Eu vejo muitos posts de pessoas em redes sociais associando os regimes fascistas (fascismo italiano, nazismo, peronismo, franquismo, etc.) à esquerda. A razão por trás disso não tem nenhum fundamento econômico e ideológico, e sim por conveniência política.
O primeiro passo é esclarecer o que é "socialismo":
"O socialismo não é uma filosofia de doutrina e programa fixos; seus ramos defendem um certo grau de intervencionismo social e racionalização econômica (geralmente sob a forma de planejamento econômico), às vezes opostos entre si. Uma característica da divisão do movimento socialista é a divisão entre reformistas e revolucionários sobre como uma economia socialista deveria ser estabelecida. Alguns socialistas defendem a nacionalização completa dos meios de produção, distribuição e troca, outros defendem o controle estatal do capital no âmbito de uma economia de mercado."
* O socialismo libertário (incluindo o anarquismo social e o marxismo libertário) rejeita o controle estatal e de propriedade da economia e defende a propriedade coletiva direta dos meios de produção através de conselhos cooperativos de trabalhadores e da democracia local de trabalho.
* O socialismo científico, cujos teóricos propunham compreender a realidade e transformá-la mediante a análise dos mecanismos econômicos e sociais do capitalismo, constituindo, assim, uma proposta revolucionária do proletariado. A luta de classes, na análise marxista, é o agente capaz de transformar a sociedade. Num primeiro momento, o controle do Estado ficaria na mão da ditadura do proletariado, quando ocorreria a socialização dos meios de produção através da eliminação da propriedade privada. Numa etapa posterior, a meta seria o comunismo perfeito, onde todas as desigualdades sociais e econômicas, além do próprio Estado, acabariam.
* o socialismo cristão, uma tentativa de aplicar os ensinamentos de Cristo sobre amor e de respeito ao próximo aos problemas sociais gerados pela industrialização. Em 1891, o papa Leão XIII lançou a encíclica Rerum Novarum, em que reconhecia o direito à propriedade privada e rejeitava o fortemente ateu socialismo científico de Marx.
* o socialismo real ou "socialismo autoritário", devido ao terror político implementado pelos diversos regimes socialistas que existiram no mundo. Como consequência do socialismo real, a semântica do termo "socialismo" foi alterada profundamente ao longo do século XX, sendo hoje associada por alguns ao totalitarismo e ao desrespeito aos direitos humanos. atualmente, muitas correntes de pensamento divergem acerca do socialismo. Algumas não crêem que as experiências taxadas de socialistas (a União Soviética sendo o maior exemplo) possam realmente ser assim consideradas, por não terem se mantido fiéis às propostas dos pensadores originais - já que os meios de produção pertenciam ao Estado controlado por burocratas e não pelo povo trabalhador. Além disso, o Estado aumentou o seu controle ao invés de diminuir, ainda havia salários e, portanto, a existência da mais-valia, fonte de lucro da burguesia. Deste modo, não acabou a exploração e sim modificou-se quem explorava, conservando os mesmos instrumentos de exploração capitalista.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Socialismo
Agora, o que são regimes liberais com economia capitalista:
O Liberalismo econômico é a crença ideológica na organização da economia em linhas individualistas, o que significa que o maior número possível de decisões econômicas são tomadas por indivíduos e não por instituições ou organizações coletivas.
Economistas liberais e libertários pró-capitalismo veem a posse privada dos meios de produção e o mercado de câmbio como entidades naturais e direitos morais, fundamentais para independência e liberdade. As maiores críticas ao sistema socialista baseiam-se na distorção sistema de preços, o que impossibilitaria um planejamento econômico eficiente. Hayek escreveu em "O Caminho da Servidão" que qualquer tentativa de controlar a economia implica numa concentração de poder estatal e na diminuição da liberdade política. O socialismo terminaria sendo um sistema econômico em que um indivíduo ou grupo de indivíduos controla os demais membros da sociedade mediante a coerção e a compulsão organizada. Exemplos de governos totalitários nesses moldes foram a URSS, especialmente durante o regime de Josef Stalin, a China de Mao Tse-tung e outros experimentos na África e na Ásia.
Outro ponto fundamental é o fato de que todos os agentes econômicos são movidos por um impulso de crescimento e desenvolvimento econômico, que poderia ser entendido como uma ambição ou ganância individual, que no contexto macro traria benefícios para toda a sociedade, uma vez que a soma desses interesses particulares promoveria a evolução generalizada, um equilíbrio perfeito.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Liberalismo_econ%C3%B3mico
E, finalmente, dentro das estruturas capitalistas, o Keynesianismo:
A escola Keynesiana ou Keynesianismo é a teoria econômica consolidada pelo economista inglês John Maynard Keynes em seu livro Teoria geral do emprego, do juro e da moeda (General theory of employment, interest and money)1 e que consiste numa organização político-econômica, oposta às concepções liberais, fundamentada na afirmação do Estado como agente indispensável de controle da economia, com objetivo de conduzir a um sistema de pleno emprego. As políticas econômicas intervencionistas foram inauguradas por Roosevelt com o New Deal, que respaldaram, no início da década de 1930, a intervenção do Estado na Economia com o objetivo de tentar reverter uma depressão e uma crise social que ficou conhecida como a crise de 1929 e, quase simultaneamente, por Hjalmar Horace Greeley Schacht na Alemanha Nazista.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Escola_keynesiana
Agora vamos às ideologias fascistas:
Fascismo é uma forma de radicalismo político autoritário nacionalista que ganhou destaque no início do século XX na Europa. Os fascistas procuravam unificar sua nação através de um Estado totalitário que promove a mobilização em massa da comunidade nacional, confiando em um partido de vanguarda para iniciar uma revolução e organizar a nação em princípios fascistas. Hostil à democracia liberal, ao socialismo e ao comunismo, os movimentos fascistas compartilham certas características comuns, incluindo a veneração ao Estado, a devoção a um líder forte e uma ênfase em ultranacionalismo, etnocentrismo e militarismo.
O fascismo tomou emprestado teorias e terminologias do socialismo, mas aplicou-as sob o ponto de vista que o conflito entre as nações e raças fosse mais significativo, do que o conflito de classes e teve foco em acabar com as divisões de classes dentro da nação. Defendeu uma economia mista, com o objetivo principal de conseguir autarquia para garantir a auto-suficiência, e a independência nacional através do protecionismo e políticas econômicas que intercalam intervencionismo e privatização. O fascismo sustenta o que é, às vezes, chamado de "Terceira Via" entre o capitalismo e o socialismo marxista.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Fascismo
Finalmente, para acabar com as dúvidas. "As privatizações no Chile e na Grã-Bretanha, implementadas no início dos anos 1970 e 1980 são geralmente consideradas as primeiras políticas de privatizações da era moderna. Apesar da literatura geralmente falhar em informar, o governo nazista da Alemanha nos anos 1930 estabeleceu uma política de privatizações em larga escala... As firmas pertenciam a um grande número de setores: aço, mineração, setor bancário, portuário e ferroviário."
http://economistsview.typepad.com/economistsview/2006/09/nazi_privatizat.html
Isto posto, esclarecidas as diferenças, vemos que se trata de um erro dizer que o fascismo é uma ideologia de "esquerda", no sentido marxista do termo. E tampouco ele seria de extrema-direita, pois como vimos é uma "terceira via" entre o capitalismo e o socialismo marxista. Então por que a confusão?
A direita diz que o fascismo é de esquerda porque (1) Havia um Estado autoritário que intervinha na economia e na vida individual e (2) o totalitarismo fascista provocou a Segunda Guerra e o consequente extermínio de milhões.
A esquerda diz que o fascismo é direita porque (1) suprimiu os sindicados e atuava na economia para aumentar a riqueza dos capitalistas e (2) perseguiu socialistas e outros opositores do regime.
Ou seja, como uma "batata quente", nenhum dos lados quer segurar esse "filho bastardo" da política.
Eu continuo defendendo a tese que o fascismo - e seus diversos ramos - deveria ser classificado à parte no espectro político. Infelizmente, jogar o fascismo de um lado para o outro tem suas vantagens políticas. Para a direita, facilita associar a esquerda a regimes assassinos e tirânicos; para a esquerda, facilita associar tudo aquilo que é reacionário, antisocial e explorador à direita.
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http://epaubel.blogspot.com.br/2013/02/pol-nazismo-fascismo-e-marxismo-qual.html
3 comentários:
"A direita diz que o fascismo é de esquerda porque (1) Havia um Estado autoritário que intervinha na economia e na vida individual e (2) o totalitarismo fascista provocou a Segunda Guerra e o consequente extermínio de milhões.
A esquerda diz que o fascismo é direita porque (1) suprimiu os sindicados e atuava na economia para aumentar a riqueza dos capitalistas e (2) perseguiu socialistas e outros opositores do regime." -
Concordo que não dá pra classificar o fascismo simplesmente como de esquerda, mas acho que na prática ele se aproxima mais dos regimes de esquerda do que dos liberais.
Tanto os fascistas quanto os socialistas eram mais coletivistas que individualistas e mais pra totalitários que democráticos.
E a esquerda tambem perseguiu sindicatos e socialistas (que não fossem alinhados com o poder dominante).
O liberalismo político-econômico havia caído em descrédito em toda parte, por causa do crash da bolsa em 1929 e da subseqüente grande depressão. Somente veio a ser restaurado na década de 80, com Reagan e Thatcher. Na década de 1930, praticamente nenhum país adotava o liberalismo econômico, nem os Estados Unidos, onde Franlin Roosevelt adotou o "new deal". A tese do "fascismo de esquerda" é uma invenção recente, da lavra do escritor americano Jonah Goldberg, autor de um panfleto histérico e tendencioso intitulado "Liberal Fascism", que tenta à força equiparar Roosevelt, Hitler, Stalin, Bill e Hillary Clinton.
As tentativas de 'esquerdizar' os fascismos não levam em conta que os regimes fascistas ascenderam com o consentimento dos conservadores e com a oposição da esquerda, em muitos casos violenta, como na Espanha (a propósito, não vejo ninguém querendo provar o 'esquerdsimo' de Franco)e na própria Alemanha, onde a SA travava lutas nas ruas com os comunistas.
Os fascistas se caracterizavam como anticomunistas, e embora se opusessem ao liberalismo econômico - antes de Jonah Goldberg, não era considerado essencial ser pró-mercado para ser 'direitista' - não pretenderam abolir a propriedade privada, nem combater desigualdades sociais - evidentemente, o igualitarismo é anátema para ideologias como a nazista, baseadas na desigualdade de raças.
Põe-se, diante de nós, uma dicotomia: liberdade individual versus poder estatal. Nesta oposição, pode-se muito bem identificar o que seja esquerda ou direita nos dias atuais. Todavia, não digo que estou certo, mas é um modo mais sistemático de ver as coisas e é praticamente impossível se dissociar disso. A convenção direita-esquerda, ao meu ver, a propósito, é até despropositada: o que está em jogo é o bem estar do indivíduo e sem liberdade não existe bem estar!
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