A
Marinha de Guerra alemã não pode ser considerada “tradicional” se for comparada
com a britânica, cuja origem remonta ao reinado de Alfredo, o Grande (849 –
901). A Marinha alemã é, inclusive, considerada moderna; foi criada em meados
do século XIX.
Os
numerosos e pequenos estados, dispersos ao longo do litoral do Mar do Norte e
do Báltico, não tinham suficientes recursos para manter uma frota capaz de
enfrentar-se a outras grandes potências europeias, e menos se um dos inimigos
fosse a Marinha britânica.
Assim,
foi preciso contratar navios corsários para combater a pirataria, atrasando
ainda mais o desenvolvimento de uma estrutura que pudesse organizar a futura
Marinha de Guerra.
Em
1848, a situação começou a mudar quando a Assembleia Nacional alemã (Bundestag)
reuniu-se em Frankfurt para criar uma marinha de guerra. No entanto, sua
presença na história militar é discreta e essa marinha foi dissolvida em 1852.
Um ano depois, foi fundado o almirantado da Real Marinha prussiana, o primeiro
órgão com direção independente, mas que ainda desempenhava um papel modesto –
não tinha navios de primeira linha e sua principal tarefa era o transporte de
tropas.
Após
a criação do Império Alemão em 1871, também se constitui a Marinha de Guerra
alemã, sob as ordens diretas do imperador. Mas não foi até 1888, com a ascensão
de Guilherme II ao trono – um monarca entusiasmado com o poder naval -, que a
força passou de ter um punhado de navios de cabotagem a contar com uma grande
frota de guerra.
De
acordo com o novo empenho expansionista, decidiu-se optar por um modelo
parecido ao da Grã-Bretanha, a maior potência marítima da época e futura rival
da Alemanha – a maior parte dos especialistas daquela época tinham os olhos
postos no apogeu do Império Britânico.
Depois
da derrota na Primeira Guerra Mundial e da assinatura do Tratado de Versalhes,
o desenvolvimento naval alemão foi interrompido. Mas, em 1921, o novo
parlamento, democraticamente eleito, decretou a lei de serviço militar, na qual
se inclui a decisão de formar a Marinha Nacional alemã (Reichsmarine).
O
Alto Comando, presidido pelo almirante Paul Behnke (substituído em 1924 por
Hans Zenker; e este por Erich Raeder, quatro anos depois), tinha de se enfrentar
às duras restrições impostas pelo Tratado de Versalhes – que estipulava as
restrições impostas às Marinhas de Guerra derrotadas – e pelo Tratado de
Washington – que determinava os novos pactos internacionais.
Os
termos de Versalhes eram muito rígidos, sobretudo no que se referia à limitação
quantitativa da tripulação – limitava-se o número de marinheiros, o que
dificultava o cumprimento de todas as tarefas. Desse modo, a Marinha Nacional
alemã teve de recrutar marinheiros e oficiais entre os antigos reservistas. Foi
a única maneira de contar com homens experientes a um custo razoável. Ao longo
da década de 1920, calcula-se que para cada posto da Armada havia cerca de
cinquenta candidatos, gerando, entre os selecionados, a ideia de que pertenciam
a um grupo de elite.
A Kriegsmarine
Em
24 de março de 1933, o então Chanceler Adolf Hitler obteve plenos poderes do
presidente da república, Paul Von Hindenburg, dando lugar à formação do
Terceiro Reich. O novo governo realizou imediatamente várias mudanças que
afetaram as Forças Armadas.
Em
1935, coincidindo com o fim das sanções do Tratado de Versalhes, a Marinha
Nacional alemã converteu-se na Marinha de Guerra (Kriegsmarine).
A
mudança indicava, sem dúvida alguma, a intenção política e estratégia do novo regime.
A nova lei de serviço militar determinava que o Chanceler e o chefe de Estado
também assumiam a chefia das Forças Armadas (Wehrmacht) e da Armada (Reichswehr).
Alguns anos depois, Hitler criou em Berlim o Alto Comando das Forças Armadas
(OKW, Oberkommando der Wehrmacht),
sob o seu comando.
Além
disso, mudanças significativas foram realizadas na organização das forças
navais. A mais importante foi a eliminação do almirantado anterior e a criação
do Alto Comando Naval (OKM, Oberkommando
der Kriegsmarine), controlado pelo Comando Supremo da Marinha (ObdM, Oberbefehlshaber der Kriegsmarine).
A
partir de sua posse no cargo, no final da década de 1920, o almirante Erich
Raeder, promovido a grande almirante em 1939, desempenhou um papel decidivo na
nova orientação estratégica da Marinha de Guerra alemã. Hitler – que tinha
poucos conhecimentos sobre a guerra em alto-mar – aceitou as propostas de
Raeder, mas manteve sua autoridade dentro da instituição.
Bandeira de Guerra das Forças Armadas alemãs (criada por Hitler)
Em
junho de 1935, o Tratado Naval Anglo-Germânico foi assinado. Tendo renunciado
às limitações do Tratado de Versalhes em março, a Alemanha obtinha formalmente
o direito de aumentar sua marinha até atingir 35% dos efetivos da Marinha Real
britânica. Também se concordou com o renascimento do setor de submarinos. O
Tratado foi uma obra-prima de propaganda que anunciava ao mundo que a Alemanha
não tinha intenções de desafiar a Grã-Bretanha para outra “corrida naval”. Mas,
passados apenas 11 dias da assinatura, o U-1 foi incorporado à esquadra, em
Kiel. Por volta de janeiro de 1936, mais onze submarinos haviam sido
incorporados – e todos eles já estavam em construção meses antes da assinatura
do Tratado.
Teve
início a seguir a construção da frota de batalha propriamente dita. Primeiro
vieram dois couraçados com três torres de três canhões de 11 polegadas, em vez das
duas torres de três canhões de 11 polegadas encontradas nos
couraçados-de-bolso. Eles também tinham armamento secundário pesado, de canhões
de 5,9 polegadas e podiam alcançar 32 nós. Anunciou-se que deslocavam 26.000
toneladas, mas na verdade ambos deslocavam 32.000 toneladas, grande parte devida
à pesada couraça protetora. Foram batizados com os nomes dos cruzadores que o
almirante Graf Von Spee venceu a esquadra britânica na cidade chilena de
Coronel, em 1914: Scharnhorst e Gneisenau.
Em
1936, iniciou-se a construção dos dois mais poderosos couraçados de que se tem
notícia até que a Marinha Imperial japonesa apareceu com os supercouraçados da
Classe Yamato: Bismarck e Tirpitz, armados com canhões de 15 polegadas. Uma vez
mais, as autoridades alemãs atenuaram seu verdadeiro deslocamento, anunciando
35.000 toneladas para ambos (o Bismarck deslocava 41.700 e o Tirpitz 42.900).
Dois outros cruzadores leves, o Leipzig e o Nürnberg, já se haviam unido à
frota, e um sexto, o Königsberg, foi lançado ao mar em 1937, juntamente com os
dois primeiros cruzadores pesados, o Admiral Hipper e o Blücher, armados com
canhões de 8 polegadas.
A Estrutura do Alto Comando Naval
(OKM)
Em
novembro de 1938, pouco antes do início da Segunda Guerra Mundial, a Marinha de
Guerra alemã organizou-se da seguinte maneira: sob o comando de Hitler e do
marechal de campo Keitel estava o comandante supremo da Marinha e do Alto
Comando Naval, o almirante Erich Raeder.
O
seguinte oficial na hierarquia do OKW era o comandante em chefe e chefe do
Estado Maior naval, o vice-almirante Otto Schniewind. Na figura 1, descreve-se
detalhadamente a estrutura do OKM a partir de agosto de 1939.
A
segunda cadeia de comando inclui as diferentes regiões navais, representadas
pelos comandantes chefes do Mar Báltico e do Mar do Norte, bem como pelos
representantes das frotas do Este, sob o comando do almirante Hermann Böhm.
Böhm
também comandava os oficiais dos navios de combate, reconhecimento e lanchas
torpedeiras, liderados pelo vice-almirante Günther Lütjens, além dos oficiais
das lanchas draga-minas e do comandante chefe da frota submarina, o comodoro
Karl Dönitz.
Recrutamento
Até
em tempos de guerra, a Marinha alemã somente aceitava voluntários que se
comprometiam a servir como mínimo quatro anos.
Os
suboficiais, no entanto, deviam manter-se ativos durante um período de doze
anos. Entre 1935 e 1936, exigia-se que os candidatos tivessem entre 17 e 23
anos, estatura mínima de 1,60 m, fossem alemães e tivessem determinadas
características físicas para o serviço militar em alto-mar (tônus muscular e
rápida capacidade de reação).
Os
recrutas tampouco podiam ter antecedentes criminais e, de acordo com as leis de
pureza racial promulgadas pelo regime nazista, deviam ostentar sua ascendência
ariana. Valoravam-se os candidatos que tivessem prestado o serviço de trabalho
nacional (Reichsarbeitsdienst), mas, se não o tivessem feito, podiam
apresentar um documento com as razões que justificavam a falta.
Como
era de se esperar, os candidatos tinham de ser solteiros e os menores de 21
anos necessitavam da autorização dos pais. Depois de superar um exame, tinham
de esperar que o período de recrutamento se iniciasse.
Classes e Patentes
Classes Inferiores
Em
linhas gerais, distinguiam-se em: marinheiros, marinheiros de primeira classe,
cabos, cabos de primeira classe e cabos maiores.
Nos
graus inferiores, era comum que um marinheiro de tropa fosse promovido primeiro
a marinheiro de primeira classe depois de nove meses em serviço. Depois de um
ano, convertia-se em cabo e, dois anos depois, em cabo de primeira classe.
A
hierarquia foi unificada em 1938. Antes, na Marinha alemã havia o posto de
fogoneiro, o mais baixo. Excetuando os suboficiais, os postos menores eram
reconhecidos pela denominação terminada em gast
(homem), como por exemplo, funkgast
(operador de rádio).
Suboficiais
A
introdução de novos dispositivos (armas ou sistemas de governo e comunicação)
requeriam a participação de pessoal qualificado, com formação e experiência
específicas para a realização das tarefas.
Dividiam-se
em dois grupos: suboficiais sem espada e suboficiais com espada.
Os
suboficiais sem espada ocupavam-se de diversas tarefas especializadas. Em
geral, dividiam-se em três grupos: encarregados das tarefas a bordo; dedicados
aos trabalhos administrativos; integrantes da equipe médico-sanitária. O acesso
a esse grau obtinha-se após vários anos de serviço, depois que o interessado
tivesse concluído o período de formação e demonstrado ter a experiência
necessária.
Os
suboficiais com espada possuíam um distintivo no antebraço, que formava parte
tanto da roupa de trabalho como do uniforme de gala. Na base deste grupo,
encontravam-se os sargentos, que se podiam converter em sargentos de primeira
classe depois de dois anos de serviço e obter um certificado de aptidões. Os
sargentos de primeira classe que tivessem permanecido 11 anos ou mais no cargo,
de acordo com seus méritos e formação, podiam chegar a brigadas. Depois estavam
os subtenentes. A promoção a esse grau era especial. Em princípio, podiam
chegar a esse grau os suboficiais melhor preparados após um ano de serviço e,
se superavam a fase de formação, eram imediatamente promovidos.
Na
Marinha de Guerra alemã, o termo oficial, derivado do latim officium, aplica-se
a partir do grau de tenente. Sua origem remonta à época dos Grandes Eleitores
(1620 – 1688), quando os príncipes alemães tinham o privilégio de escolher o
imperador do Sacro Império Romano-Germânico. Naquela época, a patente era
aplicada apenas aos exércitos de terra, visto que a força naval era recente na
história militar da Alemanha.
Os
candidatos que desejavam seguir a carreira de oficial deviam cumprir alguns
requisitos mínimos, exigidos também aos marinheiros de qualquer outro posto.
Deviam ser alemães e apresentar um certificado que demonstrasse que tinham
concluído o Ensino Médio (Abitur, na
Alemanha) ou que tinham um grau equivalente reconhecido pelo Estado.
Os
candidatos deviam ter, no mínimo, 1,65 m; no máximo, 24 anos de idade; boas
condições físicas, sobretudo no que se refere à agudeza visual e predisposição
para os esportes. As avaliações dos candidatos eram feitas pelas divisões da Reichsjugend ou pela própria Marinha de
Guerra.
Depois
de aprovar o teste de aptidão e sua inscrição ter sido aceita, o candidato
comprometia-se a permanecer em serviço por tempo ilimitado. No início, devia
submeter-se a um período de formação de três meses, durante o qual levaria um
distintivo dourado – uma estrela de cinco pontas se fosse um oficial da Marinha
de Guerra, ou uma roda dentada se fosse um engenheiro – na manga esquerda do
uniforme. Terminado o período de formação, permanecia como cadete a bordo do
navio-escola mais um semestre.
Concluída
a formação e o estágio em um navio, o cadete podia ser promovido a aspirante de
segundo grau (Oberfähnrich), um grau
que na prática correspondia ao suboficial maior e que podia chegar a
guarda-marinha. Passados dois anos, podia chegar a alferes de fragata (Leutnant).
O
alferes de navio (Oberleutnant) era
um oficial de primeira classe e usava duas divisas na manga e uma platina
(ombreira) prateada, com cordões paralelos trançados e uma estrela. O tenente
de navio (Kapitänleutnant) pertencia
à categoria de oficiais de segunda classe; levavam três divisas na manga e uma
platina prateada com duas estrelas e cordões paralelos trançados.
Os
oficiais de terceira classe eram os capitães de corveta (Korvettenkapitän); usavam um distintivo com três divisas na manga e
platinas prateadas com cordões trançados. Depois, estavam os capitães de
fragata (Fregattenkapitän); tinham
quatro divisas na manga e platinas prateadas com um cordão trançado e uma
estrela.
A
patente mais alta era de capitão do navio (Kapitän
zur See); utilizava quatro divisas na manga e platinas prateadas com um
cordão trançado e duas estrelas.
Em
seguida, os oficiais superiores, começando com o contra-almirante, que usava na
manga uma divisa larga e outra mais fina, além de platinas com um cordão
trançado prateado e um botão dourado. Ao vice-almirante correspondia uma divisa
larga e duas estrelas, além de platinas parecidas, adornadas com uma estrela.
O
almirante distinguia-se dos demais pelo galão com uma divisa larga e três
estreitas na manga; as platinas eram parecidas com as de seus subordinados
imediatos, mas com duas estrelas. A patente de almirante geral, criada em 1936,
não era identificada pelos galões – idênticos aos do almirante -, mas pelas
três estrelas nas platinas.
Por
último, o grande almirante, patente criada em 1939, ostentava divisa larga e
quatro estreitas; e nas platinas, em lugar das estrelas, dois sabres de prata
cruzados.
O
termo comodoro, usado nos informes de guerra, não se refere a uma patente
especial, mas ao cargo do máximo responsável por uma unidade naval. Sua função
era meramente conjuntural e isso se refletia no distintivo que utilizava na
manga do uniforme: uma única divisa.
Fontes:
Construa
o Bismarck. © 2012. Salvat do Brasil Ltda.
A
Marinha alemã: a esquadra de alto mar. Richard Humble. Editora Renes, 1974.
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