Rodrigo Casarin
Sobre uma colina com mais de 60 m de altura, o
forte de Chapultepec abrigava a Academia Militar e era um dos pontos mais
importantes para que a Cidade do México, a capital do país, permanecesse
intocada. As defesas mexicanas já estavam bastante enfraquecidas, restavam
algumas centenas de homens - muitos deles jovens cadetes - para zelar por
aquele ponto estratégico. Os ataques norte- americanos começaram na madrugada.
Ainda que tenha havido uma breve trégua, retomaram com força antes mesmo do sol
raiar. A resistência dos defensores causou diversas baixas nos invasores,
elevou alguns combatentes ao status de heróis da nação e deixou uma sensação de
vitória moral nos mexicanos. Mas não foi suficiente para que os ianques
deixassem o seu objetivo de lado. Restava aos sobreviventes debandarem para a
cidade. Ao amanhecer, o forte estava tomado pelo Exército estrangeiro, que
teria como próximo alvo a capital - faltava apenas invadi-la e tomá-la para,
definitivamente, vencerem a guerra.
Estado rebelde
Na campanha até ali, os norte-americanos haviam triunfado em duras
batalhas. Mas a tomada da Cidade do México talvez tenha sido mais fácil do que
poderiam imaginar. Ainda que necessitassem enfrentar alguns focos pontuais de
rebeldes e as adversidades provocadas pela própria população, em pouco tempo
tirariam a bandeira mexicana que tremulava sobre o Palácio Nacional e içariam a
dos Estados Unidos, definindo, simbolicamente, vencedores e vencidos.
Era o dia 14 de setembro quando os invasores chegaram à capital. A
tomada da cidade foi o último capítulo belicoso de uma guerra iniciada em 1846,
resultado de um conflito sobre o território do Texas que se juntou à
necessidade de expansão dos Estados Unidos. O México, que não queria perder um
estado rebelde, acabou perdendo muito mais do que isso.
Boa parte da população texana estava insatisfeita
com as leis mexicanas. Por isso batalharam por sua independência e, em seguida,
pediram anexação aos Estados Unidos, que aceitou o pedido. "Os Estados
Unidos declararam guerra ao México dez anos depois da independência do Texas,
num projeto mais amplo, a expansão para o oeste, no qual caravanas avançavam
levando fortes militares", diz Maria Ligia Prado, doutora em História
Social pela USP e especialista em América Latina. A desavença entre México e
Texas caiu como uma luva na necessidade de expansão territorial dos EUA. Serviu
como catalisador da nação e impulsionou, entre outras coisas, a expansão
territorial rumo ao oeste e ao sul, numa série de conquistas de novos
territórios antes pertencentes a franceses, ingleses, russos e espanhóis.
Metade para mim, metade para você
Antes da batalha de Chapultepec e o domínio da Cidade do México, outros
episódios já haviam ocorrido. Para invadir o país vizinho, o Exército dos
Estados Unidos se dividiu em três frentes, duas que rumaram para o sul do Texas
e outra que foi para o Novo México e, em seguida, para a Califórnia. Vitórias
em Palo Alto e Resaca de la Palma foram decisivas para que a ofensiva se
consolidasse, seguindo para Monterrey - palco de uma batalha de três dias que
causou muitos danos aos dois Exércitos. Apesar dos triunfos, os
norte-americanos perceberam que os mexicanos, liderados pelo general António
Lopez de Santa Anna, não se entregariam. Então, para que conseguissem alcançar
a capital, utilizaram também a Marinha. Após uma série de conflitos em Vera
Cruz, Cerro Gordo, Contretas e Molino del Rey, finalmente chegaram a
Chapultepec.
Mas se o principal objetivo dos EUA era a ampliação do território e seu
Exército conseguiu chegar até a Cidade do México, por que não ficaram com todo
o bolo? "Quando você vence a guerra, precisa tomar a capital do país
vencido, isso é uma regra básica. Contudo, anexar o país inteiro significaria
também provocar uma resistência muito grande por lá. No norte do México, a
ocupação sempre foi menor, é muito deserto. A própria população do Texas era
muito pequena. Desde o período colonial, a maior parte das pessoas estava no
centro e no sul do país, e não aceitaria que o EUA tomassem a capital, haveria
ainda mais resistência", afirma a professora Maria Ligia.
Para colocar fim à guerra - iniciada pelo México, não custa lembrar -,
autoridades mexicanas e norte-americanas assinaram, em fevereiro de 1848, o
Tratado de Guadalupe-Hidalgo, no qual o país latino cedia aos invasores, além
do Texas, áreas que atualmente correspondem aos estados do Novo México,
Califórnia, Arizona, Colorado, Nevada, Utah e Wyoming, além de pequenas partes
de Kansas e Oklahoma - um espaço de aproximadamente 2,4 milhões de km2, que
corresponde à metade do então território mexicano. O Rio Grande serviu (e ainda
serve) como referência para a fronteira. Em troca, o México recebeu uma
indenização de 15 milhões de dólares.
O tratado foi criticado por expansionistas norte-americanos, que o
consideraram condescendente com os derrotados - queriam todo o território onde
o Exército invasor fincou bandeira. Mas o acordo foi atacado até por
autoridades dos EUA, responsáveis pelas negociações de paz, que julgaram
tamanha perda territorial uma grande humilhação aos mexicanos, provocando neles
um grave sentimento de frustração. Seja como for, muito do que é hoje
território norte-americano foi descoberto, ocupado e colonizado por
descendentes de espanhóis e mexicanos.
A república do Texas
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A história dos problemas no
território texano começou quando a região ainda pertencia à coroa espanhola -
como boa parte do atual sul dos Estados Unidos, por isso nomes como Flórida,
Los Angeles e Santa Bárbara. O governo do México concedeu licença para que
300 famílias de colonos norte-americanos se estabelecessem no lugar. Em 1821,
o México conquistou sua independência da Espanha e, dois anos depois, o
Congresso votou pela abolição da escravatura, algo que ia contra a vontade
dos estrangeiros estabelecidos no Texas. Apesar do decreto, os texanos
continuavam governando a região de forma praticamente autônoma e
independente. Isso até o general Santa Anna instituir uma Constituição que
centralizava o poder, acabando com leis locais. Os colonos não desejavam ser
submissos ao governo mexicano e rebeliões começaram a ocorrer, bem como
negociações entre o México e os EUA para discutir as proibições. Tensões e
dificuldades surgiram, até que parte do Exército mexicano foi deslocada para
a região e entrou em conflito com os texanos. O México vivia um momento
delicado, no qual o Estado nacional procurava estabelecer sua organização
política, um período crítico após a guerra pela independência que durou mais
de 10 anos e levou à destruição da economia local. Os texanos, apoiados pelos
EUA, conseguiram mais do que derrotar os militares inimigos: transformaram o
general Santa Anna em refém. Em março de 1836, o Texas proclamou sua
emancipação, alegando romper com a tirania militar, a intolerância religiosa
e a falta de escolas na região. A partir da declaração, os texanos elegeram
seu próprio presidente, fizeram uma nova Constituição - na qual a escravidão
era legal - e obtiveram o reconhecimento dos EUA, país para o qual fariam uma
solicitação de anexação em 1845.
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Os pequenos heróis
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Durante a batalha de Chapultepec,
seis cadetes militares mexicanos, com idade entre 13 e 19 anos - o que dá uma
ideia de como era a formação do Exército do país - recusaram a ordem de recuo
dada por seu general e procuraram defender o lugar que ocupavam até a morte.
Esses jovens resistentes passaram a ser conhecidos como "Los niños
héroes" (meninos heróis) e se tornaram uma espécie de mito patriótico. A
versão mais romântica da História diz que o último deles, ao perceber que o
fim era inevitável, enrolou-se em uma bandeira do país e pulou do alto do
forte, evitando que o pavilhão caísse em mãos inimigas.
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