sábado, 17 de novembro de 2018

A Era Napoleônica: Uma Narrativa das Batalhas e do Sistema de Guerra de Napoleão (1792-1815)

Maria Clara Lima de Oliveira

Discente, do 5ª período de História, na Universidade Federal do Piauí – UFPI


Introdução


O terror que se alastrou com a Revolução Francesa, é interrompido em 27 julho de 1794, os interesses burgueses derrotam jacobinos e contra-revolucionários. As políticas que se sucederam, vieram a garantir definitivamente a afirmação das instituições burguesas na França: com o Diretório (1795-1799), o Consulado (1799-1804) e o Império (1804-1815). “A partir de então, é o exército a tornar-se o corpo responsável pela unificação e pacificação da nação francesa. Um corpo que tem na figura do general/cônsul/imperador Napoleão Bonaparte sua mais perfeita expressão.” (MONDAINI, 2008, p.194) De 1792 até o golpe de Estado dado por Bonaparte em 1799, o “18 Brumário”, a França de fato concretiza aquilo que já aspirava, à ruptura com os soberanos europeus. “Os ideais libertadores inicialmente presentes no projeto dos revolucionários franceses cedem espaço aceleradamente à vontade expansionista de conquistar o maior número possível de territórios, submetendo suas populações ao jugo francês.” (MONDAINI, 2008, p.194)As guerras napoleônicas são reconhecidas como uma guerra de transição entre o velho e o novo mundo. Onde o pensamento político do século XIX foi sendo progressivamente marcado pela obra de Napoleão e de seus seguidores. Sendo assim, o paper objetiva apresentar os tramites que levaram Napoleão a se tornar um mito, da sua ascensão ao declínio, no decorrer de suas batalhas em campo e no cenário político.

Considerado um dos maiores guerreiros de todos os tempos, comparado a Alexandre, o Grande, Cesar e Frederico da Prússia, no comando de batalhas enfrentando as maiores diversidades. Ele tinha a capacidade de mobilizar, organizar, equipar exércitos numerosos e domínio da guerra de massa, revolucionando de fato a arte da guerra que caracteriza a contemporaneidade. Ele recebeu e abraçou a formação de oficial, se dedicando a ética da profissão. Napoleão enquanto líder político expõe suas experiências ao escrever notas de rodapé na obra O Príncipe de Maquiavel, ao escrever mais de setecentos comentários na obra, revela a sua personalidade de líder político, contestando ou apoiando algumas das ideias de Maquiavel, manifestando seus pensamentos, expondo suas opiniões, como se tivesse dialogando com o próprio Maquiavel. Muitos o denominam como um verdadeiro discípulo de Maquiavel, no seu jogo de oportunismo político. Napoleão era adepto dos ideais iluministas, para ele os problemas do governo devem ser resolvidos pela razão e pelo bom senso, ou seja, o governo era uma questão de pura ciência. As concepções religiosas oscilavam “[...] entre um vago deísmo e a crença de que o homem foi feito da terra, aquecido pelo sol e organizado por um fluido eléctrico” (HAMPSON, 1969, p.139), assim partilhava dos conceitos de Voltaire, onde a fé religiosa, embora sem embasamento, era a maior preservação da humanidade.


A Oposição no Início do Consulado


Nos primeiros anos no poder Bonaparte, o primeiro-cônsul, encarou oposição “[...] como Cesar ou Robespierre, era obcecado por ela e talvez a superestimasse, pois, na verdade, em geral foi de pequena monta.” (ENGLUND, 2011, p.192) No início do consulado ele não tinha tanta força para impor seu ponto de vista, tanto no plano político quanto no militar. A fraqueza da oposição tinha muitas faces e razões, em principal os opositores eram diversificados e desunidos, e com freqüência detestavam e temiam uns aos outros, até mais que Bonaparte, estes eram:

Liberais desgostosos do Instituto, dos salões e da legislatura; jacobinos radicais que se haviam oposto ao Brumário; monarquistas ensandecidos diante do sucesso de um regime moderado com laivos monárquicos; e, por fim, uma cabala de generais do exército bastante frívolos e irresponsáveis, alguns participantes dos jacobinos, outros monarquistas e outros ainda (os dois mais importantes) um pouco de cada coisa. (ENGLUND, 2011, p.192)

Napoleão põe em prática a sua incontrolável ambição pessoal e política. Com Bonaparte primeiro-cônsul, o Poder executivo submete um legislativo demasiadamente incômodo, ou seja, se afirma uma relação de continuidade, se diferenciando apenas em grau de concentração de poderes. Começa-se a então a falar sobre a necessidade de anexações territoriais em nome das “Fronteiras Naturais”, a república francesa passa a praticar uma política de anexação e ocupação. Bonaparte obtivera uma lendária reputação, ele era extremamente popular, era ambicioso, abusava constantemente de seu poder, contrariando os interesses do povo, “[...] alguns condenam Bonaparte; outros acusam a nação que se cegou ao idolatrá-lo.” (ENGLUND, 2011, p.198).

A Arte da Guerra

A guerra é uma ação recíproca, podendo se elevar a níveis extremos de usos ilimitados da força. “Existe sempre um espírito de guerra entre velhas monarquias e uma república nova. Eis a raiz das discórdias européias.” (COLSON, 2015, p.47) Napoleão não era adepto de uma política de paz, mas não era um monstro, as execuções políticas eram raras e o número de prisioneiros políticos também. A gloria militar que tanto desejava era por motivos políticos, mas não deixava de ser também por motivos pessoais. O triunfo no campo de batalha representava a grandeza e a glória. E ele não se prendia a escrúpulos diante das necessidades operacionais, muitas vezes teve de tomar decisões morais e intelectualmente arriscadas sem muito questionamento.  A guerra na época napoleônica se limitava quase sempre aos exércitos, as batalhas geralmente não faziam nenhuma vítima civil, os exércitos é que eram alvos dos planos estratégicos dos adversários. “[...] Naturalmente, foi dado um passo em direção à “guerra total”, mas isto se deu progressivamente.” (COLSON, 2015, p.66)

Napoleão acreditava que o sucesso de uma guerra não é fruto do acaso, ainda que, esteja presente nos eventos. Pra ele a ciência militar, consistia em calcular bem todas as chances ao começar e estabelecer matematicamente as contribuições do acaso, porém, isso pode cair em engano, por isso, torna-se necessário a cabeça de um grande gênio, e o gênio da guerra é algo inato. As maiores faculdades de Napoleão era a sua capacidade de prevê as grandes catástrofes, por isso a presença de um general é tão indispensável, pois ele é a cabeça e o todo de um exercito. A qualidade de um bom general é ter cabeça fria, nunca se exaltar e ter o bom senso, além disso, é necessário que ele tenha conhecimentos matemáticos a fim de obter bons êxitos. É necessário que se mantenha a sanidade “[...], pois a guerra é feita de acontecimentos dramáticos, de imprevistos.” (COLSON, 2015, p.80) É preciso prudência e principalmente coragem, coragem necessária para morrer.

O conhecimento do adversário torna-se essencial na guerra. Napoleão obtinha suas informações através de espionagem, interrogava prisioneiros e desertores e interceptava cartas. “Fazer a guerra é antes de tudo obter informações.” (COLSON, 2015, p.112) Mas não deixar de modo algum as obterem também, e Napoleão controlavam bem a imprensa, transformando o segredo um estilo de seu comando. Napoleão conseguiu dirigir grandes massas de homens, deixando os exércitos dos inimigos fora de combate em pouco tempo. “[...] A tática implica em ordem. Recorre à inteligência, ao conhecimento e à organização.” (COLSON, 2015, p.129) A estratégia para ele é arte de colocar as tropas em movimento. “A tática tem como objetivo o uso das forças armadas no combate; a estratégia, o uso dos combatentes a serviço da guerra.” (COLSON, 2015, p.134) Mas as concepções estratégicas devem ser simples e racionais, na guerra se convém à simplicidade e a segurança.


Para Napoleão a arte da guerra estava na maneira inteligente de conduzir a guerra, aumentando suas chances, as suas forças sob o exército inimigo. Não se deve dá ouvidos ao temor do exército, “A massa dos inimigos a serem enfrentados é uma das grandes fontes de temor na guerra.” (COLSON, 2015, p.188) A superioridade numérica é o princípio geral da vitória, “A Revolução Francesa foi capaz de arregimentar exércitos muito mais numerosos que os das monarquias européias, o que explica as vitórias que obteve.” (COLSON, 2015, p.214) Porém o numero de soldados não é nada se os oficiais e suboficiais não tiverem consciência do que estão manobrando. É preciso então obter fidelidade e disposição das tropas. Bonaparte através de machas aceleradas conseguiu vencer vários adversários com um único exército, além disso, ele surpreendia os adversários, tornando a surpresa um elemento autônomo. Portanto a guerra se assemelha a um conserto, onde os homens são como os músicos, e para que tudo aconteça em perfeita harmonia, é preciso que cada um execute a sua parte.

A Formação do Grande Exército

A “campanha da Itália” de 1796 a 1797 elevou a carreira de Bonaparte, ao mostrar a sua genialidade na arte militar “[...] acabou se impondo como a solução para os males que a Revolução não conseguia resolver.” (MONDAINI, 2008, p.198) Ele passou a não só intervir nas questões militares, mas também no plano político da vida de todo um povo. Em 1801 ele alcança a pacificação política interna, e no plano externo, após vitórias sobre os russos (1799), austríacos (1800) e napolitanos (1801), restava a Bonaparte apenas o acerto de contas com os ingleses, para que a paz voltasse a reinar na França e na Europa. Então em 25 de março de 1802 é assinado um acordo de paz na cidade de Amiens. A paz retorna, mas por pouco tempo. Partindo para uma agressiva política externa, a retomada da guerra torna-se inevitável. “A França do general Bonaparte, transformado em imperador Napoleão I não se limitava mais a buscar a “fronteira natural” francesa na direção do Reno, Alpes e Pirineus, ela deveria ser buscada por todo o continente europeu.” (MONDAINI, 2008, p.199) Mas para isso ele precisava formar uma base forte, de homens dispostos a dar-lhe a vida em prol da Revolução e da nação francesa, Napoleão precisava de um novo exército, um Grande Exército.


O Grande Exército é construído sob uma base mais democrática, a hierarquia estava mais aberta aos setores subalternos da sociedade, algo que já tinha sido feito pelos ingleses. O novo exército não era formado de mercenários e arruaceiro de todo os tipos, e sim de voluntários. Agora o povo comum vestia uniforme e pegava em armas pela pátria. Enquanto isso, no resto da Europa se continuava a utilizar os tradicionais métodos militares, com um exército de profissionais bem treinados e pouco numerosos. A França parte para um método revolucionário e mais eficaz, como a formação de um exército recrutado de toda uma nação. O treinamento e o preparo profissional do exercito é algo muito importante mais lhe faltava algo, “[...] a vontade política revolucionária, a consciência de que se lutava para transformar a história.” (MONDAINI, 2008, p.201) O novo exército mesclava entre o velho e o novo, ou seja, entre a capacidade técnica e a disposição ideológica. Mas o que seria voluntário torna-se uma imposição legal, o serviço militar torna-se obrigatório para os jovens entre 18 a 24 anos, tornado-se um exército formado de massas por meio de recrutamento forçado, devido ao declínio dos alistamentos espontâneos, porém mantendo-se um discurso de voluntariado. A técnica, o entusiasmo e o número foram decisivos embora não exclusivos, para as vitórias obtidas pelos franceses nas batalhas terrestres até 1812. 

A Batalha de Austerlitz e o Bloqueio Continental

A Inglaterra se recusa a cumprir um artigo do tratado de Amiens, que lhe obrigava a retirar as tropas do arquipélago de Malta, e nenhuma das partes cogitava a voltar atrás nas suas posições, então a guerra entre França e a Inglaterra recomeça em maio de 1803, com a expedição da ordem de que o embaixador inglês deixasse Paris. Era uma guerra de ordem econômica, a fim de garantir o poder marítimo. Na Catedral de Notre-Dame, em 1804, Bonaparte é coroado imperador da França, recebendo a coroa das mãos do próprio Pio VII. “Napoleão agiu habilmente para fazer com que ela “acontecesse por si”. Foi tão bem sucedido que gerou a impressão de que os eventos que levaram da iniciativa de torná-lo primeiro-cônsul vitalício à sua coroação como “imperador dos franceses” foram o desdobramento natural de um processo inevitável”. (ENGLUND, 2011, p.198) Napoleão desejava dominar a Europa, mostrando a superioridade do seu Grande Exército sob a Marinha britânica. Porém seus planos não deram muito certo, consistia em utilizar o elemento surpresa e o rápido deslocamento sob a frota inglesa na travessia do canal da Mancha.

Sob o comando do lendário almirante Nelson, 27 navios ingleses dispostos de maneira inovadora em colunas, e não na tradicional formação em fila, destruíram 18 embarcações francesas e 15 espanholas comandadas pelo almirante Villeneuve. A manobra vitoriosa de Nelson — capaz de reverter à superioridade numérica do inimigo — consistiu em atacar a frota franco-espanhola furando sua linha no centro, com o intuito de isolar os navios uns dos outros, assaltando-os depois bem de perto, em certos casos até mesmo através da tática da abordagem. (MONDAINI, 2008, p.205)

Mas em 1805, Napoleão em um movimento de antecipação vence a Batalha de Austerlitz, tendo 75 franceses contra 80 mil russos e 25 mil austríacos, fazendo o imperador da Áustria assinar um tratado de paz degradante.  A batalha deu a Napoleão um misto de consagração imperial e o apogeu da estratégia militar. Uma batalha organizada e com um forte armamento. Napoleão mostrou sua verdadeira astúcia militar, fazendo do campo de batalha um verdadeiro jogo de xadrez, ele fez um movimento de retirada das suas tropas da posição de ataque ao exército austro-russo em direção a Viena, parecia está recuando do confronto, enquanto o exercito inimigo se aproximava perto de platô de Pratzen. Mas ele estava a preparar um segundo lance. Os austríacos e russos se imaginavam donos da situação, marchando para uma vitória garantida, mas eis que Napoleão ordena que suas tropas partam para o ataque tomando platô de Pratzen de assalto. Foi um desastre para os adversários. Mas não acabava aí, em um terceiro e ultimo movimento, onde o exercito inimigo decidira lutar até o fim contra o exercito napoleônico, as tropas russas são atraídas para os lagos congelados da região, Napoleão ordena então que a artilharia bombardeasse as camadas de gelo. Eis que as tropas russas submergem nas águas frias do leste europeu, sucumbindo ao degelo. “A batalha evoluiu como num tabuleiro, e bastou um único raio para fulminar [...]” (DUMAS, 2005, p.55) O cordão de força entre França e Inglaterra parecia ter se empatado, com uma vitória para ambas e seus aliados.

Para se defender da Rússia Napoleão monta uma espécie de cinturão territorial de proteção, montando uma rede de aliados de novos Estados vassalos. Tanto os ingleses quanto os franceses, faziam alianças em curtíssimo tempo. Uma quarta coalizão acontece em 27 de outubro de 1806, onde a capital de Berlim foi ocupada sob liderança dos ingleses. O primeiro ciclo de batalha se encerra em fevereiro de 1807, em Eylau. Onde russos e prussianos travavam uma violenta batalha contra o exercito francês, sem vencedores e nem vencidos, a melhor saída foi um acordo entre as partes, a paz de Tilsit, uma partilha da Europa entre os dois grandes impérios, o francês e russo.

 Vencer a Inglaterra no mar torna-se quase impossível para os franceses. A saída era uma batalha econômica, Napoleão afirma um decreto ampliando as proibições de comercialização com a Inglaterra, “[...] todos os países aliados ou ocupados, ou seja, Espanha, Itália, Suíça, Holanda, Dinamarca e Alemanha, tendo a Rússia se comprometido aplicar o decreto na Paz de Tilsit.” (MONDAINI, 2008, p.207). Formando assim o Bloqueio Continental. Não poderia haver brechas mais ela existia e se chamava Portugal, que insistia em continuar ligada economicamente a Inglaterra. Napoleão então atravessa a Espanha e invade Lisboa facilmente. “A invasão de Portugal era apenas uma escala na conquista da Espanha, onde reinava Carlos IV, [...] Napoleão apenas passara os olhos pela Espanha, num relance rápido e distraído, mas que lhe bastara, porém para ali enxergar um trono a ser conquistado. ”(DUMAS, 2005, p.60)


            Conquistada a península ibérica, Napoleão desafiara o poder do papa. Em fevereiro de 1808, ele invade Roma, Pio VII se tornara uma mera sombra. O expansionismo napoleônico disponta, 1810 a 1811, alcança a sua maior extensão territorial. Napoleão divorcia-se de sua primeira mulher, casando-se com Josefina, filha do imperador austríaco, a fim de fortalecer suas alianças e manter a Inglaterra isolada, ou pelo menos a sensação de que estava. Tudo parecia estar no perfeito controle de Napoleão, mas por pouco tempo.

Da Campanha Russa até Waterloo

Movimentos de resistência popular são formados em alguns países ocupados, surgindo então forças progressistas, “[...] inspiradas pelas idéias de nação, liberdade e igualdade, dispostas a lutar por uma constituição livre da influência francesa.” (MONDAINI, 2008, p.208) Em 1808 a 1812, espanhóis travam uma batalha violenta com os franceses, um movimento insurrecional que se alastrou por todo o território espanhol. Uma batalha contra o Grande Exército, que significou a maior derrota desde o início das guerras napoleônicas. Cai-se então o mito de invencibilidade, que se juntou ao fracasso do Bloqueio Continental.

            Em 1811, a França achava-se ainda imbatível e capaz de vencer a Rússia sua “aliada” e a Inglaterra. No ano de 1812, Napoleão forma um impressionante exército composto por 650 mil homens de diferentes nações, rumo a Rússia, encontrando pelo caminho apenas planícies desertas e queimadas. Um esfomeado exército francês entra nem Moscou, com a cidade em chamas, e um czar sem disposição para negociações. O exercito já estava sucumbindo pela forme e pelo rigoroso inverno russo. Diante da situação Napoleão ordena a retirada. “Esse retorno passaria a ser lembrado como um dos maiores desastres da história militar da guerra.” (MONDAINI, 2008, p.210) O exército russo os cercaram estando na exaustão, apenas um quinto do exercito morreu no campo de batalha, “[...] O restante padecera de fome, frio, doenças alem de desertores e capturados.” (MONDAINI, 2008, p.210) Foram vencidos pelo auxílio das forças naturais do território russo. Esta derrota trouxe um declínio acelerado do império francês e do Império de Napoleão. Dando oportunidade aos inimigos se organizarem contra. Napoleão já não tinha apoio nem dos franceses, tendo assim de abdicar.


            Apoiado pelo marechal Murat, em 26 de fevereiro de 1815 Napoleão ressurge de maneira triunfal, expulsando Luís XVIII e obrigando as nações antinapoleônicas a formarem uma nova coalizão. Então o exército inglês e seus aliados os derrotam, na batalha de Waterloo, na Bélgica em junho de 1815. Se encerrando assim o ciclo das guerras napoleônicas.

Conclusão

Napoleão Bonaparte se encaixa na categoria de mito e de ídolo. As guerras da Revolução e do Império, e em principal os graves erros cometidos por Napoleão, na península ibérica em 1807 e na invasão da Rússia em 1812, trouxeram conseqüências, os desastres humanos e políticos foram consideráveis. Napoleão pôs a perder as aquisições da revolução, deixando a França menor do que encontrara. Por outro lado as mudanças internas durante o consulado foram duradoras, porém o mesmo não ocorreu com a política externa.


 As reflexões surgidas a partir da luta contra Napoleão Bonaparte nos campos de batalha, começou-se a observar a guerra e a política de uma maneira mais sintonizada, a guerra não apenas como um ato político, mas como um verdadeiro instrumento da política. Quase sempre o objetivo político vem a determinar a meta militar. As guerras napoleônicas foram o marco de uma grande mudança rumo a outro mundo. Ele veio a ensinar muito mais a como ganhar batalhas do que ganhar guerras. A sua vida estava cruzada com a guerra, chegou e manteve o poder pela guerra, do mesmo modo como a perdeu.

Referências

COLSON, Bruno. Napoleão Bonaparte – Sobre a Guerra: A arte da batalha e da estratégia. 1ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2015, p.662.
DUMAS, Alexandre. Napoleão Imperador. Napoleão: Uma Biografia Literária. 1ª edição. Rio de Janeiro: Jorge ZAHAR Editor, 2005, p.50 a p.83.
ENGLUND, Steven. O poder: De Cidadão-Cônsul a Imperador dos Franceses. Napoleão: Uma biografia Política. Rio de Janeiro: Jorge ZAHAR Editor, 2011, p.191 a p.306.
HAMPSON, Norman: Os Últimos Lampejos do Despotismo Iluminado. A Primeira Revolução Européia (1776-1815). Lisboa: Editorial Verbo, 1969, p. 137 a p.163.
HOBSBAWM, Eric J. A guerra. A Era Das Revoluções (1789-1848). São Paulo: Paz e Terra, 1996, p.115 a p.145.
MONDAINI, Marco. Guerras Napoleônicas. In: MAGNOLI, Demétrio (org.). História das Guerras. Vol.3. São Paulo: Contexto, 2008, p.188 a p.216.

RAMOS, Vanessa Carnielo. “Os comentários de Napoleão Bonaparte a O Príncipe, de Maquiavel, contidos em nota de rodapé.” Revista PLURAIS, Goiás, V.3, n.1, p.1 a p.11, 2013.

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Grandes generais costumam entrar para a História pelo modo ousado como mudaram o rumo de uma batalha, pela inovação de suas técnicas e estratégias, pela dimensão de suas conquistas ou pela forma como impuseram sua força aos adversários. Com o prussiano Carl Von Clausewitz, foi diferente. Ele lutou mais de uma vez contra as tropas de Napoleão, na Rússia e em Waterloo, e ajudou a reorganizar o Exército da Prússia no início do século 19. Tinha sólida experiência no campo de batalha e demonstrava frieza e coragem invejáveis no front. Mas, ironicamente, não ficou famoso por suas ações.

Estudioso, devorava livros como poucos. E foi ao escrever um deles, Da Guerra, que se tornou um dos comandantes mais conhecidos do Ocidente. Clausewitz era também uma figura curiosa. Excessivamente tímido e bastante controverso, foi personagem secundário do romance Guerra e Paz, de Tolstoi. Alimentava um gosto especial por arte, ciência e educação. Sua obra, considerada ainda hoje o mais importante tratado teórico-militar de todos os tempos, já foi lida ou citada por uma lista de pensadores, escritores e militares – como o Duque de Wellington, George Patton, Lenin, Hitler, Mao Tsé-tung, Dwight Eisenhower e Henry Kissinger, entre outros.

O gosto de Clausewitz pelas armas apareceu na infância. A carreira do general prussiano começou cedo, logo aos 12 anos, participando de seu primeiro combate um ano depois. Em 1795, aos 15, a guerra contra a França revolucionária levou o então cadete a uma reclusão de cinco anos, consumidos com a leitura sobre os mais diversos assuntos. Ao sair, suas habilidades abriram-lhe portas rapidamente. Ingressou no Instituto para Jovens Oficiais de Berlim (que mais tarde faria parte da famosa Kriegsakademie, a academia de guerra alemã) e foi nomeado oficial-ajudante do príncipe Augusto da Prússia. Mas a mobilização do país para as guerras napoleônicas, a partir de 1806, afastaria Clausewitz da realeza e o levaria a uma distante jornada.

Mudança de farda

 

Naquele ano, o Exército prussiano ainda amargava os resultados das batalhas de Jena e Auerstadt. O país fora devastado pelo conflito e havia perdido metade de seu território. A Prússia tornara-se apenas um satélite da França e um grupo de oficiais, incluindo Clausewitz, acreditava que só uma profunda reforma social e militar poderia recuperar as terras tomadas. O rei Frederico III, no entanto, não compartilhava da mesma opinião – estava mais preocupado em manter sua posição do que promover uma cruzada nacionalista. A insatisfação de Clausewitz chegou ao limite em 1812, quando a coroa enviou tropas para lutar contra os russos ao lado de Napoleão. Junto com outros oficiais, o prussiano mudou de farda e foi servir no Exército russo, participando da sangrenta batalha de Borodino e testemunhando a retirada dos franceses de Moscou.

De volta à Prússia, ele foi reintegrado ao exército local com o título de coronel e estava pronto para desempenhar um papel fundamental na reformulação do Exército nacional. Nesse período Clausewitz embrenhou-se em combates seguidos: lutou em Ligny e teve um papel importante na retaguarda das ações em Wavre, ação que evitou que as forças do marechal Grouchy se reintegrassem às tropas de Napoleão, em Waterloo.

Promovido a general em 1818, o prussiano aproveitou a ociosidade do período em que ocupou um alto cargo na Escola de Guerra de Berlim para teorizar seus conceitos sobre a guerra. Sua obra começava a ser estruturada, mas foi posta de lado quando o general foi enviado à fronteira com a Polônia. Lá, organizou um cordão sanitário para frear o avanço de uma epidemia de cólera. Parecia saudável quando voltou para Breslau, mas contraíra a doença. Clausewitz morreu em 16 de novembro de 1831, aos 51 anos. Deixou a mulher, Marie von Brühl, e os manuscritos de Da Guerra, publicados por ela logo após sua morte.

Os textos de Da Guerra, um calhamaço dividido em três volumes, foram objeto de estudo em diversas escolas militares do mundo moderno. Obra densa e complexa, de difícil leitura, é conteúdo obrigatório em algumas instituições. Mas está longe de ser unanimidade: acadêmicos, cientistas políticos e militares têm visões distintas sobre obra e autor. Muitos chamam Clausewitz de gênio; outros tantos o consideram pedante e limitado. O fato é que Da Guerra atravessou o tempo e é hoje uma das maiores referências sobre estratégia militar. Serve como fonte para entender diferentes conflitos, em diferentes épocas – daí sua contemporaneidade. Seus conceitos são reflexões embasadas em ações de um período – as guerras do século 19 –, mas estabelecem uma ligação estreita entre guerra e política que assume uma incrível capacidade de se perpetuar. Nada mais atual, aliás, em tempos em que os conflitos externos dominam a agenda de grandes líderes mundiais.

Outras palavras

 

“A guerra é a continuação da política por outros meios”

“O conquistador é sempre amante da paz. Preferia sem dúvida subjugar nosso país sem ter de combater”

“Em assuntos tão perigosos como a guerra, as idéias falsas, inspiradas no sentimentalismo, de modo algum têm a cooperação da inteligência”

“A guerra é um ato de força, e não há limite para a aplicação dessa força”

“Destruir ou desarmar o inimigo deve ser sempre o propósito da ação militar. Enquanto o adversário não estiver derrotado, plenamente derrotado, é preciso temer que possa nos destruir”

POLÍTICA POR OUTROS MEIOS: CARL VON CLAUSEWITZ

 

Roberto Simon

Friedrich Engels costumava chamá-lo de “gênio puro”. Vladimir Lênin, de “um dos maiores historiadores militares”. Em 1914, a Alemanha colocou em prática seu plano de guerra. Extensos trechos de sua obra-prima eram citados nos discursos de Adolf Hitler. E até Colin Powell, ex-secretário de Estado americano, disse ter se baseado nele para formular sua estratégia contra o Iraque, em 2003. Afinal, por que Carl von Clausewitz, um general prussiano que atuou na passagem do século 18 para o 19, foi capaz de influenciar tantas personalidades?

A resposta está em um livro. Com Da Guerra, Clausewitz foi o primeiro teórico a explicar os conflitos militares modernos. Seus conceitos estão sintetizados em uma máxima: “A guerra é a continuação da política por outros meios”. Para ele, a vitória se materializa na destruição física e moral do inimigo. “Guerra é um ato de violência destinado a forçar o adversário a submeter-se à nossa vontade”, ele afirma. Como o desejo de submissão é mútuo, a rivalidade levará as batalhas a seus extremos.

Clausewitz foi capaz de teorizar essa mudança para o conflito absoluto porque ele mesmo foi protagonista dos conflitos militares de sua época. Nascido em 1780 em uma família nobre da Pomerânia, Clausewitz ingressou no Exército prussiano com apenas 12 anos. Aos 13, conheceu o campo de batalha pela primeira vez. Depois, voltou-se para a teoria militar, até que as guerras napoleônicas o lançaram novamente na guerra. Em 1806, na batalha de Auerstadt, foi derrotado pelas forças de Napoleão e enviado preso a Paris. De volta às salas de aula prussianas, em 1815 tornou-se diretor da Escola de Guerra alemã. Reconhecido como intelectual, foi incumbido da educação militar do príncipe herdeiro Frederico Guilherme IV. Quando a coroa da Prússia resolveu se aliar à França, o general se juntou às forças do imperador russo, o czar Alexandre I. Em Moscou, acompanhou de perto a retirada das tropas de Napoleão.

Ao morrer de cólera, em 1831, aos 51 anos, Clausewitz deixou uma pilha de manuscritos teóricos inacabados. No ano seguinte, sua viúva, Marie von Brühl (1779-1836), reuniu esses fragmentos e os publicou. O aspecto fragmentário de Da Guerra (publicado no Brasil pela Martins Fontes) não diminui sua importância. Como o general afirmara antes de morrer, “mesmo incompleta, a obra pode provocar uma revolução na teoria da guerra”. Clausewitz tinha razão.