segunda-feira, 14 de outubro de 2013

[POL] Hitler e as mulheres

As Mulheres no Terceiro Reich



As mulheres tiveram um papel central no plano de Adolf Hitler em criar uma Comunidade Alemã (Volksgemeinschaft) ideal. Hitler acreditava que uma população maior e mais racialmente pura fortaleceria a força militar da Alemanha e daria colonos em número suficiente para serem assentados nos territórios conquistados da Europa oriental. A agressiva política do Terceiro Reich em relação à população encorajou mulheres “racialmente puras” a parir tantas crianças “arianas” quanto fosse possível.

Antes de 1931, muitas organizações femininas apoiaram o nacionalismo, algumas abertamente defendendo o NSDAP (Partido Nazista) de Hitler. O Movimento Nacionalista Newland de Guida Diehl recrutava mulheres bem educadas da comunidade protestante e escreveu em suas memórias suas primeiras impressões sobre Hitler em meados dos anos 1920: “Sério, afetuoso e natural – ele corre atrás de seus objetivos. Ele não trouxe nada de novo. Apenas um resumo do melhor de nossa tradição nacional. Ele ofereceu uma organização dinâmica onde outros confiavam em política partidária sem inspiração.”

As mulheres católicas eram mais cautelosas, mas há muito tempo já haviam endossado visões social e politicamente conservadoras, e começaram a clamar por uma “democracia autoritária”.

Em 1931, muitas organizações femininas nacionais e nacional socialistas juntaram-se sob a NS Frauenschaft, que mais tarde foi declarada a organização oficial para mulheres no Terceiro Reich. Gertrud Scholtz-Klink liderou este grupo de 1934 até 1945. Ela começou pela organização das mulheres em Baden, um pequeno estado liberal e católico no sudoeste da Alemanha, após ficar viúva em 1928 com seis crianças para cuidar. Como líder das mulheres do Reich (Reichsfrauenfuhrerin), ela regularmente tinha que encarar encontros com o Führer e compartilhar o palanque com ele durante as principais reuniões das mulheres.

Apesar de sofrer grande miséria após a Guerra, inclusive prisão, Scholtz-Klink desapontou e enfureceu um mundo que esperava que ela mostrasse arrependimento por seu passado nazista. Após entrevistar ela em 1987, a autora feminista Claudia Koonz escreveu, “... ela não é uma ex-nazista. Sem um traço de ironia, ela lembrou que ‘se você pudesse ter visto as mulheres de Berlim defendendo sua cidade com suas vidas contra os russos, então você acreditaria o quão profundo as mulheres alemãs amavam nosso Führer.’”

Em 1932, reconhecendo o gênio cinematográfico de Leni Riefenstahl, Hitler marcou um encontro e lhe disse que quando ele assumisse o governo, “você deve fazer os meus filmes.” Após ela completar o documentário Vitória da Fé, ele prometeu-lhe recursos ilimitados e completo controle artístico para o filme da Reunião do Partido em Nuremberg em 1934. O resultado, o famoso O Triunfo da Vontade, ganhou aclamação internacional, incluindo o Prêmio Cinematográfico de Paris de 1937.

Em 1932, cerca de 50% dos votos nos nazistas vieram das mulheres.

Por outro lado, a União das Mulheres Nacional Socialistas e a Agência das Mulheres Alemãs usaram a propaganda nazista para encorajar as mulheres em focar em seus papeis como esposas e mães. Além de aumentar a população, o regime também buscava melhorar sua “pureza racial” através do “melhoramento da espécie”, notavelmente promulgando leis proibindo o casamento entre arianos e não-arianos, e simultaneamente prevenindo que deficientes e portadores de certas doenças pudessem se casar.

Em 1936, os líderes da SS criaram o programa governamental conhecido como Lebensborn (Fonte da Vida)*. Como uma extensão da Ordem de Casamento da SS de 1932, o decreto do Lebensborn de 1936 prescrevia que todo membro da SS deveria gerar quatro filhos, dentro ou fora do casamento. Os lares Lebensborn abrigavam bebês ilegítimos e suas mães, fornecia certidões de nascimento e apoio financeiro, recrutando pais adotivos para as crianças.
No final, contudo, o programa Lebensborn nunca foi promovido agressivamente. Ao invés disso, a política populacional nazista concentrou na família e no casamento. O Estado encorajava o matrimônio através de empréstimos para casamento, dispensava suplementos de renda familiar para cada nova criança, publicamente honrava famílias “ricas em crianças”, agraciava com a Cruz da Honra da Mãe Alemã as mulheres que tivessem quatro ou mais filhos e aumentava as punições para aquelas que cometessem aborto.

Durante a guerra, a necessidade por mão de obra fez com que o Estado arregimentasse mulheres para a força de trabalho (por exemplo, através do Ano do Dever, o plano de serviço compulsório para todas as mulheres). Em 1939, havia excepcionalmente uma alta porcentagem de mulheres trabalhando em comparação com outros países ocidentais: mais de 14 milhões estavam empregadas e quando a escassez de mão de obra apareceu no final da guerra, provou-se difícil levar as mulheres idosas ou mães de muitas crianças para as fábricas. Quando os bombardeios começaram, milhões de mulheres tiveram que abandonar as metrópoles em direção das pequenas cidades e vilarejos, onde elas tomavam conta de escolas locais e faziam trabalhos assistenciais. Em 1945, mais de 50% da força de trabalho nativa era feminina, um nível somente excedido pela União Soviética. Mesmo nas forças armadas, o número de mulheres em funções auxiliares se aproximava de 500.000. Portanto, a afirmação de que as mulheres sob o Terceiro Reich foram excluídas do mercado de trabalho é mito.

As Mulheres que Hitler amou

A primeira mulher na vida de Hitler foi sua mãe Klara. Como seu primogênito, ela direcionou seu amor para ele, mas logo um irmão mais novo, seguido de uma irmã, exigiram também sua atenção. Adolf cresceu segundo um caminho independente e aventureiro, interessado vivamente no mundo ao seu redor. Ele entrou em choque com seu pai por causa de sua escolha de carreira, mas não com sua mãe que permitiu-lhe seguir seu próprio caminho.

Foi a doença da mãe e a morte subsequente por câncer com 46 anos de idade que, somente dois anos após a morte de seu pai, podemos vislumbrar as fortes emoções de Hitler. De acordo com o médico da família, o jovem Adolf, então com 15 anos, deixou a escola em Viena e voltou para casa para acompanhar o estado de saúde dela, aplicando ele mesmo os dolorosos e caros tratamentos, e mesmo ajudando na manutenção da casa. Quando, um pouco antes do Natal, ela morreu, o médico relatou que nunca tinha visto alguém se abater tanto como Adolf Hitler com a perda de sua mãe**.

Foi em 1906 que Hitler ficou obsecado por Stefanie Jansten. Seu interesse pela filha de um funcionário público duraria muitos anos. Com 16 anos, ele decidiu casar-se com ela, escrevendo poemas românticos e mesmo enviando-lhe uma carta detalhando seu casamento iminente. Mesmo assim, os versos de amor permaneceram não lidos e a carta foi postada sem assinatura. Furioso por saber que ela havia dançado com outro rapaz em um baile, ele ameaçou jogar-se no Rio Danúbio. “Você deve saber. Estou apaixonado por ela,” confidenciou para um amigo aquele dia. Mesmo durante a Segunda Guerra, em seu quartel-general Toca do Lobo na Prússia oriental, ele falaria com carinho de seu “primeiro amor”. De Stefanie, ele disse que entre tais “seres humanos excepcionais” não havia necessidade da usual forma de comunicação falada.

Contudo, Hitler teve somente dois relacionamentos sérios na vida, ambos terminando com o suicídio de suas parceiras: sua meia-sobrinha Geli Raubal, que matou-se para não ter que viver um relacionamento marcado pelo ciúmes doentio, e Eva Braun, que envenenou-se no bunker em Berlim ao invés de viver sua vida sem Hitler.

 Geli Raubal e Eva Braun

Angela Maria Raubal nasceu em Linz na Áustria em 4 de junho de 1908, onde ela cresceu com seu irmão Leo e a irmã Elfriede. Seu pai faleceu aos 31 anos, quando Geli tinha apenas dois anos de idade.

Parece que ela só conheceu Hitler aos dezesseis anos, quando ele estava preso na prisão de Landsberg, escrevendo Minha Luta que mais tarde o deixaria muito rico. Geli costumava chamá-lo de “Tio Alf”. Em 1927, os dois iniciaram um relacionamento e Hitler começou a tornar-se gradativamente obcecado.
Herrmann Göring mais tarde diria aos advogados nos julgamentos de Nuremberg que a morte de Raubal devastou Hitler de tal forma que ele mudou suas opiniões e relacionamentos com todas as pessoas***.

Após a Primeira Guerra Mundial, seu primo, William Patrick Hitler, assim descreveu Geli quando a encontrou em Obersalzberg.

Geli parecia mais com uma criança do que com uma moça. Você não podia dizer que ela era bonita exatamente, mas ela tinha um encanto natural. Ela geralmente não usava chapéu e vestia roupas simples, saias amassadas e blusas brancas. Sem jóias, exceto uma suástica dourada dada a ela pelo tio Adolf, que ela chamava de tio Alf.

À medida que Hitler ascendeu como líder do Partido Nazista, ele manteve um controle direto sobre Geli, a qual dividia o tempo entre o apartamento em Munique e a casa de campo em Berghof próxima de Berchtesgaden, onde sua mãe trabalhou como governanta após 1929. Ele não permitia amizades sem seu consentimento e tentou colocar pessoas confiáveis para vigiá-la, acompanhando-a nas compras, no cinema e na ópera. Havia boatos, inclusive, de que ele a mantinha fechada em casa durante o dia, quando não podia vigiá-la. Apesar dos esforços em controlar a garota – e talvez por esse motivo – Geli não retribuiu os sentimentos e tornou-se ligada a Emil Maurice, um dos fundadores da SS e chofer de Hitler. Hitler acabou demitindo-o, porém mais tarde o recontratou e o promoveu. Maurice mais tarde afirmou que Hitler “... a amava, mas era uma afeição estranha que não transparecia.” Se qualquer ressentimento apareceu em Hitler, ele não durou, já que os dois mais tarde se reconciliaram, após Maurice ser enviado durante a Noite das Longas Facas para assassinar Bernhand Stempfle, um ex-padre e ex-prisioneiro de Landsberg, que alguns dizem ter sido um dos editores do livro Minha Luta e conhecedor de detalhes do relacionamento entre Hitler e Geli.

No início dos anos 1930, Hitler estava financeiramente bem, de modo que ele alugou um apartamento em uma região valorizada de Munique, o número 16 da Prinzregentplatz. Este imóvel continha de 9 a 15 cômodos, dependendo dos relatos diferentes registrados de seu espaço. Curiosamente, Hitler mais tarde compraria o bloco inteiro de apartamentos com os direitos do Minha Luta e doações generosas a seu partido.

Em 19 de setembro de 1931, Geli cometeu suicídio com uma pistola, da própria coleção de Hitler. Ela só tinha 23 anos na época. Desde então boatos circularam de que sua morte foi encomendada, já que seu relacionamento com Hitler representaria supostamente um problema. 

Um homem com o qual ela se confidenciou foi Otto Strasser (1897 – 1974), uma figura importante no partido na época. “Você nunca acreditará nas coisas que ele me obriga a fazer,” teria dito ela a Strasser. Isto foi o que Strasser contou a amigos, mas todos sabiam da raiva que os irmãos Strasser sentiam por Hitler+. Otto começou a ser isolado dentro do partido e queria de todas as maneiras manchar a reputação de Hitler nas eleições vindouras.

Por outro lado, mesmo antes da morte de Geli, Hitler envolveu-se com Eva Braun, a mais famosa de suas mulheres. Hitler e Braun tornaram-se amantes em 1932. Ela ficou com ele por 13 anos, até a morte.

Eva Paula Braun nasceu em Munique em 6 de fevereiro de 1912 em uma família católica tradicional. Eva era a segunda filha do professor de escola secundária Friedrich "Fritz" Braun, um protestante não praticante, e Franziska "Fanny" Kronberger, que pertencia a uma respeitada família católica bávara. Sua irmã mais velha, Ilse, nasceu em 1909 e sua irmã mais nova, Margarete, nasceu em 1915. Eva foi educada em um liceu, então por um ano em uma escola de negócios em um convento, onde foi uma aluna regular e com bom desempenho em atletismo. Ela trabalhou por muitos meses como recepcionista num consultório médico e, então, com 17 anos, conseguiu um emprego como assistente de laboratório e modelo para Heinrich Hoffmann, fotógrafo oficial do Partido Nazista. Ela se encontrou com Hitler, 23 anos mais velho, no estúdio de Hoffmann em Munique em outubro de 1929. Ele foi apresentado a ela como “Sr. Wolf” (um apelido que ele usou nos anos 1920 por motivos de segurança). Ela o descreveu para os amigos como “um cavalheiro de certa idade, com um bigode engraçado, um casaco tipo inglês descolorido e carregando um grande chapéu de feltro.” Ele gostou da cor dos olhos dela, que lembravam os de sua mãe. A família de Eva se opôs ao relacionamento e pouco se sabe sobre ele nos dois primeiros anos.

Eva Braun tentou o primeiro suicídio em 1 de novembro de 1932, com a idade de 20 anos, atirando contr si no peito com a pistola de seu pai. Ela tentou suicídio mais uma vez em 28 de maio de 1935, tomando uma overdose de Fanodorm (comprimidos para sono). Após a recuperação de Braun, Hitler tornou-se mais comprometido com ela e conseguiu comprar com os direitos das várias fotografias dele feitas pelo estúdio de Hoffmann uma casa em Munique. Esta renda também garantiu a ela um carro, um motorista e uma empregada.  

Eva sabia que Hitler jamais se casaria, já que o objetivo dele era apenas a Alemanha. Ela passava o dia fazendo exercícios, lendo livros e escrevendo em seu diário, onde ela reclamava da infelicidade por Hitler dispensar pouco tempo a ela.

Mas, de acordo com o criado de Hitler, Heinz Linge, “ele telefonava para ela a cada dois dias. Se seus auxiliares ou (Martin) Bormann viajassem até Munique, ele lhes dava cartas para Eva.” Hitler apresentava Eva a seu círculo íntimo com palavras amáveis. Traudl Junge, a secretária de Hitler de longo tempo, lembrou que ele segurava sua mão, chamando-a de Mein Patscherl.

Uma carta de Hitler para Eva após a tentativa de assassinato de 1944, revela a ligação afetiva que se desenvolveu entre os dois:

Mein Liebes Tschapperl, Não se preocupe comigo. Estou bem, apenas um pouco cansado. Espero ir para casa logo e então descansar em seus braços. Há muito tempo preciso de um descanso, mas meu dever com o povo alemão vem em primeiro lugar acima de tudo. Não se esqueça de que os perigos que encontrei não se comparam àqueles que os soldados enfrentam na linha de frente. Obrigado pela prova de sua afeição e peço-lhe que agradeça ao seu querido pai e à sua graciosa mãe pelos cumprimentos e desejos de boa recuperação. Estou muito orgulhoso da honra – por favor, lhes diga isso – de ter o amor de uma mulher que vem de uma tal família distinta. Estou lhe enviando o uniforme que estava vestindo naquele dia infeliz. É a prova de que a Providência me protegeu e não tenho mais o que temer de nossos inimigos. De todo meu coração. Seu A.H.

A resposta de Eva:

Geliebter, estou for a de mim. Estou morrendo de ansiedade agora que sei que você corre perigo. Volte o mais rápido que puder. Sinto como se fosse ficar louca. O tempo está bonito aqui e tudo parece tão calmo que fico envergonhada disso. Você sabe que sempre lhe disse que morreria se algo te acontecesse. Desde o nosso primeiro encontro, te disse que te seguirei onde quer que você for, mesmo na morte. Você sabe que vivo apenas pelo seu amor. Sua, Eva.

Quando Hitler tornou-se Chanceler da Alemanha, Braun sentava-se na área VIP como secretária, fato que transtornava sua meia-irmã Ângela (mãe de Geli), junto com as esposas de outros ministros. Consequentemente, Ângela ficou proibida de viver próxima de Eva. Em 1936, Braun se mudou para Berghof, mesmo que Hitler passasse pouco tempo lá. Em 1938, Hitler nomeou Eva como sua principal herdeira, recendo uma pensão de 600 libras britânicas na época após sua morte (considerando a inflação desde então, hoje seriam 28.000 libras, ou quase R$ 100.000). Mesmo assim, a influência política de Braun sobre Hitler foi aparentemente mínima. Ela não participava de reuniões políticas ou econômicas. A única vez que ela envolveu-se com uma questão política foi em 1943, logo após a Alemanha adotar a economia de guerra total. Entre outras coisas, isto significava o banimento de cosméticos e outros luxos (que também ocorreu nos países aliados). Hitler é conhecido por ter se oposto ao uso de cosméticos femininos pelo fato deles serem produzidos a partir de material animal (ele era vegetariano) e algumas vezes mencionava isso nas refeições. De acordo com Albert Speer, Braun encontrou-se com Hitler imediatamente indignada com essas medidas, de modo que Hitler pediu a Speer reduzisse a produção de cosméticos ao invés da total interrupção de produção.

Linge escreveu em suas memórias  que Hitler e Eva tinham dois quartos e dois banheiros com portas interconectadas em Berghof e Hitler encerrava a maior parte de suas noites sozinho com ela em seu escritório antes deles irem para a cama. Ela vestiria uma camisola, bebendo vinho enquanto Hitler degustava chá.

Em 15 de abril de 1945, ela voou de Munique para Berlim. Hitler ordenou que ela retornasse a Munique, mas ela se recusou dizendo: “Você acha que eu vou te deixar morrer sozinho?” Nas primeiras horas de 29 de abril, Hitler e Eva se casaram. No mesmo dia, de acordo com Traudl Junge, quando Hitler mandou redigir seu Último Desejo e seu Testamento Político, ele desculpou-se pelos aborrecimentos a ela e pediu “com sua gentileza usual” que todas as necessidades de Eva fossem cumpridas.

Em seu Desejo, Hitler chama Eva de sua esposa três vezes, encerrando com “Eu e minha esposa... escolhemos a morte.”

Hitler e Braun nunca apareceram juntos em público e existe a indicação de que os dois não se casaram no início do relacionamento porque Hitler tinha medo de perder o apoio do eleitorado feminino. O povo alemão nunca soube da relação de Eva com Hitler até após a guerra.

Notas:

* A Trágica História das Crianças do Lebensborn


** O Judeu Favorito de Hitler        


*** Hitler foi o "chefe perfeito", diz ex-criada
 

+ Hitler era um pervertido sexual?


Fontes:





Desmascarando "O Segredo de Hitler"

Todos os Homens do Führer

Walter Reich

The New York Times, 16/12/2001


Lothar Machtan defende em O Segredo de Hitler que ele tem obteve evidência convincente de que Hitler era homossexual e que sua homossexualidade explica muito sobre quem Hitler era e por que ele fez o que fez. Machtan, de fato, tem tal prova? E se Hitler fosse de fato homossexual, isto forneceria a chave para a psicologia do homem ou para os modos no qual era revirou as fundações morais e humanas do século XX? As acusações da homossexualidade de Hitler, ativa ou latente, não são novas. Elas o perseguiram durante sua ascensão ao poder e após ele o ganhar. Elas fizeram parte de inúmeras biografias. E elas são a base de ocasionais imagens suas até hoje. Que Mel Brooks apresenta Hitler como um homossexual exagerado em “Os Produtores” – uma bicha idiota, histérica e revoltada, como o roteiro do musical o faz – não é mera coincidência.

O que Machtan acrescenta ao seu legado de afirmações e especulações é, ele diz, evidência histórica. Ele reconhece que algumas provas são apenas circunstanciais. Mas algumas, ele insiste, não são apenas concretas, mas também novas, pelo menos no modo que ele as desenvolve e defende sua credibilidade.

Machtan, que ensina história na Universidade de Bremen na Alemanha, sugere que Hitler provavelmente teve uma relação homoerótica com seu amigo August Kubizek, com quem ele viveu em Viena em 1908; que ele teve um caso sexual rude com um colega de farda durante a Primeira Guerra Mundial; que ele pode ter tido contatos homossexuais com jovens rapazes em Munique após a guerra; e que ele pode ter se envolvido em atividades homossexuais logo após chegar ao poder em 1933.

Além disso, Machtan argumenta que muito do que Hitler fez no poder foi influenciado não pelas razões que os historiadores geralmente costumam indicar, mas por causa de seu esforço em eliminar provas de sua homossexualidade. Assim, Machtan diz que em 1934 – quando Hitler ordenou o assassinato de, entre muitos outros, seu colega de longo tempo e chefe da organização paramilitar SA, Ernst Röhm, um declarado e bem conhecido homossexual – ele estava motivado principalmente pelo desejo de destruir evidência potencialmente perigosa de seu passado homossexual, e não para se livrar de alguma ameaça política ou militar. E a perseguição do regime nazista aos homossexuais era, diz Machtan, essencialmente causada pelo desejo de Hitler calar ou destruir pessoas de um mundo que ele já havia feito parte, alguns dos quais poderiam “revelar segredos desonrosos” sobre ele. Quanto aos envolvimentos de Hitler com várias mulheres – particularmente Eva Braun e sua meia-sobrinha Geli Raubal – Machtan argumenta que estas mulheres eram camuflagem para sua homossexualidade fundamental. A prova circunstancial da homossexualidade de Hitler que Machtan cita – e que ele constrói com considerável zelo – consiste em grande medida no meio homossexual presumido ou real que Hitler teria freqüentado em várias épocas de sua vida; os homossexuais ou possíveis homossexuais que estiveram associados a ele; e a variedade de fatos que poderiam ser explicados pela homossexualidade de Hitler, como o fato de seus superiores negarem promoção durante a Primeira Guerra Mundial.

A evidência concreta que Machtan apresenta é uma série de documentos que, ele afirma, tem sido injustificadamente ignorados ou dispensados. O principal documento desta categoria é o chamado Protocolo Mend, uma afirmação feita em 1939 por Hans Mend, um mensageiro militar que serviu com Hitler durante a Primeira Guerra Mundial. Mend testemunhou que durante a guerra ele tinha visto Hitler “dormindo á noite com Schmidt – Ernst Schmidt – seu amante.”

Machtan também cita textos deixados por Eugen Dollmann, o interprete de Hitler. Dollmann escreveu que ele ouviu de Otto Von Lossow, um general do Reichswehr em Munique após a Primeira Guerra Mundial, que havia um arquivo policial contendo testemunhos de rapazes em Munique que Hitler havia lhes pago para passar a noite com ele.

Mas a prova circunstancial que Machtan fornece é apenas isso – circunstancial. E a evidência concreta parece muito menos confiável do que ele poderia nos fazer crer. Hans Mend era um mentiroso habitual e chantagista e o general Lossow havia participado na repressão ao putsch de Hitler em 1923. Consequentemente, sua vida estava sendo ameaçada pelos simpatizantes de Hitler, e ele estava desesperado em convencê-los de que ele tinha prova incriminadora contra seu líder. 
Mas o maior problema com o livro de Machtan não é a confiabilidade de suas fontes, mas o seu modo de argumentação. Ele aceita qualquer coisa que se encaixe em sua tese e rejeita aquilo que não se encaixa. Sentimos, algumas vezes, que estamos lendo um relatório interno do FBI da época de J. Edgard Hoover ao invés de um trabalho sério de academicismo no qual o autor está pronto para ser guiado pelos fatos.

Para interpretar a prova do seu meio, Machtan emprega sugestão e insinuação. Ele faz perguntas retóricas planejadas para levar o leitor a respondê-las da maneira que apóie seu argumento, mesmo quando explicações alternativas são ao menos plausíveis. Ele introduz possibilidades que são então assumidas serem probabilidades e, então, certezas. Ao usar pontos de exclamação, ele destaca o que são provavelmente comentários inócuos de modo que eles parecem carregar conteúdo homoerótico. Em outras palavras, ele escreveu um livro tendencioso que é mais um depoimento para a promotoria do que um trabalho sério de história.

Machtan diz que ele quer entender “o Hitler de Auschwitz” e lamenta que saibamos tão pouco sobre o homem que produziu a maior profanação da história humana e da moralidade. Mas ele certamente não chega perto de explicar qualquer destruição de Hitler ao explorar sua sexualidade. Num certo sentido, isto pode na verdade servir para humanizar Hitler. Mas não serve para explicá-lo.  

Lothar Machtan (n. 1949) é um historiador alemão e professor na Universidade de Bremen, nascido em uma família judia em Gelsenkirchen.      

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