Fumaça Humana (Companhia das Letras, 2010) de Nicholson Baker é um livro meticulosamente pesquisado e bem construído, demonstrando que a Segunda Guerra Mundial foi uma das maiores e mais cuidadosamente planejadas mentiras da história moderna. Ele questiona a crença geralmente aceita de que os Aliados queriam evitar a guerra a todo custo, mas foram forçados a agir pela cruzada imperdoável de Hitler. O livro consiste grandemente em transcrições oficiais governamentais e outros documentos da época. Baker cita documentos sugerindo que os líderes dos Estados Unidos e do Reino Unido provocaram a Alemanha à guerra (mostrando, por exemplo, que a Grã-Bretanha bombardeou a Alemanha antes dos alemães bombardearem a Inglaterra) e que os líderes daquelas duas nações tinham motivos secretos para querer participar.
Os fatos são indiscutíveis. Baker mostra, passo a passo, como uma aliança dominada por líderes que eram intolerantes, mais opostos ao comunismo do que ao fascismo, obcecados por venda de armas e desejando por uma luta conduziu o mundo à guerra.
O anti-semitismo era predominante entre os Aliados. De Franklin Roosevelt, Baker nota que em 1922, quando ele era advogado em Nova York, “observou que os judeus representavam um terço dos calouros em Harvard” e usou sua influência para estabelecer uma cota para os judeus naquela instituição. Por anos ele impediu ajuda à judiaria européia e, tão tarde quanto 1939, ele desencorajou a aprovação da lei Wagner-Rogers, uma tentativa do Congresso para salvar as crianças judias. O Primeiro-Ministro Neville Chamberlain disse em 1939 do tratamento alemão dos judeus que “sem dúvida os judeus não são um povo amável. Eu mesmo não me importo com eles.” Uma vez começada a guerra, Winston Churchill queria prender os refugiados judeus alemães porque eles eram alemães. Que facilidade tal liderança deve ter sido para os nazistas, que, de acordo com o New York Times de 3 de dezembro de 1931, estavam tentando bolar uma maneira de se livrar dos judeus da Alemanha sem “despertar a opinião estrangeira.”
Como o livro de Baker deixa claro, entre as duas guerras mundiais, o comunismo, e não o fascismo, era o inimigo. David Lloyd George, que foi Primeiro-Ministro da Grã-Bretanha durante a Primeira Guerra Mundial, alertou em 1933, ano em que Hitler chegou ao poder, que se os Aliados tentassem derrubar o Nazismo, “o que viria em seu lugar? Comunismo extremista. Certamente esse não pode ser nosso objetivo.” Mas mesmo maior que os comunistas, o inimigo número um de Churchill nos anos 1920 e início dos anos 1930 era Mohandas Gandhi e sua doutrina de não-violência, a qual Churchill alertou “mais cedo ou mais tarde, terá que ser combatida e finalmente esmagada.”
Churchill é uma figura dominante em “Fumaça Humana”, descrito como um belicista sanguinário que, em 1922, ainda lamentava o fato de a Primeira Guerra Mundial não ter durado um pouco mais de modo que a Grã-Bretanha pudesse ter tido a oportunidade de sua força aérea bombardear Berlim e “o coração da Alemanha”. Mas não, ele lamentou, ela tinha que parar, “devido ao nosso baixo estoque de alemães e inimigos.”
As políticas perseguidas por Churchill não poderiam estar mais longe desta demanda clara por jus in bello (limitação da ação agressiva). Como Primeiro Lorde do Almirantado na Primeira Guerra Mundial, ele supervisionou o bloqueio de suprimentos britânico da Alemanha. Ao determinar a fome entre a população alemã, Churchill esperava minar a máquina de guerra alemã a partir do interior.
“O bloqueio britânico,” mais tarde escreveu Churchill, “tratou a Alemanha por inteiro como uma fortaleza cercada, e admitidamente decidiu levar á fome a população inteira – homens, mulheres, crianças, jovens e velhos, feridos e sãos – até a submissão.
O armistício de 11 de novembro de 1918, não terminou com o bloqueio. Churchill continuou com ele até os alemães assinarem o Tratado de Versalhes em 1919. Ele disse em 3 de março de 1919,
“Estamos reforçando o bloqueio com rigor... É repugnante à nação britânica usar esta arma de fome, que cai principalmente sobre mulheres e crianças, sobre os velhos e fracos e pobres, após toda luta ter cessado, (mas) um momento a mais é necessário para garantir os termos justos pelos quais estávamos lutando.”
Tal desumanidade não é nem mesmo uma desculpa para a necessidade militar. Tivessem os alemães recusado a assinar, eles estariam indefesos contra uma tentativa inglesa e francesa de obrigá-los a fazer isso.
Baker não menciona isto, mas a geração jovem que cresceu sob estas condições medonhas tinha uma grande afinidade pelo Nazismo. O historiador da UCLA (N. do T.: Universidade da Califórnia) Peter Loewenberg, em seu artigo importante, “As Origens Psicohistóricas da Juventude Nazista” (American Historical Review, dezembro de 1971, pp. 1457-1502) documentou isto extensivamente. A política de Churchill ajudou, assim, a criar o regime nazista que ele mais tarde estaria determinado a destruir.
Churchill poderia ter dito das leis da guerra o que Jonathan Swift (N. do T.: autor de “As Viagens de Gulliver”) falou das promessas, qual seja, assim como a casca de um pão, elas foram “feitos para serem quebradas”. Baker mostra que no jornal The Aftermath, publicado em 1929, Churchill disse que tivessem os alemães não capitulado em 1918, uma campanha maciça contra o povo germânico teria trazido a guerra para um fim.
Mas o que tinha acontecido não foi nada comparado ao que teria acontecido se os alemães continuassem lutando em 1919, disse Churchill. Gases venenosos de “terrível malignidade” teriam encerrado toda resistência. “Milhares de aviões teriam reduzido a pó suas cidades.”
Dado este registro lamentável, não é de surpreender que o reinício de uma guerra mundial em setembro de 1939, a qual resultou na volta de Churchill ao Gabinete britânico como Primeiro Lorde do Almirantado, tenha trazido um novo bloqueio de fome à Alemanha. Herbert Hoover (N. do T.: antecessor de Roosevelt na presidência) protestou veementemente: era realmente uma tática de guerra aceitável levar à fome mulheres e crianças inocentes? Churchill não se emocionou e manteve o bloqueio.
Churchill não era movido pelo anti-fascismo. Em seu livro “Grandes Contemporâneos”, de 1937, ele descreveu Hitler como “um funcionário altamente competente, calmo e bem-informado com maneiras educadas.” O mesmo livro atacou ferozmente Leon Trotsky. (O que havia de errado com Trotsky? “Ele era ainda um judeu. Nada podia superar isso.”) Churchill repetidamente elogiou Mussolini por seu “jeito gentil e simples.” Em 1927, ele disse a uma platéia romana, “Se eu fosse um italiano, com certeza que eu estaria com vocês do começo ao fim na sua luta vitoriosa contra os interesses e paixões bestiais do Leninismo.” Churchill considerava o fascismo “um antídoto necessário para o vírus russo,” escreve Baker. Em 1938, ele lembrou à imprensa que se a Inglaterra fosse derrotada numa guerra, ele esperava que “pudéssemos encontrar um Hitler para nos liderar de volta para a nossa posição correta entre as nações.”
Em uma situação, Churchill foi capaz de aumentar sua reputação estratosférica de crueldade. Na guerra anterior, os bombardeiros não haviam sido usados em campanhas de terror contra civis. Teóricos militares após a guerra, como o italiano Giulio Douhet (não mencionado em “Fumaça Humana”) anteviu que a próxima guerra seria caracterizada decisivamente pelo bombardeio em massa. Churchill era um ardente defensor deste ponto de vista, e quando ele tornou-se Primeiro-Ministro, imediatamente instituiu a política de bombardeio civil. Baker talentosamente cita o funcionário do Ministério Aeronáutico britânico James Spaight lembrando que foi a Inglaterra, e não a Alemanha, que começou esta política repulsivamente imoral, condenada publicamente durante a guerra pelo corajoso bispo George Bell.
Foi na segunda noite do mandato de Churchill como Primeiro-Ministro… “Começamos a bombardear objetivos na pátria alemã antes de os alemães começarem a bombardear objetivos na pátria britânica.” (escreveu Spaight)
(As críticas ao bombardeio provavelmente custaram a Bell sua chance de suceder William Temple como Arcebispo de Canterbury.)
A última informação de Baker no livro é de 31 de dezembro de 1941, quando a campanha de bombardeio ainda não havia atingido o nível de selvageria do de Hamburgo e Dresden, mas a essência da política já estava em andamento.
Churchill não foi o único defensor do bombardeamento em massa: a política infelizmente tinha grande apelo popular. Baker cita nesta conexão algumas observações do esquerdista britânico Gerald Brenan: “Toda mulher e criança alemã morta é uma contribuição para a segurança e felicidade futuras da Europa,” escreveu Brenan.
Franklin Roosevelt rivalizou com sua contraparte britânica em seu desrespeito às regras da guerra civilizada. Antes mesmo do ataque japonês a Pearl Harbor naquela “data que viverá na infâmia,” 7 de dezembro de 1941, Roosevelt esperava que os chineses bombardeassem as maiores cidades do Japão. Por causa da presença da proximidade de construções de madeira, cidades inteiras poderiam ser rapidamente colocadas em chamas. É claro, os ataques de bombardeio americanos em Tóquio mostraram que Roosevelt estava perfeitamente certo em suas expectativas dos resultados horripilantes de tais bombardeios.
Baker afirma corretamente que Roosevelt estava ansioso pela confrontação com os japoneses. A colocação da Frota do Pacífico em Pearl Harbor por Roosevelt foi pensada como uma provocação a eles, e o comandante-em-chefe da Frota do Pacífico, Almirante James O. Richardson, protestou contra isto em várias ocasiões. Roosevelt eventualmente respondeu demitindo Richardson do seu posto.
As ofensas morais de Churchill e Roosevelt não estavam confinadas a violações das leis de guerra. Da época da ascensão de Hitler ao poder, 30 de janeiro de 1933, estava claro que os nazistas viam os judeus como seus arquiinimigos. Hitler desejava expulsá-los da Alemanha, e aqueles que desejassem emigrar eram encorajados ativamente a fazê-lo. Aqueles que ficaram viram sua situação tornar-se gradativamente precária.
Roosevelt não fez praticamente nada para ajudar. Ele se recusou a fazer pressão para relaxar as rígidas cotas de imigração americanas no sentido de permitir aos judeus a encontrar refúgio do reich. Pode ser dito em sua defesa, contudo, que as origens nacionais do sistema de cotas eram muito populares na época, e tivesse Roosevelt tentado mudá-las, ele teria arriscado cometer suicídio político. Mas ele não tentou alternativas óbvias como permitir residência temporária, sem possibilidade de futura cidadania americana. Nem ele mostrou muito interesse nos esforços para assentar os judeus em outro lugar. Churchill, com sua simpatia frequentemente expressada pelos judeus e o Sionismo, foi um pouco melhor.
As coisas ficaram piores após o pogrom da Kristallnacht em novembro de 1938. Hitler deixou claro em seu discurso de janeiro de 1939 ao Reichstag que se a guerra européia estourasse, ele contemplaria ações drásticas contra os judeus.
Dadas estas circunstâncias desagradáveis, não era um imperativo moral evitar o início da guerra e, se possível, assegurar a evacuação dos judeus das partes da Europa que poderiam possivelmente cair sob o controle alemão? Além disso, uma vez iniciada a guerra, não era imperativo terminá-la o mais rápido possível?
Churchill rejeitou todos os esforços para conseguir um assentamento. Ele continuou o bloqueio de fome, uma ação que somente exacerbaria as políticas nazistas mais extremistas. Mais uma vez, Herbet Hoover protestou, mostrando que o bloqueio colocava as crianças de Varsóvia em perigo de fome.
Em Varsóvia, Hoover disse, a taxa de morte entre as crianças era dez vezes maiores que as taxas de nascimento, e os corpos jaziam nas ruas... “É a causa Aliada mais avançada hoje como uma conseqüência da inanição das crianças?”, perguntou Hoover.
Churchill, é claro, tornou-se surdo: nenhuma consideração humanitária poderia desviá-lo da luta de vida e morte que ele estava determinado a seguir contra seu colega nazista.
Os defensores de Churchill, como John Lukacs, argumentam que ele não tinha escolha. Hitler intencionava o domínio da Europa; e não tivesse a guerra sido declarada em 1939, ou tivessem as ofertas de paz de Hitler em 1940 sido aceitas, a Grã-Bretanha logo teria que lutar de uma posição mais fraca ou aceitar a total supremacia alemã. Baker não aborda os objetivos de Hitler, apesar dele deixar claro suas simpatias a pacifistas como Rufus Jones e Jeanette Rankin. Como mencionado antes, Fumaça Humana é uma crônica de eventos significativos mais do que um argumento histórico, e os leitores em busca de uma análise da política alemã devem buscar outras fontes. Mesmo assim, gostaríamos de pensar que tendo em vista os massacres e destruição horrorosos da guerra, algumas escolhas melhores que as aquelas que Churchill e Roosevelt fizeram eram possíveis.
Fontes
http://mises.org/misesreview_detail.aspx?control=332
http://www.tkinter.smig.net/Stuff/SomeBooks/HumanSmoke.htm
http://articles.latimes.com/2008/mar/09/books/bk-kurlansky9
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