O Discurso de Gettysburg de Abraham Lincoln inspirou os americanos por gerações, mas considere suas afirmações chocantes em 1862 para uma platéia de negros emancipados na Casa Branca, recomendando-lhes que deixassem os Estados Unidos e se estabelecessem na América Central.
"Para o bem da sua raça, vocês deveriam sacrificar algo de seu conforto atual no sentido de ser tão grandes neste respeito como as pessoas brancas," disse Lincoln, promovendo sua idéia de colonização: reassentar os negros em países estrangeiros na crença de que brancos e negros não poderiam coexistir na mesma nação.
Lincoln continuou dizendo que os negros emancipados que desejavam uma vida permanente nos Estados Unidos eram "egoístas" e ele promoveu a América Central como um local ideal "especialmente por causa da semelhança de clima com a sua terra natal - assim sendo adaptada à sua condição física."
No momento em que a nação celebra o 150º aniversário do primeiro discurso de Lincoln na sexta-feira, um novo livro por um pesquisador da Universidade George Mason em Fairfax mostra que Lincoln estava muito mais comprometido com os negros colonizadores que previamente se sabia. O livro Colonização após Emancipação, é baseado em parte em novos documentos tornados públicos que os autores Philip Magness e Sebastian Page encontraram nos Arquivos Nacionais Britânicos em Londres e nos Arquivos Nacionais dos EUA.
Abraham Lincoln
Em uma entrevista, Magness diz que pensa que os documentos descobertos por ele revelam a complexidade de Lincoln.
"Eles tornam sua vida mais interessante, seu legado racial mais controverso," disse Magness, que é também professor adjunto na Universidade Americana.
As visões de Lincoln sobre a colonização são bem conhecidas entre os historiadores, mesmo se eles não colocam isso nos livros escolares. Lincoln mesmo se referiu à colonização na Proclamação da Emancipação preliminar, sua advertência de setembro de 1862 ao Sul (Estados Confederados) que ele libertaria todos os escravos no território sulista se a rebelião continuasse. Diferentemente de outros, Lincoln sempre promoveu uma colonização voluntária, ao invés de forçar os negros a irem embora.
Mas os historiadores discordam se Lincoln se afastou da colonização após ele declarar a Proclamação da Emancipação em 1º de janeiro de 1863, ou se ele continuou a apoiá-la.
O livro de Magness e Page oferece evidência de que Lincoln continuou a apoiar a colonização, se envolvendo em diplomacia secreta com a Inglaterra para estabelecer uma colônia nas Honduras Britânicas, hoje Belize.
Entre os registros encontrados nos arquivos britânicos está uma ordem de 1863 de Lincoln permitindo a um agente britânico permissão para recrutar voluntários para uma colônia em Belize.
"Ele não deixaria a colonização morrer. Ele tornou-se muito ativo na promoção na esfera privada, através de canais diplomáticos," disse Magness. Ele acredita que Lincoln se cansou da controvérsia que cercava os esforços de colonização, que se envolveram em um escândalo e foram criticados por muitos abolicionistas.
Tão tarde quanto 1864, Magness encontrou uma anotação em que Lincoln pediu ao advogado-geral da União se ele poderia continuar a receber conselhos de James Mitchell, seu comissário de colonização, mesmo após o Congresso ter eliminado os fundos para o departamento de Mitchell.
O historiador do Estado de Illinois, Tom Schwartz, que é também um diretor de pesquisa na Biblioteca Presidencial Abraham Lincoln em Springfield, disse que enquanto os historiadores discordam, existe ampla evidência de que as visões de Lincoln se distanciaram da colonização nos dois últimos anos da Guerra Civil.
Lincoln fez inúmeros discursos se referindo aos direitos que os negros conseguiram ao se alistar no Exército da União, por exemplo. E o secretário presidencial John Hay escreveu em 1864 que Lincoln havia "descartado" a colonização.
"A maior parte da evidência sugere a idéia de que Lincoln estava olhando para outros caminhos" para resolver a transição da escravidão através da colonização ao final de sua presidência, disse Schwartz.
Lincoln não é o único presidente cujas visões sobre relações raciais e escravidão eram mais complexas e menos idealistas que os livros escolares das crianças sugerem. George Washington e Thomas Jefferson eram ambos donos de escravos apesar dos mal entendidos. Washington libertou seus escravos quando morreu.
"Washington, porque ele queria manter a união, sabia que tinha que ignorar o problema da escravidão porque teria dilacerado o país," disse James Rees, diretor do Espólio Mount Vernon de Washington.
"É tentador desejar que ele tenha tentado. A nação tinha mais chance de lidar com a escravidão com Washington do que com qualquer outro," disse Rees, notando a estima com a qual Washington era tido tanto no Sul como no Norte.
Magness disse que as visões sobre Lincoln podem ser mantidas e ser frequentemente conflitantes. Ele notou que pessoas têm utilizado o legado de Lincoln para apoiar todas as agendas políticas desde o dia em que foi assassinado. E ninguém pode afirmar que possui conhecimento definitivo sobre as opiniões pessoais de Lincoln, especialmente em um tópico tão complexo quanto as relações raciais.
"Ele jamais teve a oportunidade de completar seus objetivos. As visões raciais de Lincoln evoluíram desde a época de sua morte," disse Magness.
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