sábado, 11 de abril de 2015

A Marcha do General Sherman para o Mar

Matt Carr

History Today, Vol. 64, Nº 11, nov. 2014


Em 15 de novembro de 1864, 60.000 soldados da União sob o comando do general William T. Sherman abandonaram a cidade em chamas de Atlanta e marcharam em direção da Georgia central para iniciar uma das mais celebradas campanhas da Guerra Civil Americana. Somente dois meses atrás ele se tornara o herói do Norte quando seu poderoso exército de 100.000 homens tomou Atlanta após uma campanha de verão sangrenta, efetivamente salvando o incumbente presidente Abraham Lincoln da derrota nas eleições presidenciais do outono. Foi uma ação que surpreendeu seus contemporâneos. Tendo conquistado “A Entrada para o Sul”, a maioria dos observadores presumiu que Sherman equiparia Atlanta com uma guarnição e se dirigiria para o norte em direção de Virginia, onde os exércitos orientais da União, sob o comando de seu grande amigo Ulysses S. Grant, estava preso em um beco sem saída com o Exército da Virgínia do Norte em torno da capital confederada, Richmond.

Ao tomar Atlanta, Sherman atordoou a Confederação ao ordenar a evacuação de toda a população civil da cidade, aparentemente por motivos puramente militares. Ele então procedeu em transformar a cidade num amontoado de ruínas. Desobedecendo a sabedoria convencional que um exército em avanço deve manter contato com suas linhas de comunicação, ele reduziu o tamanho de sua força quase pela metade e ordenou que seus oficiais destruíssem todas as lojas, fábricas e armazéns que pudessem ser utilizados com fins militares, incluindo a Estrada de Ferro Ocidental e Atlântica, que tinha mantido seus homens abastecidos ao longo do verão.

O destino final de Sherman era a cidade de Savannah, 500 km a leste da costa atlântica, onde ele esperava ser reabastecido pela marinha da União, antes de continuar para o norte em direção da Virgínia. Até então, seu exército ficaria largamente dependente para sua sobrevivência do que pudesse tomar da população local. O plano foi parcialmente planejado para ajudar Grant na Virginia cortando o fluxo de suprimentos para os exércitos confederados e interromper sua comunicação, mas ele tinha também um “objetivo psicológico nebuloso”. Após mais de três anos de conflito violento e aparentemente interminável, Sherman decidiu levar o conflito além do campo de batalha e sujeitar a Georgia a um nível de devastação que poderia fazer sua população perceber que “guerra e ruína são sinônimos”. Ao fazer os civis pagarem o preço por apoiar a guerra, Sherman esperava quebrar a força de vontade da Confederação e demonstrar que sua liderança não tinha mais a habilidade para proteger a população do Sul mesmo em suas próprias casas.

Esta estratégia marcou uma guinada dramática na política da União em relação ao Sul. Quando a guerra começou em abril de 1961, o presidente Abraham Lincoln ordenou que os exércitos da União não confiscassem ou destruíssem propriedade sulista na crença de que os sulistas poderiam ainda voltar à União. Na época em que o exército de Sherman marchou para Atlanta, tal restrição já havia sido abandonada há muito tempo. No verão de 1862, incapaz de transformar as vitórias no campo de batalha em resultados estratégicos e abalado pela popularidade da causa separatista, Lincoln autorizou os exércitos da União a adotar medidas gradativamente duras em uma tentativa de abalar a resistência sulista.

Lei marcial, requisições forçadas e expedições de “forrageamento”, que retirou de comunidades inteiras comida, deportações de cidadãos desleais, ataques destrutivos objetivando destruir os recursos de guerra da Confederação, atos de punição coletiva em resposta a ataques de guerrilha e emancipação de escravos – foram todas inovações da política de “guerra brutal” da União. Poucos generais aplicaram-na de forma implacável quanto Sherman. Um ex-gerente de banco, advogado e superintendente escolar, ele já havia mostrado seu desejo de estender a “mão dura da guerra” aos civis sulistas como governador militar de Memphis, Tennessee em junho de 1862; na destruição de Jackson e Meridian durante as operações de Grant no Mississipi no verão de 1863; e nas represálias contra as guerrilhas confederadas durante a invasão do norte da Georgia em maio de 1864. Sua evacuação de Atlanta o transformou numa figura odiada na imprensa sulista.


A reputação de Sherman como o arqui-inimigo do Sul foi confirmada por sua campanha na Georgia , quando seu exército invadiu o “celeiro do Sul”, atacando fazendas, apreendendo produtos, abatendo ou confiscando gado e demolindo e queimando propriedade. Alvejando a ferrovia da Georgia, eles arrancaram e derreteram os trilhos antes de transformá-los em “gravatas de Sherman” e queimar e demolir estações e armazéns, deixando uma trilha de caos com uma extensão de 80 km. “Ninguém, sem estar lá, pode formar uma ideia apropriada da devastação que será encontrada em nosso caminho,” escreveu um capelão da União: “Milhares de famílias terão suas casas transformadas em cinzas e eles próprios serão transformados em mendigos nas ruas. Levamos literalmente fogo e espada para esta outrora terra orgulhosa e desafiadora.”

A velocidade com a qual os soldados de Sherman atravessaram a Georgia foi em parte devido à ausência de qualquer resistência confederada, assim como sua tática hábil. Ao reduzir as provisões do exército a um mínimo e marchando seus soldados em duas “asas” paralelas cerca de 30 km distantes, os defensores confederados esparsos espalhados pelo Estado foram incapazes de prever o destino de seus oponentes e concentrar suas forças contra eles. Ao invés de atacar cidades bem defendidas, Sherman simplesmente contornou-as para manter a velocidade de avanço de seu exército altamente motivado. Apesar de enfrentar provavelmente a melhor força armada do mundo na época, o presidente confederado, Jefferson Davis, clamou à população para copiar a guerra partisan russa contra Napoleão e transformar a campanha da Georgia na “retirada de Moscou” de Sherman. Foi uma aspiração que jamais se tornou realidade.

Em 21 de dezembro, o exército de Sherman capturou Savannah em triunfante conclusão à “Marcha para o Mar”. As notícias foram comemoradas com exultante aclamação no Norte. Em fevereiro seguinte, ele marchou com seus homens em direção do norte rumo às terras baixas pantanosas da Carolina do Sul, onde ele utilizou as mesmas táticas. Aqui, a destruição foi mais extensiva e mais explicitamente punitiva, quando seus soldados queimaram e pilharam tudo em seu caminho através do Estado já que eles tinham essa terra como o lar espiritual da rebelião e o coração da “aristocracia” escravocrata sulista. “Toda casa, celeiro, cerca e campo de algodão recebe o calor de uma tocha,” observou um sargento de Ohio, “este resultado é revoltante, mas a guerra é um jogo militar e não pode ser civilizado.”

Esta era a visão de muitos soldados da União, que apelidaram a campanha de “marcha da fumaça”. Ela atingiu o máximo em 17 de fevereiro de 1865, após a rendição da capital do estado, Columbia. Apesar do fato de que seus defensores tenham abandonado a cidade, muito de Columbia foi reduzida a pó aquela noite por uma horda de bêbados. Apesar de Sherman ter culpado subsequentemente a cavalaria confederada por provocar os incêndios ao queimar pedaços de algodão, numerosas testemunhas viram seus soldados atear deliberadamente fogo nas casas particulares. Há pouca dúvida que muitos soldados da União, influenciados pelo álcool fornecido pela população local numa tentativa errada de aplacá-los, estavam determinados a queimar a cidade. Se Sherman não ordenou a destruição, ele fez pouco para preveni-la, mesmo que ele estivesse perfeitamente ciente do comportamento de seus homens. De qualquer forma, a “queima de Columbia” serviu aos seus objetivos estratégicos e subsequentemente ele deixou claro que não tinha nenhum remorso. Em 7 de março de 1865, o exército de Sherman entrou na Carolina do Norte, o último estado a se separar. Apesar dos exércitos da União continuarem a destruir fábricas, siderúrgicas e redes ferroviárias, o dano foi mais limitado do que na Carolina do Sul, já que tornou-se claro que a guerra estava chegando ao fim.

Pelo fim de março, os exércitos da União estavam rasgando a Confederação de todos os lados e sua posição tornou-se insustentável. Em 3 de abril, Richmond caiu diante das tropas de Grant à medida que o exército da Virgínia do Norte de Lee recuava para o oeste. Seis dias depois, Lee rendeu-se a Grant em Appomattox. No dia 13, as tropas de Sherman entraram na capital do Estado, Raleigh, e no dia seguinte ele emitiu a Ordem Especial de Campo, Nº 55, que exigia que seus soldados interrompessem “destruição adicional de ferrovias, moinhos, produção de algodão” e garantissem que “os habitantes sejam tratados gentilmente, buscando uma nova reconciliação.” Mesmo após o assassinato de Abraham Lincoln em 15 de abril de 1865, estas ordens continuaram a ser obedecidas. Em 16 de abril, Sherman aceitou de seu grande adversário, o general Joseph E. Johnston, a rendição de 90.000 soldados confederados na Fazenda Bennett próximo a Raleigh, assim retirando o último grande exército confederado da Guerra Civil.             


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