segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

O Futuro da Guerra Aérea

Vianney Riller

Defesanet, 17 de Julho, 2013

 
USS CVN77 George H.W. Bush, na costa da Virgínia - Ao se fazer um breve exercício de futurologia no campo do Poder Aéreo, poderíamos tomar dentre tantos, dois pontos de partida aparentemente óbvios. Primeiro: o que de mais avançado se desenvolve na aviação de combate, sofre maior ou menor influência do modelo operacional da Força Aeronaval Americana. Segundo: um porta-aviões é uma “base aérea” de dimensões definiUdas e limitadas. E em que esses dois pontos podem parametrizar uma linha de raciocínio sobre o futuro da guerra no ar, ao avaliarmos a velocidade e ao sucesso com que os testes com o X-47B têm acontecido?

A Nova Unidade Aérea

O mais claro e dedutível efeito, tendo por base um CVBG - Carrier Battle Group, grupo de combate de porta-aviões (que pelas suas características de mobilidade na projeção de poder aéreo, influencia por consequência as forças continentais), é que para cada comissionamento de uma aeronave-de-combate-não-tripulada (cujas dimensões são aproximadas a de um F/A-18 Super Hornet) haverá o “desembarque” de um caça tripulado, em razões óbvias das próprias limitações físicas. Se avançarmos na análise das doutrinas de emprego, em particular dos drones da Marinha Americana, que diferentemente daqueles utilizados pela Força Aérea dos Estados Unidos (que se valem de pilotagem humana), são operados exclusivamente por pré-programação e elementos de inteligência artificial, deduzimos que a estrutura de unidade aérea embarcada será drasticamente remodelada. Uma aeronave tripulada deverá liderar de dois a quatro UCAVs - Unmanned Combat Air Vehicle, em um primeiro modelo de esquadrilha, uma formação que visa manter o poder de decisão a nível do homem ao mesmo tempo que reduz sua exposição às defesas inimigas.

Invisibilidade, Ataque à Distância, Precisão... e Robotização!

O emprego da arma aérea tem avançado, por intermédio das novas tecnologias, em busca de novos trunfos. A invisibilidade permite uma penetração mais profunda no ambiente hostil sob um risco menor de detecção e interceptação. O emprego de armamento guiado (Laser, TV, IR, GPS/INS), permite ataques Standoff - a uma distância segura do inimigo. A precisão, por conseguinte, tem sido aumentada pela “inteligência” das armas em conjunção com a melhoria de radares e sensores, o que reduz os nocivos efeitos colaterais, muitas vezes determinantes no resultado da missão.

O X-47B, apelidado “Robot” pelos militares da US Navy, é o UCAV de geometria stealth (furtiva), demonstrador de tecnologia da Northrop Grumman, que objetiva reunir todas estas características em uma aeronave-não-tripulada baseada em porta-aviões. Ele se notabiliza pela automação do voo. “O modelo da US Navy é diferente do da US Air Force”, nas palavras do próprio Comandante da Força Aeronaval do Atlântico, Rear Admiral Ted Branch. “Nós não temos alguém ativamente voando a máquina com o manche na mão. Nós a voamos com um mouse e um teclado”. Na nomenclatura militar americana, a Força Aérea tem drone pilots, a Marinha, drone operators.




Um Novo Perfil para (poucos) Pilotos

O ano é 2035. Declarado com capacidade operacional em 2019, após um custo de desenvolvimento acima dos US$ 1,4 trilhões, o JSF F-35 se tornará em breve um dos poucos caças tripulados da Força Aeronaval Americana. Os novos pilotos designados para estas aeronaves são selecionados por critérios diferentes dos adotados há vinte e dois anos antes. A agressividade tão requisitada, e ilustrada no clássico “No Guts, No Glory!” do Maj Gen Frederick Blesse, cede espaço à habilidade de gerenciamento de dados em rede. Devido a cortes orçamentários, exercícios com foco na perícia do piloto, como Red Flag, tem sua frequência e importância reduzidas, perdendo campo ao novo Linked Flag, e outros mais, com foco no processamento de informações e gestão de armamentos remotos em ambientes integrados. Full-LinkedWar é o fundamento a ser aperfeiçoado.

Afinal, os novos pilotos provavelmente nunca verão um caça inimigo durante um combate, a não ser pela tela multifuncional que exibe via link, imagens repassadas pelo sistema IR/eletro-óptico dos UCAVs avançados. Tampouco enfrentariam um cenário onde tivessem necessidade de se expor à kill zone das armas de seus opositores. O Piloto de Caça como o conhecemos, é mais do que nunca uma espécie em grave mutação.


Redesenhando Missões

De volta ao presente, o Robot é um UCLASS - Unmanned Carrier Launched Airborne Surveillance and Strike System, cujas demonstrações bem sucedidas revelam a velocidade com que se avança no desenvolvimento deste tipo de arma aérea. Sua data prevista de entrada em serviço - inicialmente 2019 - pode ser antecipada (sem falar no cronograma mais imediato dos ultrassecretos programas black ops). Pelas capacidades projetadas para cumprir missões de vigilância e ataque, o provável padrão operacional será de CAPs - Combat Air Patrol, realizadas inteiramente por drones, em zonas de menor complexidade e níveis de alerta mais baixos. Elevando-se o nível de ameaça ou em ações específicas de ataque, um caça tripulado assumiria o comando destas missões, nas proporções de 1 para 2, 1 para 3, ou 1 para 4, dependendo das doutrinas produzidas durante o atual período de desenvolvimento e aprendizado; e obviamente, do tipo de missão.

O caça tripulado como nós conhecemos hoje, cada vez mais exigirá um perfil de piloto apto a desempenhar as funções de FAC - Forward Air Controller. Com a progressiva introdução dos drones, sua principal missão será a de designar objetivos e movimentações táticas aos UCAVs sob seu comando. A fusão de dados de radares e sensores, e o compartilhamento de informações de consciência situacional de um por todos - via link entre drones, caças e mesmo armas (mísseis e bombas inteligentes), terá a capacidade de estender os olhos e garras do piloto à distâncias consideráveis. O engajamento entre o piloto do futuro e seu alvo seria cada vez mais “remoto”.

Modelando o Emprego da Arma Aérea no Mundo

Uma vez que, pela mobilidade de cada um dos seus atuais dez porta-aviões, a Força Aeronaval Americana pode projetar seu poder sobre todos os continentes, é razoável assumir que seu modelo operacional e tipo de aeronaves influenciará de uma forma ou de outra, a estrutura das forças aéreas nacionais em todo o globo. Neste caso em específico, a composição caça tripulado e UCAVs pode ser adotada por outros países. Em uma cooperação europeia, SAAB AB da Suécia, EAB da Grécia, RUAG Aerospace da Suíça, EADS CASA da Espanha e Alenia da Itália, lideradas pela Dassault da França, obtiveram sucesso com os testes de seu nEUROn, o demonstrador de tecnologia para uma aeronave de combate stealth autônoma (não-tripulada), prevista para 2020.

O Reino Unido, por meio da BAE Systems desenvolve o seu Taranis (cujo primeiro voo está programado para ainda este ano, na Austrália). Dentre as potências emergentes é forte a aposta nos UCAVs. Na Rússia o protótipo do Mig Skat servirá de base para o recém assinado contrato de pesquisa e desenvolvimento celebrado entre a empresa e o Ministério da Indústria e Comércio. Na Índia o DRDO AURA deve voar pela primeira vez em 2015. Mesmo a hermética China, com seu Shenyang/Hongdu Lijian (espada afiada) está próxima dos primeiros ensaios em voo, segundo fontes daquele país.

Os modelos de interação dos drones com as aeronaves tripuladas (especialmente no que se refere aos diferentes níveis de automação do voo) estão sendo estudados e levam em conta diversas questões, como por exemplo, o emprego conjunto com caças mono ou biplaces. Se por um lado a França emprega seu Dassault Rafale biposto exatamente em missões de maior complexidade em cenários de alta oposição e hostilidade, a Suécia e Suíça parecem avançar resolutas na adoção apenas do SAAB Gripen E - monoplace. A Espanha, Itália e Reino Unido com seu Eurofighter Typhoon, e Rússia e Índia desenvolvendo o Sukhoi/HAL T-50, devem optar por apenas um tripulante.

Tanto embora a US Navy seja a mais experimentada na configuração de aeronaves de combate com duplas de tripulantes, a introdução do F-35 e as capacidades de voo autônomo projetadas para seus UCAVs, devem permitir que apenas um piloto opere tanto os sistemas de seu próprio caça, como também lidere um grupo de drones sob seu comando.

Realidade e Futuro

A importância dos drones já é hoje amplamente reconhecida, principalmente no que diz respeito à missões que exijam muitas horas dentro do teatro de operações, em que a fadiga humana possa representar um fator limitante do desempenho. Neste quesito também pesam fatores como a exposição à certos níveis de radiação e frequências de onda, que fatais ao ser humano e danosas aos sistemas de um caça, não comprometeriam a missão de um UCAV.

O temor de que pilotos sejam substituídos por robôs é compartilhado tanto por aspirantes à aviação de combate, como também, pelos atuais aviadores com menos tempo de serviço, que pelo tempo necessário à implantação destas novas armas, deverão ser os mais afetados pelos cortes de posições ofertadas à tripulantes. Curiosamente, um dos principais argumentos quando da idealização dos UCAVS pode torna-se a principal ameaça ao programa: o custo. O que inicialmente se justificava por, além de diminuir a exposição do piloto ao risco, reduzir os altos valores envolvidos na produção e operação de um caça tripulado de última tecnologia, tem se revelado tão ou mais caro quanto o que se gasta nos aviões em uso na atualidade.

O ápice das incertezas (quanto a prazos, quantidades e formas de atuação dos UCAVs) sustenta ainda a delicada balança das questões éticas. A possibilidade de robotização do combate pode conduzir à falsa impressão de um distanciamento da guerra. Uma virtualização das consequências mortais das batalhas. E isso, desperta respeitáveis reflexões em tempos de conflitos frequentemente assimétricos. Neste particular, um preocupante efeito colateral do uso dos drones é a possibilidade de aumento das ações terroristas em retaliação à operação dos “robores aéreos”. Em razão da não exposição direta de seus operadores ao risco de ferimento ou morte, aflora o pensamento de uma ética de guerra onde “aquele que reclama o direito de matar, tem que sangrar primeiro”.
Em previsões cada vez mais sujeitas a reviravoltas, especialmente pelo feroz incremento das incertezas econômicas mundiais, tentar vislumbrar o futuro pode facilmente ir de um acerto iluminado a um ridículo retumbante. Assim sendo, o Flight Deck - convoo, dos porta-aviões da US Navy, permanece como uma das melhores “bolas de cristal” ao se tentar ver o que vem pela frente.

Nota DefesaNet

Atualizando à data de hoje:

O X-47B apresentou problemas técnicos no dia 15 de julho, durante voo onde executaria a quarta missão de pouso completo no porta-aviões americano USS George H.W Bush (CVN-77). Os oficiais envolvidos no programa de testes decidiram abortar o pouso antes da aeronave aproximar-se do navio.

No dia 10 de julho o X-47B executou dois pousos e decolagens no mesmo CVN-77 navegando a 70km da costa de Virgínia Beach. O evento foi considerado um anúncio do futuro da aviação naval. Um terceiro pouso previsto para aquele dia, também foi abortado devido a uma falha em um dos três computadores de navegação do drone.

Opinião DefesaNet

Na contramão do mundo o Brasil não tem visão aeronáutica alinhada com o futuro, ao mesmo tempo que o F-X2 vai para o "Comando do Nada" deixando o país desguarnecido de uma defesa de sua soberania do espaço aéreo.

A realidade de não-tripulados (algo muito inferior aos drones) brasileiros se resume a 6 equipamentos (4 FAB e 2 PF) designados para desempenho da função primária de uma aeronave desta natureza, a vigilância, para um território de 8.515.767,049 km² e 15.179 km de fronteiras.

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