Frota
se alistou voluntariamente no 8º Batalhão de Caçadores da Reserva, aos 20 anos,
e participou dos 87 dias de peleja, que duraram até 2 de outubro.
"Ele foi a pé de São
Paulo a Santos", conta Antonio Augusto da Rocha Frota, 57, filho do
soldado. Foi Antonio quem abriu o baú de fotos e cartas à sãopaulo. O
material estava guardado há mais de 80 anos.
O primeiro destino do praça foi Santos.
De prontidão, Frota e os outros soldados achavam que a marinha de Getúlio
estava chegando durante a madrugada, mas era só o brilho da estrela Dalva
refletido no oceano. O alarme falso foi um presságio. Na sequência, forças
federais impuseram um bloqueio ao porto de Santos, ação que asfixiou São Paulo
economicamente e impediu o abastecimento de novas armas para os rebeldes
constitucionalistas.
ESTADO ADENTRO
Ao longo dos três meses que serviu ao
Estado, o soldado ziguezagueou por nove cidades no litoral e no interior. Na
correria, nem sempre conseguia contar as novas à mãe, para quem escreveu cerca
de 50 cartas: "Estou bem", resumia a mais lacônica delas.
Em outras, reclamava do frio do inverno
daquele ano, que foi ultrarrigoroso, e da garoa paulista ao cair da noite.
Também não lhe agradavam as viagens no "trem da morte" em direção às
fronteiras de São Paulo.
Uma das correspondências conta que ele
foi atingido por estilhaços de um morteiro. Nada grave. Acabou sendo derrubado
mesmo por uma gripe. Do hospital onde se internou para tratar da virulência,
escreveu: "Vou pedir ao médico dispensa de três dias para ir à missa. A
saúde de todos é o meu desejo". Ao final das cartas, pedia a bênção da
mãe, como era de praxe.
O que mais o motivava era o reencontro
com ela, que ficou esperando pelo filho no sobrado da rua José Maria Lisboa,
nos Jardins, cuidando dos 11 irmãos do aspirante.
Nos textos para a mãe, o praça nunca
mencionou quantos soldados abateu. Aos filhos, disse que viu colegas tombarem
em Queluz, cidade da região de Guaratinguetá, quando as tropas já não tinham
mais munição.
Frota não escreveu cartas longas porque
os militares não permitiam tais liberalidades.
Ao voltar, Frota foi trabalhar no Banespa por influência de seu padrinho, Altino Arantes —então presidente do Estado de São Paulo. Casou-se com Alice e teve dois filhos, Antonio e Maria de Fátima. Morreu em 1971, ao 59 anos, de leucemia.
A DATA
O
conflito começou em 9 de julho de 1932, data que marca o início da Revolução
Constitucionalista. São Paulo, sem aliados, entrou em guerra contra o resto do
país. O objetivo da insurgência era derrubar o governo provisório de Getúlio
Vargas e promulgar uma nova Constituição.
O
número de mortos durante os três meses de levante é controverso. Segundo o
livro "1932: Imagens de uma Revolução" (ed. Imprensa Oficial), de
Marco Antônio Villa, houve 634 baixas do lado paulista e 1.050 do federal.
Revolução Constitucionalista de 1932
A
Revolução Constitucionalista de
1932 aconteceu em São Paulo e foi uma insurreição contrária
ao novo quadro político que se instaurou no país após a Revolução de 1930.
As elites paulistas, as classes mais
favorecidas pelo sistema que vigorou na Primeira República, almejavam, com essa
agitação, reaver o domínio político que haviam perdido com a Revolução de 1930.
Além deste fato, a demora do governo provisório de Getúlio Vargas em convocar a
Assembleia Constituinte suscitava muita insatisfação, especialmente no Estado
de São Paulo. No começo do ano de 1932, o Partido Republicano Paulista (PRP) e
o Partido Democrático (PD) lançam uma campanha a favor da Carta Constitucional
do país e do término da interferência federal nos estados.
A repercussão popular é grande, o
sentimento de patriotismo brota nos corações paulistas, tornando mais forte o
ideal de liberdade e a disposição de se lutar por ele. No dia 23 de maio de
1932, durante a realização de um ato político no centro da cidade de São Paulo,
a polícia coíbe os manifestantes, ocasionando a morte de quatro estudantes. Em
homenagem a esses quatro jovens, o movimento passa a chamar-se MMDC – iniciais
de Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo, os mortos – e amplia a base de apoio
entre a classe média. Em 9 de julho começa a rebelião armada, está deflagrada a
Revolução Constitucionalista. Um grande número de civis ingressa
espontaneamente no corpo de infantaria e é transferido para as três grandes
frentes de batalha, no limite entre Minas Gerais, Paraná e Vale do Paraíba.
O Estado se mobiliza, milhares de
pessoas de todas as classes sociais doam pratarias, jóias e alianças para
ajudar financeiramente a revolução e a Federação das Indústrias do Estado de
São Paulo – Fiesp – incumbiu as empresas brasileiras de fabricar armamento
militar.
Organizações civis forneciam fardas,
auxílio, alimento e ajudavam na inscrição de voluntários. Todo o Estado, unido,
trabalhava com garra para a vitória da causa paulista.
Os comandantes militares, Isidoro Dias
Lopes, Bertoldo Klinger e Euclydes Figueiredo, no entanto, sabiam que as forças
federais eram superiores. Eles contam com a união e a ajuda garantida por
outros estados, como Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Mas o apoio não chega, e
São Paulo é cercado pelas tropas legalistas. Após ajustes, envolvendo indulto
aos rebeldes e facilidades para o exílio dos líderes civis e militares do
movimento, os paulistas anunciam sua rendição em 3 de outubro de 1932.
Para os
paulistas, a Revolução de 1932 transformou-se em símbolo máximo do estado, a
exemplo da Guerra dos Farrapos para os gaúchos. Lembrada por feriado no dia 9
de julho (desde 1997), a revolução é mais fortemente comemorada na cidade de
São Paulo do que no interior do estado, onde a destruição e as mortes
provocadas pela rebelião são ainda recordadas. A revolução de 1932 é também
muito relembrada nas regiões de divisa, onde se travaram os combates,
especialmente no Vale do Paraíba paulista.
No
restante do país, o movimento, assim como a já citada Guerra dos Farrapos, é
mais lembrado pela versão dos vitoriosos, a de uma rebelião conservadora,
visando a reconduzir as oligarquias paulistas ao poder, colocando esta
tentativa de volta ao poder como algo inaceitável, e de uma rebelião de velado
caráter separatista, que são as versões predominante nos livros didáticos de história
do Brasil.
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