terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Rumo a uma Política Externa Sionista Cristã

Philip Giraldi, 14/02/2013


Os países frequentemente se definem pelo que eles acreditam ser verdade. Quando realidade e crença discordam com aquela definição podemos muito bem nos referir como um “mito nacional”. Nos Estados Unidos, muitos acreditam que existe uma separação constitucionalmente estabelecida entre religião e governo. Na prática, contudo, esta separação jamais realmente existiu, exceto que os americanos são livres para praticar qualquer religião que eles escolham ou mesmo nenhuma. A religião dominante da nação, o Cristianismo, moldou de fato a política governamental em muitas áreas importantes desde a fundação da república. A isenção de impostos para as igrejas poderia ser um exemplo de legislação favorecendo a religião organizada enquanto que no século XIX os governos de um número de estados americanos tinham cláusulas religiosas escritas em suas constituições e também coletavam impostos de dízimos para apoiar a dominação cristã local. A prática só terminou com a aprovação da décima quarta emenda em 1868.

O Sionismo Cristão não é uma religião per se, mas ao invés disso um conjunto de crenças baseadas em interpretações de partes específicas da Bíblia – notavelmente o Livro das Revelações e partes de Ezequiel, Daniel e Isaías – que falam do retorno dos judeus para a Terra prometida, uma pré-condição para a Segunda Vinda de Cristo. A crença de que Israel é essencial para o processo levou à fusão do Cristianismo com o Sionismo, portanto o nome do movimento.

O significado político deste ponto de vista é enorme, significando que uma grande parte dos cristãos promove uma política externa irreal baseada numa interpretação controversa da Bíblia, a qual abraça com fervor considerável. O Sionismo Cristão por definição consiste de cristãos (normalmente evangélicos protestantes) que acreditam que uma vez que as condições sejam satisfeitas para a Segunda Vinda de Jesus Cristo, todos os crentes verdadeiros serão conduzidos ao Paraíso, apesar dos detalhes da sequência de eventos e o tempo serem questionáveis. Muitos sionistas cristãos acreditam que a Segunda Vinda acontecerá logo, dentro de uma geração após o retorno dos judeus à Terra Santa, de modo que eles apoiam o governo e o povo de Israel completa e incondicionalmente em tudo o que eles fazem, para incluir a realização da profecia através do encorajamento da expansão por força na Judéia histórica, que incluiria o que resta do lado ocidental palestino.

Outro aspecto do Sionismo Cristão é a crença de alguns que o fim dos tempos, como eles se referem, será precedido por um governo mundial (convenientemente visto como as Nações Unidas) e anos de guerra e tumulto com uma gigante batalha final colocando as forças do bem contra as forças do mal, na qual todos os malfeitores serão destruídos e os direitos serão triunfantes. A batalha supostamente deverá acontecer em Armageddon, um local desconhecido no Oriente Médio que alguns acreditam ser derivado do nome da antiga capital hitita Megiddo.  

Que os sionistas cristãos acreditam que o retorno de Cristo é iminente e que haverá grandes guerras e uma batalha final no Oriente Médio precedendo-o pareceria irrelevante para a maioria de nós, mas isso tem, neste caso real, consequências mundiais, pois temos seu envolvimento na política americana e, em particular, em alguns aspectos da política externa americana. Cristãos evangélicos começaram a se mobilizar e tornar-se uma força política poderosa no final dos anos 1970 e início dos anos 1980 em reação à ação da administração de Jimmy Carter em desafiar o status de tributação das escolas cristãs independentes.

Muita da agenda inicialmente apoiada dos sionistas cristãos era sectária, refletido em sua aparente antipatia em relação ao catolicismo, que eles descrevem como uma “prostituta da Babilônia” e em sua crença de que o Papa é o Anti-Cristo, ou social, tal como sendo anti-aborto e hostil aos direitos homossexuais, mas também sempre houve desde o início um horror ao “Comunismo Ateu” e uma identificação com Israel. Era sempre mantido que Israel deveria ser protegido acima e além dos interesses da política externa americana na região do Oriente Médio. Através da criação de organizações como a poderosa Cristãos Unidos por Israel (CUFI), com dois milhões de membros e liderada pelo pastor John Hagee, este foco em Israel tem obtido um mecanismo para unir os evangélicos e fornecer-lhes os meios e direção para pressionar o congresso para continuar os altos níveis de ajuda para Israel e também resistir a quaisquer tentativas de desafiar o apoio às políticas de Israel. Este mecanismo foi mais recentemente observado em ação em 28 de janeiro quando 200 líderes da CUFI viajaram até Washington com todas as despesas pagas por um “doador anônimo” para pressionar seus senadores contra a confirmação de Chuck Hagel como Secretário da Defesa. Hagel foi criticado por não ser totalmente apoiador de Israel e hesitante em entrar em guerra contra o Irã pelo interesse de Israel.

Apesar de ser uma organização que se define como cristã, a CUFI apoia a Guerra contra o Irã como um precursor de um conflito global total. Hagee explica: “Os EUA devem se unir a Israel num ataque preventivo contra o Irã para satisfazer o plano de Deus para Israel e o Ocidente... um confronto bíblico profetizado do fim dos tempos com o Irã, que conduzirá ao Êxtase, Aflição e à Segunda Vinda de Cristo.”  

A maioria dos evangélicos, mesmo se eles não compartilhem da agenda detalhada da CUFI, favorece Israel e tem os inimigos de Israel como seus próprios. Este foco em Israel vindo de possivelmente 60 milhões de evangélicos é visto mais poderosamente no Partido Republicano, que incorpora em suas próprias visões, mas isso também tem certo apelo entre os democratas. É concentrado em um número de estados sulistas e fronteiriços, o Cinturão Bíblico, que tem significado que poucos congressistas daqueles estados se sentem predispostos a questionar o que Israel faz. De fato, eles fazem o contrário e frequentemente ovacionam seu amor por Israel, que pode ser ou não genuíno. Alguns congressistas, incluindo o antigo porta-voz da Casa, Dick Armey, do Texas, abraça a agenda total do Armageddon, levando-nos a pensar por que alguém votaria em um político que deseja fervorosamente trazer o fim do mundo.

Este bloco poderoso de sentimento pró-Israel fornece um passe livre para os assentamentos ilegais israelenses e também para a política externa brutal de Tel Aviv com seus vizinhos, que tem prejudicado outros interesses americanos na região. Isso também significa que qualquer consideração dos árabes como partes prejudicadas no rebuliço do Oriente Médio é raramente expressa, apesar de que muitos dos árabes que são vítimas das políticas centradas em Israel são, de fato, vítimas de cristãos.

John Hagee disse falsamente que o Corão conclama todos os mulçumanos a matar cristãos e judeus. A identificação persistente de mulçumanos como inimigos de Israel e também como apoiadores do terrorismo por evangélicos em geral e sionistas cristãos em particular tem levado a um crescimento natural da islamofobia nos estados Unidos. Este preconceito surge da percepção de que o Islã faz parte integral dos problemas do mundo árabe, levando a uma rebelião infeliz naqueles americanos, incluindo congressistas como Peter King e Michelle Bachmann, que acreditam que o Islã é uma religião má e que os mulçumanos deveriam ser monitorados pelas autoridades e mesmo negados de ter alguns direitos civis básicos, ou deportados porque eles não são confiáveis. Em virtude dos armageddonistas acreditarem que haverá um confronto final com as forças do mal, tem sido necessário identificar o inimigo e aquele inimigo é, frequentemente, caracterizado como mulçumano. Hagee construiu este conflito contra o mundo mulçumano como uma resistência futura às investidas satânicas se opondo ao final dos tempos.

Neoconservadores, que geralmente poderiam ser descritos como não-religiosos, rapidamente identificaram as vantagens derivadas de ligar sua causa com a dos evangélicos e estabelecer laços fortes durante a administração Reagan. Israel também reconheceu os benefícios de uma relação próxima e continuada com os sionistas cristãos, mesmo que os líderes de Israel quase que certamente façam cara feia neste caso, achando que a escatologia do retorno de Cristo invejosa para todos os judeus, mas aqueles que se converterem também morrerão e irão para o inferno quando o mundo acabar. Quando grupos como a CUFI organizam suas peregrinações em massa para visitar Israel, eles gastam todo seu tempo em Israel, frequentemente se recusando a visitar os principais sítios cristãos em terras árabes e nunca se encontrando com os cristãos palestinos, que eles não reconhecem como correligionários. Quando os sionistas cristãos se reúnem em Jerusalém eles frequentemente encontram com líderes israelenses, como o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que muitas vezes fala com eles.

Alguns líderes evangélicos, incluindo John Hagee, também tem se beneficiado da relação diretamente de outras formas. O governo israelense presenteou Hagee com um jato executivo, completo com tripulação, para tornar sua evangelização mais confortável. Tem sido sugerido, é claro, que a ajuda americana e contribuições de caridade livres de impostos para Israel são assim redirecionados para apoiar aqueles grupos que inevitavelmente estão desejosos de fornecer ainda mais ajuda até que o poço de Washington finalmente seque.

Portanto, a questão é que o envolvimento do sionismo cristão na política americana em favor da relação de Washington com Israel não tem servido a qualquer interesse nacional americano, a menos que pensemos que Israel e os EUA são essencialmente a mesma forma de governo, o que é insustentável. Pelo contrário, a política sionista cristã tem sido um grande responsável pelo apoio à política externa obtusa dos EUA na região do Oriente Médio e também em outros países mulçumanos, uma política que tem contribuído para pelo menos quatro guerras em quanto torna o mundo um lugar mais perigoso para se viver para todos os americanos. O sionismo cristão promoveu uma política externa que serve apenas a um interesse restrito paroquial que, ironicamente, é pretendido fazer qualquer coisa para trazer o fim do mundo, possivelmente uma vitória para cavalheiros como o pastor John Hagee, se sua interpretação da Bíblia é correta, mas inegavelmente um desastre para o resto de nós.

http://original.antiwar.com/giraldi/2013/02/13/towards-a-christian-zionist-foreign-policy/

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