terça-feira, 24 de setembro de 2013

[SGM] O Primeiro e o Último: A Biografia de Adolf Galland


 

No início da Segunda Guerra Mundial, Adolf Galland era um tenente aviador na Luftwaffe, tendo obtido certa experiência com a legião Condor na Guerra Civil Espanhola. Ele ascendeu ao posto de Inspetor de Pilotos durante a guerra e a terminou em combate novamente como o comandante da maior (e praticamente única) unidade de caças a jato da Alemanha, lutando contra chances esmagadoras com o primeiro interceptador a jato do mundo, o lendário Messerschimidt 262.

 

O Primeiro e o Último não é, de fato, uma autobiografia – apesar de o autor descrever brevemente seus anos de juventude, o livro termina em 1945 (Galland viveu mais algumas décadas após a guerra). Nem o leitor encontrará muitos detalhes sobre a vida na Alemanha Nazista, exceto onde a política nazista influenciava as operações da Luftwaffe (uma parte significativa do livro, particularmente nos estágios finais da guerra). Este livro não é mais e nem menos o que ele afirma ser, a estória da equipe de caças da Alemanha vista pelo homem que tornou-se intimamente associado a ela.

 

A primeira parte do livro ilustra o entusiasmo como a juventude alemã abraçou o vôo, apoiado tacitamente pelo governo com seu apoio às escolas de planadores. Naqueles dias, era totalmente aceitável para os jovens construírem seus próprios planadores e entrarem neles para competições. Como muitos pilotos de caças, Galland parece ter sido um jovem altamente espirituoso, qualidade que os deixavam em boa posição se eles fossem capazes de aceitar também a disciplina. Falando sobre a Guerra Civil Espanhola, ele menciona sua alta estima em relação à habilidade dos republicanos em ocultar sua força terrestre. De forma interessante, ele também nota que pelo menos alguns alemães tinham certas reservas sobre Franco e suas reais intenções, e que a alta desigualdade na Espanha ainda parecia existir apesar da retórica de ambos os lados. Ao longo do livro, Galland não faz muitos comentários políticos, de modo que aqueles que aparecem são frequentemente interessantes.

 

De principal interesse para muitos leitores britânicos, será a visão de Galland sobre a Batalha da Inglaterra. Durante a campanha, ele comandou o JG26 sobre a costa do Canal. Olhando para este período, ele nota que é ainda difícil com retrospecto estabelecer se a Operação Leão Marinho (a invasão das ilhas britânicas) poderia ter sido bem sucedida se ela tivesse sido lançada quase imediatamente, ao invés de ter sido planejada no prazo dilatado como foi. Suas principais explicações para a primeira falha da Luftwaffe são o pequeno alcance do Me 109 na época (cobrindo um décimo do território britânico dos aeródromos franceses) e a baixa disponibilidade da força de bombardeiros, possuindo somente entre 600 e 700 bombardeiros médios. Quando consideramos que levou dois anos de 1.000 missões de bombardeio aéreo pela frota Aliada bem mais numerosa para causar estragos significativos na Alemanha, devemos necessariamente concordar com o ponto de vista de Galland. Como ele mostra, esta foi também a primeira campanha aérea estratégica independente da história e as lições ainda estavam sendo aprendidas com uma força aérea que tinha apenas quatro anos de idade. Os Aliados ocidentais aprenderam dessas experiências e as usaram contra a Luftwaffe mais tarde.

 

As partes mais interessantes do livro, contudo, são aquelas relacionadas ao declínio aéreo da Alemanha, e como Galland o relata. Apesar de que teria sido fácil (e simples) para ele juntar-se à onda do pós-guerra em repudiar Hitler e os nazistas, ele se afasta disto e, ao invés disso, procura por razões mais específicas. É difícil não ver, entretanto, que sua opinião de Göring não era particularmente boa. Desde cedo ele homenageia o papel de Göring como arquiteto da Luftwaffe (apoiado por Hitler), mas ele é muito superficial. Apesar de nunca usar apelidos, ele nota secamente que o “Gorducho” (que parece ter sido o apelido de Göering entre os comandantes) uma vez enviou caças noturnos em uma busca frenética através do Reich após ser enganado por um logro britânico. Mais tarde, a moral de Göring caiu ainda mais (de fato, no final da guerra somente o estranho senso de lealdade de Hitler para velhos camaradas parece ter garantido sua sobrevivência) e os comandantes de caça experientes o enfrentaram em 1945 com uma lista de preocupações sobre a condução da guerra aérea. Apesar de seu desejo de evitar dar nome aos bois, Göring viu isto como uma rebelião e reagiu furiosamente, exilando alguns dos melhores pilotos a postos distantes tão longe quanto a Itália e apontando Galland como o líder do grupo. Ironicamente, isto deu a Galland o que ele queria, retirando-o da Inspeção de Pilotos e indo para o comando do esquadrão de Me 262, um padrão para o qual os poucos pilotos de caça restantes da Luftwaffe buscavam nos últimos dias desesperados da guerra.  

 

O próprio Hitler não surge particularmente bem no livro. Novamente, apesar de Galland se afastar das críticas diretas e fáceis do ditador, ele deixa claro que a interferência de Hitler no assunto do Me 262 – sua exigência de converter o caça a jato em um bombardeiro – era lembrada com horror pelos profissionais. De fato, há um momento particularmente seco quando ele nota que Hitler grita “Nenhum de vocês teria pensado nisto!” e deixa o leitor sem dúvidas por que nenhum dos aviadores e estrategistas havia pensado nisto. Apesar de Alfred Price (ex-piloto da RAF e autor de livros militares) ter recentemente justificado a decisão de Hitler, o consenso de opinião é que na visão da grave situação estratégica aérea sobre a Alemanha na época, a tentativa de converter o Me 262 em um bombardeiro resultou em atrasos sérios que poderiam ter sido evitados. O Heinkel 162, o último caça a jato que fascinou os estrategistas militares por muitas décadas após a guerra, também sofre crítica severa, tanto o avião em si como o plano insano de usar membros da Juventude Hitlerista treinados com planadores como pilotos (um “massacre em massa no ar”, como Galland relembra). No frigir dos ovos, apesar de um número de aeronaves ter sido entregue, dificilmente alguém a viu em ação e o plano de usar pilotos adolescentes felizmente jamais rendeu frutos. Na visão da influência que o He 162 teve no pensamento do pós-guerra, os comentários de Galland são muito interessantes. Apesar de ser complementar em relação ao avião movido a foguete Messerschmidt 163, ele também nota que a obsessão no final da guerra com “defesa pontual” (tendo pequenos grupos de aviões defendendo alvos particulares) também era um beco sem saída. É difícil na visão do que ele diz discordar com seus comentários de que os recursos teriam sido melhor aplicados se fossem para o Me 262, um projeto aprovado com sucesso na prática.

 

O autor do livro é altamente profissional e sintético, sem aridez excessiva ou autopiedade moralizante. Apesar de Galland obviamente ver o bombardeio das cidades alemãs com ódio, ele evita se posicionar contra os Aliados neste assunto, assim como ele evita discutir a maldade do regime ao qual ele serviu. Um prefácio interessante do livro é feito pelo ás da RAF Douglas Bader, que foi atingido por Galland ou um de seus homens sobre a França (resultando na perda de suas pernas) e que encontrou-se com o ás alemão após sua captura. Bader relata o incidente em sua biografia, Em Busca dos Céus, e Galland acrescenta sua própria versão dos eventos e como Bader quase o convenceu a deixá-lo voar em um Me 109 em torno do aeródromo! Ambos os homens parecem ter tido uma admiração verdadeira entre si, e acredito que tenham mantido contato após a guerra. Bader estava ciente dos horrores do Nazismo, mas exonera Galland de envolvimento direto já que enquanto jovem não podia ser responsabilizado pelas visões e ações de Hitler e seus homens. Ao invés disso, ele encerra o livro dizendo:

 

Por qualquer critério, Galland é um bravo, e eu pessoalmente desejo encontrá-lo algum dia em qualquer lugar e em qualquer companhia.

 

http://www.cyberlizard.plus.com/Books/books_agalland.html


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