A Guerra
Hispano-Americana de 1898 sinalizou de vez a decadência espanhola como potência
mundial e catapultou os Estados Unidos para o primeiro plano das disputas
políticas globais. A Espanha tinha perdido quase todas as suas colônias na
primeira metade do século 19; restavam apenas alguns poucos lugares do antigo
império onde “o Sol nunca se punha”, como as Filipinas, Cuba ou Porto Rico. Já
os Estados Unidos, depois de uma devastadora Guerra Civil entre 1861 e 1865,
continuaram sua vertiginosa expansão econômica, mas mantinham em grande parte
um isolamento político das questões mundiais. Isso mudaria radicalmente com a
guerra.
Foi então
que um dos mais influentes pensadores militares da história escreveu um livro
seminal: A Influência do Poder Naval na História, 1660-1783, do capitão Alfred
Thayer Mahan (1840-1914). Nesse livro, publicado em 1890, encontram-se as
sementes intelectuais da guerra de 1898, das guerras japonesas contra chineses
e russos logo em seguida e da corrida naval entre britânicos e alemães antes da
Primeira Guerra Mundial. Para Mahan, o país que tivesse uma esquadra poderosa
poderia derrotar uma frota rival e, com isso, controlar as rotas marítimas e
bloquear a economia do inimigo. Ele defendia a busca dessa batalha naval
decisiva para decidir o conflito.
Foi o que
aconteceu em 1898, quando a renascente Marinha americana derrotou
fragorosamente sua rival espanhola nas batalhas da Baía de Manila, nas
Filipinas, e da Baía de Santiago, em Cuba. Com o domínio do mar, os americanos
puderam projetar seu poder em terra e vencer as tropas inimigas.
Dos
navios envolvidos nessas batalhas, o cruzador USS Olympia é o único
remanescente que ainda flutua. Foi a nave-capitânia do almirante George Dewey
(1837-1917) na batalha da Baía de Manila e encontra-se hoje preservado como
navio-museu em Filadélfia, ao lado de um submarino da Segunda Guerra, o USS
Becuna. Visitar o Olympia é voltar mais de um século no tempo e ajuda a
entender como eram as batalhas navais da época da segunda Revolução Industrial.
A evolução
dos navios
No começo
do século 19, os navios eram de madeira, de propulsão a vela e armados com
canhões de carregar pela boca com balas esféricas. No meio do século, surgem os
navios encouraçados com ferro, movidos a vapor, embora ainda com velas como
meio de propulsão auxiliar, e armados com canhões que disparam granadas
explosivas. Assim eram os navios da Guerra Civil americana e da Marinha
brasileira na Guerra do Paraguai.
A partir
da década de 1880, uma nova revolução na engenharia naval se traduz em navios
feitos de aço. As velas desaparecem de vez e começa a haver maior padronização
dos tipos de navio de guerra. O principal deles passa a ser um couraçado de aço
armado com canhões de grande calibre e uma bateria secundária de outros de
calibre menor. Os cruzadores são versões menores, menos blindadas, porém mais
rápidas.
A partir
de 1883, o Congresso dos EUA decide iniciar a construção de navios modernos
para substituir os velhos cascos da época da Guerra Civil. O país já estava no
caminho de se tornar a maior potência industrial do planeta. Mas a situação da
Marinha americana no começo da década de 1880 era tão ruim que até mesmo os
navios adquiridos por marinhas sul-americanas causavam preocupação. Segundo o
historiador naval John Roberts, era particularmente preocupante não haver
então, na Marinha americana, couraçados equivalentes em poderio aos brasileiros
Riachuelo e Aquidaban, nem ao cruzador chileno Esmeralda, todos fabricados no
Reino Unido.
O USS
Olympia foi autorizado em 1888, lançado ao mar em 1892 e entrou em operação em
1895. Era, portanto, um navio novo e moderno em 1898. Apesar de ser a maior
embarcação presente na batalha, o USS Olympia hoje impressiona por ser um navio
pequeno. Com pouco mais de cem metros de comprimento, ele é mais curto que uma
fragata de hoje. Apesar disso, tinha quatro canhões poderosos para um cruzador
da época, de calibre 8 polegadas, em duas torres avante e a ré.
Estopim
do conflito
O estopim
para a guerra foi justamente o afundamento em Havana de um dos navios dessa
nova Marinha, o pequeno couraçado USS Maine, em 15 de fevereiro de 1898. Tudo
indica que a explosão foi acidental, seja nos depósitos de carvão, seja nos
paióis de munição. Mas não poderia haver momento ou lugar pior para o acidente.
Os EUA
pressionavam a Espanha para ceder a independência da ilha aos rebeldes cubanos,
que a opinião pública americana defendia como “combatentes da liberdade”.
Muitos se convenceram de que o Maine fora afundado por uma mina espanhola, como
o então influente secretário-assistente da Marinha, Theodore Roosevelt Junior
(1858-1919), amigo pessoal e fã das teses do capitão Mahan – e futuro
presidente americano.
A
imprensa popular americana, especialmente os jornais das cadeias de William
Hearst (1863-1951) e Joseph Pulitzer (1847-1911), comprou a tese e iniciou
forte campanha pela declaração de guerra. Hearst foi o principal modelo de
Cidadão Kane, clássico filme de Orson Welles.
Roosevelt
acreditava na iminente declaração de guerra e começou os preparativos assim que
soube do afundamento do USS Maine. Ainda em fevereiro ele telegrafou ao então
comodoro George Dewey para reunir em Hong Kong os navios do esquadrão asiático
americano e preparar-se para eventualmente atacar as Filipinas. Roosevelt
também despachou outro cruzador, o USS Baltimore, para reforçar a frota e
completar seu suprimento de munição.
Um
relatório apressado da Marinha americana afirmou no mês seguinte que o Maine
tinha sido afundado por mina, mesmo sem provas. A pressão pela guerra passou a
ser irresistível. O presidente William McKinley Junior (1843-1901) foi
autorizado pelo Congresso em 19 de abril a usar força armada para retirar Cuba
da autoridade espanhola. Em 25 de abril, o Congresso declarou guerra.
Dewey
comprou dois mercantes, o Nanshan e o Zafiro, para transportar carvão extra, e
partiu rapidamente de Hong Kong rumo às Filipinas com quatro cruzadores, duas
canhoneiras e um navio auxiliar. Já em 30 de abril, a frota avista a ilha
filipina de Luzón. Os americanos descobrem que a frota espanhola do
contra-almirante Patricio Montojo y Pasarón (1839-1917) deixara a Baía de Subic
e se concentrara em Manila. O esquadrão espanhol ancora perto da fortaleza de
Cavite. Com navios menos poderosos, o almirante espanhol queria aproveitar a
defesa adicional dos canhões dos fortes que protegem a capital da colônia.
A frota
americana aproxima-se durante a noite e troca tiros com os fortes na entrada da
baía. Mas o comandante americano prefere atacar de dia, na manhã de 1º de maio.
A batalha começa às 5h10. O USS Olympia está em primeiro na fila de navios; em
seguida vêm os USS Baltimore, Raleigh, Petrel, Concord e Boston. O auxiliar
McCulloch e os carvoeiros mantêm-se a distância. Dewey espera chegar mais perto
dos navios espanhóis ancorados antes de começar a atirar. Só às 5h40 que ele dá
a famosa ordem ao capitão do Olympia, Charles Vernon Gridley (1844-1898): “Pode
disparar quando estiver pronto, Gridley”. As duas frotas estavam então a meros
4,5 quilômetros de distância uma da outra.
Tiro ao
alvo
A batalha
foi um exercício de tiro ao alvo – e mal realizado. A pontaria americana é
péssima, mas a espanhola é infinitamente pior. Análises depois da batalha nos
navios espanhóis destruídos indicaram, por exemplo, que dos 635 disparos dos
canhões de calibre 6 polegadas, apenas sete (1%) atingiram o alvo (veja quadro
na página anterior).
A munição
começa a faltar e Dewey faz uma original pausa no combate para o café-da-manhã
da tripulação. Depois de três horas fora da baía, a frota americana retorna ao
combate. Apenas um navio espanhol, a pequena canhoneira Don Antonio de Ulloa,
sai ao encontro do inimigo e termina afundada com a perda de toda a tripulação.
Por volta das 12h30, os espanhóis rendem-se, depois de perderem 381 homens
mortos e todos os principais navios. Apenas nove tiros atingiram os navios
americanos, provocando danos leves e ferindo sete marinheiros, mas sem matar
nenhum. “O estarrecedor índice de acertos, particularmente contra alvos
estacionários em Manila, e quando o fogo de resposta era desprezível, foi a
lição mais conspícua”, segundo o historiador e engenheiro naval britânico David
K. Brown.
A
principal razão das perdas espanholas foi o fogo. Ainda havia muita madeira a
bordo dos navios espanhóis, e nos trópicos ela tende a ficar bem seca e vulnerável
a incêndios. A frota espanhola era “uma coleção de navios antigos, obsoletos e
com ruim manutenção, de escasso ou nulo potencial de combate”, afirmou o
historiador espanhol Antonio Carrasco Garcia, justificando a derrota.
A Espanha
coleciona depois outras derrotas no mar e em terra, e a guerra termina em
agosto, com um tratado de paz assinado no final do ano.
Os EUA
saem do conflito como uma verdadeira potência colonial, de posse das Filipinas,
Guam e Porto Rico e um quase-protetorado na independente Cuba.
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