Plan Vert (Plano Verde); resgatou pilotos aliados abatidos sobre a França; e, por estar atrás das linhas inimigas, foi capaz de uma série de ações para atrasar as tropas do Eixo, especialmente com táticas de guerrilha, como parte do Plan Tortue (Plano Tartaruga).

Na Inglaterra, a participação da população também foi intensa. O exemplo mais claro do engajamento dos cidadãos na guerra foi dado por uma campanha iniciada pela BBC. A rádio pediu que cada família que tivesse passado férias nas praias francesas antes de sua ocupação mandasse cartõe-postais com fotos dos locais visitados. Em alguns meses, mais de dez milhões de imagens foram armazenadas, formando, com as fotografias panorâmicas tiradas de aviões pelos militares, um grande e detalhado painel da topografia da costa ocupada.

Até estúdios cinematográficos entraram no esforço, construindo grandes galpões cenográficos para abrigar divisões armadas inexistentes. O 1º Grupo do Exército dos EUA chegou a ficar baseado em Dover, ameaçando Pas-de-Calais, comandado pelo já legendário general George Patton, o que dava credibilidade à farsa. Funcionou. Quando o Dia D chegou, os alemães não faziam a mais remota idéia de que os inimigos estavam prestes a desembarcar. E vinham em números impressionantes. Para tentar tomar um pedaço de 80 quilômetros de praias francesas, foram mobilizados cerca de 175 mil soldados americanos, britânicos, canadenses, franceses, noruegueses, poloneses e de outras nacionalidades, 50 mil veículos de diversos tipos, quase 11 mil aeronaves e 5 333 embarcações.

Já os Aliados tinham uma boa idéia do que esperar. Sabiam de cada obstáculo topográfico, cada bunker, cada canhão. Mas, no fim, nenhum dos dois lados estava preparado para a carnificina que aconteceu. Ou para os meses de ataques e contra-ataques que ainda viriam pela frente.

Dia D: os últimos preparativos

A última grande batalha travada no Ocidente nos tempos modernos começou, oficialmente, no dia 6 de junho de 1944, quando as tropas aliadas invadiram a Normandia para libertar a França da ocupação alemã, que já durava quatro anos. Mas o Dia D, como ficou conhecida a data em que a chamada Operação Overlord foi colocada em prática, já vinha sendo arquitetado havia três anos, desde que os Aliados iniciaram atividades de espionagem e contra-espionagem e passaram a traçar um meticuloso plano de desembarque.

O mar e o céu precisavam estar completamente dominados por americanos, canadenses e ingleses para haver condições de deflagrar a maior invasão anfíbia da História. Tudo precisava seguir um cronograma perfeito. Em jogo, afinal, estava a vitória sobre as forças de Hitler na frente ocidental da Segunda Guerra Mundial.

A costa de Pas-de-Calais era o lugar óbvio para o desembarque aliado na França, ideal sob todos os aspectos, especialmente dois: era o ponto mais próximo da Inglaterra e ficava numa posição estratégica no Canal da Mancha. O único problema é que era óbvio demais. Os alemães, sob o comando do general Erwin Rommel, já estavam fortificando a região.




A melhor opção passou a ser a costa de Calvados, na Normandia, onde havia um pequeno porto, Caen, que, se fosse capturado, cortaria acessos ferroviários e rodoviários de Paris a Cherbourg. Os ingleses deveriam invadir as praias de Sword e Gold, além de tomar Caen. Os canadenses desembarcariam em Juno. Os americanos entrariam nas praias de Omaha e Utah, já na Costa do Cotentin. Mas os alemães teriam de continuar acreditando que o destino aliado era Pas-de-Calais.

Como escreveu o historiador americano Stephen Ambrose em O Dia D, “o problema aliado era desembarcar, penetrar na muralha atlântica e assegurar posições numa área apropriada para viabilizar reforços e expansão. A conditio sine qua non da operação era conseguir o fator surpresa.”

Os aliados precisavam, a qualquer custo, fazer com que a Operação Overlord fosse um sucesso. Se falhassem, a guerra poderia se arrastar por muitos anos ainda, já que outra operação daquela magnitude não seria possível tão cedo. Nas palavras do primeiro-ministro britânico Winston Churchill, a Overlord foi “a mais difícil e complicada operação de todos os tempos.”





Dia D: o desembarque na Normandia

“Havia navios de desembarque avançando pelo mar cinzento até onde os olhos podiam alcançar. O sol estava coberto e a fumaça soprava por todo o litoral.” Assim o escritor americano Ernest Hemingway, correspondente de guerra da revista Colliers, descreveu a chegada aliada em 6 de junho de 1944. Hemingway estava em uma balsa americana em direção a Fox Green, um setor da praia de Omaha, observando o impressionante ataque naval em direção à costa, ao nascer do sol: “‘Veja o que eles estão fazendo com aqueles alemães’, ouvi um recruta dizer, sob o rosnado do motor. ‘Acho que nenhum homem sairá vivo dali’, afirmou ele, contente”, conta Hemingway.

Ao amanhecer, os milhares de soldados embarcados, muitos enjoados pelo balanço do mar, receberam a ordem de avançar. Cada grupo tinha um setor da praia ao sul da Baía do Sena. De leste para oeste, esses setores ganharam os nomes de Sword, Juno, Gold, Omaha e Utah. O mar estava coalhado de navios e embarcações diversas, todos com o objetivo de despejar bombas ou soldados nas praias.

As britânicas Sword e Gold e a americana Utah foram tomadas com relativa facilidade – apesar de as metas das tropas que desembarcaram em Sword não terem sido alcançadas no primeiro dia. “O problema dos ingleses não foi dominar as praias, mas, sim, tomar Caen, que era considerado um alvo prioritário”, diz o historiador Márcio Scalercio, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e da Universidade Cândido Mendes.





Sob fogo cerrado

Com ou sem Caen, foram os canadenses em Juno e os americanos em Omaha que se envolveram em batalhas longas e sangrentas, com numerosas mortes tanto para o lado aliado quanto para o alemão. Em Juno, que ficava entre as duas praias dos ingleses, a divisão de infantaria e as brigadas armadas do Canadá começaram o dia tendo sérios problemas com a maré alta, os recifes naturais e os bancos de areia. Quando finalmente conseguiram desembarcar, enfrentaram fogo cerrado alemão. Havia numerosos ninhos de metralhadoras e canhões, e as equipes de assalto, as que desembarcaram primeiro, sofreram as maiores baixas. Dos 21,4 mil canadenses que foram lutar em Juno, 1,2 mil morreram ou ficaram gravemente feridos, quase todos nas primeiras horas.

Os canadenses precisavam transpor a muralha atlântica. Feito isso, chegariam a um campo livre, com pouca resistência. O problema era conseguir. Para tanto, usariam uma série de engenhocas britânicas, conhecidas como “Hobart‘s Funnies”, carros de combate modificados para flutuar na água, destruir minas e lançar chamas, por exemplo, inventados pelo major britânico Sir Percy Hobart – quase uma versão verdadeira do Q, o inventor das histórias de James Bond.

As baixas foram enormes, mas a infantaria canadense transpôs a muralha atlântica e entrou nas aldeias e cidades atrás dela promovendo uma feroz troca de tiros com os alemães escondidos dentro das casas. Juno, Sword e Gold tinham essa particularidade: diferentemente das praias atacadas pelos americanos, nelas ou em suas proximidades havia uma série de vilas, aldeias ou cidades. Muitas das lutas aconteceram no meio das ruas, entre casas de civis, algumas ocupadas pelos invasores.

Os combates de rua aconteceram ao longo de todo o dia, até que os canadenses tomaram as cidades de Bernières e de Saint-Aubin, já no início da noite. A partir daí, novas aldeias, pontes e encruzilhadas eram conquistadas. Não chegaram ao Aeroporto de Carpiquet – um dos objetivos –, mas avançaram bastante para o interior. Conseguiram cortar a estrada de Caen-Bayeux e se ligar à 50ª Divisão britânica em Gold. Mas não foram capazes de se unir à 3ª Divisão britânica na praia de Sword, deixando uma abertura pela qual a 12ª Divisão SS Panzer HitlerJugend, formada em grande parte por adolescentes da juventude hitlerista, contra-atacou.

No primeiro confronto entre os canadenses e a divisão blindada, 28 tanques aliados foram destruídos. Um dos comandantes alemães, Kurt Meyer, declarou que era hora de “jogar o peixinho de volta no mar”. Os peixinhos, no entanto, resistiram furiosamente. O combate se estendeu de 7 a 12 de junho, durante o qual os alemães perderam 60% de suas forças: 20% foram mortos e 40%, feridos. A poderosa divisão blindada de Hitler viu-se envolvida num dos mais longos e sangrentos confrontos da Overlord. Há relatos de atrocidades cometidas pelos dois lados do embate, e muitos membros da Divisão Panzer foram, mais tarde, julgados por crime de guerra.

Horror em Omaha

Na praia de Omaha, a ferocidade da batalha também impressionou. “Omaha foi um horror, porque lá os alemães estavam com uma divisão de infantaria de verdade”, ressalta Márcio Scalercio. Dos 34 mil homens que lá desembarcaram, cerca de mil morreram, a maioria na primeira hora. Ao longo do dia, os americanos perderam 2,4 mil soldados, entre mortos e feridos. Além disso, o forte vento afundou dezenas de tanques anfíbios.

“Fora um assalto mortal em plena luz do dia, contra uma praia minada, defendida por tudo o que a inventiva militar havia projetado. A praia fora defendida tenaz e inteligentemente, nenhuma tropa o faria melhor. Mas cada barco do Dix conseguiu desembarcar suas tropas e seu carregamento. Nenhum barco foi perdido por imperícia náutica. Todos os que se perderam o foram pela ação do inimigo. E tomáramos a praia”, escreveu Hemingway sobre o assalto a Fox Green. Lá, como em Easy Red, outro setor de Omaha, os soldados sofreram para superar a Muralha Atlântica de Hitler. O primeiro dia terminou em vantagem para os alemães.



“Praia de Omaha foi um pesadelo”, escreveu o general responsável pela invasão, Omar Bradley: “A 1ª Divisão ficou imobilizada praticamente no mar, enquanto o inimigo varria a praia com armas portáteis. A artilharia inimiga castigava impiedosamente as lanchas de desembarque que se aproximavam”. O comandante pensou até em recuar: “Cheguei a ter a impressão de que nossas forças tinham sofrido uma catástrofe irreversível, de que havia pouca esperança de que pudéssemos forçar nosso caminho para a praia. Particularmente, considerei a hipótese de evacuar a cabeça-de-praia”.

Mas, no dia seguinte, a situação começaria a se inverter. Os alemães gastaram a maior parte de sua munição durante o primeiro dia e não tinham como repô-la rapidamente. Já os americanos recebiam tropas e armamentos de reposição diretamente de um dos mulberries, portos artificiais erguidos pelos aliados nas proximidades. Lenta e laboriosamente, debaixo de saraivadas de tiros, conseguiram avançar para o interior.

Desembarque tranqüilo

Em Utah, graças ao trabalho da 82ª e da 101ª Divisões Aerotransportadas americanas, que protegeram todo o flanco ocidental da invasão, aconteceu o mais tranqüilo desembarque do Dia D. Para começar, 32 tanques anfíbios Sherman aportaram na praia, às 6h30. Os regimentos da 4ª Divisão de Infantaria americana vinham em sua esteira. Mas, por causa do bombardeio, do vento e da fumaça, muitos acabaram saltando longe dos lugares marcados. Ainda assim, foram ágeis na hora de se reunir.

Os homens sofreram mais com o mar, muito agitado, do que com os alemães. No fim, apenas 197 baixas entre 23 mil soldados americanos, que ao fim do dia já se moviam para sua nova missão: tomar Montebourg. A 101ª Aeroterrestre já havia aberto o caminho. Nos dias e nas semanas seguintes, a 4ª Divisão envolveu-se em embates bem mais violentos, mas tomou não só Montebourg, como também Cherbourg, além de participar da libertação de Paris.

Os ingleses não penaram tanto quanto os canadenses e os americanos de Omaha. Principalmente em Gold, onde, ao anoitecer, os britânicos já haviam entrado cerca de dez quilômetros para o interior e ligado-se aos canadenses em Creully, fechando uma passagem para os alemães. Houve somente 400 baixas entre 25 mil homens. Não tomaram Bayeux, na estrada para Caen, mas estavam em boa posição para fazê-lo nos dias que se seguiram.

Na turística Sword, cheia de casas de veraneio e lojas, os homens da 6ª Divisão Aeroterrestre deixaram o caminho livre para os soldados que desembarcaram em 6 de junho. Afinal, os alemães pretendiam defender sua posição na praia com as baterias de Merville, tomadas pelos pára-quedistas ingleses de madrugada. Ainda assim, o fogo alemão foi mais pesado lá do que em Gold ou Utah. Por isso, apesar de conseguirem dominar a praia, os britânicos não puderam se unir aos canadenses no flanco direito, que ficou desprotegido. Foi por ali que os alemães responderam violentamente.

Houve 630 baixas entre os 29 mil homens que invadiram Sword e que não conseguiram capturar Caen, o alvo principal. A cidade estava guardada pela 21ª Divisão Panzer, e o 22º Regimento dos blindados entrou em combate com os ingleses. Os Aliados ainda precisariam de vários dias até conseguir alcançar seu objetivo final. Mas o caminho estava bem pavimentado.

Dia D: o ataque pelos céus

Assim que o planador Horsa pousou ao lado do Canal de Caen, pouco depois da meia-noite do dia 6 de junho de 1944, o tenente Dan Brotheridge reuniu os 28 homens de seu pelotão de infantaria, membros da 6ª Divisão Aeroterrestre britânica, e correu para a ponte sobre o canal, defendida por cerca de 50 alemães – entre eles o soldado Helmut Rommer, de 17 anos. O jovem sentinela foi o primeiro a ver os pára-quedistas ingleses e logo correu para avisar aos outros, gritando e disparando tiros de sinalizador. Brotheridge, então, metralhou-o. Em seguida, já em meio à troca de tiros, jogou uma granada sobre um ninho de metralhadoras. No mesmo momento, foi atingido no pescoço. O tenente inglês que deu os primeiros tiros da Operação Overlord e matou o primeiro alemão foi também, como conta Stephen Ambrose, o primeiro soldado aliado a ser morto pelo fogo inimigo no Dia D.




A invasão estava marcada para o dia 5 de junho, mas o mau tempo fez com que fosse adiada. Os Aliados precisavam de boa visibilidade para o sucesso da operação. “Eles compensariam a menor capacidade de mobilização das tropas com uma absoluta supremacia aérea”, diz o historiador Márcio Scalercio. Os soldados tiveram de esperar 24 horas, ansiosos, irritados e enjoados pelo balanço dos barcos no mar. O dia 6 chegou, com o tempo ainda ruim, mas com menos nebulosidade. Logo nos primeiros minutos do ataque, enquanto os bombardeiros ingleses e americanos despejavam milhares de toneladas de explosivos por todos os lados, os pára-quedistas e integrantes das unidades aerotransportadas da 6ª Divisão Aeroterrestre britânica, entre eles Dan Brotheridge, puderam finalmente entrar em combate.

Foram eles os homens que começaram a ação no Dia D, na primeira e última grande invasão pára-quedista noturna de que se tem notícia. O pelotão de Brotheridge entrou em cena simultaneamente a centenas de pára-quedistas britânicos e americanos precursores, cuja missão inicial era marcar zonas de lançamento para os batalhões pára-quedistas que ainda viriam: os ingleses e canadenses da 6ª Divisão à leste, perto de Sword e de Caen; e os americanos da 82ª e da 101ª Divisões à oeste, próximos a Utah e a Cotentin. A missão dos três grupos, formados por 23,4 mil homens, não era fácil. Eles deveriam confundir os alemães para evitar um contra-ataque rápido nas praias que seriam invadidas pelas tropas transportadas por mar dali a algumas horas. Precisavam, ainda, proteger os flancos em Sword e Utah.

Muitos, levados pelo vento, acabaram perdidos, pendurados em árvores ou presos às imensas e numerosas cercas vivas da Normandia. Eles tornaram-se alvos fáceis dos inimigos. Boa parte caiu longe de seu local de aterrissagem, como o soldado Ryan, do filme de Steven Spielberg. Os que conseguiram atingir seus objetivos abriram caminho para as outras divisões que saltariam nas horas seguintes, enfrentando não só o vento e as cercas vivas, mas também o incessante fogo antiaéreo alemão.




Luta sangrenta

Do lado inglês e canadense, um dos objetivos era destruir uma bateria inimiga em Merville, composta por quatro casamatas e quatro canhões que poderiam atingir as tropas que desembarcassem em Sword. Foi uma luta sangrenta. Em torno das casamatas, havia cercas de arame farpado e muitas minas, além de trincheiras, dez ninhos de metralhadoras e quase 200 alemães. Para completar, dos cerca de 700 pára-quedistas ingleses destinados a Merville, somente 150 conseguiram se reunir para a ação.

Como não havia soldados suficientes para envolver a bateria nazista, optou-se por um ataque frontal, atravessando minas debaixo do fogo inimigo. Com enorme coragem, os que alcançaram as muralhas atiraram pelos buracos. O posto de artilharia foi conquistado em 20 minutos. Dos soldados aliados, 66 morreram e 30 ficaram feridos. Do outro lado, apenas 22 alemães ilesos conseguiram se render.

Além disso, ingleses e canadenses deveriam explodir as pontes sobre o rio Dives e capturar, intactas, as pontes sobre o rio Orne e sobre o Canal Orne. Conseguiram. Todas as metas foram alcançadas em apenas uma noite. A tomada da Ponte Pegasus, no rio Orne, por exemplo, foi realizada em impressionantes cinco minutos, pela Companhia D.

Já a 6ª Divisão teve de resistir a um forte contra-ataque alemão, mas antes do amanhecer havia tomado o lado esquerdo da praia de Sword. “As tropas aeroterrestres britânicas tinham conseguido um início estupendo”, disse Stephen Ambrose. E tornaram-se os heróis daquele começo de batalha, personagens da seguinte manchete do jornal Evening Standard, de Londres: “Homens alados pousam na Europa”.

A partir dali, a missão passou a ser resistir aos contra-ataques e defender as pontes para evitar a passagem dos blindados alemães que estavam perto de Calais. Os pára-quedistas ingleses não alcançaram o objetivo, certamente superestimado, de tomar Caen e Carpiquet ao fim do dia 6. Mas, graças a eles, o flanco esquerdo da invasão ficou seguro e pôde receber os jipes e canhões levados pelos planadores. Quando as tropas inglesas desembarcaram em Sword, a resistência alemã já havia sido neutralizada pelos “homens alados”. Do outro lado, a 82ª e a 101ª Divisões Aéreas americanas pousaram entre Ste. Mère Eglise – a primeira cidade na França a ser libertada – e Carentan. Um pequeno grupo de soldados da 82ª Divisão encurralou rapidamente a 91ª Divisão germânica, após matar seu comandante, garantindo o domínio da Costa do Cotentin. O flanco ocidental do desembarque estava, assim, em mãos aliadas.

As baixas foram muito severas, como entre os ingleses. Por causa da dispersão, as divisões contavam com menos da metade de seus efetivos dias depois do início da operação. Mas, mesmo sem querer, acertaram no alvo ao se dispersar. Ao verem pára-quedistas descendo por todos os lados, os alemães ficaram sem saber exatamente para que lado revidar. A resposta lenta funcionou a favor dos Aliados, compensando não só a perda de homens, mas também de armas.

A 82ª não conseguiu capturar as pontes sobre o rio Merderet, assim como a 101ª não foi capaz de destruir as pontes sobre o Canal de Carentan e sobre o Estuário do Vire, que estavam entre suas metas. Os sucessos, no entanto, foram maiores que os fracassos e fundamentais para a conquista daquele trecho. A 101ª Aeroterrestre, por exemplo, tomou a Eclusa de La Barquette, mesmo estando com apenas um sexto de seus homens reunidos. Nos meses seguintes, a Easy Company, como era conhecido o 506º Regimento da 101ª, destacou-se em numerosas batalhas, inclusive na conquista de Carentan. Seus membros são personagens do livro Band of Brothers, de Stephen Ambrose, que virou uma minissérie de mesmo nome, produzida por Tom Hanks e Steven Spielberg.

Curiosidades da Batalha

Pistas falsas para os alemães

Hitler mandou tropas para a distante Noruega

A Operação Fortitude concentrou esforços para fazer os alemães acreditarem que o desembarque seria no departamento de Pas-de-Calais. Para confundir ainda mais o inimigo, também apontou a Noruega como um segundo alvo, em mais uma série de transmissões de rádio falsas – todas com códigos mais fáceis de serem quebrados. Além disso, espiões alemães que passaram para o lado da Inglaterra, no que constituía o chamado Sistema Double Cross, mandavam mensagens para o serviço secreto nazista descrevendo uma falsa movimentação de tropas aliadas na Escócia. Com isso, fizeram com que Hitler e seus generais colocassem 13 divisões do Exército, 90 mil homens da Marinha e 60 mil da Luftwaffe na Noruega – longe do verdadeiro ponto de desembarque.

A muralha atlântica

Barreira montada por Rommel parecia inexpugnável

“Rommel defendeu a França como um colosso”, afirma o historiador Stephen Ambrose. Represou rios para inundar áreas estratégicas, expulsou franceses de suas residências, botou casas e edifícios abaixo, derrubou florestas inteiras para ter madeira suficiente para seus obstáculos costeiros. Depositou minas nos canais e nas praias, milhões delas. Ainda assim, não foi suficiente. “Eles usaram uma quantidade impressionante de minas, mas precisavam de muito mais, tamanho era o contingente em que desembarcou”, diz o historiador Márcio Scalercio, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e da Universidade Cândido Mendes.

Além das minas, arames farpados foram usados em profusão. Havia ainda grandes trincheiras de concreto e rampas minadas, paralelamente a outros obstáculos. Por todas as praias, casamatas com canhões e ninhos de metralhadoras estavam prontos para acertar cada soldado aliado que ousasse desembarcar. Era a chamada Muralha Atlântica de Hitler.

O problema não estava nas armas, mas nos homens. Grande parte das melhores tropas alemãs estava enfrentando os russos na Frente Oriental, restando para defender a França muitas Divisões Ost (Oriente) ¬– formadas por estrangeiros, a maioria deles prisioneiros de guerra, obrigados a lutar com os nazistas. Um oficial americano chegou a deter quatro coreanos no meio de uma divisão do Eixo na praia de Utah.Essas tropas eram constituídas por poloneses, russos, croatas, húngaros, romenos, lituanos, ucranianos e homens vindos das mais diversas repúblicas da União Soviética, além de franceses, italianos, indianos, soldados da África do Norte e de países muçulmanos. Muitos deles dispostos a se entregar aos Aliados na primeira oportunidade.

Entre as divisões alemãs, algumas formadas por soldados muito jovens, ou velhos demais, o que enfraquecia a defesa e reduzia as possibilidades de contra-ataque. Mas havia também grupamentos poderosos, como a divisão de infantaria que guardava a praia de Omaha. Além disso, três unidades Panzer, de blindados, com soldados de elite, espalhavam-se pelas praias francesas. Embora fossem poucas, impressionavam e eram difíceis de ser batidas. A 21ª Divisão Panzer acampou em Caen, dificultando o trabalho dos ingleses, que deveriam tomar o porto. As outras duas ficaram numa posição da qual poderiam chegar em algumas horas tanto a Calais quanto a Calvados. Já o céu era quase todo dos Aliados. A maior parte da Luftwaffe estava na própria Alemanha, para defendê-la de possíveis ataques. Com isso, as divisões terrestres precisavam se locomover principalmente à noite, sob pena de serem destruídas pelos bombardeios aéreos aliados.

A sagrada hora do chá

Britânicos e canadenses não abriam mão do ritual diário

Nas histórias em quadrinhos de Asterix, de Albert Uderzo e René Goscinny, os bretões têm a mania de fazer uma pausa nas batalhas para tomar o chá das cinco. A piada com o hábito inglês, por incrível que pareça, não é um exagero. Em pleno Dia D, soldados britânicos e canadenses sempre conseguiam um tempinho para tomar seu chá. “Eles improvisavam, tomavam chá em galões de gasolina”, diz o historiador Márcio Scalercio.

O livro O Dia D está recheado de histórias, contadas pelos próprios soldados. O major inglês Porteous, por exemplo, relata que no caminho para a Ponte Pegasus, no Canal do Orne, sua tropa deslocou-se para o interior e aproveitou para fazer chá. Quando um dos soldados preparava a bebida num fogareiro, segurando uma marmita e uma lata de chá, uma granada explodiu. O soldado não se feriu, mas a xícara e a marmita foram destruídas.

Por essas e outras, o voluntário americano Robert Rogge ironizou: “Os exércitos britânicos e canadenses não conseguem lutar três minutos e meio sem chá”. Os americanos não entendiam como os ingleses podiam fazer uma guerra sem café.

A guerra na frente oriental

Alemães sofriam pesadas baixas contra o exército vermelho

Enquanto ocorriam os confrontos na França, Hitler preocupava-se com a situação no outro lado da Europa, na chamada frente oriental. Desde janeiro de 1943, quando as tropas alemãs foram obrigadas a recuar pela primeira vez após o fracasso da tentativa de conquistar Stalingrado, na Rússia, os nazistas passaram a perder gradativamente terreno para o Exército Vermelho e a ter de enfrentar a resistência de movimentos guerrilheiros antes enfraquecidos.

Apesar das sucessivas derrotas – como a de Kursk, em julho de 1943 –, a ordem do ditador alemão era não se retirar jamais. Assim, mantinha cerca de 3 milhões de homens, 3 mil tanques e 3 mil aeronaves espalhados ao longo de 2,2 mil quilômetros. Hitler ainda obteve sucesso em alguns contra-ataques, mas a tônica eram as investidas soviéticas, cujo contingente girava em torno de 6,5 milhões de soldados e contava com 8 mil tanques e 13 mil aeronaves, graças ao apoio americano de suprimentos e equipamentos.

Entre junho e setembro de 1944, os comunistas conseguiram avançar mais de 600 quilômetros sobre territórios até então dominados pelos nazistas. Durante esse período, o exército de Josef Stálin e os partisans (guerrilheiros) venceram os inimigos em boa parte da Europa Oriental, conquistando Letônia, Lituânia, Ucrânia, Bielorússia, Romênia e parte da Polônia. Nesses conflitos, as perdas alemãs na frente oriental foram terríveis – cerca de 215 mil mortos e 625 mil desaparecidos –, a maioria capturada pelo Exército Vermelho.

Os jovens de Hitler

Uma divisão só de calouros

Uma poderosa divisão blindada criada em 1943, formada apenas por membros voluntários da Juventude Hitlerista, a grande maioria nascida em 1926. Assim era a 12ª SS Panzer Hitlerjugend: fortemente armada e com soldados altamente comprometidos com a causa nazista. A falta de experiência da divisão, que entrou em ação pela primeira vez exatamente no Dia D, era compensada pela visão dos oficiais, a maior parte veteranos com história em outras unidades blindadas. O primeiro confronto pesado dos jovens de Hitler foi contra os canadenses, entre 7 e 12 de junho. Lá, muitos soldados e armamentos foram perdidos, mas os nazistas continuaram lutando, dando muito trabalho aos Aliados para defender Caen, por exemplo. Acabaram encurralados em Falaise, no fim de agosto. Entre o Dia D e a queda em Falaise, a 12ª SS Panzer HitlerJugend perdeu mais de nove mil homens.

O resgate do soldado Niland

A história que inspirou o filme de Spielberg

O Resgate do Soldado Ryan, filme de Steven Spielberg, de 1998, conta a história, baseada em fatos reais, de uma unidade americana deslocada para resgatar um soldado cujos três irmãos já haviam morrido na Normandia. O chefe do Estado-Maior do Exército americano, general George C. Marshall, queria devolver ileso à senhora Ryan ao menos um de seus quatro filhos. O nome verdadeiro do soldado resgatado e mandado de volta para casa não era James Francis Ryan. Ele, na verdade, era um sargento. Frederick Niland estava no 501º Regimento da 101ª Divisão Aeroterrestre americana quando se soube que seus três irmãos haviam morrido na primeira semana da Batalha da Normandia: um em Ste. Mère Eglise, em 6 de junho; outro em Utah, também no Dia D; e o terceiro, na Birmânia. O sargento Niland foi retirado de combate e mandado para casa pouco depois de sua mãe ter recebido os três telegramas sobre as mortes dos filhos no mesmo dia.

A batalha por Ste. Mère Eglise

Os soldados da 82ª divisão americana tomaram a estratégica cidade francesa. Mas os alemães não desistiram facilmente

A grande conquista de uma Divisão Aeroterrestre americana no dia 6 de junho foi Ste. Mère Eglise, de grande importância estratégica. Perto do rio Merderet, muitos homens da 82ª acabaram atolados em pântanos criados pelas inundações ordenadas por Rommel – 36 deles chegaram a morrer afogados. Apesar das dificuldades, o 3º Batalhão do 505º regimento conseguiu reunir 180 de seus soldados e, às 4 horas, rumou para Ste. Mère Eglise. A cidade acabara de apagar um incêndio causado por bombardeiros. Os alemães foram surpreendidos pela chegada dos americanos. Em poucos minutos, a cidade foi conquistada, suas linhas de comunicação cortadas e a estrada que ligava Cherbourg a Carentan, ocupada.

Não foi tão fácil manter o território, e muitos americanos chegaram a pensar que sairiam derrotados de lá, como conta o sargento Otis Sampson, em relato registrado no livro O Dia D: “Muitas coisas passaram pela minha mente. Eu temia que a invasão tivesse sido um fracasso. Pensava no meu país e nas pessoas que estávamos tentando ajudar. Eu estava quase certo de que nunca veria a luz do dia novamente. Não posso dizer que sentia medo. Queria apenas uma oportunidade de levar tantos jerries [como os alemães eram chamados] comigo quantos fosse possível! Queria que viessem até onde eu estava para que eu pudesse vê-los. Queria era um monte deles na minha frente antes que me apanhassem. Teria sido muito mais fácil morrer daquele jeito”.

Os alemães contra-atacaram na principal batalha que uma divisão aeroterrestre americana enfrentou naquele dia. Durante oito horas, 42 soldados tentaram retomar Ste. Mère Eglise. Só 16 conseguiram fugir ilesos. Os homens da 82ª defenderam a cidade com fúria.

Um deles, o praça Fitzgerald, definiu bem o que foi estar naquela batalha: “O impacto das granadas levantava para o alto montes de terra e lama. O chão tremia e meus tímpanos pareciam arrebentar. A terra estava enchendo minha camisa e entrando nos meus olhos e na minha boca. Aqueles 88 mm [canhões com os quais os alemães atiravam do sul da aldeia] tornaram-se uma lenda. Disseram que houve mais soldados convertidos ao cristianismo pelos 88 mm do que por Pedro e Paulo juntos (…) Não pude segurar o barbeador com firmeza bastante para fazer a barba durante os dias que se seguiram”.

Enxurrada de bombas

Como foi a ofensiva da maior armada aérea de todos os tempos

Os pára-quedistas entraram em cena logo depois de os bombardeiros da Força Aérea Real (RAF), da Inglaterra, abrirem o Dia D à meia-noite em ponto, atacando as baterias de Caen. Em seguida, as aeronaves americanas também iniciaram o lançamento de uma enxurrada de bombas em Calvados e na praia de Utah. Foram mais de 14 mil ataques aéreos, deflagrados por 3 467 bombardeiros pesados, 1 645 bombardeiros médios e 5409 caças. “Foi a maior armada aérea que já se conseguiu reunir”, escreveu o historiador militar Stephen Ambrose.

Os aviões começaram os trabalhos dois dias antes, bombardeando Pas-de-Calais, ainda como parte do Plano Fortitude. Nos meses anteriores, já haviam se mostrado fundamentais para a destruição de linhas de trem e para impedir que tropas alemãs se locomovessem durante o dia, além de forçar a Luftwaffe a recuar para defender os céus germânicos.

No próprio Dia D, no entanto, a maior parte dos objetivos não foi alcançada por causa do mau tempo e da pouca visibilidade. Muitas das bombas acabaram nos campos normandos, deixando quase incólume a muralha atlântica erguida pelos alemães. Foi assim nos alvos ingleses (Sword e Gold), canadense (Juno) e em um dos alvos americanos (Omaha). Em Caen, também não foram efetivos. Em Utah, no entanto, o sucesso foi tão grande que justificou a operação. Os bombardeiros conseguiram, ao menos em uma praia, destruir a maioria das defesas inimigas.

Linha do tempo

Os momentos decisivos da Batalha da Normandia

6 de dezembro de 1943

O general Dwight D. Eisenhower é nomeado chefe supremo da Força Expedicionária Aliada para a Operação Overlord.

6 de junho de 1944

Dia D: começa a Batalha da Normandia, com bombardeios aéreos e navais, e o desembarque das forças aliadas nas praias de Sword, Juno, Gold, Omaha e Utah. Ao fim do dia, os ingleses conseguem proteger o flanco leste do desembarque e conquistar uma série de cabeças- de-ponte na região do rio Orne, mas não tomam Caen. Os americanos protegem o flanco oeste da invasão e conquistam Ste. Mère-Eglise, mas não tomam Carentan.

12 de junho de 1944

O 1° Exército americano conquista Carentan, após sangrenta batalha.

18 de julho de 1944

O 1° e o 8° Corpos britânicos e o 2° Corpo canadense tomam Caen, durante a Operação Goodwood, após seis semanas de batalhas.

19 de julho de 1944

O 1° Exército americano conquista Saint-Lo.

10 a 22 de agosto de 1944

Americanos, canadenses, ingleses, franceses e poloneses encurralam 150 mil alemães no Bolsão de Falaise. Os alemães sobreviventes são capturados ou recebem autorização para fugir.

25 de agosto de 1944

Paris é libertada. Termina a Batalha da Normandia.

Fontes

http://guiadoestudante.abril.com.br/estudar/historia/normandia-local-invasao-435855.shtml

http://guiadoestudante.abril.com.br/estudar/historia/dia-d-ultimos-preparativos-435854.shtml

http://guiadoestudante.abril.com.br/estudar/historia/dia-d-ataque-pelos-ceus-435856.shtml

http://guiadoestudante.abril.com.br/estudar/historia/dia-d-desembarque-normandia-435857.shtml

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Comemorações do Programa Apollo em 2012

Tragédia com o Apollo 1 completa 45 anos

Terra, 27 de janeiro de 2012


A Nasa deu início na quinta-feira às homeganes para marcar as maiores tragédias espaciais de sua história. O dia de hoje marca os 75 anos do primeiro acidente, que causou a morte de três astronautas americanos.

Os tripulantes do Apollo 1, Gus Grissom, Ed White e Roger Chaffee morreram no dia 27 de janeiro de 1967 em um incêndio no módulo de comando durante um teste do dispositivo. Apesar do desastre, o programa continuou para levar à Lua, em 16 de julho de 1969, na nave Apollo 11, os astronautas Neil Armstrong, Buzz Aldrin e Michael Collins.

Como em todos os anos, na última semana de janeiro, a agência espacial quer "homenagear suas vidas e lembranças", disse o diretor da Nasa, Charles Bolden, durante uma cerimônia ontem. Bolden espera que estes sacrifícios sirvam de inspiração para as próximas gerações e pediu aos funcionários da Nasa para que façam ouvir sua opinião e se dirijam a seus superiores para que "a segurança seja sempre prioridade".

Além do Apollo 1, outras duas grandes tragédias marcaram a conquista espacial americana. A nave Challenger se desintegrou em 28 de janeiro de 1986, pouco mais de um minuto após seu lançamento no Centro Espacial Kennedy. Entre os sete tripulantes que morreram estava Christa McAuliffe, uma professora que fazia parte de um projeto da Nasa para levar a ciência aos estudantes.

A tragédia causou um grande impacto na sociedade americana, o que levou a Nasa a realizar uma revisão em todos os seus sistemas e procedimentos centrada na segurança. No entanto, em fevereiro de 2003, os Estados Unidos enfrentaram outra tragédia espacial, quando os sete tripulantes da nave Columbia morreram no momento de entraram na atmosfera terrestre.


Da esquerda para a direita: Virgil Grissom, Edward White e Roger Chaffe


Interior do Módulo de Comando após o incêndio


Apollo 13: há 42 anos, explosão no espaço interrompia missão

Terra, 13 de abril de 2012
 

Há 42 anos, uma explosão no tanque de oxigênio número 2 da Apollo 13 interrompia os planos dos Estados Unidos de realizarem a terceira missão a pousar na Lua. Lançada da Flórida no dia 11 de abril de 1970 com o comandante James Lovell, o piloto John Swigert e o piloto do módulo lunar Fred W. Haise, a nave foi resgatada no dia 17, no Pacífico. A história virou filme em 1995, com Tom Hanks, Kevin Bacon e Bill Paxton interpretando os respectivos astronautas.

Apesar de o objetivo final não ter sido atingido, a missão é considerada pela Nasa, a agência espacial americana, como uma "falha bem sucedida", já que foi possível aprimorar o conhecimento para casos de emergência e resgate.

Investigações apontaram depois que a explosão foi causada devido a modificações no sistema de oxigênio, que aumentaram a voltagem nos tanques de 28 para 65 volts. Contudo, os interruptores termostáticos não foram adaptados para a mudança e não resistiram ao superaquecimento.

Nasa impede leilão de objetos da Apollo 13

Em janeiro deste ano, a Nasa impediu que a caderneta usada pelo comandante James Lovell para refazer os cálculos e possibilitar o retorno da Apollo 13 à Terra fosse leiloado. A agência quer que artefatos utilizados em viagens espaciais não sejam comercializados.

Segundo a Heritage Auctions, empresa que leiloaria a caderneta de Lovell, as anotações no objeto foram feitas logo após o contato dos astronautas com a base, momento em que foi dita a célebre frase "Houston, we have a problem!" (Houston, temos um problema!). A expectativa era de que a peça, um manual de ativação do módulo lunar, atingisse um valor em torno de US$ 25 mil.


Da esquerda para a direita: James Lovell, John Swigert e Fred Haise


Há 41 anos, Apollo 15 levava o primeiro carro a chegar à Lua

Terra, 26 de julho de 2012


Na manhã de 26 de julho de 1971, um foguete Saturn V (o mais poderoso já feito pelo homem) era lançado com os astronautas e o equipamento da missão Apollo 15. Na bagagem, a maior quantidade de equipamentos de pesquisa científica já levados pelas missões tripuladas à Lua. Curiosamente, no "porta-malas" do Saturn V ainda ia o primeiro carro a chegar ao nosso satélite natural.

O lunar roving era movido a eletricidade e servia para levar a tripulação e o equipamento pela superfície lunar. Ele chegava a no máximo 16 km/h e enfrentava inclinações de até 25 graus. Ao invés de um volante, um controle - parecido com aquele de aviões de caça - ficava entre os dois bancos e permitia que ele fosse dirigido tanto pela esquerda, quanto pela direita. Ele suportava até 696 kg (sendo que o próprio veículo pesava 206 kg), tinha 3 m de comprimento, 2,1 m de largura e 114 cm de altura.

Os astronautas pousaram no início da noite (no Brasil) de 30 de julho. Lá eles permaneceram até 3 de agosto - um deles permaneceu em órbita no módulo de comando. Outra curiosidade é que, na saída, eles deixaram um satélite para analisar a massa da Lua, mudanças gravitacionais e a interação com o campo magnético da Terra. A chegada ao planeta ocorreu em 7 de agosto.

O lunar roving era movido a eletricidade e chegava a no máximo 16 km/h  

[SGM] Quem estava planejando atacar quem em junho de 1941, Hitler ou Stalin?

Viktor Suvorov

The Journal of the Royal United Services Institute for Defence Studies, Londres, Grã-Bretanha Junho 1985


Na sexta-feira, 13 de junho de 1941, a Rádio Moscou fez um anúncio incomum da TASS que dizia: “os rumores das intenções da Alemanha de romper o Pacto e promover um ataque contra a União Soviética não tem qualquer fundamento,” e que tais boatos “eram propaganda enganosa de forças hostis à URSS e à Alemanha e interessadas na extensão da guerra.” No dia seguinte, os jornais soviéticos publicaram este anúncio e, uma semana depois, a Alemanha lançou um ataque repentino e traiçoeiro contra a União Soviética.(1) Era totalmente óbvio que o próprio Stalin havia escrito o relatório da TASS. Seu estilo característico era familiar a todos: os generais nas equipes de comando(2), os prisioneiros no GULAG (3), e analistas estrangeiros (4). Muitos historiadores, tanto na União Soviética quanto no Ocidente, consideram este relatório da TASS ter demonstrado, no mínimo, uma falha completa em compreender a natureza dos eventos em andamento e, no máximo, um exemplo notável de negligência criminosa (5). À parte a questão de Stalin fazer uma declaração que foi rapidamente demonstrada ser inteiramente falsa, existe um ponto mais fundamental do porquê ele achou necessário fazer uma declaração como aquela. Ele não era, de todos os tiranos, o mais silencioso? Muitos historiadores notaram a habilidade vacilante de Stalin em manter-se calado em épocas de crise e nas principais questões políticas, e de fato alguns críticos consideram seu silêncio como sendo sua maior arma (6). Além disso, muitos comandantes sêniores soviéticos foram testemunhas de que suas crenças verdadeiras eram totalmente o inverso do que o anúncio da TASS sugeria, e que na realidade ele considerava a guerra contra a Alemanha ser inevitável (7). Se Stalin tivesse repentinamente revisado seu julgamento sobre a probabilidade de guerra, sua opção mais provável teria sido discutir o problema com seus conselheiros mais próximos ou simplesmente tê-lo guardado para si. Por que, então, a visão das intenções pacíficas da Alemanha de Stalin em relação à União Soviética tornadas embaraçosamente públicas?

Além disto, a tendência do relatório da TASS também parecia fora de sintonia com a ideologia comunista em voga. A propaganda comunista (e esta era especialmente verdadeira no caso da Rússia de Stalin) envolvia a constante repetição de uma idéia simples: estamos cercados de inimigos. Isto era um expediente conveniente; ele racionalizava então, como ele faz hoje, por que as fronteiras do Estado eram fechadas, por que a oposição tinha que ser destruída, por que não há eleições livres, por que não há imprensa livre e por que era necessário produzir canhões ao invés de manteiga. Esta noção de uma ameaça sempre presente permite uma explicação de tudo o que for necessário. Gerações inteiras de cidadãos soviéticos têm sido enganadas por esta crença básica apresentada por jornais, cinemas, livros, transmissões de rádio e mesmo livros escolares. E, mesmo assim, nesta ocasião única, a rádio nacional anunciou pomposamente para o país e para o mundo: a ameaça de agressão não existia!

Entretanto, seria um erro simplesmente considerar a declaração de Stalin para a TASS como mal julgada: incompreensível e inexplicável seriam expressões intercaladas mais apropriadas, necessitando uma investigação detalhada das mentiras por trás das palavras.

Uma Data Importante na História Soviética

13 de junho de 1941, a data do anúncio da TASS, é uma das datas mais importantes em toda a história soviética, infinitamente mais importante do que 22 de junho de 1941, o dia da invasão alemã. Muitos marechais e generais soviéticos escrevem sobre o 13 de junho com maior precisão e detalhe do que eles fazem em relação ao dia 22. O que segue é um exemplo típico do relato do General N.I. Biryukov, então comandando a 186ª. Divisão de Infantaria estacionada no Distrito Militar do Ural:

“Em 13 de junho de 1941, recebemos uma diretiva de importância especial do Staff Distrital de acordo com o qual a divisão deveria mover-se para ‘um novo campo’. O local do novo quartel-general não foi comunicado mesmo para mim, o comandante da divisão. Somente quando passei por Moscou fiquei sabendo que nossa divisão deveria concentrar-se nas florestas a oeste de Idritsa.” (8) Todas as divisões no Distrito Militar do Ural receberam ordens semelhantes sinalizando um deslocamento para a fronteira ocidental. O registro oficial do distrito fixa esta data com precisão: “A 112ª. Divisão de Infantaria foi a primeira a começar a transferência. Na manhã de 13 de junho, o primeiro escalão* moveu-se de uma pequena estação ferroviária... então começou a despachar as divisões de infantaria 98ª., 153ª. e a 186ª. O movimento das tropas foi conduzida em segredo.” (9)

A Criação de Novos Exércitos

Staffs de Corpos** foram criados para coordenar a organização operacional das divisões do Ural que estavam secretamente se concentrando nas florestas da Bielo-Rússia e o 22º. Exército assumiu o comando dos Corpos. O General de Brigada*** F. A. Ershakov, o comandante do Distrito Militar do Ural, assumiu o comando deste novo exército e o Chefe de Gabinete do Distrito, o General de Brigada** G. F. Zakharov assumiu a responsabilidade pelo Staff do Exército. Assim, todo o Distrito Militar do Ural, incluindo o comandante, seu staff e todas as formações subordinadas, secretamente começaram a mover-se para oeste. Extraordinariamente, o Vice-Comandante do distrito, o General de Brigada M. F. Lukin**, cuja função habitual teria sido permanecer na retaguarda como comandande do distrito, havia sido ordenado, um tempo antes, a se apresentar no Distrito Militar de Transbaikal onde ele estabeleceu e assumiu o comando do 16º. Exército, no momento em que a TASS estava transmitindo seu comunicado insólito, estava secretamente se dirigindo para o oeste no comando do exército. (10)

* Escalão: grupo de exércitos com mais de 700.000 homens. Ataque em escalão é uma unidade militar posicionada para ataque em linhas paralelas.

** Corpo de Exército: ver tópico “Nomenclatura Militar”.

*** Original em inglês: Ershakov - Major-General, Zakharov – Lieutenant-General, Lukin – Lieutenant-General. No Exército Brasileiro, não existe equivalência para estes postos. Como o Mj.Gen. e o Ltn.Gen. estão acima do General de Brigada, mas abaixo do General de Divisão, optei por traduzir como o primeiro.

Movimentações semelhantes estavam acontecendo simultaneamente em todos os distritos militares internos (11) da União Soviética. Os Comandantes de Distrito, os Generais de Brigada A. K. Smirnov, I. S. Konev, F. M. Remezov, V. F. Gerasimenko, S. A. Kalinin e V. Y. Kachalov (respectivamente comandando os distritos de Kharkov, Cáucaso do Norte, Orel Volga, Sibéria e Archangel), transformaram os conselhos de distrito em staffs dos 18º., 19º., 20º., 21º., 24º. e 28º. Exércitos. Lembrando dos 16º. e 22º. Exércitos mencionados antes, um total de oito exércitos completos de repente surgiu nos distritos internos do país. O 18º. era para ser colocado para reforçar o 1º. Escalão Estratégico do Exército Vermelho, os sete restantes (ao todo, 69 divisões blindadas, motorizadas e de infantaria) constituíram o 2º. Escalão Estratégico. Dos oito exércitos, cinco foram deslocados imediata e secretamente para a Ucrânia e Bielo-Rússia. Todas as fontes soviéticas enfatizaram o segredo de todas estas movimentações: “Antes do início efetivo da guerra, as forças reservas começaram a se organizar nos distritos de fronteira sob condições de total segredo.” (13) “Os outros três exércitos foram colocados sob ordens para movimentação.” (14)

Problemas de Transporte

Somente falta de transporte preveniu os oito exércitos de se deslocarem simultaneamente. Antes, em abril e maio, movimentos de tropas em vasta escala haviam sido executadas do interior até a fronteira alemã. Toda a capacidade reserva do sistema ferroviário nacional inteiro foi utilizada para esta operação principal e secreta. Ela foi completada em tempo mas o material circulante tinha então uma viagem de retorno de milhares de quilômetros. Pensando nestes movimentos iniciais das tropas, o antigo vice-ministro da Superintendência Nacional, I. V. Koyalev, relata o seguinte: “No período de maio até o começo de junho, o sistema de transporte da URSS teve que garantir o transporte de cerca de 800.000 reservistas... isto teve que ser feito secretamente.” (15) Esta preparação não esteve restrita às tropas ordinárias terrestres, como o Coronel-General I. Lyudnikov registrou: “Estando em maio de 1941 no staff do 36º. Corpo de Infantaria, fiquei sabendo que as tropas aerotransportadas estavam concentradas na área de Zhitomir e nas florestas do sudoeste dela. (16)

O Marechal da União Soviética, I. K. Bagramyan, era coronel nesta época e mantinha o posto de Chefe do Departamento Operacional do staff do Distrito Militar Especial de Kiev. Entre outras formações para as quais o distrito deveria assumir responsabilidade, ele nota que durante a última parte de maio de 1941, ele assumiu o comando do 31º. Corpo de Infantaria recém-chegado do extremo oriente após uma jornada de mais de 10.000 km, e então, no final do mês, absorveu o 34º. Corpo do Distrito Militar do Cáucaso do Norte. Este último Corpo tinha sozinho 48.000 homens em suas quatro divisões de infantaria e tinha uma divisão montanhista adicional,”... tínhamos que fornecer alojamentos para quase todo um exército em curto espaço de tempo. No final de maio, escalão após escalão começaram a chegar.” (17) Foi deste modo que o 1º. Escalão Estratégico do Exército Soviético foi secretamente reforçado.

Posicionamento Secreto

Na metade de junho, quando a TASS estava transmitindo seu estranho comunicado e a imprensa soviético estava levando essa informação pra o grande público, o Conselho Militar do Distrito Militar de Odessa recebeu instruções para crier uma administração de exército em Tiraspol, próximo da fronteira romena (18) para o 9º. Exército, o mais móvel e poderoso de todos. Mas a atividade na zona fronteiriça não estava restrita à acomodação de tais formações grandes reforçadas; começou também um reagrupamento secreto de unidades dentro das fronteiras dos distritos. “Sob o pretexto de mudar os campo de verão, as formações se aproximaram da fronteira… A maioria dos movimentos aconteceu à noite.” (19) As publicações oficiais soviéticas estão cheias de relatórios do tipo: “Em 14 de junho, a 78º. Divisão de Infantaria sob o General de Brigada F. F. Alyabushev, sob o pretexto de exercícios de treinamento, foi deslocado em direção da fronteira do Estado.” (20) e “Antes da guerra real, algumas formações do Distrito Militar Especial Ocidental começou a se deslocar em direção da fronteira do Estado em conformidade com as instruções do GS.” (21) e “em 14 de junho, o Conselho Militar do Distrito Militar do Báltico confirmou o plano para o reposicionamento de um número e de regimentos individuais para a zona fronteiriça.” (22) Estes relatos testemunhais são também notáveis por sua ênfase no segredo destes movimentos no cinturão da fronteira, os esforços feitos para despistar e a prontidão das unidades relativa às operações ativas. Os relatos de três oficiais que mais tarde atingiram altos postos no Exército Soviético confirmaram este ponto. O Marechal da União Soviética, R. Ya. Malinowski, na época General de Brigada no comando do 48º. Corpo de Infantaria no Distrito Militar de Odessa, escreve: “Tão cedo quanto 7 de junho, os Corpos deixaram a area de Kirovogrado para Bel´tsy e, em 14 de junho, estava in situ. Este movimento aconteceu sob o disfarce de exercícios de treinamento em larga escala.” (23) O Coronel Bagramyan, que foi mencionado anteriormente, estava ocupado preparando o deslocamento de cinco corpos de infantaria e quarto mecanizados em direção da zona fronteiriça. (24) Em 15 de junho ele foi instruído a começar a mover todos os cinco corpos de infantaria para a fronteira e nota, “eles levaram consigo todo o necessário para operações ativas.” (25) O Marechal, M. V. Zakharov, na época General de Brigada e Chefe de Gabinete do 9º. Exército no Distrito Militar de Odessa, nota que: “Em 15 de junho, as 30ª. e 74ª. Divisões de Infantaria posicionaram-se na floresta a leste de Bel´tsy sob o pretexto de exercícios de treinamento.” (26)

Havia, de fato, 170 divisões no 1º. Escalão Estratégico. Destas, 56 já estavam posicionadas diretamente na fronteira. (27) 114 estavam posicionadas logo atrás na zona fronteiriça, mas: “Entre 12 e 15 de junho a ordem foi dada para os distritos militares ocidentais: todas as divisões estacionadas no interior (daqueles distritos militares) devem ser deslocadas próximo da fronteira do país.” (28) O 1º. Escalão Estratégico agora começava sua concentração diretamente no cinturão da fronteira. Para estes 114 devem ser adicionadas as 69 divisões do 2º. Escalão Estratégico que haviam também se deslocado ou estavam se preparando para tal. Assim, no dia do famoso comunicado da TASS o movimento de 138 divisões estava em andamento: o maior deslocamento de tropas por um único Estado em toda a história da Civilização; um movimento direto para a fronteira e conduzido com o máximo segredo e encobrimento.

Reações ao Comunicado

Retornando ao comunicado da TASS de 13 de junho, ele não fala apenas das intenções alemãs, mas também das ações soviéticas: “Rumores de que a URSS está se preparando para a Guerra contra a Alemanha são falsos e provocativos... os posicionamentos das reservas do Exército Vermelho no verão e as manobras em andamento não têm outro objetivo senão o treinamento de reservistas e verificação do funcionamento do sistema de transporte. É bem conhecido que este é um evento anual, portanto ao descrever estas medidas como hostis à Alemanha é absolutamente absurdo...” Ao comparar a explicação do anúncio da TASS com o que realmente aconteceu em campo, notamos uma certa discrepância, não atípica no caso de Stalin, entre teoria e prática. Por um lado o comunicado tranquilizador, por outro concentração massiva ultra-secreta de tropas na fronteira.

O comunicado da TASS diz que os movimentos estavam relacionados à “verificação do aparato da rede ferroviária.” Entretanto, a concentração de tropas começou em março, atingiu uma vasta escala em maio, e em junho assumiu simplesmente proporções gigantescas. Em outras palavras, o transporte por trilhos (o sistema de transporte nacional mais importante) ficou paralisado por quatro meses completos, e isto na época da colheita quando qualquer vagão tem o seu peso valendo ouro; dificilmente um exercício rotineiro como “verificar o aparato da rede ferroviária”. A explicação de que as movimentações eram “treinamento normal”, é igualmente falsa. Treinamento era realizado no outono quando a colheita havia sido reunida e os campos eram limpos e, além disso, quando a ajuda do Exército com a colheita estava completa. Mas “esta regra foi quebrada em 1941.” (29) Não é de se surpreender que o General de Brigada S. Iovlev, comandando a 64ª. Divisão de Infantaria do 44º. Corpo de Infantaria do Distrito Militar Ocidental Especial, comentou que “a excepcionalidade das movimentações colocavam as pessoas em apreensão.” (30) Por isso a frase repetida “sob o pretexto de treinamento” nos relatórios dos marechais e generais soviéticos relatando estas movimentações.

Outra possibilidade é que os movimentos de tropas tenham sido concebidos como uma demonstração de força. Mas para serem efetivas, as demonstrações precisavam ser vistas; estes movimentos foram realizados de forma tão secreta quanto possível.

As Ações de Stalin

Uma explicação alternativa para os movimentos massivos de tropas é que Stalin, não importando suas declarações no comunicado da TASS, de fato esperava ser atacado pela Alemanha, e estava secretamente aglomerando seus exércitos para criar defesas ao longo da fronteira. Mas esta explicação não é sustentada pelos fatos. Tropas preparando-se para defesa estabelecem trincheiras, canais anti-tanque, barricadas camufladas e cercadas por arame farpado. Basicamente, isto é feito no trajeto do avanço do inimigo, através de estradas e na retaguarda de linhas de rios. Mas o Exército Vermelho não fez nada desse tipo. Como foi relatado anteriormente, divisões foram escondidas nas florestas próximas da fronteira de modo idêntico como as divisões alemãs realizaram seu ataque surpresa. “As tropas de infantaria poderiam ter ocupado e completado instalações defensivas, mas isto não foi feito.” (31)

Esta falha em estabelecer trabalhos defensivos é curiosa já que, com a assinatura do Tratado de Não-Agressão Teuto-Soviético e a subsequente “divisão” da Polônia entre os dois Estados, as forças soviéticas e alemãs agora confrontavam-se ao longo de uma fronteira comum sem nenhum “estado intermediário” entre eles. Além disso, enquanto que a prudência comum poderia ter ditado o fortalecimento, ou pelo menos a retenção da fortificação da Linha Stalin ao longo da fronteira antiga, o oposto estava acontecendo. Este sistema de proteção poderoso foi desmontado e, em muitos lugares, explodido ou enterrado; minas eram retiradas e por uma distância de milhares de quilômetros, “o arame farpado era retirado.” (32) Os destacamentos Partisans, que haviam sido criados no caso dessas terras serem ocupadas pelo inimigo, foram dispensados; (33) cargas explosivas foram removidas de milhares de pontes, estações ferroviárias e complexos industriais, que haviam sido preparados para serem destruídos no caso de uma invasão. Resumindo, esforços colossais foram feitos para destruir tudo conectado à defesa. (34) Ao mesmo tempo, enquanto que antes da assinatura do tratado somente divisões e corpos existiam nos distritos fronteiriços soviéticos, exércitos completos agora começavam a ser montados na nova zona estendida da fronteira. Entre agosto de 1939 e abril de 1941, o número de exércitos na fronteira occidental soviética aumentou de zero para 11. Três adicionais juntaram-se a eles durante maio junto com cinco corpos aerotransportados. Se Hitler não tivesse atacado primeiro, Stalin teria tido 23 exércitos e mais de 20 corpos independents enfrentando-o. Isto aconteceu antes da mobilização geral.

Doutrina Militar Soviética

Nos anos 1930, a doutrina militar soviética considerava que um conflito maior futuro seria uma Guerra de exércitos e milhões de homens, mas aquilo não precisaria necessariamente aguardar o momento quando a mobilização destes milhões de homens estivesse completa antes de a ofensiva começar. Era considerado que nos distritos de fronteira, mesmo no período de paz, haveria tropas que atravessariam a fronteira e entrariam no território inimigo no primeiro dia de Guerra, assim interrompendo a mobilização inimiga e dando cobertura para a sua própria. O Marechal A. E. Egorov pensava que é essencial, mesmo na paz, ter “grupos de invasão” na fronteira. (35) O Marechal M. W. Tukhachevski considerava que isto abrandava o caso um pouco. Em sua visão, não deveria haver “grupos de invasão” mas sim “exércitos de invasão”. Na opinião de Tukhachevski, “a força e posicionamento do exército em avanço devem, basicamente, ser subordinadas à habilidade de cruzar a fronteira imediatamente após o anúncio da mobilização... é essencial para os corpos mecanizados serem posicionados próximos da fronteira... as formações mecanizadas devem ser posicionadas entre 50 e 60 quilômetros da fronteira... de modo a estar capaz de cruzá-la com efeito desde o primeiro dia de mobilização.” (36)

Os Marechais Egorov e Tukhachevski foram mais tarde executados durante o expurgo de Stalin (ambos os oficiais tinham altas posições no Exército Vermelho e subsequentemente no governo) mas suas idéias foram estendidas e desenvolvidas pelo homem que subiu à posição de Chefe do Gabinete Geral e rapidamente tornou-se o praticante mais notável do Exército, o mestre das ofensivas de surpresa, o General de Exército (mais tarde Marechal) G. K. Zhukov. Sob a direção de Zhukov o princípio foi estabelecido que “a responsabilidade pela performance das tarefas do exército de invasão deve ser dada integralmente ao 1º. Escalão estratégico.” (37)

O 1º. Escalão Estratégico que foi formado na fronteira soviética em junho de 1941 foi, em virtude de sua estrutura organizacional, posicionamento e preparação military, claramente ofensivo por natureza. Logo, foi o 2º. Escalão Estratégico que começou seus movimentos secretos em direção da fronteira alemã em 13 de junho de 1941. Muitos marechais e generais soviéticos não sabiam destes fatos diretamente e, é claro, ambos os escalões foram surpreendidos pelo ataque surpresa alemão e teve que atuar de forma defensiva. Entretanto, eles não haviam planejado isso, de modo que o General de Exército M. Kazakov, falando dos exércitos do 2º. Escalão Estratégico, notou: “após o início da guerra, os planos para o seu uso tiveram que sofrer mudanças drásticas.” (38) O General de Brigada V. Zemskov expressou sua proposta estratégica de forma mais precisa, “fomos forçados a usar estas reservas, não para ação ofensiva, de acordo com os planos, mas para defesa.” (39) O General de Brigada M. P. Lukin, que participou nestes eventos como comandante do 16º. Exército, o qual fez parte do 2º. Escalão estratégico, explicou o assunto de forma simples e direta: “fomos criados para lutar em território inimigo.” (40) Enquanto que outro especialista em ataques-surpresa em território inimigo, o Marechal A. M. Vasilevski, corrobora a opinião do General Lukin: “em suas palavras há uma dura verdade.” (41)

Parece certo que a concentração soviética na fronteira estava para ser completada por volta de 10 de julho. (42) Assim, o ataque alemão que ocorreu 19 dias mais cedo encontrou o Exército Vermelho em uma situação totalmente vulnerável – em vagões de trem. Numerosos relatórios soviéticos descreviam mais ou menos o seguinte: “quando a guerra começou, o 63º. Corpo de Infantaria estava a caminho,” (43) “no início da Guerra, a 200ª. Divisão de Infantaria estava a caminho,” (44) e “na erupção da guerra, a 48ª. Divisão de Infantaria estava a caminho.” (45) muitas linhas de tanques, ainda viajando em suas plataformas ferroviárias, ficaram paradas indefesas em campos abertos. E não foram somente tanques, mas canhões, suprimentos e veículos. Uma autoridade notou que: “ao final de junho de 1941, 1.320 plataformas de caminhões estavam estacionadas nas linhas do cinturão frontal.” (46) A imensa escala desta operação ferroviária torna óbvio que alguém havia a organizado antes da eclosão da Guerra, carregada com tanques e caminhões sobre vagões, transportando-os sobre enormes distâncias, e então sido incapaz de descarregá-los.

Houve outras vítimas desta sincronização infeliz do ataque alemão, como o Coronel-General de Artilharia I. Volkotrubenko explica: “Em 1941, a frente ocidental perdeu 4.216 vagões de munição.” (48) Uma baixa mais estranha foi uma coleção de mapas, como o General de Brigada M. Kudryavestev notou: “Havia cerca de 200 vagões com mapas topográficos dos Distritos Militares do Báltico Ocidental e de Kiev. Tivemos que destruir grande parte deste material.” (49) A perda destes mapas merece um exame mais cuidadoso. Por que eles estavam nos vagões? Onde pretendiam ser enviados? Que tipos de mapas eram eles? Se eles eram mapas de regiões interioranas da URSS, eles deveriam estar nas regiões interiores, não havia necessidade de enviá-los para lá.

As Razões para as Ações de Stalin

Quanto mais se estuda as ações de Stalin durante este período crítico, mais aparente se torna que elas não eram uma reação aos movimentos de Hitler. (50) Stalin agiu de acordo com seus próprios planos e estes anteviam uma concentração de tropas soviéticas na fronteira por 10 de julho. Ao determinar o que estes planos pretendiam, é importante considerar o que teria acontecido se Hitler não tivesse atacado antes da data e Stalin tivesse tido a oportunidade de completar sua concentração de tropas na fronteira alemã de forma pacífica e secreta.

Certas conclusões são incontrovertíveis. Primeira, as divisões móveis não poderiam retornar aos distritos distantes de onde vieram. Tal movimento teria absorvido todos os recursos da rede ferroviária por muitos meses e teriam resultado em catástrofe econômica. Segunda, estas forças gigantes não poderiam ser deixadas ao relento onde estavam escondidas durante o inverno. Tantas novas divisões haviam sido criadas e montadas no cinturão frontal que muitas delas já tinham gasto o inverno de 1940-41 em abrigos. Tão cedo quanto 1940, haviam insuficientes centros de treinamento e alcances de artilharia e fuzis na nova fronteira ocidental adquirida, mesmo para as divisões existentes. (52) As tropas que não podem treinar rapidamente perdem sua capacidade de luta.

Em todo empreendimento complexo humano existe um momento crítico no qua los eventos atingem um ponto sem volta. Este momento para a União Soviética veio em 13 de junho de 1941. Após este dia, massas de tropas soviéticas foram secreta, mas inexoravelmente, movidas em direção da fronteira alemã. Depois de 13 de junho, a liderança soviética não podia mais retornar essas tropas ou mesmo Pará-las, por razões militares e econômicas. A guerra tornou-se inevitável para a União Soviética, independentemente de como Hitler poderia ter agido. Finalmente, a composição e disposição das forças na zona fronteiriça não indicavam que elas foram concebidas para permanecer lá. Tais acontecimentos, como o corpo aerotransportado na primeira camada das “defesas”, unidades de artilharia nos locais avançados, o desmantelamento da Linha Stalin e a ausência de qualquer defesa em profundidade ou esforço para construir uma, não ponta a intenção de manter qualquer posição defensiva ao longo da fronteira. Se tudo isto é visto no contexto da doutrina de Zhukov esboçada antes, então torna-se claro que a única intenção militar crível que Stalin poderia ter tido era começar a guerra no verão de 1941.

Os historiadores que aceitaram sem críticas a tese de que Stalin foi vítima de uma agressão não provocada no verão de 1941, devem agora reviser, ou pelo menos modificar, seus pontos de vista.

Referências

1. Muitos historiadores datam este famoso comunicado da TASS em 14 de junho, mas é significativo que ele foi transmitido pela URSS em 13 de junho.

2. Maior-Gcneral P. Grigorenko, V podpolie mogno vstretit tolo krys (Detinetz, New York, 1981). p. 249.

3. G. Oserov. Tupalevska sharaga (Powev-Verlag, Frankfurt/Main, 1971), p. 108.

4. B. H. Liddell Hart, History of the Second World War (Pan, London, 1978). p. 161.

5. For example, R. A. Medvedev, Let History Judge (Alfred Knopf, New York, 1974), p. 900, Worth, A., loc. cit.

6. R. Conquest, The Great Terror: Stalin's Purge of the Thirties (Mac-millan, London, 1968).

7. Marshal K. A. Meretskov, Na Sluzhbe narodu (Pol. Lit., Moscow, 1968), p. 202.

8. Lieutenant-General Birykov, Voenno-istoricheskii Zhurnal (VIZ, 1962, 4), p. 60.

9. Krasnoznamernii Uralsky: History of Ural Military District, (Voenizdat, Moscow, 1983), p. 104.

10. Soviet Military Encyclopaedia (Voenizdat, Moscow, 1978), Vol. 5, p. 34 (Hereafter cited as SVE).

11. Os escritores soviéticos usualmente diferenciam entre distritos de fronteira, que possuem um limite comum com outro estado, e distritos internos, os quais não possuem.

12. Escalões Estratégicos são posicionamentos operacionais de exércitos soviéticos: eles são criados somente quando ação militar é iminente.

13. Army General S. M. Shtemenko, Generalnii shtab v gody voiny (Voenizdat, Moscow, 1968), p. 26.

14. Army General S. P. Ivanov, Nachalnii period voiny (Voenizdat, Moscow, 1974), p. 211.

15. I. V. Kovaliov, Transport v. Velikoi Otechestvennoi voine (Nauka, Moscow, 1981), p. 41.

16. Colonel-General I. Ludnikov, "Pervie dny voiny," VIZ 9 (1966).

17. Marshal I. Kh. Bagramyan, "Zapisky nachalnika operativnogo otdela," VIZ I (1967), p. 61.

18. A Khorcov, "Meroprijtia po povisheniu boevoi gotovnoti," VIZ 4 (1978), p. 86.

19. Ivanov, op. cit., p. 211.

20. Kievsky krasnoznamionny: History of Kiev Military District (Voenizdat, Moscow, 1974), p. 162.

21. Krasnoznamenny Byelorussky Voennii okrug: History of Byelorussian Military District (Voenizdat, Moscow, 1963), p. 18.

22. SVE,Vol. 6, p. 517.

23. Marshal R. J. Malinovski, "Dvadzatiletie nachala VOV," VIZ 6 (1961), p. 6.

24. Marshal I. Kh. Bagramyan, tak nachinalas voina (Voenizdat, Moscow, 1971),p.64.

25.ibid, p. 77.

26. Marshal M. V. Zahkarov, "Stranitsy istorri Vooruzhennykh sil nakanune Velikoi voiny," Voprosy Istorii, 5 (1970), p. 451.

27. Istoriya Vtoroi Mirovoi voiny (1939-1973), Vol. 4, p. 25 and Vol. 3, p. 441.

28. V, Khovostov, Major-General A. Grilev, "Nakanune Velicoi Otechestvennoi voini," Kommunist 12 (1968), p. 68.

29. Ludnikov, op. cit., p. 66.

30. Major-General S. Iovlev, "V boiykh pod Minscom," VIZ 9 (1960), p. 56.

31. V, A. Anfilov, Nachalo Velicoi Otechestvennoi Voiny (Voenizdat, Moscow, 1962), p. 44.

32. Iolev, op. cit., p. 57. 33.VIZ 8 (1981), p. 89.

34. I.T. Starinov, Mini jdut svoego chase (Voenizdat, Moscow, 1964), p. 186.

35. Marshal A. I. Egorov, "Doklad nachalnica shtaba RKKA RVS SSSR," VIZ 10 (1963), p. 31.

36. M. N. Tukhachevski, Izbrannye proizvedeniya (Voenizdat, Moscow, 1964), II, p, 219.

37. VIZ 10 (1963), p. 31.

38. Army General M. Kazakov, "Sozdanie i ipsolzovanie strategicheskikh rezervov," VIZ 12 (1972), p. 46.

39. Major-General V. Zemskov, "Nekotorie voprosy sozdanij i ipsolzovanij strategicheskikh reservov," VIZ 10 (1971), p. 13.

40. Lieutenant-General M. F. Lukin. "V Smolenskom sragenii," VIZ 7 (1979), p. 43.

41. Marshal A.M. Vasilevsky, VIZ 7 (1979), p, 43.

42. Ivanov, op. cit., p. 211.

43. G. P. Kuleschov, "Na Dneprovscom rubege," VIZ 6 (1966), p. 17.

44. Ludnikov, op, cit, p. 68.7 45.VIZ 7 (1974), p. 77. 46.VIZ 1 (1975),p.81.

47. Uma vez começada a guerra, o Distrito Militar Ocidental Especial (um dos cinco criados na fronteira ocidental soviética) foi renomeado para Frente Ocidental. Podemos supor, portanto, que outros quatro distritos fronteiriços tenham reportado baixas, apesar de a escala precisa destas não ser confirmada.

48. Artillery Colonel-General I. Volkotrubienko, "Artillerieskoe snabgenie v pervom periode voiny," VIZ 5 (1980), p. 71.

49. Lieutenant-General M. Kudriavzev, "Topograficheskoe obespechenie voisk v Vilikoi otechestvennoi voine," VIZ 2 (1970), p. 22.

50. M. Mackintosh, Juggernaut (Seeker & Warburg, London, 1967), p. 136.

51. Colonel-General L. M. Sandalov, Peregitoe (Voenizdat, Moscow, 1966), p. 48.

52. Marshal K. S. Moskalenko, Na Igo-Sapadnom Napravlenii (Nauka, Moscow, 1969), pp. 18-20.

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terça-feira, 24 de julho de 2012

Césares russos

Eduardo Szklarz , 10/09/2009

De uma pequena fração de terra ao maior país do mundo, os czares fizeram a Rússia. Opulentos, autoritários e vingativos, eles criaram uma unidade nacional e governaram por mais de mil anos

Eram 2 da manhã quando Nicolau II foi despertado naquele 17 de julho de 1918. O último "imperador de todas as Rússias" agora era prisioneiro dos revolucionários bolcheviques numa casa de Ecaterimburgo, oeste do país. Nicolau foi conduzido com a mulher, o filho, as quatro filhas, o médico e os empregados para um quartinho dos fundos, onde 12 homens os esperavam com armas na mão. Depois do fuzilamento, o pelotão se assustou ao ver que as filhas continuavam vivas - as balas ricochetearam nas jóias costuradas em seus vestidos. O jeito foi terminar o "serviço" com golpes de baioneta.


Nicolau II

Era o fim dos 300 anos da dinastia Romanov. Era também o fim de quatro séculos de domínio dos czares - déspotas com autoridade ilimitada sobre cada um de seus súditos. Ao longo da História, líderes eslavos, sérvios e tártaros também receberam o título de czar (derivado dos "césares" de Roma), mas na Rússia ele adquiriu caráter especial. Usando uma mescla de terror e nacionalismo religioso, os czares russos transformaram um reino minúsculo numa potência mundial e expandiram seu território até ter o dobro do tamanho do Brasil.

Para alguns historiadores, porém, o czarismo não morreu com Nicolau II. Seus métodos autoritários prosseguiram na era soviética e ainda fazem a cabeça dos líderes do Kremlin.

Moscóvia

A semente do czarismo foi plantada no século 9, quando o chefe viking Riurík fundou uma dinastia em Nov-gorod, no noroeste da atual Rússia. Seus descendentes ampliaram o reino até Kiev (Ucrânia), converteram-se à fé ortodoxa - ramo do cristianismo que rompeu com o catolicismo romano no século 11 e se espalhou nos domínios do Império Bizantino. Os descendentes de Riurík usaram o termo "Rus" para descrever seu povo e sua terra. No fim do século 12, o reino se fragmentou em principados rivais e as disputas favoreceram a invasão de Rus pelos tártaros - um povo turco muçulmano que pertencia ao império mongol.

"Os tártaros queimaram cidades e mataram milhares. Naquela época de intensa devoção, os russos pensaram que era um castigo divino", diz o historiador Ronald Hingley, da Universidade de Oxford. Os invasores pouparam o principado de Novgorod, com a condição de que seu príncipe, Alexandre Nevsky, lhes pagasse altos tributos. Foi quando tudo começou. Daniel, filho de Alexandre, tornou-se príncipe de um vilarejo chamado Moscou - e começou a anexar terras. As conquistas tiveram sinal verde dos tártaros, mais preocupados em incentivar as brigas entre os principados fortes. Em troca, os moscovitas obedeciam e pagavam impostos. Resultado: em sete décadas, o reino de Moscóvia cresceu oito vezes. Em 1326, desbancou Kiev como sede da Igreja Ortodoxa. Seus líderes adotaram o título de vseya Rusi ("de toda a Rus"), traduzido em geral como "de todas as Rússias". A essa altura, Moscou já fugia ao controle dos tártaros e criou um regime autoritário cujo príncipe, chamado de czar desde meados do século 15, governava com o apoio de uma facção aristocrática.

"A política de Moscóvia se parecia com a de Al Capone: para vencer os outros reinos, seus líderes tinham de ficar unidos e reconhecer o poder absoluto do príncipe. A crueldade e a unidade eram recompensadas, e os principais clãs se beneficiavam da expansão", diz Dominic Lieven, professor de História Russa na London School of Economics. "Sobre essa política de estilo gângster, a Igreja Ortodoxa carimbou um selo de aprovação." O czar contava com autoridade ilimitada pois seu poder emanava de Deus. A igreja se beneficiava do aumento do poderio russo, pois crescia dentro do cristianismo.

Nos 600 anos seguintes, o principado de Moscou cresceria até ocupar um sexto do planeta. E seus habitantes veriam na monarquia absoluta a única forma de evitar o caos.

A saga dos Ivãs

Talvez o czar moscovita mais eficiente tenha sido Ivã III. Em 43 anos de governo, ele explorou as rivalidades dos tártaros do mesmo jeito que eles tinham feito com os russos. Insuflou o nacionalismo entre o povo e quadruplicou o tamanho do reino. Depois festejou a glória ampliando a construção do Kremlin, a fortaleza que até hoje abriga o governo russo. Não foi à toa que ele ficou conhecido pela alcunha de Ivã, o Grande.

Com a conquista de Constantinopla (Bizâncio) pelos turcos, em 1453, Moscou se proclamou centro da cristandade e herdeira do Império Romano do Ocidente (Bizantino). "Moscou, a terceira Roma!", ouvia-se agora no Kremlin. Ivã III também inaugurou a prática de deportações em massa, que seriam usadas pela União Soviética. Sua crueldade seria mantida por seu filho Vassily III e passaria dos limites com seu neto Ivã IV - chamado também de "o Terrível."

"Ivã IV integra o grupo de superlíderes russos ao lado de Pedro, o Grande, Catarina, a Grande, Lênin e Stálin", diz Hingley. "Todos aplicaram o terror em defesa de si e do regime. Mas enquanto Pedro, Catarina e Lênin se limitaram a objetivos políticos, Ivã IV e Stálin praticaram uma matança extravagante que desafia qualquer compreensão."

Ivan IV, o Terrível

O terrível rebento tinha só 3 anos ao ser escolhido czar, e por isso sua mãe assumiu o trono. Com a morte dela (supostamente envenenada), o país virou palco de lutas entre os boiardos, nobres proprietários de terras. Eles supervisionaram a criação de Ivã, maltratando-o a ponto de fazê-lo passar fome, o que não explica completamente a brutalidade do futuro príncipe. Para muitos pesquisadores, ele sofria surtos de paranoia.

Certo é que Ivã IV se casou com a princesa Anastácia em 1547, ano em que foi coroado oficialmente com o título de "Czar de Toda a Rússia" e ficou conhecido como "o primeiro czar". Seu reinado começou bem: ele derrotou os tártaros e expandiu seus domínios no leste até o mar Cáspio e a Sibéria, transformando Moscóvia num estado multiétnico. Após matar boa parte dos boiardos, vingando os maus-tratos que sofrera na infância, ele deu espaço político a pessoas comuns, como artesãos, professores e profissionais liberais, ao criar o Zemsky Sobor (Assembleia da Nação), que também reunia membros do clero e da nobreza. Mas a morte de Anastácia, também supostamente envenenada, em 1560, provocou um piripaque na cabeça do monarca. Ele prendeu seus conselheiros e abriu fogo contra o povo. O terror ficou a cargo da Oprichnina, um esquadrão de cavaleiros vestidos de preto e com carta-branca para matar quem quisessem. Ao contrário dos outros czares, Ivã IV presenciava as execuções e maquinava formas de morte. Em 1570, uma plateia em Moscou viu como ele e seus homens desmembravam e ferviam vítimas suspeitas de traição.

Ivã IV casou com outras seis mulheres sem se firmar com nenhuma, e ainda se meteu numa guerra suicida contra suecos, poloneses e lituanos. Queria obter acesso ao mar Báltico, mas acabou derrotado. Tanto deslize favoreceu outra invasão de Moscou pelos tártaros. Desavenças na família também causaram uma tragédia pessoal: num de seus ataques de fúria, o czar golpeou seu filho Ivã Ivanovich na cabeça com uma bengala de ferro, matando-o. Amargaria essa dor por toda a vida. O maior mistério em torno de Ivã IV foi sua enorme popularidade. Embora tenha matado mais camponeses que boiardos, ele seria lembrado na URSS como caçador de nobres. Não é à toa que Stálin gostava de comparar a Oprichnina com a polícia secreta soviética, a NKVD (depois KGB).

A era Romanov

Passado o furacão Ivã, os boiardos voltaram a brigar pelo poder, provocando uma época de devastação e pilhagens conhecida como "Tempo dos Problemas". A dureza só terminou em 1613, quando a Assembleia da Nação escolheu o novo czar: Mikhail Romanov - o primeiro de uma dinastia que duraria 300 anos.

Nenhuma dinastia dura tanto tempo sem intrigas. Foi assim com Pedro I e sua irmã Sofia. Como ele tinha só 9 anos ao ser coroado, em 1682, ela virou regente. Aos 17, Pedro viu que a irmã queria tirá-lo da jogada e, com o apoio da nobreza, confinou-a num convento. Assumiu com um grande objetivo: transformar a Rússia num Estado europeu moderno.

Assim, Pedro I organizou o Exército e a Marinha, estabeleceu relações com outros países e traduziu livros para o russo. Também derrotou os suecos em 1709 na batalha de Poltova. Ela marcou a conquista da supremacia russa no nordeste da Europa e a entrada do país no clube das grandes potências. Mais: Pedro I conquistou parte da Estônia e chegou à sonhada costa do Báltico - no extremo mais próximo ao restante da Europa. Lá fundou São Petersburgo e fez dela a capital da Rússia, deixando claro que o reino de Moscóvia era coisa do passado. Assim levava adiante seu projeto de aproximação da cultura europeia, que se refletiu na arquitetura da cidade. Ele acreditava que a formação da Rússia moderna deveria se guiar no modelo das nações europeias, o que causou uma grande cisão cultural no país. De um lado estavam os "ocidentalistas", que apoiavam Pedro; de outro, os "eslavófilos", que rejeitavam as reformas liberais e queriam resgatar o passado idílico, rural e autóctone russo. Além disso, a mudança da capital para São Petersburgo mergulhou a aristocracia em excessos palacianos nos moldes de Versalhes. Tudo isso contribuiu para o enfraquecimento da corte na Revolução de 1917.


Pedro, o Grande

Ao botar uma pá de cal em Moscóvia, Pedro proclamou o Império Russo e assim ganhou três títulos: imperador de toda a Rússia, grande pai da terra e Pedro, o Grande. Por trás de toda essa pompa, estava o aparato brutal de sua guarda militar, a Preobrazhensky. "A longa história da Rússia como uma burocracia terrorista começou de fato com o imperador", diz Hingley.

Ao contrário de Ivã IV, Pedro I era frio, racional. Foi assim que lidou com o rebelde mais famoso do reino: seu filho Alexis, que não aguentou as cobranças do pai e fugiu da Rússia, mas foi caçado. "Seu pai o matou a sangue-frio, ao contrário do surto que levou Ivã a matar o filho dele", afirma Hingley.

No fim das contas, o grande "modernizador" não se importou com os camponeses. Ao contrário: manteve-os na servidão, como meros objetos pertencentes ao Estado e aos nobres. Enquanto a elite russa se parecia cada vez mais com a europeia, a massa ainda vivia na Idade Média.

Catarina, a Grande

Frederica Sofia era uma princesinha sem grandes chances de subir na vida. Seu pai era um dos tantos nobres decadentes da Prússia do século 18. Mas, aos 15 anos, a czarina Isabel a convidou para conhecer seu sobrinho, o príncipe herdeiro Pedro III, neto de Pedro, o Grande. Isabel achava que ela seria mais dócil que uma nobre de alta linhagem para se casar com o futuro czar. Ledo engano!

Para realizar a boda, Sofia se converteu à fé ortodoxa e passou a se chamar Catarina. Mas o casamento logo azedou. Além de obcecado pela disciplina prussiana, Pedro era imaturo e impotente. Ou estéril, como diziam os fofoqueiros da corte. Seja como for, os dois não se bicavam - e ela decidiu disputar o trono sozinha. "Catarina sabia que só seria aceita se parecesse russa. Passava noites aprendendo o novo idioma", diz Henri Troyat na biografia Catarina, a Grande.


Catarina, a Grande

Quando Pedro III assumiu o trono, Catarina sentiu o perigo: o marido a deixaria para se casar com outra. Mandou então seu amante Grigori Orlov, membro da guarda imperial, dar cabo do czar. O clero e a nobreza apoiaram o golpe e aclamaram a nova imperadora: Catarina II. Ela estabilizou o reino e conquistou prestígio entre os europeus. Também abocanhou terras da Turquia, coisa que nem Pedro, o Grande, havia feito.

Mas ai de quem criticasse seu governo. O escritor Alexandre Radishchev foi exilado na Sibéria. Já Yemelyan Pugachov, líder de uma rebelião dos cossacos, terminou esquartejado. E, quanto mais poderosa Catarina ficava, mais amantes ela tinha (leia quadro na pág. 30). "Em 1796, seu filho Paulo I a sucedeu disposto a reverter tudo o que a mãe havia feito. Os dois se odiavam", diz Troyat. De fato, Paulo anistiou Radishchev, prestou homenagens ao pai (Pedro III) e baixou regras prussianas. Por exemplo, proibiu o uso de chapéus redondos e ternos à francesa. Até hoje ninguém sabe quem mandou matá-lo, ou quem foi seu pai biológico. Só se sabe que seu filho Alexandre I, o neto querido e protegido da czarina Catarina, não perseguiu seus assassinos ao assumir o trono.

Gigante de papel

A Rússia entrou no século 19 cheia de contradições. Seus canhões causavam medo, mas seus 14 milhões de habitantes continuavam na miséria. Somariam 60 milhões em 1835, graças à anexação de terras - 95% deles viviam no campo. Era preciso modernizar o país, mas isso ameaçava o poder dos czares. Como dar liberdade ao povo sem perder o controle da nação?

Esses foram os dilemas de Alexandre I, o czar que botou para correr as tropas do general francês Napoleão Bonaparte e desfilou triunfante em Paris. A vitória aumentou a autoestima russa, mas colocou as tropas em contato com as ideias da Revolução Francesa. Os oficiais voltaram para casa querendo um sistema constitucional. E os soldados, emancipação. Alexandre I até falou em reformas liberais, mas era tudo fachada. Sua maior preocupação foi consolidar a Rússia como peça-chave do Congresso de Viena - o pacto celebrado pelas potências europeias em 1815 para restaurar a monarquia após a derrota de Napoleão. Ao lado da Prússia e da Áustria, ele fundou a Santa Aliança para reprimir as revoluções no continente em nome da fé cristã.

A tarefa continuou com seu irmão Nicolau I, outro czar que sonhava transformar a Rússia em cão de guarda da Europa. Mas ficou só no sonho: várias revoluções surgiram em 1848 e puseram fim à Santa Aliança. Nicolau I foi derrotado por ingleses, franceses e turcos na Guerra da Crimeia - prova da fraqueza russa. Faltava tudo, de locomotivas a munição. E faltava acabar com a servidão. Foi o que fez Alexandre II, filho de Nicolau I. "Ele libertou mais escravos que o presidente americano Abraham Lincoln, e sem guerra civil no meio", diz Hingley. Mas as mudanças só jogaram mais água no caldeirão revolucionário. Os socialistas diziam que os libertos viraram escravos da burguesia. Alexandre II escapou de vários atentados até que, em 1881, foi dilacerado por uma granada caseira.

O fim

Não era fácil ser czar no século 20. Alexandre III sabia que não repetiria as façanhas de seus antepassados. Ele bem que tentou reviver a trilogia "autocracia, ortodoxia e nacionalismo", mas em vão. Pouca gente ainda aceitava que a vontade do czar era a vontade de Deus. E outra: insuflar o nacionalismo num império multiétnico, onde apenas 46% dos habitantes eram russos, apenas acionou uma bomba-relógio. Enquanto o movimento revolucionário crescia, os monarcas culpavam os judeus pela crise e matavam milhares nos pogroms, massacres em pequenos vilarejos de israelitas. Entre 1880 e 1920, cerca de 2 milhões de judeus russos emigraram para as Américas fugindo dessas perseguições.


Império Russo - 1912

A hora da implosão estava perto. Em 1904, a Rússia cambaleou numa guerra contra o Japão. Em 1905, centenas de manifestantes morreram ao exigir liberdade em São Petersburgo - num dia lembrado como Domingo Sangrento. Em 1917 não teve jeito: Nicolau II abdicou. Foi fuzilado por ordem de Vladimir Lênin, líder dos bolcheviques. Era a vez deles de derramar sangue. A URSS impôs uma nova ideologia, mas manteve a velha lógica: quanto mais inocentes matasse, menores as deserções e maior a certeza de que todos marchariam rumo à vitória final. Durou 70 anos. Hoje, especialistas veem ares de czar no ex-KGB, ex-presidente e atual primeiro-ministro russo Vladimir Putin. "A Rússia abraçou outra vez o czarismo por várias razões. O país tem longa tradição de um poder indivisível e quase sagrado. A democracia é um conceito negativo no imaginário popular, sinônimo de um pode-tudo onde só os ladrões prosperam. Além disso, a maioria das pessoas associa estabilidade com um líder forte", diz Dmitri Trenin, ex-oficial do Exército russo e diretor do Centro Carnegie de Moscou.

O Kremlin exerce controle cada vez maior sobre as TVs e o Parlamento, enquanto jornais estão sendo comprados por empresários amigos do governo. Coisas de czar...

Os amantes de Catarina

A czarina era ninfomaníaca e não podia viver nem uma hora sem amor

Ter amantes era uma prática comum na corte imperial russa. Mas Catarina II foi insuperável. Aos 23 anos, depois de oito sem dividir a cama com o marido, Pedro III, ela conheceu os prazeres da carne com o jovem Sergei Saltikov. "Ele era lindo como o dia", escreveu Catarina em suas memórias, dando a entender que o mancebo era o pai de seu filho, Paulo I. Saltikov se cansou da imperadora, mas muitos outros viriam. "Minha desgraça é que meu coração não pode se contentar nem uma hora se não tem amor", ela confessou em seu diário. Sorte de Estanislao Poniatowski, um virgem de 23 anos enviado pelo embaixador inglês. Foi o brinquedinho de Catarina, que passou a gastar fortunas com seus amantes. De todos, o mais poderoso foi o tenente Grigori Potiomkin. Ele influía nas decisões da czarina, e talvez tenha sido o único que ela amou. "Potiomkin vivia no palácio. Só precisava dar dois passos, subir uma escada e já estava no aposento real. Chegava desnudo por baixo da bata", diz o biógrafo russo Henri Troyat. Quando o sexo esfriou, Potiomkin passou a selecionar os novos "favoritos".

Ser "favorito", aliás, era uma profissão. O sujeito recebia salário, e quando deixava de agradar era indenizado com terras, rublos e escravos. "Em seguida, abandonava discretamente seus aposentos, enquanto Potiomkin escolhia o substituto", diz Troyat. "O novo candidato era examinado por um médico e depois submetido a uma prova íntima com uma condessa, que passava um relatório a Catarina. Só então ela tomava a decisão."

Revolta dezembrista

Mal-entendido provocou levante popular com consequências trágicas

O império russo viveu uma bela trapalhada em 1825, e tudo por causa de um mal-entendido. Naquele ano, o czar Alexandre I morreu sem deixar herdeiro direto. Quem devia então assumir o trono era seu irmão Constantino I, vice-rei da Polônia. Mas Constantino não queria saber de ser rei. Havia firmado um manifesto no qual transferia esse direito ao irmão mais novo, o belicoso Nicolau I. O problema é que ninguém sabia do documento, cujas cópias ficaram mantidas em segredo no Senado e no Santo Sínodo (cúpula ortodoxa). "Nicolau ignorava o manifesto e jurou fidelidade a Constantino. Só uma renúncia oficial do irmão poderia fazê-lo assumir", diz o biógrafo russo Henri Troyat. Assim, enquanto Constantino demorava para se pronunciar, Nicolau ficava sem ação, sabendo que era mais impopular que o irmão. Quando Nicolau finalmente assumiu, as tropas do Exército já tinham jurado lealdade a Constantino.

Foi no meio dessa sinuca que eclodiu uma revolta em São Petersburgo. Os líderes eram oficiais que queriam instaurar uma monarquia constitucional nos moldes europeus, e achavam que era seu dever defender Constantino contra o irmão. Em 14 de dezembro, milhares de revoltosos se uniram ao levante e invadiram a praça do Senado. Com armas na mão e vodca na cabeça, eles gritavam a favor de Constantino e da Constituição. "Alguns achavam que a Constituição era mulher de Constantino", afirma Troyat. Mal liderados, os rebeldes não avançaram para tomar o poder. Tampouco obedeceram as ordens de Nicolau de cair fora da praça. O czar ordenou que se abrisse fogo contra a multidão, resultando em dezenas de mortos (talvez mais), 3 mil presos, cinco enforcamentos e centenas de exilados na Sibéria. Tudo por culpa de um mal-entendido.

Ovos Fabergé

Joia personalizada era ofertada na Páscoa no lugar do ovo tradicional

Entre os objetos que simbolizam a opulência dos czares russos, nenhum é tão rico em detalhes e surpresas quanto os ovos de Fabergé. Fabricados pelo ourives que deu nome às peças, eram verdadeiras joias em formato ovalado. A história começa quando o czar Alexandre III quis surpreender sua esposa, a czarina Maria Feodorovna, na Páscoa de 1885. Um dos rituais dos seguidores da Igreja Ortodoxa era trocar ovos na celebração da reencarnação de Cristo, como se faz em todo o mundo católico, nos dias de hoje. Mas antigamente os ovos eram de galinha mesmo, e não de chocolate. O detalhe era adorná-los com pinturas. Quando o czar encomendou um ovo de ouro, a Páscoa da dinastia Romanov nunca mais foi a mesma. A cada ano, Fabergé fabricava um ovo mais caprichado, elaborado com esmalte, metais e pedras preciosas. Os ovos sempre continham surpresas em seu interior, que às vezes recontavam episódios da história russa e conquistas do exército ou reproduziam grandes obras arquitônicas. Em 2007, um exemplar foi leiloado por 18,7 milhões de dólares.

Saiba mais

LIVROS

Russia, a Concise History, Ronald Hingley, Thames and Hudson, 1972

O professor de Oxford relaciona o czarismo com outros períodos da história russa.

Catalina, la Grande, Henri Troyat, Ediciones B, 2005

Biografia com detalhes sobre a vida pública e privada da imperadora.

Nicolás II, Dominic Lieven, El Ateneo, 2006

Um livro sobre o último czar que acaba sendo uma bela análise de toda a era czarista.