History
Today, Vol. 65, nº 5, maio 2015
Durante
as últimas quatro décadas as Cruzadas tornaram-se uma das áreas mais dinâmicas
da investigação histórica, significando uma curiosidade crescente na compreensão
e interpretação destes eventos extraordinários. O que levou as pessoas no
Ocidente cristão a desejar recapturar Jerusalém? Qual impacto teve o sucesso da
Primeira Cruzada (1099) nas comunidades muçulmana, cristã e judaica do
Mediterrâneo oriental? Qual foi o efeito das Cruzadas nos povos e instituições
da Europa ocidental? Como as pessoas registravam as Cruzadas e, finalmente,
qual o seu legado?
O debate
acadêmico avançou significativamente durante os anos 1980, à medida que a
discussão em torno da definição de cruzada reuniu os pesquisadores. A
compreensão do escopo das Cruzadas expandiu-se com um novo reconhecimento que
as cruzadas se estenderam muito além das expedições originais do século XI à
Terra Santa, tanto em termos de cronologia quanto de escopo. Isto é, elas
aconteceram bem depois do final da dominação dos francos no Oriente (1291) e
continuaram até o século XVI. Em relação a seu objetivo, os cruzados também
foram convocados contra os muçulmanos da Península Ibérica, os povos pagãos da
região báltica, os mongóis, oponentes políticos do Papado e hereges (como os
cátaros ou os hussitas). Uma aceitação dessa estrutura, assim como a
centralidade da autorização papal para tais expedições, é geralmente referida
como a posição “pluralista”.
A
emergência desta interpretação energizou o campo existente e teve o efeito de
atrair um grande número de estudiosos. Junto com isso veio um interesse
crescente na reavaliação dos motivos dos cruzados, com algumas das ênfases
existentes em relação a dinheiro serem diminuídas e o cliché de filhos mais
jovens desgarrados em busca de aventura sendo deixado de lado. Através do uso
de um espectro mais amplo de evidência (especialmente documentos, isto é,
vendas e locação de terras e/ou direitos), uma preocupação em impulsos
contemporâneos religiosos como o fator motivador dominante para,
particularmente na Primeira Cruzada, veio à tona. No entanto, o resto do
mundo se intrometeu em e, em seguida, de algum modo, estimulou o debate acadêmico: os
horrores do 11/09 e o uso desastrado pelo presidente George W. Bush da palavra
“cruzada” para descrever a “Guerra ao Terror” alimentou a mensagem dos
extremistas de ódio e a noção de um conflito mais longo e maior entre o Islã e
o Ocidente, datando do período medieval, tornou-se extrememamente visível. Na
verdade, é claro, tal visão simplista é totalmente equivocada, mas é uma arma
poderosa nas mãos de extremistas de todos os tipos (de Osama Bin Laden a Anders
Breivik ao EI) e certamente deu impulso ao estudo do legado da era das Cruzadas
no mundo moderno, como veremos aqui.
A
Primeira Cruzada foi convocada em novembro de 1095 pelo Papa Urbano II na
cidade de Clemont na França Central. O Papa fez uma proposta: “Quem quer que
seja por devoção apenas, sem nenhum ganho de honra ou dinheiro, for a Jerusalém
para libertar a Igreja de Deus pode substituir essa jornada por toda penitência.”
Este apelo era uma combinação de uma série de tendências contemporâneas junto
com a inspiração do próprio Urbano, que acrescentou inovações particulares à
mistura. Por muitas décadas, os cristãos lançaram-se em terras muçulmanas nas
fronteiras da Europa, na Península Ibérica, por exemplo, assim como na Sicília.
Em alguns exemplos a Igreja tornou-se envolvida nestes eventos por meio da
oferta de prêmios espirituais limitados aos participantes.
Urbano
era responsável pelo bem-estar espiritual de seu rebanho e a cruzada
apresentou-se como uma oportunidade para os cavaleiros pecadores da Europa
Ocidental interromperem sua luta eterna e exploração dos fracos (camponeses e
monges) e tornar boas suas vidas violentas. Urbano viu a campanha como uma
chance para os cavaleiros direcionarem suas energias para aquilo que era visto
como um ato espiritualmente merecedor, basicamente a tomada da cidade santa de
Jerusalém do Islã (os muçulmanos tomaram a cidade em 637). Em retorno a isto,
eles seriam, com efeito, perdoados dos pecados que tivessem confessado. Isto,
por sua vez, os salvaria da perspectiva da danação eterna nos fogos do Inferno,
um destino repetidamente enfatizado pela Igreja em consequência de uma vida
pecadora.
Numa
época de tal religiosidade intensa, a cidade de Jerusalém, o lugar onde Cristo
viveu, caminhou e morreu, tinha um papel central. Quando o objetivo de libertar
Jerusalém foi relacionado a estórias fantásticas (provavelmente exageradas) de
mau tratamento tanto dos cristãos nativos do Levante quanto de peregrinos
ocidentais, o desejo por vingança, junto com a oportunidade para redenção
espiritual, formou uma combinação potencialmente motivadora. Urbano estaria
cuidando de seu rebanho e melhorando a condição espiritual da Europa ocidental
também. O fato de que o papado estava engajado em uma luta poderosa contra o
imperador alemão Henrique IV (a Controvérsia das Investiduras[1]), e que a convocação
aumentaria a força papal foi uma oportunidade boa demais para Urbano
desperdiçar.
Uma
faísca nessa palha seca veio de outra força cristã: o Império Bizantino. O
imperador Alexios I temia o avanço dos turcos seljúcidas em direção de sua
capital Constantinopla. Os bizantinos eram cristãos ortodoxos gregos mas, desde
1054, estavam em um estado de cisma com a Igreja Católica. O lançamento da
cruzada deu a Urbano a chance de se aproximar dos ortodoxos para cicatrizar as
feridas.
A reação
ao pedido de Urbano foi surpreendente e notícias da expedição correram pela
maior parte do Ocidente latino. Milhares viram isto como uma nova forma de
obter a salvação e evitar as consequências de suas vidas pecadoras. Mesmo
assim, ambições de honra, aventura, ganho financeiro e, para uma pequena
parcela, terra (neste caso, a maioria dos primeiros cruzados voltaram para casa
após o término da expedição) também podem ter influenciado. Enquanto clérigos
desaprovavam os motivos mundanos porque eles acreditavam que tais objetivos
provocariam a ira de Deus, muitos leigos tinham pouca dificuldade em adaptá-los
à sua religiosidade. Assim, Estevão de Blois, um dos homens mais experientes na
campanha, escreveria para sua esposa, Adela de Blois (filha de Guilherme o
Conquistador), que ele recebeu presentes e honras valiosos pelo imperador e que
ele agora tinha o dobro de ouro, prata e outras riquezas em relação ao que ele
tinha no Ocidente. Pessoas de todas as classes sociais (exceto reis) uniram-se
à Primeira Cruzada, apesar de um confronto inicial de rebeliões disciplinares
provocaram um surto horrível de antissemitismo, especialmente na Renânia, já
que eles procuraram financiar sua expedição tomando o dinheiro dos judeus e
atacando um grupo que era visto como inimigos de Cristo em suas próprias
terras. Estes contingentes, conhecidos como “Cruzada do Povo”, causou problemas
reais fora de Constantinopla, antes que Alexios os enviasse para o Bósforo e
Ásia Menor, onde os turcos seljúcidas os destruíram.
Liderados
por uma série de nobres experientes, os exércitos principais foram reunidos em
Constantinopla em 1096. Alexios não esperava que tal número de ocidentais
batessem à sua porta, mas viu a oportunidade de recuperar as terras perdidas
para os turcos. Dada a necessidade dos cruzados por alimentação e transporte, o
imperador se empenhou nessa relação, significando, contudo, que ele era
cauteloso ao lidar com os novos chegantes, particularmente após a confusão
causada pela Cruzada do Povo e o fato de que os exércitos principais incluíam
um grande número de contingente siciliano normando, um grupo que invadiu terras
bizantinas em 1081. A maioria dos líderes cruzados jurou lealdade a Alexios,
prometendo devolver-lhe terras previamente pertencentes aos bizantinos em troca
de suprimentos, guias e presentes supérfluos.
Em junho
de 1097, os cruzados e gregos tomaram um dos principais objetivos do imperador,
a formidável cidade fortaleza de Nicéia, cerca de 200 km de Constantinopla,
apesar de que após a vitória alguns relatos falaram do descontentamento dos
francos durante a divisão da pilhagem. Os cruzados moveram-se país adentro,
dirigindo-se à planície da Anatólia. Um grande exército turco atacou as tropas
de Bohemond de Taranto próximo da Dorileia. Os cruzados marchavam em contingentes
separados e isto, mais a tática desconhecida de ataques rápidos com arqueiros a
cavalo, quase provocou sua derrota até que a chegada de forças sob o comando de
Raymond de Toulouse e Godofredo de Bouillon salvou o dia. Esta vitória
duramente conseguida provou ser uma lição valiosa para os cristãos e, enquanto
a expedição continuava, a coesão militar do exército cruzado cresceu
continuamente, tornando-os uma força mais eficaz.
Nos meses
seguintes, o exército, liderado pelo Conde Baldwin de Bolonha, atravessou a Ásia
Menor com um certo contingente tomando as cidades cilicianas de Tarsus e
Mamistra e outras, dirigindo-se via Capadócia para as terras cristãs orientais
de Edessa (a bíblica Roais), onde a maioria populacional armênia saudou os cruzados.
Conflito político local significou que Baldwin foi capaz de tomar o poder para
si e assim, em 1098, o conhecido Estado Cruzado, a Província de Edessa, surgiu.
Nesta
época, o grosso do exército alcançou a Antióquia, hoje no interior da fronteira
meridional turca com a Síria. Esta grande cidade foi um assentamento romano;
para os cristãos ela era significativa como o local onde os santos Pedro e
Paulo viveram e foi um dos cinco assentos patriarcais da Igreja Cristã. Era
também importante para os bizantinos, tendo sido uma metrópole em seu império
tão recentemente quanto 1084. O sítio era muito grande para cercar
apropriadamente, mas os cruzados fizeram seu melhor pressionando o lugar até a
submissão. No inverno de 1097, as condições tornaram-se extremamente duras,
apesar de uma frota genoese na primavera de 1098 tenha fornecido algum apoio
útil. A paralisação foi somente encerrada quando Bohemond persuadiu um cristão
local a trair uma das torres e em 3 de junho de 1098 os cruzados invadiram a
cidade e a capturaram. Sua vitória não foi completa, contudo, porque a
fortaleza, elevando-se sobre o sítio, permaneceu em mãos muçulmanas, um
problema agravado pela notícia que um grande exército muçulmano de alívio
estava se aproximando de Mosul. A falta de comida e a perda da maioria de seus
cavalos (essenciais para os cavaleiros, é claro) significou que o moral atingiu
o fundo do poço. O Conde Estevão de Blois, uma das figuras mais experientes na
Cruzada, junto com um punhado de homens, desertaram, acreditando que a expedição
estava condenada. Eles se encontraram com o imperador Alexios, que estava
trazendo reforços longamente aguardados, e disse-lhe que a cruzada era uma
causa perdida. Assim, de boa fé, o governante grgo retirou-se. Em Antióquia,
enquanto isso, os cruzados foram inspirados pela “descoberta” de uma relíquia
da Lança Sagrada, a lança que atingiu o lado de Cristo quando Ele estava na
cruz. Uma visão disse a um clérigo em Raymond do exército de Saint Gilles onde
escavar e, certamente o objeto foi encontrado. Alguns lembraram isto como uma
conveniência e muito fácil de estimular uma reação do contingente provençal,
mas para as massas ele agiu como uma inspiração vital. Duas semanas depois, em
28 de junho de 1098, os cruzados reuniram suas últimas centenas de cavalos
junto, lançou-os em suas agora familiares linhas de batalha e avançaram contra
as forças muçulmanas. Com escritores relatando a ajuda de santos guerreiros no
céu, os cruzados triunfaram e a fortaleza rendeu-se, deixando-os em controle
completo de Antióquia antes que o exército muçulmano de alívio chegasse.
Como
resultado da vitória, muitos dos cristãos exaustos sucumbiram a doenças,
incluindo Ademar de Le Puy, o delegado papal e líder espiritual da campanha. Os
cruzados de alta patente estavam amargamente divididos. Boehemond queria ficar
e consolidar seu poder em Antióquia, argumentando que, desde que Alexios não
havia cumprido seu lado da barganha, então seu juramento aos gregos estava
encerrado e a conquista permanecia sua. A maioria dos cruzados ignoravam esses
detalhes políticos porque eles queriam alcançar a tumba de Cristo em Jerusalém
e convenceram o exército a se direcionar para o sul. No trajeto, eles evitaram
confrontos com outras grandes cidades fazendo acordos e alcançaram Jerusalém em
1099.
Forças
concentraram-se ao norte e sul da cidade fortificada e em 15 de julho de 1099
as tropas de Godofredo de Bouillon conseguiu trazer suas torres de cerco
próximas o suficiente das paredes para atravessá-las. Seus companheiros
cristãos invadiram a cidade e nos próximos dias o lugar foi colocado sob a
espada em uma onda de limpeza religiosa e liberação de tensão após anos de
marcha. Um massacre terrível viu muitos dos defensores muçulmanos e judeus da
cidade serem massacrados, apesar de a frase frequentemente repetida de “vadear
até seus joelhos em sangue” ser um exagero, sendo uma linha do Livro da
Revelação apocalíptico (14:20) usado para causar uma impressão da cena ao invés
de ser uma descrição real – uma impossibilidade física. Os cruzados fizeram
agradecimentos emocionados para o seu sucesso quando eles alcançaram seu
objetivo, a tumba de Cristo no Santo Sepulcro.
Sua
vitória ainda não estava assegurada. O vizir do Egito via o avanço dos cruzados
com uma mistura de emoções. Como guardião do Califado xiita no Cairo, ele tinha
um profundo desgosto dos mulçumanos sunitas da Síria, mas igualmente ele não
queria uma nova potência estabelecendo-se na região. Suas forças enfrentaram os
cruzados próximo de Ascalão em agosto de 1099 e, apesar de sua inferioridade
numérica, os cristãos triunfaram e também asseguraram uma considerável
quantidade de saque. Nesta época, tendo atingido seus objetivos, a vasta
maioria dos cruzados exaustos estavam ansiosos em retornar aos seus lares e
famílias. Alguns, é claro, escolheram permanecer no Levante, resolvidos a
proteger o patrimônio de Cristo e estabelecer domínios e títulos para si.
Fulcher de Chartres, um contemporâneo no Levante, lamentou que somente 300
cavaleiros permaneceram no reino de Jerusalém; um número muito pequeno para
estabelecer um domínio permanente na região.
Na
próxima década, entretanto, ajudado pela falta de oposição real dos muçulmanos
locais e alimentado pela chegada de uma série de frotas do Ocidente, os
cristãos começaram a tomar controle de toda linha costeira e criar uma série de
Estados viáveis. O apoio dos centros comerciais italianos de Veneza, Piza e,
particularmente neste estágio inicial, Genova, foi crucial. Os motivos dos
italianos têm sido frequentemente questionados, porém há evidência convincente
que mostra que eles estavam tão ansiosos quanto outros contemporâneos para
capturar Jerusalém, ainda que como centros comerciais eles estavam determinados
a avançar a causa de suas cidades também. Os escritos de Caffaro de Genova, uma
fonte secular rara deste período, mostram pouca dificuldade em assimilar estes
motivos. Ele continuou com a peregrinação para o Rio Jordão, compareceu a
celebrações da Páscoa no Santo Sepulcro e celebrou a aquisição de riquezas.
Marinheiros e soldados italianos ajudaram a capturar os portos costeiros vitais
(tais como Acre, Cesaréia e Jaffa), em troca da qual eles receberam privilégios
comerciais generosos que, por sua vez, deu um impulso importante na economia já
que os italianos transportavam mercadorias do interior mulçumano (especialmente
especiarias) de volta para o Ocidente. Tão importante quanto isto era seu papel
no transporte de peregrinos para e da Terra Santa. Agora que os locais sagrados
estavam em mãos cristãs, muitos milhares de ocidentais podiam visitar os sítios
e, à medida que eles caíam sob controle latino, comunidades religiosas
floresciam. Assim, a ideia básica por trás das Cruzadas foi atingida. Existe
uma argumentação forte de que os estados cruzados não poderiam ter sido
mantidos se não fosse a contribuição dos italianos.
Um dos
efeitos colaterais da Primeira Cruzada (e um assunto de extremo interesse
acadêmico hoje) é a explosão sem precedentes de escritos históricos que
surgiram após a captura de Jerusalém. Este episódio incrível inspirou autores
por todo o Ocidente cristão a escrever sobre estes eventos em um modo que nunca
foi visto na história medieval. Não era mais preciso olhar para os heróis da
antiguidade, já que sua própria geração havia fornecido homens de feitos
comparáveis. Esta era uma época de literatura crescente e a criação e
circulação de textos cruzados era uma parte grande deste movimento. Histórias
numerosas, mais contos oralmente distribuídos, frequentemente na forma de
menestréis, populares nas primeiras épocas da era cavalheiresca, celebravam a
Primeira Cruzada. Os historiadores olharam previamente estas narrativas para
construir a estrutura dos eventos, mas hoje muitos estudiosos estão se
aprofundando nestes textos para considerar mais profundamente as razões pelas quais
eles foram escritos, os diferentes estilos de escrita, o uso de motivos
clássicos e bíblicos, os inter-relacionamentos e as cópias entre os textos.
Outra
área recebendo atenção crescente é a reação do mundo islâmico. Hoje está claro
que quando a Primeira Cruzada chegou os muçulmanos do Oriente Próximo estavam
extremamente divididos, não apenas na questão Sunita/Xiita, mas também, no caso
deste último, entre eles próprios. Foi uma coincidência feliz que durante
meados dos anos 1090 a morte dos líderes mais antigos no mundo seljúcida tenha
significado que os cruzados encontraram oponentes que estavam primeiramente
preocupados com sua própria luta política interna ao invés de ver uma ameaça
externa. Dado que a Primeira Cruzada era, claramente, um evento novelesco, isto
era compreensível. A falta do espírito jihad também era evidente, como lamentou
Sulami, um clérigo damasceno cujo alerta das classes governantes para se unirem
e cumprirem sua missão religiosa foi largamente ignorado até o tempo de
Nur-ad-Din (1146 – 47) e Saladino a seguir.
Os
colonos francos tiveram que se adaptar à mistura complexa cultural e religiosa
do Oriente Próximo. Seu número era tão baixo que uma vez eles tivessem
capturado um lugar, eles rapidamente precisavam adaptar seu comportamento da
retórica belicista da guerra santa do Papa Urbano II para uma forma mais
pragmática de relativa tolerância religiosa, com armistício e mesmo alianças
ocasionais com vários vizinhos muçulmanos. Tivessem eles oprimido a maioria da
população local (e muitos muçulmanos e cristãos orientais viveram sob o domínio
franco), não teria havido mão de obra para as fazendas locais ou para cobrar
impostos e sua economia teria colapsado. Trabalho arqueológico recente pelo
estudioso israelense Ronnie Ellenblum mostrou que os francos não viveram, como
antes se suspeitava, somente nas cidades, separados da população local.
Comunidades locais cristãs frequentemente viviam lado a lado com ela, algumas
vezes compartilhando igrejas.
Os
estados francos de Edessa, Antióquia, Trípoli e Jerusalém estabeleceram-se no
caldeirão cultural, religioso e político do Oriente Próximo. Um dos primeiros
governantes de Jerusalém casou-se com uma nobre cristã armênia e, assim, a
Rainha Melisende (1131 – 52) tinha um grande interesse em apoiar os habitantes
locais assim como a Igreja Latina. A peculiaridade genética, aliada à alta taxa
de mortalidade entre os governantes masculinos, significou que as mulheres
exerciam maior poder do que antes se supunha dado o ambiente bélico do Oriente
Latino e das atitudes religiosas prevalecentes em relação às mulheres como
emocionalmente fracas.
Os
francos sempre sofreram escassez de recursos humanos, mas eram um grupo
dinâmico que desenvolveu instituições inovadoras, tais como as Ordens
Militares, para sobreviver. As ordens foram fundadas para ajudar no cuidado dos
peregrinos; no caso dos Hospitalários, através de cuidados médicos; no caso dos
Templários, acompanhar os visitantes na estrada para o Rio Jordão. Logo, ambas
eram instituições religiosas de pleno direito, cujos membros faziam juramentos
monásticos de pobreza, castidade e obediência. Provou ser um conceito popular e
doações de peregrinos admiradores e em gratidão significaram que as ordens
Militares desenvolveram um papel central como proprietários rurais, como
administradores de castelos e como o primeiro exército real na Cristandade.
Eles eram independentes do controle dos governantes locais e podiam, às vezes,
causar problemas para o rei ou brigar entre si. Os templários e os hospitalários
também mantinham grandes extensões de terra através da Europa Ocidental, que
forneceu recursos para a máquina de guerra no Levante, especialmente a construção
dos castelos que se tornaram tão vitais para o domínio cristão na região.
Em
dezembro de 1144, Zengi, o governante muçulmano de Alepo e Mosul, capturou
Edessa marcando o primeiro revés territorial para os francos do Oriente
Próximo. A notícia deste desastre obrigou o Papa Eugênio III a emitir um apelo
para a Segunda Cruzada (1145 – 49). Fortalecido por este chamado poderoso para viver de acordo com os feitos de seus primeiros antepassados cruzados, além da retórica
inspirada de (Santo) Bernardo de Clairvaux, os governantes da França e Alemanha
assumiram o fardo para marcar o início do envolvimento real nas Cruzadas. Os governantes cristãos na Ibéria
juntaram-se com os genoeses no ataque das cidades de Almeria na Espanha
meridional (1147) e Tortosa no nordeste (1148); analogamente, os nobres da
Alemanha setentrional e os governantes da Dinamarca lançaram um expedição
contra os pagãos Wends da costa báltica próximo de Stettin. Enquanto isto não
fazia parte do grande plano do Papa Eugênio, mas, ao invés disso, uma reação aos
apelos que lhe foram enviados, mostra a confiança nas cruzadas na época. Neste caso, este otimismo provou ser profundamente falso. Um grupo de cruzados
anglo-normandos, flamengos e renanos capturaram Lisboa em 1147 e as outras
campanhas ibéricas também foram bem sucedidas, mas a campanha báltica não
atingiu virtualmente nada e a expedição mais prestigiada de todas, aquela para
a Terra Santa, foi um desastre. Os dois exércitos não tinham disciplina,
suprimentos e financiamento, e ambos foram severamente maltratados pelos turcos
seljúcidas quando atravessaram a Ásia Menor. Então, em conjunção com os colonos
cristãos, os cruzados cercaram a cidade muçulmana mais importante na Síria,
Damasco. Mesmo assim, após somente quatro dias, receosos das forças de alívio
lideradas pelo filho de Zengi, Nur ad-Din, executaram uma retirada ignominiosa.
Os cruzados culparam os francos do Oriente Próximo por esta falha, acusando-os
de aceitar um suborno para retirarem-se. Qualquer que seja a verdade nisto, a
derrota em Damasco certamente prejudicou o entusiasmo cruzado no Ocidente e
cerca de três décadas mais tarde, apesar de apelos crescentemente elaborados e
frenéticos por ajuda, não houve nenhuma cruzada de grande porte na Terra Santa.
Lembrar
dos francos como inteiramente debilitados seria, contudo, um erro sério. Eles
capturaram Ascalão em 1153 para completar seu controle da costa levantina, um
avanço importante para a segurança do comércio e tráfego de peregrinos em
termos de reduzir o assédio pelo transporte muçulmano. No ano seguinte,
entretanto, Nur ad-Din tomou o controle em Damasco para marcar a primeira vez
que as cidades haviam se unido a Alepo sob o domínio do mesmo homem durante o
período cruzado, algo que aumentou grandemente a ameaça aos francos. A piedade
pessoal considerável de Nur ad-Din, seu encorajamento das madrajas
(instituições de ensino) e a composição de poesia jihad e textos exaltando as
virtudes de Jerusalém criaram uma ligação entre as classes religiosa e política
que faltavam visivelmente desde a chegada dos cruzados no
Oriente. Durante os anos 1160, Nur ad-Din, atuando como o campeão da ortodoxia
sunita, tomou controle do Egito xiita, aumentando dramaticamente a pressão
estrategicamente sobre os francos e, simultaneamente, aumentando os recursos
financeiros à sua disposição através da fertilidade do Delta do Nilo e do porto
vital de Alexandria.
Este
período da história do Oriente Latino é relatado em detalhes pelo mais
importante historiador da época, William, Arcebispo de Tiro. Ele era um homem
imensamente culto, que logo envolveu-se nas lutas políticas do final dos anos
1170 e 1180, durante o reinado da figura trágica do Rei Baldwin IV (1174 – 85),
uma juventude afetada pela lepra. A necessidade de estabelecer seu sucessor
forneceu uma oportunidade para facções rivais emergirem e provocar uma briga
interna entre os francos. Isto não quer dizer que eles fossem incapazes de
infligir perigo para o sucessor de Nur ad-Din, Saladino, que, de sua base no
Egito, esperava usurpar a dinastia de seu antigo mestre, unir os muçulmanos do
Oriente Próximo e expulsar os francos de Jerusalém. Em 1177, contudo, os
francos triunfaram na Batalha de Montgisard, uma vitória que foi extensamente
relatada na Europa Ocidental e fez pouco para convencer o povo dos
assentamentos para uma necessidade real por ajuda. A construção em 1178 e 1179
do grande castelo da Vau de Jacob, somente a um dia de galope de Damasco, foi
outro gesto de agressão que obrigou Saladino a destruir o lugar. Neste caso, em
1187 o sultão reuniu uma grande, porém frágil, coalizão de guerreiros do Egito,
Síria e Iraque que foi suficiente para levar os francos para o campo de batalha
e infligir lhes uma derrota terrível em Hattin em 4 de julho. Em questão de
meses, Jerusalém caiu e Saladino recuperou a terceira cidade muçulmana mais
importante, após Meca e Medina, um feito que ainda hoje tem efeitos.
Notícias
da queda calamitosa de Jerusalém provocou tristeza e ultraje no Ocidente. O
Papa Urbano III supostamente morreu de um ataque cardíaco ao saber das notícias
e seu sucessor, Gregório VIII, emitiu um apelo emocionado de cruzada e os
governantes da Europa começaram a organizar suas forças. O exército alemão de
Frederico Barbarossa derrotou com sucesso os turcos seljúcidas na Ásia Menor
apenas para o imperador se afogar em um rio no sul da Turquia. Logo depois,
muitos dos alemães morreram de doenças e Saladino escapou enfrentando esse
inimigo formidável. Os francos no Levante conseguiram agarrar-se à cidade de
Tiro e então cercaram o porto mais importante na costa, Acre. Isto forneceu um
alvo para as forças ocidentais e foi lá, no verão de 1190, que Filipe Augusto e
Ricardo Coração-de-Leão desembarcaram. O cerco durou quase dois anos e a
chegada dos dois reis ocidentais e suas tropas deu aos cristãos o impulso que
eles precisavam. A cidade se rendeu e o prestígio de Saladino foi duramente
afetado. Filipe logo voltou para casa e, enquanto Ricardo fez duas tentativas
de marchar para Jerusalém, temores quanto às perspectivas de longo prazo após
ele ter ido embora significaram que a cidade santa permaneceria em mãos
islâmicas. Assim, a Terceira Cruzada falhou em seu objetivo principal, apesar
de ter permitido aos francos recuperar uma faixa de terras ao longo da costa
para fornecer uma cabeça de ponte para expedições futuras. De sua parte,
Saladino sofreu uma série de derrotas militares, mas, crucialmente, manteve o
controle de Jerusalém com o Islã.
O
pontificado de Inocente III (1198 – 1216) presenciou outra fase na expansão das
cruzadas. Campanhas no Báltico avançaram bem e a guerra santa na Ibéria seguiu
a passos rápidos também. Em 1195, os mulçumanos esmagaram as forças cristãs na
Batalha de Alarcos, que, logo após o desastre em Hattin, pareceu mostrar o
desgosto profundo de Deus com Seu povo. Em 1212, entretanto, os governantes da
Ibéria uniram-se para derrotar os islâmicos na Batalha de Las Navas de Tolosa para
marcar a recuperação da península. No sul da França, enquanto isso, esforços
para combater a heresia cátara[2], mas no final suas raízes na sociedade local
significavam que eles podiam durar e foi somente através de técnicas mais
persuasivas da Inquisição, iniciada nos anos 1240, que a Igreja teve sucesso
onde a força falhou.
O
episódio mais infame desta época foi a Quarta Cruzada (1202 – 04) que viu outro
esforço para recuperar Jerusalém terminar no saque de Constantinopla, a maior
cidade cristã do mundo. As razões para isto foram uma combinação de tensões de
longa data entre a Igreja Latina (católica) e a Ortodoxia Grega; a necessidade
para os cruzados em cumprir os termos de um contrato extremamente otimista para
transporte ao Levante com os venezianos e a oferta de pagar este serviço por um
pretendente ao trono bizantino. Esta combinação de circunstâncias levou os
cruzados às paredes de Constantinopla e quando seu candidato jovem foi
assassinado e os locais se voltaram definitivamente contra eles, eles atacaram
e pilharam a cidade. No início, Inocente ficou feliz por Constantinopla estar
sob domínio latino, mas quando soube da violência e pilhagem que acompanhou a
conquista, ele ficou horrorizado e castigou os cruzados pela “perversão de seus
peregrinos”.
Uma
consequência de 1204 foi a criação de uma série de Estados Francos na Grécia
que, com o tempo, também necessitaram apoio. Assim, no curso do século XIII, as
cruzadas foram criadas contra esses cristãos, apesar de em 1261 Constantinopla
ter voltado a mãos gregas.
Apesar
destes desastres, é interessante ver que as cruzadas permaneceram um conceito
atraente, algo feito pela quase lendária Cruzada das Crianças de 1212.
Inspirada por visões divinas, dois grupos de camponeses jovens (melhor
descritos como adolescentes, ao invés de crianças) reuniram-se em torno de
Colônia e próximo a Chartres na crença de que sua pureza garantiria aprovação
divina e os permitiria recuperar a Terra Santa. O grupo alemão atravessou os
Alpes e alguns alcançaram o porto de Gênova, onde a realidade dura de não ter
dinheiro ou esperança real de alcançar algo significou a recusa de passagem para
o Oriente e o empreendimento inteiro colapsou.
Assim, o
início do século XIII ficou caracterizado pela diversidade das cruzadas. A
guerra santa estava se tornando um conceito flexível e adaptável que permitiu à
Igreja direcionar a força contra seus inimigos em diversas frentes. A lógica da
cruzada, como um ato defensivo para proteger cristãos, poderia ser refinado
para se aplicar especificamente à Igreja católica e, assim, quando o papado
entrou em conflito com o imperador Frederico II por causa do controle da Itália
meridional, eventualmente foi convocada uma cruzada contra ele. Frederico já
havia sido excomungado por falhar em cumprir suas promessas em tomar parte na
Quinta Cruzada. Esta expedição atingiu a intenção original da Quarta Cruzada de
invadir o Egito, mas ficou atolada fora do porto de Damietta antes que uma
tentativa pobre de marchar sobre Cairo tenha colapsado. As tentativas de
Frederico de torna-la boa foram frustradas por doença, mas nesta época o papado
já havia perdido a paciência com ele. Recuperado, Frederico foi à Terra Santa
já que, nesta época, o rei de Jerusalém (por casamento com a herdeira do trono)
era – por mais irônico que seja – um excomungado negociou a restauração
pacífica de Jerusalém para os cristãos. Suas habilidades diplomáticas (ele
falava árabe), o perigo resultante de seus recursos consideráveis, assim como
as divisões no mundo islâmico nas décadas que se seguiram à morte de Saladino,
permitiram lhe conseguir isso. Um período breve de relações melhores entre o
Papa e o imperador se seguiu, porém em 1245 a cúria o descreveu como um herege e autorizou a convocação de
uma cruzada contra ele.
Além do excesso
de expedições cruzadas que aconteceram ao longo dos séculos, temos que lembrar
também que o lançamento de tais campanhas teve um profundo impacto nas terras e
povos de onde eles vieram. As cruzadas exigiam níveis substanciais de suporte
financeiro e isto, com o tempo, presenciou a emergência de impostos nacionais
para apoiar tais esforços, assim como esforços para levantar dinheiro dentro da
própria Igreja. A ausência de um grande número de nobres experientes e clérigos
poderia afetar o balanço político de uma área, com oportunidades para mulheres
para agir como regentes ou para vizinhos inescrupulosos para desafiar a
legislação eclesiástica e tentar tomar as terras de cruzados ausentes. A morte
ou desaparecimento de um cruzado, sendo uma figura menor ou um imperador,
obviamente levava tragédia pessoal para aqueles que eles deixaram para trás,
mas pôde também precipitar instabilidade e mudança.
No ano
anterior, Jerusalém caíra de volta em mãos muçulmanas e isto foi o principal
motivo para o que tornou-se a grande expedição cruzada do século (conhecida
como Sétima Cruzada) liderada pelo Rei (depois Santo) Luís IX da França. Bem
financiado e preparado cuidadosamente e com uma vitória anterior em Damietta,
esta campanha poderia ter sido definida como justa não fosse a acusação
imprudente contra o irmão de Luís na Batalha de Mansoura (Egito) de enfraquecer
as forças cruzadas. Isto, associado com o endurecimento da resistência islâmica,
levou a expedição a uma interrupção e, famintos e doentes, eles foram obrigados
a se render. Luís permaneceu na Terra Santa por mais quatro anos – um sinal de
sua culpa na falha da campanha, mas também um comprometimento formidável para
um monarca europeu estar ausente de sua casa por um total de seis anos –
tentando fortalecer as defesas do reino latino. Nesta época, com os latinos
largamente confinados a uma faixa costeira, os colonos confiavam em fortalezas
crescentemente mais fortificadas e foi durante o século XIII que castelos
poderosos como o Krak des Chevalier, Safet e Chastel Pelerin, assim como as
imensas fortificações urbanas de Acre, tomaram forma.
Por volta
desta época, a complexidade política do Oriente Médio estava mudando. Os
invasores mongóis acrescentaram outra dimensão à luta enquanto eles
conquistavam muito do mundo islâmico no leste; eles também ameaçaram brevemente
a Europa Oriental com incursões selvagens em 1240-41 (fato que também provocou
um apelo à cruzada). Os sucessores de Saladino foram substituídos pelos
mamelucos, os antigos soldados-escravos, cujo líder, o sultão Baibars, era um
expoente fanático da guerra santa e fez muito para trazer os estados cruzados a
seus joelhos nas duas décadas seguintes. Lutas internas entre a nobreza franca,
complicadas ainda mais pelo envolvimento das cidades comerciais italianas e as
ordens Militares serviram para enfraquecer mais os Estados Latinos e
finalmente, em 1291, o Sultão al-Ashraf invadiu a cidade de Acre e encerrou o
domínio cristão na Terra Santa.
As
Cruzadas sobreviveram na memória e imaginação dos povos da Europa Ocidental e
do oriente Médio. No primeiro, elas ganharam popularidade através da literatura
romântica de escritores como Sir Walter Scott e, quando as terras do Oriente
Médio caíram nas mãos dos impérios do século XIX, os franceses, em particular,
escolheram estabelecer vínculos com seu passado cruzado. A palavra tornou-se
sinônimo de uma causa com direito moral, seja em contexto não-militar, como a
cruzada contra o alcoolismo, ou nos horrores da Primeira Guerra Mundial. A
ligação do general Franco com a Igreja Católica na Espanha invocou a ideologia
cruzada em talvez a encarnação moderna mais próxima da ideia e ela permanece
uma palavra em uso comum hoje em dia.
No mundo
muçulmano, a memória dos Cruzados enfraqueceu, apesar de não ter desaparecido,
da visão e Saladino continuou sendo uma figura ainda vista como exemplo de
grande governante. No contexto do século XIX, a invocação dos europeus do
passado sobre esta memória e a imagem de ocidentais hostis e agressivos
buscando conquistar as terras islâmicas ou árabes tornou-se extremamente
potente para líderes nacionalistas islâmicos, e Saladino, o homem que
recapturou Jerusalém, permanece como um homem idolatrado.
Notas:
[1] A Questão das
investiduras, Controvérsia das Investiduras, ou mesmo Guerra das
Investiduras foi o conflito mais significativo entre Igreja e Estado na Europa
medieval. Nos séculos XI e XII, uma série de papas lutaram contra a intromissão
das monarquias europeias nas investiduras (nomeações) de bispos, abades e dos
próprios papas, tentando restaurar a disciplina eclesiástica. A polêmica foi
finalmente resolvida pela Concordata de Worms em 1122.
[2] O catarismo
foi um movimento cristão de ascetismo extremo na Europa Ocidental entre os anos
de 1100 e 1200, estreitamente ligado aos bogomilos da Trácia. O movimento foi
tão forte no sul da Europa e na Europa Ocidental que a igreja Católica Romana
passou a considerá-lo uma séria ameaça à religião ortodoxa. O catarismo teve
suas raízes no movimento pauliciano na Armênia e no Bogomilismo na Bulgária que
teve influências dos seguidores de Paulo. A ideia de dois deuses ou princípios,
sendo um bom outro mau, foi fundamental para as crenças dos cátaros. O Deus bom
era o Deus do Novo Testamento e criador do reino espiritual, em oposição ao
Deus mau que muitos cátaros identificavam como Satanás, o criador do mundo
físico do Antigo Testamento. Toda a matéria visível foi criado por Satanás, e
portanto foi contaminada com o pecado, isto incluía o corpo humano. Esse
conceito é oposto à Igreja Católica monoteísta, cujo princípio fundamental é
que há somente um Deus que criou todas as coisas visíveis e invisíveis. Os
cátaros também pensavam que as almas humanas eram almas sem sexo de anjos
aprisionadas dentro da criação física de Satanás amaldiçoado a ser reencarnado
até os fiéis cátaros alcançarem a salvação por meio de um ritual chamado Consolamentum.
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