quarta-feira, 20 de novembro de 2013

[POL] Alemães prontos para ver Hitler como humano

Globalpost, 07/12/2010




Quando Suástica foi apresentado no festival de Cannes em 1973, brigas eclodiram na sala de projeção e alguém lançou uma cadeira contra a tela.

“Foi um pandemônio,” disse Philippe Mora, o diretor francês radicado em Los Angeles. “As pessoas gritavam e jogavam coisas. Eventualmente, eles interromperam o filme e um cara saiu da multidão e disse, ‘Senhoras e senhores, isto é o festival de Cannes e não um salão de cervejaria.’”

A razão pela reação furiosa foi que o documentário de Mora parecia humanizar Adolf Hitler. Usando vídeos domésticos inéditos do líder nazista descansando em seu retiro alpino em Obersalzberg, filmados em sua maior parte pela namorada de Hitler, Eva Braun, Suástica destruía a imagem aceita de Hitler como um monstro.

As platéias puderam ver a personificação do Mal brincando com seu cachorro, paparicando crianças e discutindo o filme “E o Vento Levou”. Elas não gostaram e o filme foi proibido na Alemanha.

Mês passado, Suástica foi exibido na Universidade Humboldt de Berlim para uma platéia nova e mais jovem, que estava entre os primeiros alemães a ver o filme. Não somente não atiraram coisas como se sentiram confortáveis o suficiente para rir sarcasticamente nos momentos irônicos e fizeram perguntas educadas durante a sessão de esclarecimento de dúvidas.

Foi um exemplo, Mora notou mais tarde, como a visão da Alemanha de sua própria história nazista está constantemente evoluindo e que perguntas-chaves – incluindo por que tantos alemães comuns apoiaram o regime que perpetrou o Holocausto – ainda estão para serem respondidas.

Até os anos 1980, alemães ocidentais raramente discutiam a era nazista, disse Simone Erpel, co-curadora de uma nova exibição, “Hitler e os Alemães”, parte do mesmo esforço para reexaminar a era nazista junto com a exibição de Suástica. A idéia de Hitler como personagem cinematográfico era um tabu até o final dos anos 1990. Filmes controversos como “A Queda” (2004), que retratava Hitler humanamente e mesmo em algumas vezes de forma simpática, ou “Mein Führer” (2007), que foi uma comédia madura, derrubaram o tabu.

“O filme de Philippe foi feito muito cedo,” diz Erpel após a exibição na Universidade Humboldt, na qual ela participou da sessão de perguntas e respostas. “Muita coisa mudou desde o começo dos anos 1970.”

Sua exibição atual no Museu Histórico Alemão, que mostra como os alemães comuns contribuíram entusiasticamente para a máquina de propaganda nazista, teria encontrado o mesmo destino se tivesse sido realizada em 1973, diz ela.

“Os alemães não estavam preparados para aqueles fatos 30 anos atrás,” diz ela. “Eles criaram lendas que diferenciam o povo alemão dos nazistas. As pessoas diriam, “Meu avô não era nazista e ele não foi um assassino.”

O ultraje que Suástica originalmente recebeu foi mais constrangedor em virtude do enorme trabalho que Mora teve para revelar os vídeos caseiros de Hitler. Era material para um romance de espionagem internacional.

Ele tornou-se um diretor celebrado de filmes como Mad Dog Morgan, com Dennis Hopper, O Retorno do Capitão Invencível, com Alan Arkin, e o filme de ficção científica Communion, com Christopher Walken, sem mencionar os filmes de terror B, The Howling, partes I e II.

Mas quando começou Suástica, Mora era apenas um cineasta de 23 anos explorando a história nazista. Seu próprio pai, que nasceu em Leipzig, foi expulso da Universidade de Humboldt nos anos 1930 porque ele era judeu.

Mora planejou originalmente uma biografia de Albert Speer, o arquiteto nazista e confidente de Hitler que escapou da sentença de morte. Ele passou um dia na casa de Speer em Heidelberg, durante o qual Speer apresentou seus próprios vídeos caseiros dos anos 1930. Em um filme, Eva Braun podia ser vista segurando sua própria câmera no retiro de Oberzalsberg, Berghof.

“Perguntei a Speer, ‘O que aconteceu aos filmes da câmera de Eva Braun?’ Ele disse, “Eles não existem.’ Mas ele estava mentindo.”

Poucas semanas depois, Mora disse, seu parceiro criativo alemão, Lutz Becker, estava numa festa e encontrou um soldado americano que esteve entre os primeiros a pisar em Berghof no final da guerra. Ele perguntou ao soldado se ele havia encontrado qualquer filme e o soldado disse, “Sim, pilhas deles.”        

Mora foi até o Pentágono, onde um funcionário disse que procuraria por eles. Ele realmente não esperava mais receber notícias do funcionário novamente, porém três meses depois, o funcionário o procurou. Eles haviam encontrado os filmes.

“Ficamos simplesmente boquiabertos,” disse Mora, em um almoço em Berlim no mês passado. “Aqui estava um filme incrível que estava escondido porque ninguém havia perguntado sobre ele.”

O produto é um filme estranho e inquietante sem narração e com somente um vago roteiro. Mesmo assim, ele funciona a um nível resumido. Em suas conversas banais com seus companheiros nazistas em Obersalzberg, Hitler se torna completamente humano.

No momento seguinte, o filme corta para o noticiário de Hitler como um semideus em frente à multidões extasiadas que, Mora afirma, poderiam ser “fãs histéricas em um show do Rolling Stones.”

Como plateia, vislumbramos desconfortavelmente como as pessoas entravam na euforia. O filme também tem seu humor negro. Ele termina com algumas imagens chocantes do Holocausto e encerra os créditos finais com a canção satírica de Noel Coward, “Não deixe de ser bestial com os alemães.”

Mora disse que ele nunca quis questionar a maldade de Hitler ou suavizar o período mais sombrio da história alemã, mas ao invés disso fazer os espectadores pensarem de modo diferente.

“O filme foi feito sob a premissa que todo mundo sabia que Hitler era um monstro e um assassino. Não esperava que fosse ser motivo de debate,” ele disse. “Mas ele foi um homem com uma mãe e um pai e irmãs e um cachorro de estimação. E isto perturba as pessoas.”

“Se pensarmos em Hitler como um ser extraterrestre ou um demônio sobrenatural, não perceberemos a vinda do próximo. Mas provavelmente haverá outro.”

Jens Koethner Kaul, 46 anos, um produtor cinematográfico que esteve na exibição na Humboldt, acha que Suástica deveria fazer parte do currículo do ensino médio na Alemanha.

“Crescer na Alemanha significa aprender os fatos dos nazistas e do Holocausto,” ele disse. “Mas o entendimento emocional estava faltando. Havia claramente algo de sedutor ou pelo menos tentador em relação a esses caras que fazia com que as pessoas os seguissem. Você vê isso no filme de Philippe.”

À medida que a Alemanha vai aceitando seu passado, as controvérsias continuarão a crescer. Talvez a fronteira final seja o humor – e de acordo com Simone Erpel, isto está no planejamento dos cineastas mais jovens.

“Visões satíricas e irônicas são um modo de lidar com o passado,” ela disse. “Rir de algo sério é importante. É assim que o humor trabalha. Isto acontecerá nos próximos dez anos.”


 
Trechos de Suástica:




 
A Televisão sob o Nazismo:

Um comentário:

Anthero Crespo Valim disse...

Este psicopota só vai ser humano o dia que for empalado e gemer de dor.................a europa em crise é natural que as pessoas busquem tábuas de salvação, e os grupos de direita se aproveitam disto.........mas jamais este senhor será humano