No início do século 14, o xogunato de
Kamakura estava irremediavelmente em crise. Os esforços de guerra para impedir
a invasão do arquipélago japonês pelos mongóis, em 1274 e 1281, haviam exaurido
os recursos do governo militar. Além disso, entre os súditos do clã Hojo, que
então controlava o xogunato, havia um clima de crescente ressentimento, pois
muitos acreditavam não terem sido devidamente recompensados por ajudar a deter
os mongóis. Tirando proveito do ambiente de insatisfação, o imperador Godaigo
tentou restaurar seu poder. Em 1333, com a ajuda do general Ashikaga Takauji,
um samurai descendente do clã Minamoto, ele derrubou o xogunato de Kamakura.
Mas a alegria de Godaigo não durou. Em 1338, o próprio Takauji resolveu tomar
as rédeas do governo. Indicou um novo imperador, assumiu o título de xogum e
instalou a nova capital do país em Kyoto. Era o início do chamado Período
Muromachi – em alusão ao nome do distrito em Kyoto onde Ashikaga construiu a
sede de seu governo.
O xogunato da família Ashikaga duraria
pouco mais de dois séculos (até 1573), mas sem o mesmo poder do bakufu de
Kamakura. A autoridade central estava desmantelada, criando um vácuo de poder
que permitiu o surgimento de diversos senhores feudais regionais, os daimiôs.
Embora formalmente subordinados ao xogum, esses daimiôs (que significa
literalmente “grande nome”) tinham poder quase ilimitado em seus domínios. Em
meados do século 15, havia cerca de 260 daimiôs no Japão – o que, na prática,
significava a existência de 260 estados, cada qual com seu exército e alguns
até com moeda própria.
Em 1467, a disputa em torno da
sucessão do xogum entre dois dos clãs mais influentes da época, os Hosokawa e
os Yamana, deu início à Guerra de Onin. Os confrontos arrastaram-se por dez
anos, causaram milhares de mortos e deixaram a cidade de Kyoto arrasada. Foi
apenas o prelúdio de um longo período de guerra civil que envolveria vários
daimiôs, que disputavam territórios e tentavam aumentar sua esfera de
influência. Esse período de caos e desordem duraria pouco mais de um século e
ficaria conhecido como Período Sengoku – a Era dos Estados em Guerra. Foi a
época de ouro dos samurais. Nunca eles foram tão úteis e necessários. Afinal, a
disputa entre os daimiôs rivais era decidida pela força da espada.
A espada era a lei
Nesse período da lei do mais forte,
sobressaíram principalmente três personagens: Oda Nobunaga, Toyotomi Hideyoshi
e Tokugawa Ieyasu. Eles seriam os principais responsáveis pela reunificação do
Japão, restabelecendo o poder em uma autoridade central. O primeiro homem a
tentar recolocar o Japão sob comando centralizado foi Oda Nobunaga, daimiô da
província de Owari (atual Nagoya). Não por acaso, o selo de seu clã continha a
inscrição Tenkafubu, que pode ser livremente traduzida como “todo o Japão sob
uma única espada”.
A fama de Nobunaga começou a se
espalhar em 1560, quando ele tinha 26 anos. Liderando 3 mil samurais, ele
derrotou a tropa do clã Imagawa – que contava com 30 mil homens – na épica
Batalha de Okehazama. A estratégia de Nobunaga foi atacar o inimigo de surpresa
(os adversários festejavam uma vitória em outra batalha) e centrar o foco no
chefe do clã rival, Imagawa Yoshimoto (que foi rapidamente capturado e
decapitado, levando seus comandados a desistirem de lutar).
Nobunaga foi o primeiro general
japonês a aprender a usar eficientemente as armas de fogo, introduzidas no
Japão pelos portugueses, em 1543. Antes de Nobunaga, o uso de arcabuzes não era
visto pelos japoneses como prático nos campos de batalha, já que a operação de
carregar a pólvora, introduzir o projétil na arma e puxar o gatilho era muito
demorada. Em vez de um único soldado cuidar de todo o processo, Nobunaga passou
a usar grupos de quatro homens: o primeiro limpava a arma, o segundo a enchia
de pólvora, o terceiro a municiava com a bala e o quarto concentrava-se em
disparar, diminuindo o intervalo entre os tiros. Fascinado pelas coisas do
Ocidente, Nobunaga adotou o cristianismo, que havia sido introduzido no Japão
por missionários portugueses. Em 1571, demonstrando seu desprezo pelo budismo,
Nobunaga arrasou o mosteiro do Monte Hiei, em Kyoto, que servia de base para
monges guerreiros, vistos por ele como uma ameaça às suas ambições de poder.
Cruel e implacável, Nobunaga ordenou o massacre de cerca de 3 mil monges e seus
familiares, incluindo mulheres e crianças. A essa altura, Nobunaga controlava
toda a região central do Japão e continuava a ampliar seus domínios. Mas o
sonho de unificar o país sob sua espada foi interrompido em 1582, quando ele
sofreu uma emboscada armada por um de seus principais oficiais, o general
Akechi Mitsuhide. Não se sabe ao certo se Nobunaga foi assassinado ou se foi
obrigado a cometer suicídio. Conta-se que o jovem Mori Ranmaru, adolescente que
servia de criado e, segundo alguns, mantinha um relacionamento amoroso com
Nobunaga, morreu junto com seu mestre.
Após a morte de Nobunaga, um de seus
mais próximos auxiliares, Toyotomi Hideyoshi, agiu rápido. Matou o traidor
Mitsuhide e depositou sua cabeça no túmulo de Nobunaga. Hideyoshi logo emergiu
como o novo líder militar do Japão, prosseguindo o trabalho de unificação do
país. Para reduzir o risco de insurreições, determinou que somente os samurais
podiam portar armas. Além disso, criou barreiras para a mobilidade social,
estabelecendo uma linha demarcatória nítida entre os camponeses e os soldados.
Os samurais não poderiam mais cultivar a terra e passariam a viver próximos aos
castelos, recebendo um “salário” em quantidade de arroz. Assim, os samurais
tornavam-se uma classe permanente e suas prerrogativas seriam transmitidas de
geração a geração. Na prática, Hideyoshi queria evitar o risco de que surgisse
alguém como ele – um camponês que ascendeu a comandante supremo do país. Em
1591, o franzino general controlava quase todo o Japão.
Mas Hideyoshi queria mais. Sua ambição
era estender o império nipônico por toda a Ásia. Em 1592, enviou 200 mil
soldados para a Coréia, com o objetivo de chegar até a China. Mas as forças de
Hideyoshi encontraram inesperada resistência de guerrilheiros coreanos,
auxiliados por chineses. A operação foi um fiasco. Em 1597, Hideyoshi enviou
nova expedição à Coréia. No ano seguinte, porém, o general caiu doente e, no
leito de morte, convocou um conselho de cinco regentes – entre eles Tokugawa
Ieyasu – para governar o país até que seu filho Hideyori, então com cinco anos,
atingisse a maioridade. No entanto, os regentes não se entenderam e iniciaram
uma luta aberta pelo poder, que culminou com a Batalha de Sekigahara, em 1600.
Cerca de 160 mil samurais participaram do combate, que terminou com a vitória
de Tokugawa. Essa batalha marcou o fim do Período Sengoku. Em 1603, Tokugawa
foi nomeado xogum e transferiu a sede do governo para Edo (atual Tóquio).
Nobunaga havia iniciado a unificação do Japão, Hideyoshi havia concluído o
processo e, agora, caberia a Tokugawa desfrutar de um período de paz. Mas o
novo xogum não sossegou antes de eliminar a última ameaça ao seu poder. Em 1615,
atacou o Castelo de Osaka, a base de Hideyori, e obrigou-o a cometer seppuku.
Nos próximos dois séculos e meio – até a Restauração Meiji, em 1868 –, Tokugawa
e seus descendentes governariam o Japão de forma quase absoluta.
Minha
casa, meu castelo
O Período Sengoku foi a época de ouro
para a proliferação de castelos no Japão. No início, essas construções eram
erguidas no alto de montanhas de difícil acesso, pois a principal finalidade
era servir de abrigo para os daimiôs, os senhores feudais, quando necessário.
Essas fortalezas eram relativamente pequenas e não contavam com muitas torres,
valas e outras estruturas de defesa. Em geral, aproveitavam as características
naturais da área – relevo, vegetação, rios – para dificultar o acesso dos
inimigos. Com o tempo, os castelos passaram a ser construídos em colinas não
tão altas, desde que permitissem uma boa visão da área circunvizinha.
Os castelos serviriam não somente de
residência segura para os senhores feudais, mas também de sede do governo
provincial. As fortalezas foram adquirindo características de palácios, cada
vez maiores e imponentes. Era uma forma de demonstrar poder e intimidar
inimigos – quanto maior o castelo, mais rico e influente era o senhor feudal. O
Castelo de Azuchi, construído pelo general Oda Nobunaga entre 1576 e 1579, às
margens do Lago Biwa, foi um dos mais exuberantes erguidos no Japão. Tinha sete
andares, era coberto de ouro e decorado internamente com luxuosas obras de
arte. De lá, Nobunaga sonhava governar todo o país.
No entanto, o general morreria pouco
depois, em 1582, e o castelo foi destruído. A exemplo do que ocorreu na Europa,
muitos castelos no Japão foram embriões de futuras cidades. Em seu entorno
foram surgindo outras casas e florescendo o comércio. Os samurais também moravam
em residências permanentes nas proximidades do castelo – quanto mais perto,
maior o prestígio do guerreiro. As casas dos samurais eram relativamente
modestas, mas eram as únicas com permissão para ter muros e portões.
Com a instalação do xogunato de
Tokugawa Ieyasu, em 1603, o Japão entrou num longo período sem guerras, o que
levou os castelos à decadência. Tokugawa baixou uma ordem para que cada
província tivesse um castelo – nem mais, nem menos. Províncias que não possuíam
castelos foram obrigadas a construir um, embora fosse totalmente inútil em
tempos de paz. Outras, que possuíam mais de um castelo, tiveram de demolir
construções de importância histórica apenas para cumprir o decreto de Tokugawa.
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