terça-feira, 7 de agosto de 2012

O Judeu Favorito de Hitler

Meu Paciente, Hitler

Lembranças do Médico Judeu de Hitler

Dr. Eduard Bloch


"Meu paciente, Hitler" pelo Dr. Eduard Bloch "como relatado a J. D. Ratcliff," apareceu originalmente em duas partes no semanário Collier nas edições de 15 e 22 de março de 1941. Naqueles dias pré-televisão, a revista Collier era um dos mais influentes e lidos periódicos dos Estados Unidos. Lembrado por historiadores sérios como uma fonte histórica primária importante sobre a juventude de Hitler, este ensaio é citado, por exemplo, na bibliografia e notas de referência da biografia aclamada de John Toland, Adolf Hitler (Francisco Alves, 2 vol., 1978). É também citada como fonte no estudo de Robert Payne, A Vida e Morte de Adolf Hitler (Praeger, 1973) e na Enciclopédia do Terceiro Reich de Louis Snyder (McGraw Hill, 1976). Mesmo descrevendo francamente o impacto devastador das medidas antisemitas de Hitler em sua própria vida e carreira, o Dr. Bloch também escreve sobre o adolescente Hitler com uma honestidade e sensibilidade que seria quase impensável em uma revista americana de grande circulação hoje. O texto completo do ensaio de duas partes original, incluindo os subtítulos, é reimpresso aqui, com somente comentários adicionais pequenos entre parênteses.

O Editor


Parte I

Estávamos há três dias em direção de Lisboa seguindo a oeste para Nova York. A tempestade no sábado foi ruim, mas no domingo o mar havia se acalmado. Um pouco antes das onze horas da noite nosso navio, a pequena embarcação espanhola Marques de Comillas, obteve ordens para parar. Os oficiais de controle britânicos à borda de um navio queriam examinar os passageiros. A ordem foi que todos ficassem alinhados no salão principal.

Quatro oficiais britânicos, vestindo coletes salva-vidas, entraram. Sem nenhuma palavra eles percorreram a linha, verificando os passaportes. Havia uma certa tensão no ar. Muitos daqueles que estavam à bordo estavam fugindo; eles achavam que haviam conseguido escapar da Europa uma vez que a âncora foi içada em Lisboa. Agora? Ninguém estava certo. Talvez alguns de nós fossem retirados do navio.

Finalmente chegou minha vez. O oficial em comando pegou meu passaporte, deu uma olhada e levantou a cabeça, sorrindo. "Você foi médico de Hitler, não foi?" ele perguntou. Isto era correto. Também teria sido correto para ele acrescentar que sou judeu.

Conheci Adolf Hitler na infância e adolescência. Tratei-o muitas vezes e era intimamente familiar com a vizinhança humilde na qual ele cresceu até atingir a maturidade. Cuidei, em sua agonia final, a pessoa mais próxima e querida para ele - sua mãe.

A maioria dos biógrafos - tanto simpáticos quanto críticos - têm evitado a juventude de Adolf Hitler. Os críticos têm feito disso uma necessidade. Eles poderiam se deter somente nos fatos mais desagradáveis. As biografias oficiais do partido têm passado batido por este período em virtude do desejo do ditador. Por que toda esta sensibilidade anormal em torno de sua juventude? Não sei. Não há nenhum episódio escandaloso o qual Hitler desejaria esconder, a menos que alguém queira voltar a cerca de 100 anos durante o nascimento de seu pai. Alguns biógrafos dizem que Alois Hitler era um bastardo. Não posso falar com certeza sobre este fato.

E sobre aqueles anos iniciais em Linz, Áustria, onde Hitler passou seus anos de formação? Que tipo de garoto era ele? Que tipo de vida ele levava? São sobre estas coisas que falarei aqui agora.

Quando Adolf Hitler tinha Treze Anos

Primeiro, tenho que me apresentar. Nasci em Fraeunburg, uma pequena vila na Boêmia austral que, no curso da minha vida, esteve sob três bandeiras: austríaca, tcheca e alemã. Tenho 69 anos. Estudei medicina em Praga, então me alistei no exército austríaco como médico militar. Em 1899, fui transferido para Linz, capital da Áustria Alta, e a terceira maior cidade no país. Quando completei meu tempo no exército em 1901, decidi permanecer em Linz e praticar medicina.

Como centro urbano, Linz sempre foi sossegada e reservada assim como Viena era alegre e barulhenta. No período do qual estou falando - quando Hitler era um menino de 13 anos - Linz era uma cidade com 80.000 habitantes. Meu consultório e lar eram na mesma casa, uma construção barroca na Landstrasse, a principal rua da cidade.

A família Hitler se mudou para Linz em 1903, pois, acredito, havia boas escolas lá. A estrutura familiar é bem conhecida. Alois Schicklgruber Hitler era filho de uma garota camponesa pobre. Quando ele atingiu idade suficiente para trabalhar, ele conseguiu um emprego como aprendiz de sapateiro, trabalhou no serviço público e tornou-se um inspetor de alfândega em Braunau, uma pequena cidade fronteiriça entre a Bavária e a Áustria. Braunau está a 85 km de Linz. Aos 56 anos, Alois Hitler tornou-se candidato à pensão e aposentou-se. Orgulhoso de seu próprio sucesso, ele estava ansioso para seu filho entrar no serviço público. O jovem Hitler violentamente se opôs à idéia. Ele queria ser artista. Pai e filho brigaram por causa disso enquanto sua mãe, Klara Hitler, tentou manter a paz em casa.

Alois S. Hitler

Enquanto viveu, Alois Hitler tentou moldar o destino de seu filho segundo seus próprios desejos. Seu filho teria a educação que lhe teria sido negada; uma educação que lhe asseguraria um bom emprego no governo. Assim, pai Alois preparou-se para deixar o vilarejo de Braunau e ir para a cidade de Linz. Por causa de seu emprego público, ele não precisava pagar a mensalidade de seu filho na Realschule. Com tudo isto em mente, ele comprou um sítio em Leonding, um subúrbio de Linz.

A família era muito grande. Mais tarde, Adolf ultrapassou tanto os outros que eles são, na melhor das hipóteses, esquecidos. Havia o meio-irmão Alois, que eu nunca encontrei. Ele abandonou o lar muito cedo, conseguiu um emprego como garçom em Londres e mais tarde abriu seu próprio restaurante em Berlim. Ele nunca foi amigo de seu irmão mais novo.

Adolf Hitler recém-nascido

Então havia a Paula, a mais velha das meninas. Ela (na verdade Angela) mais tarde casou o Senhor Rubal (Raubal), um funcionário da Receita em Linz. Mais tarde, após a morte de seu marido (?) e a asensão de seu irmão ao poder, ela foi para Berchtesgaden para tornar-se governanta da casa de Hitler. A irmã Klara por algum tempo administrou um restaurante para estudantes judeus na Universidade de Viena; e a irmã Angela, a mais nova das garotas, (mais tarde) se casou com um professor Hamitsch (Hammitzsch) em Dresden, onde ela ainda vive.

Um Trabalho para a Senhora Hitler

A família mal havia se estabelecido em sua nova casa nos arredores de Linz quando Alois, o pai, morreu repentinamente de um ataque apopléctico (N.do T.: vulgo AVC) (em janeiro de 1903).

Na época, Frau Hitler estava com quarenta e poucos anos. Ela era uma mulher simples e educada. Ela era alta, tinha cabelo castanho, o qual ela mantinha esmeradamente plissado, e uma face longa e oval com olhos azuis-escuros lindamente expressivos. Ela estava desesperadamente preocupada sobre suas responsabilidades após a morte de seu marido. Alois, 23 anos mais velho, sempre cuidou da família. Agora, o trabalho era dela.

Era aparentemente claro que o filho Adolf era muito jovem (não havia completado 14 anos) e também muito frágil para se tornar um fazendeiro. Então, a melhor opção parecia ser vender o sítio e alugar um pequeno apartamento. Isto, ela fez, logo após a morte de seu marido. Com os rendimentos desta venda e a pequena pensão que ela ganhou por causa do emprego público de seu marido, ela conseguiu manter a família unida.

Em uma pequena na Áustria, a pobreza não resulta nas indignidades que ocorrem na cidade grande. Não há favelas e sobrepopulação. Não sei exatamente a renda da família Hitler, mas estando familiarizado com o valor das pensões governamentais, estimo em U$25 por mês. Esta pequena soma permitia-lhes viver reservada e decentemente - pessoas desconhecidas em uma cidade fora de mão.

O Dr. Bloch, que era judeu, tratou Hitler na infância e adolescência, junto com sua mãe e outros membros da família. A foto acima é de 1938, tirada por ordem de Hitler.


O apartamento da família consistia de três pequenos quartos em um sobrado na Bluetenstrasse 9, que atravessa o Danúbio da principal parte de Linz. Suas janelas davam uma excelente visão das montanhas.

Minha impressão predominante do apartamento simples era sua limpeza. Ele brilhava; nem um grão de pó nas cadeiras ou mesas, nem uma porção de lama no chão lustrado, nem uma mancha nas cortinas das janelas. Frau Hitler era uma dona de casa extraordinária.

Os Hitler tinham poucos amigos. Um estava acima dos outros; a viúva do carteiro que vivia no mesmo sobrado.

O orçamento limitado permitia nem mesmo a menor extravagância. ZTínhamos a usual ópera municipal em Linz; nem boa, nem má. Aqueles que escutavam as melhores iam para Viena. Assentos no salão de nosso teatro, o Schauspielhaus, vendidos de 10 a 15 centavos de dólar. Mesmo assim, ocupar um desses assentos para escutar uma trupe indiferente cantando Lohengrin era uma ocasião memorável que Hitler registrou no Mein Kampf!

A maior parte da diversão do garoto era limitada àquelas coisas que eram de graça: caminhadas nas montanhas, um banho no Danúbio, um concerto gratuito de banda. Ele lia extensivamente, e era particularmente fascinado pelas estórias sobre os índios americanos. Ele devorava livros de James Fenimore Cooper, e do escritor alemão Karl May - que nunca visitou a América e jamais viu um índio.

A dieta da família era, por necessidade, simples e austera. Comida era barata e em grande quantidade em Linz; e a família Hitler tinha quase a mesma dieta das outras pessoas vivendo em circunstâncias semelhantes. Carne seria servida talvez duas vezes por semana. A maioria das refeições consistia de sopa de batata ou repolho, pão, bolo e uma torta de pera e cidra de maçã.

Na vestimenta, eles usavam roupas de lã bruta que chamamos de Loden. Adolf, é claro, vestia o uniforme de todos os meninos: calções, suspensórios, um pequeno chapéu verde com uma pena na fita.

Um Amor Materno Extraordinário

Que tipo de menino era Adolf Hitler? Muitos biógrafos o descrevem como um agitador, desafiador, desarrumado; como um jovem grosseiro que personificava tudo o que é desagradável. Isto simplesmente não é verdade. Enquanto jovem, ele era quieto, educado e sobriamente vestido.

Ele registra que aos quinze anos ele se via como um revolucionário político. Possivelmente. Mas deixe-nos ver Adolf Hitler como ele impressionava as pessoas ao seu redor, não como ele impressionava a si próprio.

Ele era alto, pálido, velho para sua idade. Ele não era nem robusto nem doente. Talvez "aparência frágil" seria uma descrição mais apropriada. Seus olhos - idênticos ao de sua mãe - eram grandes, melancólicos e profundos. Sem exagerar, este menino vivia dentro de si. Quais sonhos ele sonhava eu não sei. Exteriormente, seu amor por sua mãe era sua qualidade mais aparente. Mesmo assim, ele não era um "menino da mamãe" no senso comum, nunca presenciei uma ligação mais íntima. Alguns insistem que este amor tendia a ser patológico. Como íntimo da família, não acredito que isso seja verdade.

Klara Poltz Hitler

Klara Hitler adorava seu filho, o caçula da família. Ela permitia-lhe seguir ser ele mesmo em todo lugar possível. Seu pai insistia que ele deveria tornar-se um funcionário público. Ele se rebelou e conquistou sua mãe ao seu lado. Ele logo cansou da escola, então sua mãe permitiu que ele abandonasse os estudos.

Todos os amigos da família sabem como Frau Hitler encorajou seus esforços em tornar-se um artista; a qual custo ninguém pode imaginar. Apesar de sua pobreza, ela permitiu-lhe rejeitar um emprego que lhe foi oferecido na agência de correio, de modo que ele pudesse continuar suas pinturas. Ela adorava suas aquarelas e seus desenhos paisagísticos. Se isto era uma admiração honesta ou simplesmente um esforço para encorajar seu talento eu não sei.

Ela fez o melhor para dar um bom crescimento ao menino. Ela percebeu que ele era puro, limpo e tão bem alimentado quanto sua renda permitia. Toda hora que ele ia ao meu consultório, este menino estranho sentar-se-ia entre os outros pacientes e aguardaria sua vez.

Nunca houve qualquer coisa seriamente errada. Possivelmente sua amígdalas estariam inflamadas. Ele permaneceu parado obediente e firme enquanto eu pressionava sua língua e lavava as manchas com problemas. Ou, possivelmente, ele estaria sofrendo por uma gripe. Eu o trataria e o enviaria de volta para casa. Como qualquer garoto polido de quatorze ou quinze anos ele me saudaria e agradeceria com cortesia.

Eu, é claro, sei da úlcera que o incomodaria mais tarde na vida, grandemente resultado de sua péssima dieta enquanto trabalhava em Viena. Não consigo entender as as muitas referências ao seu problema pulmonar na juventude. Eu fui o único médico a trata-lo durante este período no qual ele supostamente sofria disso. Meus registros não mostram nada deste tipo. Para estar certo, ele não tinha as bochechas rosadas e nem uma saúde forte como a de muitos jovens; mas ele também não era doente.

Na Realschule, o trabalho do jovem Adolf era tudo menos brilhante. Com autoridade nisto, tenho a palavra de seu antigo professor, o Dr. Karl Huemer, um velho amigo meu. Eu era o médico de Frau Huemer. No Mein Kampf, Hitler registra que ele era um estudante relapso na maioria dos assuntos, mas ele amava história. Isto concorda com as lembranças do professor Huemer.

Desejando adicional treinamento em pintura, Hitler decidiu ir a Viena para estudar na Academia. Isto foi um momento decisivo para um membro de uma família pobre. Sua mãe preocupou-se como ele se viraria. Entendo que ela mesmo sugeriu apertar o orçamento familiar para permitir-lhe enviar-lhe uma pequena quantia de dinheiro. Mesmo assim, ele recusou. Ele mesmo foi além: ele assinou sua desistência à herança em favor de suas irmãs. Ele tinha dezoito anos na época.

Não estou certo dos detalhes exatos do que aconteceu em sua viagem a Viena. Alguns dizem que ele não foi admitido na Academia por causa de seu trabalho insatisfatório. Outros aceitam a declaração de Hitler de que sua rejeição doi devido à sua falha em graduar-se na Realschule - o equivalente de uma escola de nível médio americana. De qualquer forma, ele estava de volta em casa após umas poucas semanas. Foi mais tarde neste ano - 1908 (na verdade, 1907) - que coube a mim dar a Hitler o que talvez tenha sido a notícia mais triste de sua vida.

Um dia, Frau Hitler veio me visitar durante a manhã. Ela reclamava de uma dor no peito. Ela conversou com uma voz calma e baixa; quase como um suspiro. A dor, ela disse, era grande; suficiente para acorda-la durante a noite inteira. Ela estava ocupada cuidando do lar e havia recusado procurar auxílio médico. Além disso, ela achava que a dor iria passar um dia. Quando um médico ouve tal estória ele quase imediatamente pensa em câncer. Um exame mostrou que Frau Hitler tinha um enorme tumor no seio. Não contei-lhe o diagnóstico.

A Família Decide

Reuni as crianças em meu consultório no dia seguinte e relatei o caso de forma franca. Sua mãe, eu lhes disse, era uma mulher gravemente doente. Um tumor maligno é sério hoje em dia, mas há trinta anos atrás era ainda mais sério. As técnicas cirúrgicas não eram tão avançadas e o conhecimento do câncer não era tão grande.

Sem cirurgia, expliquei, não havia qualquer esperança de recuperação. Mesmo com ela, havia uma pequena chance de que ela sobrevivesse. Na reunião familiar, eles devem decidir o que deve ser feito.

A reação de Adolf Hitler a esta notícia foi tocante. Sua longa e pálida face estava contorcida. Lágrimas fluíram de seus olhos. Sua mãe, ele perguntou, não tinha nenhuma chance? Somente então eu percebi a magnitude da ligação que existia entre mãe e filho. Expliquei que ela tinha uma chance; mas era pequena. Mesmo esta esperança vazia deu-lhe algum conforto.

As crianças levaram a mensagem para sua mãe. Ela aceitou o veredito como eu estava certo que aceitaria - com coragem. Profundamente religiosa, ela aceitou seu destino como um desejo de Deus. Nunca lhe passou pela cabeça reclamar. Ela submeter-se-ia à cirurgia tão logo eu fizesse os preparativos.

Expliquei o caso para o Dr. Karl Urban, o chefe do staff cirúrgico no Hospital das Irmãs da Misericórdia em Linz. Urban era um dos melhores cirurgiões na Áustria Alta. Ele era - e é - um homem generoso, um crédito em sua profissão. Ele concordou sinceramente em assumir a operação em qualquer base que eu sugerisse. Após um exame, ele concordou com a minha crença que Frau Hitler tinha poucas chances de sobrevivência, mas aquela cirurgia era a única esperança.

É interessante notar o que aconteceu a esse homem generoso quase três décadas mais tarde - após o Anschluss (união) com a Alemanha. Por causa de suas convicções políticas, ele foi forçado a abandonar sua posição no hospital. Seu filho, que foi um dos pioneiros em cirurgia cerebral, também teve o mesmo destino.

Frau Hitler chegou ao hospital em uma manhã no início do verão de 1908 (1907). Eu não lembro a data exata, já que os registros do caso foram transferidos para os arquivos do partido nazista em Munique. De qualquer forma, Frau Hitler passou a noite no hospital e foi operada na manhã seguinte. À pedido desta alma gentil, permaneci ao lado da mesa de operação enquanto o Dr. Urban e seu assistente realizavam a cirurgia. Duas horas depois, dirigi minha carruagem através do Danúbio para a pequena casa na Bluetenstrasse 9, na parte da cidade conhecida como Urfahr. Lá, as crianças me aguardavam.

As garotas receberam a palavra que eu trouxe com calma e reserva. A face do menino estava mergulhada em lágrimas, e seus olhos cansados e vermelhos. Ele escutou até que eu terminei de falar. Mas ele tinha apenas uma pergunta. Em uma voz entrecortada ele perguntou: "Minha mãe sofreu?"

O Pior Momento de Hitler

À medida que as semanas e meses passaram após a operação, a força de Frau Hitler começou visivelmente a cair. No máximo, ela poderia ficar fora da cama por uma ou duas horas por dia. Durante este período, Adolf passou a maior parte deste tempo visitando a casa, para a qual sua mãe havia retornado.

Ele dormia num quarto contíguo ao de sua mãe, de modo que ele podia cuidar dela a qualquer hora durante a noite. Durante o dia, ele pairava em torno da cama larga na qual ela descansava. Na doença que Frau Hitler sofria, há geralmente muita dor. Ela carregou seu fardo bem; resoluta e sem reclamar. Mas para ser uma tortura para seu filho. Um semblante angustiado caía sobre ele quando ele via a dor aparecer no rosto de sua mãe. Havia pouco que poderia ser feito. Uma injeção de morfina de vez em quando daria alívio temporário; mas nada dura para sempre. Mesmo assim, Adolf parecia enormemente feliz mesmo por estes curtos períodos de alívio.

Jamais esquecerei Klara Hitler naqueles dias. Ela tinha 48 anos (47) na época; alta, magra e muito simpática, mesmo acabada pela doença. Ela falava calmamente, paciente; mais preocupada com o que acontecia com sua família do que com a aproximação da morte. Ela não escondeu essas preocupações; ou sobre o fato de que a maioria de seus pensamentos eram para seu filho. "Adolf é ainda muito jovem," ela dizia repetidamente.

No dia 20 de dezembro de 1908 (1907), fiz duas ligações. O fim estava se aproximando e queria que esta boa mulher se sentisse tão confortável quanto eu poderia fazer para ela. Eu não sabia se ela viveria outra semana, outro mês; ou se a morte viria numa questão de horas.

Então, a palavra que Angela Hitler me trouxe na manhã seguinte veio sem surpresa. Sua mãe havia morrido calmamente durante a noite. As crianças decidiram não incomodar-me, sabendo que sua mãe estava além da ajuda médica. Mas, ela perguntou, "você pode vir agora?" Alguém em uma posição oficial teria que assinar a certidão de óbito. Coloquei meu casaco e me dirigi com ela ao lar em sofrimento.

A viúva do carteiro, a amiga mais próxima da família, estava com as crianças, tendo mais ou menos assumido a responsabilidade das coisas. Adolf, sua face mostrando o cansaço de uma noite não dormida, sentou-se ao lado de sua mãe. Para preservar um último momento, ele a desenhou como ela se encontrava em seu leito de morte.

Sentei com a família por um instante, tentando acalmar seu sofrimento. Expliquei que neste caso a morte havia sido uma benção. Eles compreenderam.

Não fui ao funeral de Klara Hitler, que aconteceu na véspera de Natal. O corpo foi levado de Urfahr para Leonding, apenas uns poucos quilômetros distante. Klara Hitler foi enterrada ao lado de seu marido no cemitério católico, atrás da igreja pequena e amarela estuque. Após os outros - as garotas, a viúva do carteiro - deixarem o local, Adolf permaneceu lá; incapaz de se separar do túmulo recém ocupado.

E assim este jovem magro e empalidecido permaneceu sozinho no frio. Sozinho com seus pensamentos na véspera de Natal enquanto o resto do mundo estava alegre e exultante.

Poucos dias após o funeral, a família veio ao meu consultório. Eles desejavam agradecer-me pela ajuda que eu havia lhes dado. Lá estavam Paula, justa e forte; Angela, magra, bonita mas muito anêmica; Klara e Adolf. As garotas falaram o que sentiam enquanto Adolf permaneceu em silêncio. Lembro-me particularmente desta cena de modo tão vivido como se tivesse ocorrido na última semana.

Adolf vestiu um paletó preto e uma gravata mal amarrada. Então, como agora, uma franja de cabelo caiu sobre sua testa. Seus olhos estavam fixados no chão enquanto suas irmãs falavam. Então, chegou sua vez. Ele caminhou para frente e segurou em minha mão. Olhando nos meus olhos, ele disse "Serei eternamente grato ao senhor." Isto foi tudo. Então ele me saudou. Fico pensando se hoje ele lembra desta cena. Estou certo de que ele lembra, pois num certo sentido Adolf manteve sua promessa de gratidão. Favores foram-me garantidos que nenhum outro judeu na Alemanha ou Áustria conseguiu.


Parte II

Quase imediatamente após o funeral de sua mãe, Hitler foi embora para Viena, no sentido de mais uma vez iniciar uma carreira como artista. Seu crescimento para a maturidade foi uma experiência dolorosa já que ele era um garoto introvertido. Mas dias de angústia estavam para vir. Pobre como a família era, ele teve garantida comida e abrigo enquanto vivia em sua casa. Isto não pode ser dito nos dias de Viena. Hitler estava inteiramente envolvido com o objetivo de manter corpo e alma unidos.

Todos nós sabemos de sua vida lá - como ele trabalhou como servente de pedreiro em trabalhos de construção até que peões o ameaçaram empurrá-lo de um andaime. E sabemos que ele escavava neve e pegou vários outros trabalhos que podia encontrar (N. do T.: isto contrasta com a descrição de artista boêmio e vagabundo que William Shirer e outros fizeram a respeito de Hitler em Viena). Durante este período, por três anos na verdade, Hitler viveu em um albergue para homens, o equivalente a um pequeno hotel em qualquer cidade americana. Foi aqui que ele começou a sonhar com o mundo refeito segundo sua própria estética.

Enquanto viveu no albergue, cercado pela ralé da grande cidade, Hitler disse, "Tornei-me insatisfeito comigo mesmo pela primeira vez na vida." A insatisfação consigo mesmo foi seguida da insatisfação com tudo ao seu redor - e o desejo de mudar as coisas de acordo com o seu gosto.

A causticidade do ódio começou a tomar conta do seu corpo. As realidades repugnantes da vida que ele vivia encorajaram-no a odiar o governo, os sindicatos, as pessoas com as quais convivia. Mas ele ainda não tinha começado a odiar os judeus.

Durante este período, ele arrumou tempo para me enviar um cartão postal. No verso, havia a mensagem: "De Viena envio-lhe meus cumprimentos. O seu, sempre fiel, Adolf Hitler." Era uma pequena coisa, mesmo assim eu apreciei. Passei uma grande parte do tempo tratando a família de Hitler, e foi bom saber que este esforço de minha parte não havia sido esquecido.

Publicações oficiais nazistas também registram que eu recebi uma das aquarelas de Hitler - uma pequena paisagem. Se eu recebi, não me lembro. Mas é totalmente possível que ele tenha me enviado uma e que eu tenha esquecido o assunto. Na Áustria, pacientes frequentemente enviam pinturas ou outros presentes para seus médicos particulares como forma de gratidão. Mesmo agora tenho meia dúzia destes óleos e aquarelas que eu salvei; mas nenhum pintado por Hitler entre eles.

Eu preservei, contudo, uma peça do trabalho de arte de Hitler. Esta chegou durante o período em Viena quando ele estava pintando para cartões postais, posters, etc, ganhando dinheiro suficiente para manter-se. Este era uma época em sua vida em que Hitler era capaz de fazer sucesso com seu talento.






Aquarelas de Hitler


Ele pintava estes cartões postais e os secava em frente da lareira, dando a eles uma aparência agradável de antiguidade. Então os outros moradores do albergue os espalhariam pela cidade. Hoje na Alemanha uns poucos exemplares remanescentes destes trabalhos são altamente valorizados e vendidos mais caros do que trabalhos de Picasso, Gauguin e Cézanne!

Hitler enviou-me um destes cartões. Ele mostrava um frade capuchinho segurando uma taça de champagne borbulhante. Abaixo da figura estava a frase: "Prosit Neujahr" - Um brinde para o Ano Novo. No lado reverso, ele havia escrito a mensagem: "A família Hitler envia-lhe os melhores votos de um Feliz Ano Novo. Em gratidão eterna, Adolf Hitler."

Por que eu guardei estes cartões para serem salvos, eu não sei. Possivelmente foi por causa da impressão que me causaram por aquele garoto infeliz. Mesmo hoje, penso nele em termos de sua tristeza e não pelo que ele fez ao mundo.

Aqueles cartões postais têm uma história curiosa. Eles indicavam a extensão com a qual Hitler capturou a imaginação de algumas pessoas. um rico industrial vienense - eu não sei o seu nome pois o negócio foi feito por um intermediário - mais tarde fez uma oferta extraordinária. Ele queria comprar aqueles dois cartões e estava disposto a pagar 20.000 marcos por eles! Rejeitei a oferta na hora, pois não poderia eticamente realizar tal venda.

Há, ainda, outra estória envolvendo estes dois cartões. Dezessete dias após o colapso do governo Schuschnigg e da ocupação da Áustria pelas tropas alemãs (março de 1938), um agente da Gestapo veio até minha casa. Na época, estaca atendendo um paciente, mas minha esposa o recebeu.

Retidos por Segurança

"Estou informado," ele disse, "que vocês possuem algumas recordações do Führer. Gostaria de dar uma olhada nelas." Agindo discretamente, minha esposa não fez nenhum protesto. Ela não queria ter sua casa revirada como alguns lares judeus haviam sido invadidos. Ela encontrou os dois cartões e entregou-lhes. O agente rabiscou um recibo que estava escrito: "Certificado para Proteção de dois Cartões Postais (um deles pintado à mão por Adolf Hitler) confiscados na casa do Dr. Eduard Bloch." Ele foi assinado pelo agente, chamado Grömer, que era um desconhecido pra nós. Ele disse que eu deveria ir à sede da Gestapo na manhã seguinte.

Quase tão logo os nazistas entraram na cidade, a Gestapo se instalou em um pequeno hotel na Gesellenhausstrasse, formalmente patrocinado por clérigos viajantes. Fui até o local e recebido quase imediatamente. Fui cumprimentado gentilmente pelo Dr. Rasch, chefe do escritório local. Perguntei-lhe por que aqueles cartões foram apreendidos.

Aqueles eram dias agitados para a Gestapo. havia muitas coisas para serem investigadas em uma cidade de 120.000 pessoas. O fato desenrolou-se porque o Dr. Rasch não estava familiarizado com o meu caso. Ele me perguntou se eu estava sob suspeita por alguma atividade política desfavorável aos nazistas. Respondi que não estava; que era um profissional sem conexões políticas.

Aparentemente, como se não tivesse pensado nisso antes, ele me perguntou se eu não era ariano. Respondi sem receio: Sou 100% judeu." A mudança que ocorreu nele foi quase instantânea. Previamente, ele agia como se estivesse fazendo um negócio, porém de forma cortês. Agora, ele tornou-se distante.

Os cartões, ele disse, seriam retidos por segurança. Então ele me dispensou, nem erguendo a mão e nem cumprimentando como ele fez quando entrei. Até onde sei, os cartões ainda estão de posse da Gestapo. Eu nunca mais os vi.

Quando foi para Viena, Adolf Hitler estava destinado a desaparecer de nossas vidas por muitos anos. Ele não tinha amigos em Linz por quem pudesse retornar para uma visita e poucos com os quais pudesse trocar correspondência. Logo, foi muito mais tarde que soubemos de sua pobreza miserável naqueles dias, e de sua subseqüente mudança para Munique em 1912 (na verdade, em maio de 1913).

Nenhuma notícia tivemos do modo como ele ficou de joelhos e agradeceu a Deus quando a guerra foi declarada em 1914; e nenhuma notícia de sua participação na guerra como cabo do 16º. Regimento de Infantaria. Não soubemos nada dele ser ferido e envenenado por gás. Não até ele começar sua carreira política em 1920, quando então recebemos notícias deste menino reservado e educado que cresceu ao nosso lado.

Isto era Adolf?

Ocasionalmente, jornais locais publicariam notícias a respeito do grupo de simpatizantes políticos que Hitler estava reunindo em torno de si em \Munique; estórias de seu ódio aos judeus, ao Tratado de Versalhes, e a quase todo o resto. Mas nenhuma importância particular foi relacionada a essas atividades. Não até vinte pessoas morrerem no putsch da cervejaria de 8 de novembro de 1923, Hitler conseguiu notoriedade. Era possível, perguntei-me, que o homem por trás destes atos ser o garoto reservado que havia conhecido - o filho da gentil Klara Hitler?

Eventualmente, mesmo a menção do nome de Hitler na imprensa austríaca foi proibida; mesmo assim, continuamos a receber informações passadas de boca em boca de nosso antigo co-cidadão: estórias de perseguição que ele havia começado; do rearmamento alemão; da guerra por vir. Estes boatos alcançaram ouvidos responsivos. Um partido nazista local reagiu.

Teoricamente, tal partido não deveria existir; ele havia sido banido pelo governo. Na prática, as autoridades deram-lhe sua benção. Proibidos de usar uniforme, os nazistas locais adotaram métodos de identificar-se para todos. Eles usavam meias brancas. Nos seus casacos eles usavam uma pequena flor silvestre, muito parecida com a margarida americana, e no Natal eles queimavam velas azuis em suas casas.

Sabíamos todas estas coisas, mas nada foi feito. De tempos em tempos, autoridades locais encontravam uma bandeira nazista ni túmulo de Klara Hitler em Leonding, e a removeriam sem qualquer cerimônia. Mesmo assim, a tempestade na Alemanha parecia distante. Foi após um tempo que recebi uma notícia de Adolf Hitler. Então, em 1937, um número de nazistas locais se deslocou para a reunião do partido em Nuremberg. Após a reunião, Hitler convidou muitas dessas pessoas para ir com ele à sua casa na montanha em Berchtesgaden. O Führer perguntou por notícias de Linz. Como estava a cidade? As pessoas o apoiavam? Ele perguntou informações sobre mim. Eu ainda estava vivo, ainda praticando medicina? Então, ele fez uma afirmação que irritou os nazistas locais: "O Dr. Bloch," disse Hitler, "é um Edeljude - um judeu nobre. Se todos os judeus fossem como ele, não haveria a questão judaica." Foi estranho, e num certo sentido um elogio, que Adolf Hitler pudesse ver o bem em pelo menos um membro de minha raça.

É curioso agora olhar para trás em relação ao sentimento de segurança que tínhamos pela virtude de vivermos no lado certo de uma linha imaginária, a fronteira internacional. Certamente, a Alemanha não ousaria invadir a Áustria. A França era amiga. A ocupação da Áustria seria contrária aos interesses da Itália. Oh, mas éramos cegos naqueles dias! Então, fomos arrastados para uma série de eventos importantes. Foi com esperança que lemos da viagem de Schuschnigg (chanceler austríaco) a Berchtesgaden; seu plebiscito; sua inclusão de Seyss-inquart em seu gabinete. Possivelmente, passaríamos por essa crise incólumes. Mas a esperança foi morta em apenas algumas horas. Tão logo Seyss-Inquart foi colocado no governo, broches apareceram em todas as lapelas de paletó: "Um Povo, Um Reich, Um Líder."

Quando a Áustria morreu

Em 11 de março de 1938, uma sexta-feira, a rádio Viena esta transmitindo um programa de música. Eram 19:45. De repente, o locutor interrompeu o programa. O Chanceler iria falar. Schuschnigg entrou no ar e disse que a população deveria evitar um banho de sangue, que ele estava capitulando para atender as exigências de Hitler. As fronteiras seriam abertas, e ele terminou sua transmissão com as palavras: "Gott schiitze Österreich" - Deus proteja a Áustria. Hitler estava voltando para Linz.

Nos dias sem dormir que se seguiram, sintonizamos nossos rádios. Tropas estavam atravessando a fronteira em Passau, Kufstein, Mittenwalde e todos os outros lugares. O próprio Hitler estava cruzando o rio Inn em Braunau, o lugar onde nasceu. Quase sem respiração, o locutor nos contou a estória da marcha. O próprio Führer descansaria em Linz. A cidade foi à loucura de tanta alegria. O leitor não deve ter dúvidas sobre a popularidade do Anschluss com a Alemanha. As pessoas o apoiaram. Elas saudavam a invasão das tropas alemãs com flores, gritos e canções. Os sinos da Igreja tocaram. As tropas austríacas e a polícia confraternizaram com os invasores e havia alegria geral.

A praça pública em Linz, a um quarteirão da minha casa, era um tumulto. Toda tarde era tocada a canção Horst Wessel e o Deutschland über Alles. Aviões rasgavam os céus e unidades avançadas do exército alemão eram recebidas com aclamações. Finalmente, a rádio anunciou que Hitler estava em Linz. Instruções avançadas foram dadas à população. Todas as janelas ao longo da rota de procissão deveriam ser fechadas. Todas elas deveriam ser iluminadas. Fiquei na janela de minha casa olhando para a Landstrasse. Hitler passaria diante de mim.

O Herói Retorna

Logo a procissão chegou - o grande e negro carro Mercedez, seis rodas, flanqueado por motocicletas. O menino frágil que tratei tanto, e quem eu não via trinta anos - estava no carro. Eu tinha dado a ele somente bondade, o que ele estava agora fazendo com as pessoas que eu amava? Olhei por cima das cabeças da multidão em Adolf Hitler.

Foi um momento de excitação tensa. Por anos Hitler foi proibido de visitar o país natal. Agora, o país pertencia a ele. A elação que ele sentiu ficou escrita em suas vitórias. Ele sorriu, acenou, deu a saudação nazista às pessoas que infestavam a rua. Então, por um momento, ele acenou em direção da minha janela. Não sei se ele me viu, mas ele deve ter tido aquele momento de reflexão. Aqui estava a casa do Edeljude, que havia diagnosticado o câncer fatal de sua mãe; aqui estava o consultório do homem que havia tratado suas irmãs; aqui estava o lugar que ele havia ido quando garoto para ter suas dores curadas.

Foi um momento breve. Então, a procissão foi embora. Ela moveu-se vagarosamente para a praça da cidade - a Franz Josef Platz, a ser reinaugurada como Adolf Hitler Platz. Ele falou de uma varanda na prefeitura. Eu ouvi pelo rádio. Palavras históricas: a Alemanha e a Áustria eram agora uma única nação.

Hitler ficou no Hotel Weinzinger, particularmente requisitando um apartamento com visão para a montanha Pöstling. Esta vista era a que ele tinha das janelas do seu modesto apartamento onde ele passou sua infância.

No dia seguinte, ele convidou alguns velhos amigos: Oberhummer, um funcionário do partido local; Kubitschek (August Kubizek), o músico; Liedel, o relojoeiro; Dr. Hümer, seu antigo professor de história. Era compreensível que ele não pudesse me convidar, um judeu, para tal encontro, ainda que ele tenha perguntado sobre mim. Por um instante, pensei em pedir por uma audiência, mas decidi que não seria muito inteligente.

Hitler chegou na tarde de sábado. No domingo, ele visitou o túmulo de sua mãe, e avaliou os nazistas locais enquanto eles marchavam diante dele. Sem uniformes, eles vestiam os trajes tradicionais locais. Na segunda, Hitler partiu para Viena.

Em breve, fomos trazidos à dura realidade de quão diferentes as coisas estavam. Havia 700 judeus em Linz. Lojas, casas e escritórios de todas estas pessoas foram marcadas com cartazes amarelos agora visíveis por toda a Alemanha, JUDE - Judeu.

O primeiro sinal de que estava recebendo tratamento especial veio um dia quando a Gestapo local me telefonou. Eu deveria remover os sinais amarelos de meu escritório e casa. Então, uma segunda coisa aconteceu: meu propetário, um ariano, foi até a sede da Gestapo para perguntar se eu deveria continuar no meu apartamento. "Não devemos nos meter neste assunto," foi-lhe dito. "Será tratado por Berlim." Hitler, aparentemente havia lembrado. Então, algo aconteceu que me fez duvidar.

Sem nenhuma razão aparente, meu genro, um jovem médico, foi preso. Nenhuma visita foi permitida a ele, e não recebemos nenhuma notícia sua. Minha filha foi até a Gestapo. "Será que o Führer gostaria de saber que o genro de seu antigo médico foi enviado para a prisão?", ela perguntou. Ela foi tratada de maneira rude e de forma brusca para o seu temor. Os sinais não haviam sido removidos da casa de seu pai? Não era o suficiente? Mesmo assim, sua visita deve ter tido algum efeito. Em três dias seu marido estava livre.

Minha profissão, acredito era uma das mais requisitadas em Linz, começou a definhar cerca de um ano antes da visita de Hitler. Nisto, eu deveria ter percebido um presságio do que estava por vir. Antigos clientes confiáveis foram francos em suas explicações. O ódio propagado pelos nazistas estava tomando conta dos jovens. Eles não patrocinariam mais um judeu.

Por decreto, minhas atividades estavam limitadas a pacientes judeus. Isto era uma outra forma de dizer que eu deveria parar de trabalhar. Planos estavam sendo feitos para livrar a cidade dos judeus. Em 10 de novembro de 1938, uma lei foi estabelecida de que todos os judeus deveriam deixar Linz dentro de 48 horas. Eles deveriam ir para Viena. O choque que esta lei provocou pode ser imaginado. Pessoas que haviam vivido todas as suas vidas em Linz tiveram que vender suas propriedades, colocar suas coisas em malas e partir no espaço de dois dias.

Fui até a Gestapo. Eu deveria partir? Fui informado que uma exceção foi feita no meu caso. Eu poderia ficar. Minha filha e seu marido? Já que eles já haviam declarado sua intenção de emigrar para a América, eles também poderiam ficar. Mas eles teriam que deixar sua casa. Se houvesse um quarto no meu apartamento que eles pudessem ficar, seria permitido a eles se mudar para lá.

Sem mais Favores

Após 37 anos de trabalho ativo, minha profissão havia chegado ao fim. Fui permitido tratar somente de judeus. Após a ordem de evacuação, havia apenas sete membros desta raça vivendo em Linz. Todas tinham mais de oitenta anos de idade.

É compreensível que minha filha e seu marido desejassem levar suas coisas com eles quando emigrassem para a América. Então, viria a minha vez para partir. Conseguir alguma ajuda local em tal assunto estava fora de cogitação. Sabia que não poderia ver Adolf Hitler. Mesmo assim, senti que se pudesse enviar-lhe uma mensagem, ele poderia talvez nos dar alguma ajuda.

Se o próprio Hitler estivesse inacessível, talvez uma de suas irmãs poderia nos ajudar. Klara era a mais próxima, ela vivia em Viena. Seu marido era falecido e ela vivia sozinha em um apartamento modesto em um distrito residencial tranqüilo. Planos foram feitos para minha filha, Gertrude, para viajar até Viena para vê-la. Ela foi até o apartamento, bateu à porta, mas não obteve resposta. Entretanto, ela estava certa de que havia alguém em casa.


Ela procurou a ajuda de uma vizinha. Frau Wolf - Klara Hitler - não recebia ninguém, a vizinha informou, exceto uns poucos amigos íntimos. Mas esta mulher gentil concordou em levar uma mensagem e pedir uma resposta de Frau Wolf. Minha filha esperou. Logo, a resposta chegou. Frau Wolf enviou saudações e faria tudo o que fosse possível. Por sorte, Hitler estava em Viena aquela noite para uma de suas freqüentes, mas não divulgadas, visitas à ópera. Frau Wolf o viu e, estou certo, lhe deu a mensagem. Mas nenhuma exceção foi feita em nosso caso. Quando chegou nossa vez, fomos forçados a partir com os bolsos vazios, como milhares de outros.

Como Hitler tratou um velho amigo - alguém que cuidou de sua família com paciência, consideração e caridade? Vamos resumir os favores:

Não acredito que outro judeu em toda a Áustria tenha sido permitido a manter seu passaporte. Nenhum "J" estava marcado no meu cartão de ração, quando a comida tornou-se escassa. Isto era muito útil porque os judeus hoje (1940 - 1941) têm permissão somente durante horas restritas que são freqüentemente inconvenientes. Sem o "J" no meu cartão, poderia comprar a qualquer hora. Eu inclusive recebi um cartão de ração para roupas - algo geralmente negado a judeus.

Se minhas relações com a Gestapo não fossem precisamente cordiais, eu sofreria nas suas mãos assim como aconteceu com muitos outros. Eu estava sob proteção, e posso realmente acreditar nisso, já que o escritório em Linz recebeu instruções especiais da Chancelaria em Berlim para eu ser atendido para qualquer favor razoável.

É possível, mas improvável, que meu registro de guerra tenha sido particularmente responsável por estas pequenas considerações. Durante a guerra, tive sob minha responsabilidade 1.000 leitos hospitalares, e minha esposa supervisionou o trabalho de recuperação dos doentes. Fui duas vezes condecorado por este serviço.

Hitler Reconstrói sua Cidade Natal

Hitler ainda lembra de Linz como seu lar verdadeiro, e as mudanças que ele trouxe são extraordinárias. A cidade que já foi sossegada e quieta foi transformada por seu "padrinho" - um título honorário particularmente querido para Hitler. Blocos inteiros de velhas casas foram retirados para abrir caminho a modernos prédios de apartamentos; causando, assim, aguda, porém temporária, falta de disponibilidade de casas. Um teatro novo surgiu e uma nova ponte foi construída sobre o Danúbio. A ponte, de acordo com a lenda local, foi projetada pelo próprio Hitler e os planos foram imediatamente completados à época do Anschluss. A vasta Siderúrgica Hermann Göring, estabelecida nos últimos dois anos, está começando suas operações. Para conduzir este programa de reconstrução, vagões repletos de trabalhadores foram importados: tchecos, poloneses e belgas.

Hitler visitou a cidade duas vezes desde o Anschluss, uma na época da eleição, que foi para aprovar a união com a Alemanha; a segunda vez secretamente para ver como a reconstrução da cidade estava progredindo. Toda vez ele ficava no Hotel Weinzinger.   
Na segunda visita, o proprietário do hotel foi informado de que a presença de Hitler na cidade não deveria ser anunciada; que ele faria sua rotina de inspeção pela manhã. Feliz por ter tal personalidade importante em seu estabelecimento, o proprietário não resistiu à tentação de divulgar a notícia. Ele telefonou para vários amigos para dar-lhes a informação. Por esta quebra de disciplina ele pagou caro. Seu hotel foi confiscado.

Muitas vezes, fui procurado por biógrafos de Hitler para informações sobre sua juventude. Na maioria dos casos, me recusei a falar. Mas conversei com um destes homens. Ele era um cavalheiro agradável de meia-idade de Viena, que foi enviado pelo departamento governamental liderado por Rudolf hess, do círculo interno nazista. Ele estava escrevendo uma biografia oficial. Dei-lhe alguns detalhes que pude lembrar, e meus registros médicos que ele enviou em seguida para a sede do partido nazista em Munique. Ele permaneceu em Linz e Braunau por muitas semanas; então, o projeto terminou abruptamente. Foi me dito que ele foi enviado para um campo de concentração. Por que, eu não sei.

Quando finalmente chegou minha vez para deixar Linz rumo a América, soube que seria impossível para mim levar minhas economias comigo. Mas a gestapo tinha mais um favor para mim. Fui permitido levar 16 marcos do país, ao invés dos costumeiros 10!

A organização nazista de médicos concedeu-me uma carta de recomendação, cujo valor não conheço, que diz que eu era "digno de recomendação." Ela continuou dizendo que, por causa do meu "caráter, conhecimento médico e prontidão para ajudar os doentes," eu tinha conquistado "a confiança e estima dos meus companheiros de profissão." Um funcionário do partido sugeriu que eu deveria mostrar alguma gratidão por todos esses favores. Talvez uma carta para o Führer? Antes de eu deixar Linz em uma manhã enevoada e fria de novembro. Eu a escrevi. Eu fico imaginando se ela foi realmente recebida. Ela dizia:

Sua Excelência:

Antes de atravessar a fronteira, gostaria de expressar meus agradecimentos pela proteção que recebi. Na pobreza material que estou agora deixando a cidade onde vivi por 41 anos; mas a deixo cônscio de ter vivido todas as minhas obrigações. Aos 69 anos de idade, recomeçarei minha vida em um país estranho onde minha filha está trabalhando duro para apoiar sua família.

Fielmente seu,

Eduard Bloch


Publicado em Journal of Historical Review, Maio-Junho 1994 (Vol. 14, No. 3), páginas 27-35.

Leitura Recomendada:

August Kubizek, The Young Hitler I Knew (Greenhill, 2006)

Werner Maser, Hitler: Legend, Myth and Reality (HarperCollins, 1975)

John Toland, Adolf Hitler (Francisco Alves, 1978)

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