quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Falta de profissionais ameaça o Programa Espacial Brasileiro

Defesanet, 05 de Abril, 2012

A recomposição do quadro de profissionais para o programa espacial brasileiro é uma promessa antiga do governo, mas a falta de uma ação mais efetiva tem provocado uma perda sistemática de recursos humanos no setor, situação que vem piorando com a elevação da faixa etária dos pesquisadores.

"Se não houver uma decisão neste ano, as nossas projeções indicam que em 2020 o Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA) estará próximo de uma situação de colapso, reduzido a 26% do efetivo que possuía em 1994", diz o diretor do órgão, brigadeiro Ailton dos Santos Pohlmann. Segundo ele, a média de idade dos pesquisadores do Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), responsável pelos principais projetos espaciais do país na área de foguetes, é superior a 50 anos.
 
A perda de cérebros no programa espacial é crescente e com a demora em abrir um novo concurso a situação só tende a piorar. "A grande dificuldade daqui para a frente será treinar o pessoal novo, pois os que detêm o conhecimento, adquirido em mais de 20 anos de trabalho e estudos, já terão saído", alerta o presidente da Associação Aeroespacial Brasileira (AAB), Paulo Moraes Jr.
 
O último concurso público autorizado pelo governo para o DCTA foi feito em 2010, mas apenas 93 funcionários foram contratados para atender a todo o órgão, que inclui 11 institutos de ensino e pesquisa e dois centros de lançamento de foguetes. O déficit de pessoal hoje, de acordo com o brigadeiro Pohlmann, é de mais de mil funcionários. Em 2011, mais de 70 servidores deixaram o DCTA.
 
O lançamento do Veículo Lançador de Satélite (VLS) mais uma vez será afetado pela falta de recursos humanos especializados. "Desde 2003, quando aconteceu o acidente com o foguete na base espacial de Alcântara e se perderam 21 especialistas, não houve reposição desse pessoal", ressalta o brigadeiro.
 
O problema já foi relatado por diversas vezes ao governo e mais recentemente, em fevereiro, a direção do DCTA enviou um relatório ao Ministério da Defesa sinalizando que a situação ficará ainda mais crítica com o projeto de duplicação do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), projeto que conta com o apoio pessoal da presidente Dilma Rousseff.
 
A ampliação do ITA deverá ocorre ao longo dos próximos cinco anos, mas já em 2013 a escola vai oferecer o dobro das vagas atuais, ou seja, 240. Atualmente, o ITA recebe 120 alunos por ano, mas de acordo com o reitor, Carlos Américo Pacheco, cerca de 500 estudantes que prestam o vestibular para o instituto, têm nota mínima para entrar. Este ano o ITA recebeu um total de 9.400 inscrições, o que representou um aumento de 20% em relação a 2011.
 
Para ampliar o número de vagas, o ITA também precisará contratar 150 professores no período de cinco a seis anos e cobrir cerca de 50 aposentadorias que deverão acontecer nesse período. A expansão do instituto terá um custo de R$ 300 milhões e as obras estão previstas para começar este ano.
 
"Não é possível duplicar o ITA se não houver a reposição dos quadros. A ampliação da escola exigirá também um aumento significativo na capacidade do DCTA de apoiar essa expansão, na parte de pessoal (contratação de mais professores), infraestrutura de alojamento, alimentação, laboratórios de pesquisa e segurança, entre outros", diz o brigadeiro Pohlmann.
 
No Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) a situação é mais grave na área de gestão, que em dez anos deve perder 70% do pessoal que trabalha no apoio às atividades finais do instituto, devido às aposentadorias. O plano diretor do Inpe para os anos de 2011 a 2015 mostra que em 1989 a instituição tinha 1,6 mil servidores, sendo apenas 50 com mais de 20 anos de serviço. Passados 20 anos, o número de funcionários é de 1.131, dos quais só 300 têm menos de 20 anos de casa. Atualmente, 72% dos engenheiros e tecnologistas do Inpe trabalham há mais de 20 anos na instituição.
 
A área de engenharia de satélites, que recebe os principais recursos do orçamento do instituto também preocupa bastante a direção do Inpe. Segundo o coordenador de Gestão Tecnológica do instituto, Marco Antônio Chamon, em cinco anos o número de funcionários desse setor deverá cair de 132 para 89. "Em dez anos estimamos que esse número esteja reduzido a 33 pessoas", afirma.
 
São essas mesmas pessoas que trabalham hoje no ambicioso programa de satélites do Inpe, que prevê lançar até 2014 três satélites. Entre 2015 e 2020, estão previstos mais dois satélites em parceria com a China, um em parceria com a Argentina, um satélite com a Agência Espacial Americana (Nasa) e três satélites nacionais.
 
"Não temos hoje condições de fazer dois satélites ao mesmo tempo", afirma Chamon. O satélite CBERS-3, feito com a China, segundo ele, será lançado no fim deste ano e desde fevereiro uma equipe de 30 a 50 técnicos e engenheiros do Inpe está no país para trabalhar na integração e testes finais do satélite. "Eles ficarão por lá até o lançamento do satélite e isso certamente reduziu o ritmo de trabalho de outros projetos, pois não há substituto para esse tipo de especialista."
 
O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) liberou a abertura de concurso público para a contratação de 107 servidores para o Inpe em 2012, mas a instituição precisa de um mínimo de 400 contratações para repor especialistas em setores considerados estratégicos, como meteorologia, controle de satélites, ciência espacial e engenharia de satélites.
 
"Assim como nas universidades, precisamos de mecanismos que nos permitam repor nossos quadros de maneira sistemática, pois assim é possível preservar o conhecimento e transferi-lo aos poucos", explica.
"Há oito anos que o sindicato vem insistentemente cobrando as autoridades do governo federal sobre a contratação urgente de servidores para o Inpe e o DCTA. As poucas contratações que aconteceram foram temporárias, o que na área de ciência e tecnologia chega a ser uma estupidez," protesta o vice-presidente do Sindicato Nacional dos Servidores Públicos Federais na Área de Ciência e Tecnologia do Setor Aeroespacial (SindiCT), Fernando Morais Santos.
 
O Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos do Inpe (CPTEC), responsável pela produção de informações meteorológicas diárias e climáticas, possui hoje um total de 148 funcionários. Desses, cerca de 80 são contratados em regime temporário. "São atividades que não podem parar e esse pessoal temporário só tem mais dois anos para ficar no CPTEC", ressalta.
 
Entre os funcionários temporários do CPTEC, segundo Chamon, existe um grupo de 15 programadores, responsáveis por manter o supercomputador do centro em funcionamento, que encerram o contrato com a instituição no segundo semestre deste ano. "Sem esse pessoal não tem como fazer a previsão do tempo, pois são eles que colocam as informações que rodam no supercomputador", afirma Chamon.
 
Recursos escassos ameaçam projetos
 
A modernização da base de lançamento de foguetes em Alcântara, no Maranhão e o desenvolvimento de veículos lançadores e de satélites estão entre as prioridades do governo federal na área espacial. Esses projetos já têm, inclusive, recursos garantidos da ordem de R$ 2,2 bilhões até 2015, conforme previsto no plano plurianual 2012-2015.
 
Embora estejam na lista de prioridades de investimentos, alguns projetos ainda sofrem com a insuficiência de recursos. Somados à falta de especialistas em diversas áreas, os planos do governo nessa área poderão ser afetados. O lançamento do foguete VLS (Veículo Lançador de Satélite), por exemplo, que estava previsto para o início de 2013, deverá ser adiado. "Para cumprir a meta de lançamento no ano que vem precisamos de R$ 55 milhões e para este ano só temos disponível um pouco mais de R$ 16 milhões", revela o diretor do DCTA, brigadeiro Ailton dos Santos Pohlmann.
 
Os projetos que não estão na indústria, como os foguetes, são os mais afetados pelos constantes contingenciamentos de recursos e a falta de pessoal. "O setor de aerodinâmica de foguetes do Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE) já teve 18 especialistas. Hoje tem apenas quatro", comenta o presidente da AAB, Paulo Moraes. O pesquisador, que trabalha no IAE, ressalta que não está sendo formado um número suficiente de engenheiros no Brasil para atender às novas iniciativas do governo, das empresas de tecnologia e também a uma indústria de defesa em fase de crescimento.
 
Com 11 institutos e dois centros de lançamento de foguetes, em Alcântara, no Maranhão, e em Natal (RN), o DCTA é o órgão da Aeronáutica que executa e coordena os principais projetos do governo na área de defesa. O programa de lançadores VLS e o Cruzeiro do Sul, que seria uma nova geração de foguetes, são os mais conhecidos.
 
A lista de responsabilidades do DCTA, no entanto, inclui ainda outros programas de vulto, como o da aeronave de transporte militar KC-390, que está sendo desenvolvida pela Embraer, o processo de seleção das novas aeronaves de combate F-X2 e de todos os mísseis utilizados pela Força Aérea Brasileira (FAB), que hoje estão sendo produzidos pelas empresas Mectron, controlada pelo grupo Odebrecht, e Avibras.
 
O DCTA também coordena a compra de outras aeronaves, como os 56 helicópteros que estão sendo adquiridos da Helibras para as Forças Armadas, os Super Tucano produzidos pela Embraer, a modernização da frota de aeronaves F-5 e AMX e o desenvolvimento de veículos aéreos não tripulados.
 
Fuga de pesquisadores ameaça projetos da Agência Espacial
 
Defesanet, 23 de Maio, 2012
 
A Agência Espacial Brasileira (AEB) é uma autarquia do governo brasileiro de natureza civil, que está vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). Criada em 10 de fevereiro de 1994, pela lei nº 8.854, tem por finalidade promover o desenvolvimento das atividades espaciais brasileiras de forma descentralizada.
 
Para nortear estas ações e definir diretrizes, a AEB atua na coordenação central do Sistema Nacional de Desenvolvimento das Atividades Espaciais (SINDAE) e tem a responsabilidade de formular a Política Nacional de Desenvolvimento das Atividades Espaciais (PNDAE) e de formular e implementar o Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE), cujas atividades são executadas por outras instituições governamentais que compõem o sistema.
 
Atualmente a AEB está sob controle civil, anteriormente estava sob controle militar. Alguns atribuem a pressões dos Estados Unidos por esta mudança. Outros acreditam que foi decorrente da mudança de foco do programa espacial, decorrente da chegada de civis à Presidência da República.

O novo presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB), José Raimundo Braga Coelho, que toma posse oficialmente hoje em Brasília, pretende seguir adiante com o programa de lançadores, aumentar a participação das empresas e universidades brasileiras nos projetos, assim como lançar no prazo estabelecido pela presidente Dilma o primeiro satélite geoestacionário brasileiro, com base num empreendimento público-privado entre Telebras e Embraer.


José Raimundo Braga Coelho já trabalhou como chefe de cooperação internacional e de gabinete de Raupp no tempo em que ele era diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais(Inpe), entre 1985 e 1989. Foi no Inpe também que Coelho coordenou a área de engenharia e tecnologia e o programa de satélites feito com a China (CBERS), do qual participou desde o início.
 
Valor: Qual o orçamento da AEB para este ano?
 
Coelho: A nossa marca era da ordem de R$ 350 milhões, mas como todos sabem, o setor público brasileiro sofreu cortes. De forma que nós temos um número menor, mas ainda não tenho o valor preciso, pois estamos discutindo outras possibilidades. Estamos chorando junto ao governo para atender algumas necessidades que são prioritárias no nosso programa. E tem também um valor contingenciado, que estamos batalhando para que seja reincorporado ao orçamento da Agência.
 
Valor: Os cortes do orçamento vão afetar quais projetos?
 
Coelho: Com exceção do projeto CBERS-3, que será lançado até novembro, todos os grandes projetos terão de ser analisados. O caso do satélite CBERS é diferente porque, tecnicamente, todas as questões estão resolvidas e as previsões orçamentárias para o custeio estavam viabilizadas.
 
Valor: Como a AEB pretende tratar a questão do esvaziamento de pesquisadores no Inpe e no DCTA, um problema que vem se agravando com o aumento das aposentadorias de profissionais?
 
Coelho: Nós sabemos da dificuldade grande de reposição dos quadros nos nossos institutos, mas eu acho que deveria haver uma análise crítica e precisa da situação dos recursos humanos. Todas as pessoas que foram contratadas para o desenvolvimento de satélites estão realmente trabalhando nisso? Precisamos reavaliar se o que está sendo feito hoje pelos institutos está de acordo com a demanda das políticas públicas. A partir daí faríamos uma proposta mais convincente de reposição dos nossos recursos humanos para o governo.
 
Valor: O DCTA e o Inpe já estão prevendo um colapso no andamento dos projetos, caso não haja uma solução a curto prazo.
 
Coelho: Nós temos alertado o governo da importância de se manter essa massa crítica de conhecimento dos institutos, mas no caso de projetos pontuais, onde existe uma necessidade urgente de se contratar pessoas, não vejo problema em realizar contratos temporários. Alguns projetos também poderiam ser feitos na indústria, depois de passar por um processo de qualificação dentro dos Institutos.
 
Valor: O modelo de gestão do Satélite Geoestacionário Brasileiro, com Embraer e Telebras, vai servir de referência para outros projetos?
 
Coelho: A iniciativa de se constituir uma empresa integradora na área espacial no Brasil pode gerar muitos "spin offs" (criação de uma empresa a partir de uma tecnologia ou de outra empresa) daqui por diante. Que poderão ser úteis para vários segmentos das atividades espaciais.
 
Valor: Mas o satélite será comprado no exterior. Quais seriam as possibilidades de transferência de tecnologia neste caso?
 
Coelho: Através de cláusulas de "offset" ou acordos de contrapartida na área comercial, industrial e tecnológica. Essa empresa tem compromisso de trazer o satélite brasileiro, não quer dizer necessariamente que ele vai ser totalmente fabricado no país. Não será no Brasil em função de um cronograma muito apertado. (VS)
 
 

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